terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Como a televisão brasileira cobriu o julgamento de Lula?


SEXTA-FEIRA, 26 DE JANEIRO DE 2018

Como a televisão brasileira cobriu o julgamento de Lula?

por Intervozes — publicado 25/01/2018 16h00, última modificação 25/01/2018 20h26
Suposto equilíbrio no meio não surgiu do nada: Lula já estava condenado pela mídia antes do relator proferir seu voto
Cristiana Lobo e Gerson Camarotti, na GloboNews: "Dircurso de Lula sobre perseguição acabou"
Por Bia Barbosa*
Nos últimos anos o Intervozes monitorou a cobertura da chamada grande imprensa brasileira em episódios políticos considerados importantes para o país, como o dia em que o ex-presidente Lula foi levado coercitivamente para depor à Operação Lava-Jato, ao longo do processo de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, nos dias de greve geral convocadas pelos trabalhadores/as contra as reformas trabalhista e da Previdência, entre outros.


O mesmo ocorreu neste 24 de janeiro, quando Lula foi julgado em segunda instânciapelo Tribunal Regional Federal 4, em Porto Alegre. E, desta vez, algo chamou a atenção de quem estava acompanhando a mídia: no geral, a imprensa televisiva reportou o julgamento com certo distanciamento e uma suposta áurea de equilíbrio, não vista nos episódios anteriores.
O comportamento teve razão de ser. Em primeiro lugar, o trabalho de condenação de Lula perante à opinião pública foi feito anteriormente, ao longo de mais de dois anos de ataques, desde o primeiro indiciamento do ex-presidente.
Leia também:

Em segundo lugar, já havia uma previsão da confirmação da condenação de Lula pelo Tribunal, mesmo que o placar seguisse incerto. Não foi necessário, portanto, às vésperas do julgamento, inflar a população para ir às ruas; tampouco carregar nas tintas da análise política.
Por fim, diante do resultado sem divergências na segunda instância, bastou às TVs reportar o ocorrido e dar luz aos argumentos e declarações trazidos pelos próprios desembargadores. Afinal, ali estão todos de acordo com o resultado proferido na tarde desta quarta-feira.
Vale, contudo, registrar alguns momentos que se diferenciaram nesta cobertura. Neste primeiro artigo de uma série que sai nos próximos dias, destacamos a análise da imprensa televisiva.
GloboNews
Assim que o resultado foi proferido pelo presidente do TRF, desembargador Leandro Paulsen, a GloboNews iniciou sua análise sobre o julgamento com foco em três aspectos: o aumento da pena de Lula e a redução dos recursos disponíveis para a defesa, a desconstrução da linha da defesa de que aquele tinha sido um julgamento político e sem provase os próximos passos da disputa política em curso.
De Porto Alegre, a repórter Isabela Camargo destacou que “os desembargadores fizeram questão de refutar o argumento da defesa de Lula de que a ação estaria toda baseada nas declarações apenas de Leo Pinheiro”.
No estúdio, Gerson Camarotti e Cristiana Lobo comentaram:
“O PT fez uma politização, desde a 1a instância, atacando todo o colegiado. Vimos isso nas ruas, nas palavras das principais lideranças do partido. E todos os desembargadores destacaram em seus votos a imparcialidade do Tribunal. Mandaram um recado direto a essas críticas recebidas. (…) Vemos a consistência da decisão de 1ainstância e a contundência das provas na avaliação desses juízes, inclusive na questão do triplex”, acredita o jornalista, que mais tarde acrescentou: “Houve uma tentativa de constranger a Justiça. Houve isso na 1a instância com o Sergio Moro e depois se tentou criar esse embaraço ao TRF. (…) Esse mesmo Tribunal absolveu Vaccari duas vezes, e aí o PT elogiou a decisão e utilizou o TRF para questionar as decisões de Moro. Agora vem decisão contrária. Então só vale quando lhe favorece?”
“Todos os três amarraram com muita propriedade os votos que fizeram e isso dá dificuldade para o recurso da defesa. (…) Lula fez até aqui o discurso de perseguição e arguiu formalmente a suspensão do juiz Moro. Agora o Tribunal, por unanimidade, confirma a condenação de Moro e ainda amplia sua pena. O discurso de perseguição ele não poderá mais fazer”, opinou Cristiana. “Agora o STF pode tomar decisões em relação a outros investigados da Lava-Jato que tem prerrogativa de foro e mostrar que a Justiça está funcionando. Se algum deles tiver uma condenação confirmada pelo Supremo, esse discurso da celeridade e de que Lula é perseguido não vai prevalecer. Então a pressão sobre o Supremo vai aumentar”, avalia Cristiana.
Pelo visto, a Globo já começou a fazer sua parte.
O canal a cabo produziu então várias matérias com trechos dos votos proferidos pelos desembargadores e também da acusação – Ministério Público Federal (“a tropa de choque de Lula se aproximou da coação do Judiciário”) e advogado da Petrobras (“a empresa foi vítima de uma quadrilha”). Porém, depois de mais de duas horas de cobertura, nenhum trecho da sustentação da defesa de Lula ou de Paulo Okamotto havia ido ao ar.
Os telejornais noturnos do canal de notícias centraram sua análise no pós-julgamento. Eliane Catanhede abriu os comentários dizendo que o rei está nu. “O advogado não tinha defesa para Lula (…) Como falar em candidatura se o Lula pode já ser preso? (…) Você tem o líder de um partido que é condenado em 1e em 2a instâncias e que tem um monte de processos. As pessoas vão se perguntar: se a Cristiane Brasil não pode tomar posse no Ministério do Trabalho, como o Lula pode ser Presidente da República? (…) A candidatura Lula a partir de hoje é uma candidatura de ficção”, sentenciou. Para Merval Pereira, “Lula hoje está mais perto da prisão do que do Palácio do Planalto”.
Leia também:

A primeira declaração do advogado de Lula foi ao ar às 21h08, com 1'30 minuto de duração. Lula só apareceu na GloboNews às 22h06, numa matéria de três minutos sobre onde o ex-presidente tinha acompanhado o julgamento e sobre as manifestações que tinham ocorrido pelo país. A defesa de Paulo Okamotto só foi ao ar às 22h53. Ou seja, mesmo sem ataques explícitos em massa, como se costuma constatar, o desequilíbrio foi claro.
Jornal Nacional
No canal aberto do grupo, o Jornal Nacional teve uma edição primorosa. Para o telespectador comum, tudo pode ter sido assistido como um mero relato dos fatos, mas a análise detalhada do discurso revela as sutilezas da emissora que tanto trabalhou para que este dia chegasse. Se no JN o tempo de fala dado à defesa foi o mesmo da acusação, é preciso lembrar que os votos dos três desembargadores, que foram o destaque da edição, só reforçaram os argumentos do Ministério Público Federal.
Destaques para os trechos “Lula perdeu o rumo”, de Victor Luiz dos Santos Laus, e “Não importa o quanto alto você esteja, a lei está acima de você”, de Leandro Paulsen, que também apareceu dizendo que “as provas são inequívocas”. Em seguida, a apresentadora Renata Vasconcellos explicou que foram 19 as provas, numa lista que vai de A a T. O esforço para responder a mobilização em apoio ao direito de Lula ser candidato, que usaram a #Cadêasprovas, foi nítido.
Lula aparece numa declaração escolhida a dedo: dizendo que tinha certeza que o júri, por não ter provas, iria dar um resultado de 3x0 revertendo a decisão de Moro. O JNveiculou então uma longa reportagem sobre a Lei da Ficha Limpa, que deve impedir o ex-presidente de se candidatar.
Exibida também depois na GloboNews, a reportagem traz declarações, à época da aprovação da lei, de representantes de todos os partidos que, hoje, declararam apoio a Lula: o então deputado José Eduardo Cardoso (PT/SP), que defendeu a Presidenta Dilma enquanto AGU no processo de impeachment), à época relator do PL; o então deputado Flávio Dino (PCdoB/MA), hoje governador do estado; o deputado federal Chico Alencar (PSOL/RJ); e o então senador Aloísio Mercadante (PT/SP). A reportagem lembrou que a lei foi aprovada por unanimidade no Congresso. “Hoje o Brasil começa a mudar, começamos a passar o país a limpo”, afirmou o então senador Pedro Simon, do PMDB/RS.
Em todos os telejornais noturnos, tanto no canal fechado quando na TV aberta, a Globo citou a nota do Partido dos Trabalhadores que menciona a orquestração do grupo de comunicação no golpe em curso. A resposta foi: “A menção à Rede Globo em nota do Partido dos Trabalhadores é desrespeitosa, despropositada e fora da realidade”.
Leia mais:

 Outros canais
Jornal da Record deu muito menos atenção ao julgamento de Lula, e mostrou uma cobertura mais equilibrada. Advogado de defesa teve voz: “o que se tem aqui é um processo nulo, que gerou uma sentença nula e também um processo que não foi feita a prova da culpa e sim a prova da inocência”, disse Cristiano Zanin Martins.
A Record também mostrou uma declaração de Lula já após o julgamento. Mas mostrou que a Força Tarefa da Operação Lava-Jato comemorou o resultado e encerrou a cobertura de 17 minutos com imagens de queima de pneus nas rodovias pelos movimentos sociais.
Na Bandeirantes, depois de a BandNews cometer a gafe do dia e divulgar, ainda pela manhã, que Lula já havia sido condenado por unanimidade - revelando talvez a torcida do grupo - o Jornal da Band priorizou a fala dos desembargadores, reforçando os argumentos da acusação – que, aqui, teve quase o triplo de tempo de fala que a defesa.
A cobertura, que durou cerca de 27 minutos, também deu mais espaço à repercussão política do julgamento com atores contrários a Lula. Enquanto do lado petista falaram o deputado federal Carlos Zarattini e o senador Lindbergh Farias, do lado oposto foram ouvidos o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin e os senadores Cássio Cunha Lima (PSDB/PB), Ana Amélia Lemos (PP/RS) e Cristovam Buarque (PPS/DF). As imagens de “violência dos manifestantes” na Paraíba encerraram o jornal.
O Repórter Brasil, da TV Brasil, foi o único em que as manifestações de apoio a Lula tiveram alguma relevância, mostrando os protestos em Salvador, São Paulo, Porto Alegre e São Luis. O telejornal trouxe imagens da Praça da República, na capital paulista, repleta, mas não entrevistou nenhum manifestante.
Vale destacar que o silenciamento dos milhares de cidadãos e cidadãs que foram às ruas em crítica ao julgamento do ex-presidente foi a tônica em todas as emissoras de TV, tanto às vésperas quanto no dia da condenação de Lula.
Coube, uma vez mais, à imprensa alternativa – com destaque para os veículos do Brasil de Fato – mostrar em detalhes as manifestações pelo Brasil e fora dele, onde, em mais de 20 países, brasileiros também foram às ruas.
Para a GloboNews, entretanto, os protestos “não foram espontâneos”. “Muito pouca gente foi pra rua perto da mobilização feita. Mais gente dos movimentos do que do partido. Teve gente em São Paulo e Porto Alegre, mas não provocaram a comoção social esperada”, concluiu a comentarista Cristiana Lobo.
Confira a análise da cobertura dos jornais impressos e veículos online no próximo artigo do blog.
* Bia Barbosa é jornalista e integra a Coordenação Executiva do Intervozes.
Participaram do monitoramento da cobertura do julgamento de Lula os/as militantes do Intervozes: Ana Cláudia Mielke, Camila Nóbrega, Eduardo Amorim, Helena Martins, Iara Moura, Marcos Urupá, Olivia Bandeira, Ramênia Vieira e Tiago Coutinho.

Texto original: CARTA CAPITAL

Paraná recorre a vergonhosos contêineres para abrigar presos


Paraná recorre a vergonhosos contêineres para abrigar presos


Segunda-feira, 5 de Fevereiro de 2018

Paraná recorre a vergonhosos contêineres para abrigar presos

Foto: Luiz Silveira/Agência CNJ
Há quem pinte o Estado do Paraná como uma ilha da fantasia da execução penal, mas a sombra da intranquilidade é perene entre 33 mil presos, agentes penitenciários e policiais civis. O exemplo mais extremo é o abandono das carceragens das delegacias: dez mil presos dormem sob condições desumanas porque estão enjaulados em celas medievais no interior e na capital. Há espaços sem luz, sem buraco sanitário, sem água corrente. Pelo menos mil custodiados fugiram em 2017, de acordo com a associação dos delegados do Estado.
A Central de Flagrantes, no coração de Curitiba, é uma bomba-relógio.
Na segunda-feira (22), 84 presos ocupavam o espaço de apenas 8.
Havia condenados, provisórios, réus primários, jovens de 18 anos, moradores de rua, tuberculosos, aidéticos e feridos (balas alojadas, costelas quebradas, pus aparente). Policiais civis e militares ajudavam na custódia.
O Paraná é o segundo pior Estado do país em encarceramento improvisado em unidades da Polícia Civil, de acordo com o relatório de informações penitenciárias (Infopen) divulgado no final de 2017. Há abusos sexuais, mortes, pernas quebradas, corrupção e violações que fariam corar um cidadão da Idade Média. As mulheres são submetidas à violência de permanecer horas a fio com as mãos algemadas ou os pés acorrentados a um banco. Elas ainda precisam implorar para serem levadas ao banheiro para trocar um absorvente.
O 11° Distrito Policial, localizado no bairro mais populoso de Curitiba, foi interditado pela Vara da Fazenda Pública em 2015, mas até dezembro do ano passado custodiava presos sob “condições sanitárias extremamente precárias”, nas palavras da juíza Carolina Delduque Sennes Basso, que concedeu o pedido formulado pelo Ministério Público estadual.
Em novembro, uma vistoria conjunta do Conselho da Comunidade de Curitiba, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR e do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Penitenciário do Paraná (GMF-PR) encontrou nessa carceragem ratos, presos defecando em marmitas, presos dormindo em colchões molhados e celas com pouquíssimas entradas de ar. Havia 204 presos para 30 vagas.
Para solucionar esse problema crônico, que se arrasta desde o início do século, a Secretaria de Segurança Pública do Paraná pretende instalar nos próximos dias contêineres nas penitenciárias, o que contraria o fortuito memorando de entendimento para melhorar as condições do cárcere assinado entre o Estado e a Organização dos Estados Americanos (OEA) no segundo semestre do ano passado.
As autoridades apelidaram essas celas de “modulares”, mas a denominação não passa de um eufemismo para namorar a imprensa. Esses contêineres ferem as Regras de Mandela, que orientam a aproximação máxima da execução da pena à realidade em sociedade, e o equivocado Plano Nacional de Segurança, lançado em 2017, que promete modernizar o sistema penitenciário.
O Paraná afirma que as celas modulares são vanguardistas, mas elas não têm iluminação elétrica. Os contêineres devem abrigar 12 presos, mas vão amontoar muito mais, nos mesmos moldes da Casa de Custódia de Piraquara, nas imediações de Curitiba, que usa esse mesmo sistema para acolher 14 ou 15 presos – com 2 ou 3 na praia, o eufemismo para chão. As portas dos contêineres novos ainda têm grades, mas logo vão fechar os espaços livres com chapas de ferro com a eterna desculpa da segurança.
Os contêineres são geladeiras no inverno e cozinham lentamente no verão. Um Estado Democrático de Direito não trancaria 12 cachorros raivosos numa cela modular, até porque o decreto seria impopular, mas não tem vergonha de aprovar a sua utilização para seres humanos.
E ainda não há qualquer sinal de reação da sociedade que assumiu a fama de ser republicana depois da Operação Lava Jato.
Há um descontrole absoluto sobre o sistema penitenciário local porque o número de presos aumentou nos últimos anos no mesmo ritmo que o número de funcionários caiu. Já o modus operandi do discurso duro da segurança pública como alvará para a truculência permaneceu. As autoridades nem coram as maçãs do rosto ao discorrer sobre a incapacidade de soltar os presos para o pátio de sol mais de uma vez por semana.
Há ainda a temeridade de revoltas maiores. O projeto pedagógico para privados de liberdade foi interrompido no final do ano passado. Há poucos meses uma rebelião de grandes proporções deixou feridas abertas em Cascavel, no Sudoeste do Estado. A penitenciária foi totalmente destruída enquanto parte da população propunha, com grande equívoco, que as forças policiais riscassem um fósforo maior para “acabar com o problema”.
O Paraná também caminha mal porque há um desencontro entre o Poder Judiciário e o Depen. As audiências de custódia têm sido muito rigorosas e não há tratamento penal adequado, o que torna o sistema impraticável e repetitivo (as carceragens estão repletas de reincidentes). Para resolver essa situação, a Secretaria de Segurança Pública promete abrir seis mil novas vagas em penitenciárias, mas quem trabalha com o sistema local sabe que elas ainda não passam de papéis.O Tribunal de Contas do Paraná afirma que há um déficit de 10 mil vagas e que os números referentes a educação e trabalho esbarram nos 20%. Há ociosidade além do aceitável.
Um Estado Democrático de Direito requer seriedade e construção contínua. A atuação policial e o Poder Judiciário precisam trafegar no rigor da lei e sob supervisão da sociedade. Ao sistema penitenciário cabe um ritmo intenso de reeducação social. Há quem diga que uma cadeia é uma moto: em trânsito, flui; parada, cai. Esse é o modelo equilibrado da nossa Carta Magna.
Nos últimos dias de 2017, recebi em mãos um documento que contém 1.500 assinaturas. Ele foi escrito dentro da Penitenciária Central do Estado, maior unidade do Paraná. Os encarcerados reclamam de muitas coisas, mas, em suma, pedem oportunidade de trabalho e estudo, e pelo menos duas horas de sol por dia. Se o Estado não estende a mão, há quem estenda.
Com os contêineres, o Paraná pretende voltar algumas casas no tabuleiro da democracia.
Essa política está totalmente desconectada do dia a dia dos funcionários da execução penal. Um Estado rico como o nosso não pode repetir o mantra da eloquência moderna (“se não quer assim leva para casa”). O dinheiro dos contêineres poderia servir para implementar um programa de alternativas penais, o que seria parte da solução.
Isabel Kugler Mendes é advogada e preside o Conselho da Comunidade da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba.

Um retrato dos privilegiados no Brasil

Acessem:

https://www.cartacapital.com.br/blogs/brasil-debate/um-retrato-dos-privilegiados-no-Brasil

Projeto de lei sobre avaliação de desempenho ameaça os servidores

Projeto de lei sobre avaliação de desempenho ameaça os servidores

por Sergio Tuthill Stanicia* — publicado 01/02/2018 18h15, última modificação 01/02/2018 13h10
Caso aprovada, a proposta da senadora Maria do Carmo Alves, do DEM, irá instituir critérios subjetivos de controle e abrir espaço para abusos de poder
Edilson Rodrigues/ Agência Senado
Projeto de lei sobre avaliação de desempenho ameaça os servidores
O Senado pode legitimar o assédio moral no setor público
Em sua redação original, a Constituição previa que os servidores públicos se tornassem estáveis após dois anos de exercício efetivo, podendo perder o cargo apenas em virtude de procedimento administrativo ou de sentença judicial transitada em julgado.
A Emenda Constitucional 19, de 1998, ampliou esse período para três anos e incluiu como hipótese de perda do cargo a reprovação em procedimento de avaliação periódica de desempenho, a ser disciplinado por lei complementar (art. 41 §1º III).
projeto de lei complementar que regulamentaria esse dispositivo constitucional proposto em abril de 2017 pela senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE), não é, porém, adequado, pois deixa o servidor público à mercê de critérios de avaliação excessivamente subjetivos.
Ainda que o substitutivo proposto pelo senador Lasier Martins (PSD-RS) e aprovado em outubro pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania tenha corrigido alguns de seus problemas mais graves (a competência exclusiva do superior hierárquico para efetuar a avaliação e a possibilidade de “acordo” entre avaliador e avaliado), o texto aprovado preserva a principal deficiência do projeto original, a falta de objetividade nos critérios de avaliação.
O projeto inicialmente apresentado deixava a avaliação de desempenho a cargo unicamente do superior hierárquico, o que poderia levar a situações de abuso ou constrangimento, por exemplo, em caso de inimizade pessoal ou até mesmo de ordens ilegais emitidas pela chefia que o servidor se sentiria compelido a cumprir.
Caso não concordasse com o resultado da avaliação, eram poucos os mecanismos de defesa previstos para o servidor. O primeiro deles era um “pedido de reconsideração” para o próprio avaliador, medida com grande possibilidade de ser inócua por ser apreciada pela mesma pessoa. O segundo era um recurso ao “órgão máximo de gestão de recursos humanos”.
O servidor também contaria com um formulário para “avaliação do avaliador”, com uma garantia formal de sigilo que na prática não ocorreria nos casos de superiores com poucos subordinados, pois seria fácil reconhecer e retaliar subordinados que manifestassem insatisfação.
O projeto original previa ainda a possibilidade de acordo entre avaliador e avaliado quanto ao planejamento das atividades a serem realizadas, que seria “flexível, permitindo repactuações ao longo do período avaliativo”, em dispositivo que lembra as ideias que pautaram a reforma trabalhista aprovada nos últimos meses.
Com o substitutivo aprovado pela CCJ, a previsão de acordo entre avaliador e avaliado foi suprimida. Obviamente não haveria paridade entre o avaliado e seu superior hierárquico para acordar livremente, o que se extrai da própria lei que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores federais, segundo a qual é dever do servidor “cumprir as ordens superiores, exceto quando manifestamente ilegais” (art. 116 IV Lei 8.112/90).
Ironicamente, a justificativa para a supressão do acordo parece não ter sido o mero reconhecimento do dado real da ausência de paridade, o que não ocorreu no caso da reforma trabalhista, mas o receio de que o subordinado desobedecesse e se recusasse a executar as tarefas determinadas pela chefia. Consta do parecer do senador Martins que “atos negociais pressupõem a possibilidade de recusa de uma das partes”, o que não existiria “no caso da distribuição de tarefas ao servidor público".
De todo modo, o substitutivo eliminou uma das regras mais nocivas aos servidores, pois o projeto passou a prever que a avaliação não ficará mais a cargo da chefia imediata, mas de uma “comissão avaliadora”, isto é, um “colegiado composto pela chefia imediata do avaliado e mais dois servidores estáveis, um dos quais escolhido pelo órgão de recursos humanos da instituição e o outro determinado por sorteio dentre os servidores lotados na mesma unidade do avaliado” (art. 3º).
Contudo, o substitutivo não eliminou o ponto mais prejudicial que constava do projeto original: a subjetividade dos critérios de avaliação. A lei proposta faz uma primeira divisão entre fatores avaliativos fixos e fatores avaliativos variáveis.
Os fatores avaliativos fixos são a qualidade e a produtividade, e comporão, cada um, 25% da nota atribuída ao servidor. As definições de qualidade e produtividade não são tão problemáticas, pois até têm alguma objetividade. Na definição de qualidade, por exemplo, o projeto menciona a observância às normas e procedimentos da instituição. A definição de produtividade é mais subjetiva, pois utiliza palavras como “tempestividade”, “eficiência” e “eficácia”, mas isso também pode ser mitigado com regras específicas para cada cargo ou órgão.
Os fatores avaliativos variáveis serão cinco, escolhidos entre os elencados no projeto de lei e aprovados pela “autoridade máxima da instituição”. Cada critério comporá 10% da nota do servidor.
Os fatores avaliativos variáveis constam do art. 9º do projeto de lei: relacionamento funcional, foco no usuário/cidadão, inovação, capacidade de iniciativa, responsabilidade, solução de problemas, tomada de decisão, aplicação do conhecimento, compartilhamento do conhecimento, compromisso com objetivos institucionais, autodesenvolvimento e abertura a feedback.
A cada um desses critérios, o projeto de lei atribui definições retóricas vagas, que repetem o próprio nome dado ao fator avaliativo ou utilizam sinônimos desprovidos de significado.
Para dar alguns exemplos: “relacionamento funcional” significa que “o avaliado cria e mantém vínculos pessoais e funcionais cooperativos e construtivos”;
"Inovação” quer dizer que “o avaliado propõe ideias aplicáveis a situações de trabalho”;
“Solução de problemas” é definida como a proposta pelo avaliado de “soluções consistentes para os problemas enfrentados em situações de trabalho”;
“Aplicação do conhecimento” significa que “o avaliado aplica oportunamente o conhecimento adquirido para melhoria do desempenho pessoal e da equipe”;
“Compartilhamento de conhecimento” significa que “o avaliado compartilha conhecimentos que possam ser relevantes para o desenvolvimento de pessoas ou o aperfeiçoamento de atividades”;
“Abertura a feedback” é definida como a utilização pelo avaliado de “feedback recebido para aprimorar o próprio desenvolvimento pessoal e funcional”.
Como se pode ver, as definições beiram o ridículo: solução significa solução, compartilhamento significa compartilhamento, feedback significa feedback etc. É nos fatores avaliativos variáveis que reside o grande problema do projeto de lei em sua redação atual. Não se trata de ser contra a perda do cargo por mau desempenho, tampouco de ser contra a promulgação de lei complementar que defina o procedimento de avaliação periódica conforme determina a Constituição. Trata-se de ser contra o projeto de lei em sua redação atual.
Embora o substitutivo aprovado seja consideravelmente melhor que o projeto inicial (por eliminar a competência exclusiva do superior hierárquico para a avaliação e o “acordo” entre avaliador e avaliado), o texto atual ainda contraria o princípio da impessoalidade na administração pública ao vincular 50% da nota atribuída ao servidor a fatores avaliativos tão vagos e subjetivos que sua regulamentação se torna tarefa muito difícil ou praticamente impossível.
*Sergio Tuthill Stanicia é Doutor em Direito pela USP

Ligando os pontos.

Por Florestan Fernandes Júnior Ligando os pontos.
Repasse!!!
30/01/2018

Em 2007 a Petrobras descobre campos enormes de petróleo em águas ultra-profundas do nosso litoral. Uma reserva de mais de 80 bilhões de barris de petróleo. 
Um ano depois, em janeiro de 2008 foram roubados 4 laptops e 2 HDS com informações sigilosas da bacia de Santos. Dados de 30 anos de pesquisas da Petrobras no valor estimado de 2 bilhões de dólares. 
Em 30 de outubro de 2009, o WikiLeaks uma organização transnacional com sede na Suécia publica em sua página informações “vazadas” de governos e empresas assuntos estratégicos de interesse público. No documento, o nome do juiz Sérgio Moro é citado como participante de uma conferência promovida pelo programa Bridges Project (“Projeto Pontes”), vinculado ao Departamento de Estado Norte-Americano, cujo objetivo era “consolidar o treinamento bilateral [entre Estados Unidos e Brasil] para aplicação da lei”.
Em 2013, uma semana após notícias de que a presidente do Brasil, Dilma Rousseff foi espionada pela CIA,  o ex-consultor da agência de inteligência americana Edward Snowden indicou que os EUA espionavam também a Petrobras. Em junho de 2013 a “Operação Lava Jato” tem início com o  monitoramento das conversas de doleiros no Paraná. Em março de 2014 é deflagrada a primeira fase ofensiva da operação que iria derrubar a presidente da República, paralisar a Petrobras, a economia do país e, sucatear os estaleiros responsáveis pela construção de plataformas e as fabricas de sondas de perfuração. Tudo com a cobertura massificante dos nossos meios de comunicação.
Lá se vão 4 anos de uma lavagem que levou para o ralo, milhões de empregos, milhares de empresas públicas e privadas e quase todos os avanços sociais e econômicos. O "novo" velho governo já extingui uma reserva ambiental em território de quase quatro milhões de hectares para atividades privadas de mineração. Anunciou a venda da gigante de energia elétrica Eletrobras, da Casa da Moeda e pasmem, vai oferecer ao mercado em leilões que pretende realizar a partir de 2018 campos de óleo e gás da Petrobrás. Ao todo, 21 áreas, com descobertas de petróleo e gás serão liberadas para petroleiras internacionais. Parte destes poços estão  localizados nas três bacias produtoras mais nobres da empresa brasileira - Campos, Santos e Espírito Santo. Nesta quarta-feira 6, o ex-ministro Antonio Palocci afirmou em seu depoimento ao juiz Sergio Moro que a descoberta do pré-sal fez mal para o Brasil. Como o pre sal, responsável por mais da metade da produção brasileira poderia fazer mal ao país? A afirmação é um claro sinal de submissão aos interesses estratégicos das forças que patrocinam a venda da empresa brasileira. Para que o Brasil permaneça de joelhos é necessário agora impedir a chegada ao poder de grupos desenvolvimentistas comprometidos com a defesa das nossas riquezas. Por isso a eleição de 2018 é incerta e temerosa. Como disse está semana o ex-ministro Bresser Pereira: "O Brasil está se condenando a ser uma economia de propriedade dos países ricos. E nós seremos todos empregados".

Já que grande mídia não informa, vamos nós informar, cada um passa para dez grupo de pessoas. Passe no face e no whatsapp até todos ficarem sabendo, por que se depender da mídia ficaremos mais desinformados. 
Previdência e o falso rombo divulgado pelo governo

Dados: ANFIP (Assoc Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal), que divulgam dados da Seguridade Social, não existe déficit, pelo contrário, houve superávits nos últimos anos e sucessivos:
Saldos positivos: 
R$ 59,9 bilhões 2006; 
R$ 72,6 bi, em 2007; 
R$ 64,3 bi, em 2008; 
R$ 32,7 bi, em 2009; 
R$ 53,8 bi, em 2010; 
R$ 75,7 bi, em 2011; 
R$ 82,7 bi, em 2012; 
R$ 76,2 bi, em 2013; 
R$ 53,9 bi, em 2014.

Em dez anos, de 2005 e 2015, houve SUPERÁVIT de 658 bilhões. Este dinheiro foi *usado em outras áreas e pagou juros da dívida pública, que representa 42,6℅ do total das despesas*do Governo, mas isto o Temer não diz.

fonte:

Divulguem, espalhem, o Congresso Nacional está prestes a aprovar a escravização do trabalhador e os.  brasileiros estão cegos!!!

Não podemos aceitar todas estas mentiras e enganações.
Por Florestan Fernandes Júnior Ligando os pontos.
Repasse!!!
30/01/2018

Diálogando com Ladislau Dowbor

Acessem:

https://www.youtube.com/watch?v=_fNk6cKiW5M&feature=youtu.be

Confissões de um carrasco

Confissões de um carrasco


Por quase meio século, ex-capitão nazista Erich Priebke tinha vivido tranquilo, com seu verdadeiro nome, em Bariloche, renomeado centro turístico de montanha no sul da Argentina

Esteja sempre bem informado
Receba todos os dias as principais notícias de Opera Mundi

Opera Mundi republica neste domingo (04/02) um texto do segundo número da revista Atenção!, que circulou nos meses de dezembro de 1995 e janeiro de 1996. Neste texto, o então editor-chefe do veículo, Giancarlo Summa, entrevista Erich Priebke, ex-oficial nazista (então com 82 anos) acusado de participar do massacre de 335 pessoas em Roma, em 1944. O ex-oficial vivia na Argentina e estava, então, prestes a ser extraditado para a Itália. Priebke morreu em 2013, aos 100 anos, cumprindo prisão domiciliar em Roma.
A revista Atenção! teve 13 números e seu diretor de redação era o fundador de Opera Mundi, Breno Altman. Entre os colaboradores e colunistas da revista, estavam Gilberto Maringoni, Eduardo Galeano, Simone Biehler Mateos, Manuel Vázquez Montalbán, Plínio de Arruda Sampaio, Rosane Pavam, Aimar Labaki e outros.
Roma, 23 de março de 1944. Na cidade ocupada pelas tropas alemãs, um comando de partisans prepara um atentado. Em via Rasella, uma pequena rua do centro, explode um cesto de lixo recheado com 12 quilos de dinamite, matando 33 soldados do batalhão Bozen. De Berlim, Hitler ordena uma represália feroz: por cada soldado morto, dez italianos têm que ser fuzilados. O comandante da SS – as tropas de elite nazistas -, coronel Herbert Kappler, é encarregado de preparar o massacre. Seu braço direito é o capitão Erich Priebke, oficial conhecido pela sua eficiência e seus sucessos galantes com as jovens atrizes romanas. Os nomes dos condenados são escolhidos entre os prisioneiros das SS e da casa de detenção pública de Regina Coeli. São, no total, 335 pessoas, cinco a mais do que Hitler tinha pedido. Destas, 75 são judeus, quatro adolescentes, muitos anciãos. A chacina começa às 15h30 do 24 de março. As vítimas são conduzidas às Fossas Ardeatinas, um complexo de minas abandonadas , e mortas com uma bala na nuca. Priebke confere os nomes das vítimas na lista preparada pelo comando. O capitão Kurt Shitz comanda as execuções: “Preparar, apontar, fogo!” A certa altura, o próprio Priebke mata um prisioneiro com um tiro à queima-roupa. Depois, vai embebedar-se junto com os outros oficiais.

Buenos Aires, 3 de novembro de 1995. Depois de uma batalha legal de 18 meses, a Corte Suprema argentina aceita o pedido de extradição de Priebke, formulado pelo governo italiano. Por quase meio século, o ex-capitão nazista tinha vivido tranquilo, com seu verdadeiro nome, em Bariloche, renomeado centro turístico de montanha no sul do país. Onde, em sua confortável casa, concedeu esta entrevista exclusiva a Atenção! na véspera da extradição.

Atenção!:  O senhor sabe que a Itália quer processá-lo pelo massacre das Fossas Ardeatinas?
Erich Priebke: Sim, conheço a acusação.

Atenção!: O que foi que o senhor fez exatamente naquele 24 de março de 1944?
Erich Priebke: Temos que começar pelo dia anterior naturalmente, pelo atentado da Rua Rasella. Eu era o oficial de ligação no escritório de Kappler, quando ainda estávamos na embaixada alemã em Roma. Depois do setembro de 1943, quando a Itália assinou o armistício com os aliados e se formou o Comando de Roma, Kappler confiou-me o cargo de oficial de ligação. Isso significa que eu não pertencia a nenhuma divisão, estava diretamente sob suas ordens. Tinha meu próprio escritório, não precisava de tradutor porque falava bem o italiano, e permanecia com meu cargo anterior: ligação com instituições e autoridades italianas, particularmente com o Ministério do Interior. Quando o comando começou a efetuar as primeiras prisões – tínhamos uma pequena cadeia, na Rua Tasso – o Vaticano se interessou pelos presos, e enviou um intermediário. Era o superior da ordem dos Salvatorianos em Roma, dom Pancrácio Pfeiffer. Ele vinha duas ou três vezes por semana. Por vezes falava com Kappler, mas na maioria das vezes falava comigo. Era meu trabalho. Eu não tinha nada a ver com as prisões e os interrogatórios, não conheciam nenhum prisioneiro.

Atenção!: Qual foi, então, o seu papel no massacre?
Erich Priebke: Na noite do dia 23, Kappler recebeu a ordem de represália do quartel-general de Hitler, através do marechal Kesserling, o comandante das tropas alemãs na Itália, e do comandante de Roma, Meltz. O chefe da divisão 4, o capitão Kurt Shitz, e seus homens deveriam preparar a lista, porque eles tinham efetuado as prisões e conheciam a história de cada um dos presos. O coronel Kappler os encarregou da completa organização da represália. Nenhum de nós queria fazer aquilo. Éramos funcionários da polícia, sequer andávamos armados. Mas as ordens eram as seguintes: “A polícia tem os reféns, a polícia tem que fazer a represália.” Nós não soubemos nada, até que nos chamaram para ir às Fossas Ardeatinas. Eu estava no primeiro grupo e me encarregaram de controlar a lista.

Erich Priebke em sua casa em Bariloche, na foto publicada pela revista <i>Atenção!</i> em 1995 (Imagem: Giancarlo Summa)Atenção!: Foi o senhor que verificou, um por um, os nomes...
Erich Priebke: Não, não. Eles desciam dos caminhões e, enquanto passavam, um oficial ou um suboficial me dava os nomes das vítimas. Quando a execução ainda nem estava na metade, fui com um grupo nosso que deveria voltar a Roma para substituir os camaradas que haviam ficado no escritório. Todos os membros do grupo tinham de participar da execução.

Atenção!: Não foi por sua responsabilidade que foram fuzilados cinco pessoas a mais?
Erich Priebke: Absolutamente não. É uma acusação falsa. A razão deve ser que tudo foi feito na última hora. Como dizia, eu tinha voltado para Roma muito antes. Cheguei em meu escritório por volta das 17h30, pois às 18h dom Pfeiffer ia chegar mais uma vez.

Atenção!: O senhor matou?
Erich Priebke: Um só.

Atenção!: E quem foi que matou, o senhor se lembra?
Erich Priebke: Não, não.

Atenção!: Usou sua automática?
Erich Priebke: Sim, minha pistola, mas não lembro quem era. Estávamos tão nervosos, tão ensurdecidos... Não me lembro de nada. Para mim essa execução foi uma tragédia pessoal. Tinha vivido na Itália em 1933 e 1934, quando aprendi a falar italiano, e desde então a Itália, junto com o seu povo, era o meu país favorito. Em Roma tivemos muitos amigos, muitos bons amigos. Vivemos lá durante anos, eu e a minha família.

Atenção!: Que lembranças têm do massacre?
Erich Priebke: Nenhuma, porque era horrível. Fiquei feliz quando pude ir embora.

Atenção!: Os gritos, os disparos...
Erich Priebke: Isso acontecia dentro das minas, eu estava fora. Entrei uma só vez, mas era tão impressionante, tão horrível... Apesar de aqueles homens que estavam para morrer serem da Resistência, sabíamos que nunca haviam sido condenados à morte.

Atenção!: O que vocês fizeram na noite do massacre?
Erich Priebke: Penso nisso há muito tempo, mas não me lembro. Sei que todos estavam tão impressionados... Alguns beberam, ficaram bêbados. Eu, eu... Não me lembro. A coisa impressionante é que ninguém entre nós falava sobre esse assunto.
Atenção!: Como foram escolhidas as vítimas?
Erich Priebke: Pelo que eu ouvi, todos os que estavam na prisão era da Resistência, eram partisans. Infelizmente, digo hoje, eram partisans da linha de Badoglio [o general monarquista que assinou o armistício da Itália com os Aliados], porque os comunistas estavam mais bem organizados, e não era assim tão fácil se infiltrar nas organizações comunistas quanto na organização badogliana. Assim os italianos perderam muitos bons oficiais; homens excelentes perderam suas vidas na represália.

Atenção!: O senhor diz que as vítimas era partisans. Mas foram mortos civis também: havia velhos, mulheres e crianças.
Erich Priebke: Mulheres não, nenhuma.

Atenção!: Crianças, adolescentes...
Erich Priebke: Crianças não. Uma menina de 5 anos morreu no atentado. Se alguma criança foi morta nas Fossas Ardeatinas não foi por nós, porque não havia crianças em nossas prisões. As vítimas vinham da prisão da Rua Tasso, de uma prisão do exército alemão e um grupo – de oitenta, noventa pessoas – que Caputo [chefe da polícia italiana em Roma] tinha que mandar alguma criança, isso eu não sei.

Atenção!: Lembra-se da prisão de Rua Tasso?
Erich Priebke: Sim.

Atenção!: Um oficial italiano declarou que o senhor batia nos prisioneiros com um soco inglês.
Erich Priebke: Este homem está enganado. Nunca tomei parte de um interrogatório, nunca. Não era o meu trabalho.

Atenção!: O senhor afirmou: “Eu não tenho nada a ver com isso, só cumpri ordens.” É isso mesmo?
Erich Priebke: Tínhamos que cumprir ordens, todos tinham que fazê-lo. Kappler não podia negar a represália, e nós não podíamos nos recusar a participar. Estávamos em guerra, e essa era a regra dos militares. Quando chegamos às Fossas Ardeatinas, Kappler nos reuniu e disse: “Se alguém tiver a ideia de não querer atirar, vai acabar no grupo das vítimas e vai ser fuzilado.”

Atenção!: Senhor Priebke: dia primeiro de junho de 1944 em La Storta, nas proximidades de Roma. Lembra-se desta data?
Erich Priebke: O que foi que aconteceu?

Atenção!: As SS estavam transferindo alguns prisioneiros para Bolonha e, segundo alguns testemunhos, o senhor estava lá. Um caminhão quebrou, e quatorze italianos, entre os quais estava Bruno Buozzi, o fundador do sindicato italiano CGIL, foram fuzilados.
Erich Priebke: Nosso grupo deixou Roma em 2 de junho. Eu fiquei com o major Hass, não me lembro da data exata, no campo de concentração de Mathausen, nas proximidades de Linz, onde o filho de Badoglio estava preso, num pavilhão especial, onde também estava o filho de Stálin. O filho de Bodoglio havia sido preso em Roma, e fora transferido para lá; Hass e eu deveríamos interrogá-lo. Voltamos de Mathausen na noite entre o dia 1º e o dia 2 de junho.

Atenção!: Depois o senhor esteve em Brescia. Quando? Em agosto de 1944?
Erich Priebke: Sim, suponho que sim.

Atenção!: O senhor não tem nada a ver com o fuzilamento de cinquenta prisioneiros em Brescia,  naquele mês?
Erich Priebke: Nunca, não, nunca.

Atenção!: O senhor foi feito prisioneiros dos aliados em maio de 1945. Como foi?
Erich Priebke: Bem, quando a guerra estava para terminar, eu tinha que me retirar de Brescia e ir para Bolzano. Quando chegamos, me apresentei ao general Hartz, que era nosso chefe, e ele me disse: “Muito bem, camarada Priebke, a guerra acabou e cada um deve se virar para conseguir voltar para casa.” Comuniquei isso aos meus homens, e cada um foi para um lado. Com meu carro, dirigi-me para Vipiteno, onde minha família vivia. No dia seguinte chegou um tenente americano, e me disse para acompanhá-lo ate Bolzano, porque o general Wolff estava lá, querendo reunir seus homens. No dia 13 de maio, era um domingo, chegaram os americanos, que nos levaram como prisioneiros para Bolonha, e em seguida para Rimini. O de Bolonha era um campo provisório, enquanto que o de Rimini era um campo enorme com mais de 200 mil prisioneiros alemães.

Atenção!: O senhor fugiu de Rimini no dia 31 de dezembro de 1946.
Erich Priebke: Fiquei vinte meses nos campos de prisioneiros, em Rimini, Ancona, Afragola, e novamente em Rimini. Vinte meses pareceram-me muitos. Certa vez perguntaram-me sobre o assunto de Roma, mas sem acusações, só queriam saber algumas coisas. Com outros camaradas que pensavam como eu – vinte meses já eram suficientes – fugimos. Dois dias depois da fuga cheguei em Vipiteno, fiquei ali com minha família até emigrarmos para a Argentina.

Atenção!: Como chegou na Argentina?
Erich Priebke: Teríamos gostado de voltar para Berlim, mas a cidade estava tão arrasada que desistimos. Devíamos decidir para onde ir, até que, por meio da Igreja Católica, chegou a oferta de irmos para a Argentina. Um franciscano que eu conhecera no campo de prisioneiros ofereceu-me a entrada na Argentina. Aceitamos, vendemos as últimas coisas que tínhamos para pagar a viagem e viemos para cá.

Atenção!: Com que passaporte?
Erich Priebke: Um passaporte com meu nome verdadeiro da Cruz Vermelha Internacional, naturalmente: não havia mais passaportes alemães.

Atenção!: O senhor disse ter sido ajudado pelo bispo austríaco Alois Hudal.
Erich Priebke: Sim, na hora de fazer os passaportes. Mas antes disso foi o franciscano, que nos contatou e que conseguiu a livre entrada na Argentina. Só então os passaportes foram confeccionados.

Atenção!: O passaporte lhe foi entregue pelo bispo?
Erich Priebke: Não vi o bispo, havia um funcionário.

Atenção!: O senhor acha que o Vaticano sabia dessas ajudas?
Erich Priebke: Não tenho ideia. Não tive contato nenhum, a não ser com essa pessoa que havia me indicado em Roma.
 
 

Centrais sindicais convocam greve de transportes contra reforma da previdência na Argentina

Argentina: Avós da Praça de Maio encontram neta 127

Argentina: as ruas são a única esperança

 
Atenção!: O papa Pio XII não sabia de nada?
Erich Priebke: Não tenho ideia. Hoje se pode dizer uma porção de coisas, naturalmente. Tenho um dossiê de dom Graham, o historiador do Vaticano, sobre dom Pfeiffer, onde também aparece meu nome, em que se diz que ele veio até meu escritório. Esse documento fala dessas coisas, diz que o papa não via com bons olhos... Mas eu não tenho ideia.

Atenção!: Quando o senhor trabalhava na Rua Tasso, quais eram as relações com o Vaticano?
Erich Priebke: As comunicações se davam através do dom Pfeiffer. Somente uma vez nos surpreendemos. Um informante que tínhamos no Vaticano – um funcionário civil, não dom Pfeiffer – nos comunicou que um dirigente comunista estava escondido com certa família de Roma. Quando nossos homens chegaram para prendê-lo, descobriu-se que ele era Mario Badoglio. Isso significa que o Vaticano nos entregou o filho de Badoglio. As relações entre o Vaticano e Badoglio não eram das melhores, aquilo foi uma pequena vingança.

Atenção!: O Vaticano se mexeu para salvar os judeus romanos?
Erich Priebke: Não sei. Dom Pfeiffer vinha sempre, apresentou uns quarente casos de prisioneiros, e acho que uns 25, ou 28 foram favoráveis, e essas pessoas foram soltas. Em nossa prisão, se havia um judeu não era por causa de sua raça, mas por causa de sua atividade de combatente da Resistência. Nunca fizemos ações contra os judeus, nós do comando de Roma. A certa altura, chegou um comando em Roma para uma blitz contra os judeus, mas nós não tínhamos nada a ver com isso. Minha impressão é de que o grupo de judeus mortos nas Fossas Ardeatinas veio da prisão italiana.

Atenção!: Voltando à Argentina. O governo do general Péron ajudou, deu-lhes cobertura?
Erich Priebke: Não, abriu suas portas e só isso. Não havia nem a rota dos ratos [assim foi batizada a rede de monastérios e navios utilizada pelo Vaticano e pelos aliados para ajudar a fuga dos nazistas para a América Latina], nem Odessa [A organização secreta de ajuda entre nazistas], nem nada. Quando cheguei aqui com minha mulher e meus dois filhos, a única coisa que eu tinha nos bolsos eram minhas mãos.

Atenção!: O que o senhor fez aqui?
Erich Priebke: Primeiro trabalhei como garçom, depois como maître de hotel, e em 1959 tive a possibilidade de comprar uma pequena salsicharia. Tenho uma boa relação com as pessoas, além do que conhecia queijos e frios. Em pouco tempo tornou-se uma das melhores lojas do gênero em Bariloche. Então conseguíamos juntar um bom dinheiro. Com esse dinheiro compramos esta casa, sempre trabalhando das oito da manhã, às dez da noite.

Atenção!: O senhor também foi presidente da Associação Alemã de Bariloche.
Erich Priebke: Desde 1959 faço parte do comitê de direção da Associação Cultural Alemanha-Argentina. Quando tinha a salsicharia, não tinha muito tempo para dedicar a isso, mas quando meu filho voltou da Alemanha com sua mulher, ele passou a me ajudar na loja, então pude participar um pouco mais. Como aposentado, pude dedicar muito tempo para a escola alemã. Durante muitos anos fui vice-diretor, e de 1986 em diante presidente da Associação.

Atenção!: Com seu verdadeiro nome? Então todos sabiam quem era.
Erich Priebke: Naturalmente.

Atenção!: Nunca encontrou seus ex-camaradas aqui em Bariloche? Aqui havia muitos deles, procurados no mundo todo.
Erich Priebke: Não havia ninguém das SS. E Além do mais há muitas mentiras...
Wikimedia Commons

Antiga prisão da rua Tasso, em Roma, onde hoje funciona o Museu da Reistência


Atenção!: Menguele, o “anjo da morte” de Auschwitz, viveu aqui pelo menos por um ano.
Erich Priebke: Pode ser, mas certamente não aqui em minha casa. Quando a guerra acabou, para mim também acabou o nazismo. Entende? Quando éramos jovens e idealistas eles nos enganaram completamente. Cada um de nós perdeu muito com o fim da guerra, e eu não queria mais nem saber de política. Quando hoje escrevem que eu sou um nazista, um ex-nazista... É uma coisa tão boa.

Atenção!: O senhor foi filiado ao partido nazista, não foi?
Erich Priebke: Filiei-me em 1933. Quando ia para a Itália, veio uma pessoa de Gênova pedindo que eu me filiasse ao partido. Naturalmente, naquela época eu acreditava no nazismo, tinha 20 anos.

Atenção!: O senhor era um dirigente do partido?
Erich Priebke: Dirigente? Não, nunca. Nunca participei das atividades do partido e das SS, em nível político.

Atenção!: O que pensava de Hitler e da ideologia nazista?
Erich Priebke: Como milhares e milhares de pessoas, pensava que Hitler acabaria sendo um salvador, que recuperaria as terras alemãs perdidas depois da Primeira Guerra Mundial, que daria trabalho para todos. Como na Itália, quando chegou Mussolini; todos o aclamavam. E até 1939, na Alemanha, tudo funcionava perfeitamente.

Atenção!: O senhor não tem remorsos.
Erich Priebke: Veja, durante toda a minha vida, em minha alma ficou o fato de ter matado uma pessoa que eu não conhecia, que não tinha me feito nada de mal, e que... Foi uma tragédia pessoal, não somente para mim, mas para alguns de meus camaradas, que viveram na Itália por muitos anos. Matar uma pessoa é como matar um irmão, se você tem muitos amigos lá.

Atenção!: O senhor não acredita ter cometido crimes contra a humanidade?
Erich Priebke: Não, não. Os autores do atentado são os responsáveis pela morte de 335 homens. Se o atentado não tivesse acontecido, não teria havido represália. Isso é claro. A represália, dessa forma, foi reconhecida como legal pelos tribunais. Houve um processo contra Kesserling, um processo contra Kappler, e depois outros de que não me lembro, que sempre disseram que, segundo as leis internacionais de guerra, essa represália era legal.

Atenção!: O senhor sabe que nesse período há na Alemanha, na Europa, muitos movimentos que se remetem ao nazismo.  Qual a sua opinião sobre esses neonazistas?
Erich Priebke: É uma loucura, Mas não os considero neonazistas, diria antes que são jovens que não sabem o que fazer. Na juventude sempre houve rebeldes.

Atenção!: Hoje, no que o senhor acredita?
Erich Priebke: Creio em Deus, nada mais. Gostaria que todos no mundo vivessem tranquilos como nós aqui em Bariloche. É um grupo de onze comunidades europeias, que outrora não eram tão amigas. Hoje convivem juntos os italianos e os croatas, os eslovenos, os bascos com os espanhóis... É assim que deve ser: deve existir tolerância.

Atenção!: O senhor não tem que pedir perdão para ninguém?
Erich Priebke: É uma pergunta difícil. Se soubesse quem era o morto, pediria desculpas a sua família, mas eu não sei quem ele era. Carreguei isso dentro de mim a vida toda, sempre foi doloroso. Mas aconteceram tantas coisas. Perdemos a guerra, o mundo ruiu em cima da gente... O que me parece absurdo, é que, depois de cinquenta anos, o Tribunal Militar de Roma venha com essa acusação. Tiveram todo o tempo para me acusar antes, e nunca o fizeram. Em 1950 apareceu na revista Tempo, de Milão, um longo artigo sobre a fuga de Ciano [o genro de Mussolini] de Roma para Mônaco e sobre a minha participação em sua fuga. No artigo havia uma foto minha de uniforme, dizendo que hoje o ex-capitão Priebke trabalha como garçom numa cervejaria de Buenos Aires. Milhares de pessoas leram aquele artigo, e algum magistrado militar também, suponho.

Atenção!: Por que não quer ser processado na Itália?
Erich Priebke: Porque a acusação italiana é tão absurda e chega cinquenta anos depois. Na acusação, por exemplo, escreveram que eu era inencontrável desde 1946. Mas em 1946 ainda estava num campo de prisioneiros. Depois, até outubro de 1948, vivi em Vipiteno, com minha família e com meu verdadeiro nome. Desde novembro de 1948, eu vivo na Argentina como Erico Priebke. Viajei oito vezes para os Estados Unidos, sempre com o passaporte alemão, e nunca ninguém me importunou. Estive várias vezes na Alemanha, duas vezes na Itália. Em um dos pedidos dos italianos está escrito que eles procuram o major Hass, o capitão Shutz e Priebke. Pois bem. O Capitão Shutz viveu a vida toda na Alemanha, onde trabalhou como policial. O major Hass viveu por muitos anos em Roma – não sei se ainda está vivo – e da última vez que estive em Roma, em 1979 ou 1980, jantamos juntos, com nossas esposas. Desconfio dos italianos.

Atenção!: Seu advogado declarou que o senhor, pelo contrário, aceitaria ser extraditado para a Alemanha. Por quê?
Erich Priebke: Por saber que na Alemanha vou receber um tratamento normal. E, além do mais, para mim hoje é muito mais fácil falar em alemão do que em italiano.

Atenção!: O senhor hoje está com 82 anos. Como imagina seus próximos anos?
Erich Priebke: Como vou saber? Espero ser declarado inocente, viver os últimos anos em paz, com minha mulher.