quinta-feira, 3 de maio de 2018

VÍDEO – atriz Lucélia Santos manda seu “bom dia, presidente Lula”

A “perícia” imprestável dos tiros sobre a caravana de Lula

A “perícia” imprestável dos tiros sobre a caravana de Lula

O G1 publica partes do que seria o relatório pericial da polícia do Paraná sobre os tiros disparados contra a caravana do ex-Presidente Lula no final de março passado.
A reportagem só não é rir porque é de chorar que jornalismo possa aceitar afirmações do tipo “se foi uma só pessoa que fez [os disparos], a pessoa planejou o ataque, direcionou o tiro”.
Que o ataque foi planejado e que os tiros foram direcionados, francamente, é algo que dispensaria um mês de investigações. Mas o delegado Hélder Lauria, responsável pelas investigações sobre o ataque foi capaz de frases incríveis, como esta:
“Quem fez isso sabia o que estava fazendo. Não podemos dizer que foi algo orquestrado e o que motivou. Mas, a pessoa não estava lá atirando em passarinhos e por acaso acertou o ônibus”.
Jura, Doutor?
Será possível que depois de quase um mês e meio,  a perícia consiga chegar a “detalhes” como o de que o atirador “encontrava-se do lado direito dos veículos, afastado aproximadamente 18,90m (dezoito metros e noventa centímetros)e sobre um piso de aproximadamente, 4,36m, considerando-se um atirador em pé e com estatura de 1,70m” , mas não seja capaz de dizer onde partiram os disparos .
A impunidade, para os terroristas de direita, parece estar assegurada.

O drama gigante e a notícia anã

O drama gigante e a notícia anã

De repente, um incêndio, um desabamento, um número de mortos que não é sabido – até porque, se os há, são pessoas invisíveis, subcidadãos – e descobrimos que o problema gigantesco da crescente falta de moradia para as pessoas é, essencialmente, a presença de supostos espertalhões que arrecadavam 200 ou 300 reais dos pobres infelizes de uma ocupação de um prédio público abandonado.
Janio de Freitas, na sua coluna de hoje na Folha, repõe a questão no termos em que deveria estar, embora dada a estupidez generalizada para a qual contribui uma imprensa sensacionalista, se prefira coloca-lo no campo da criminalidade.

O tamanho da tragédia

Janio de Freitas, na Folha
Por um instante, estamos de volta a palavras e expressões como “tragédia”, “descaso do poder público” e “problema de moradia” colhidas na fogueira de uma ocupação no centro de São Paulo. São verdades, mas pequenas verdades. A tragédia e o descaso são monstruosamente maiores.
Diz-se, com base no IBGE, que há coisa de 8 milhões de imóveis desocupados no Brasil. E uns 7 milhões de famílias, bem mais de 20 milhões de pessoas, sofrendo o eufemismo “déficit habitacional”. Não crer nesses números é uma sugestão amigável.
Moradias desocupadas, como as lojas, na crise e no desemprego multiplicaram-se em uma forma de denúncia involuntária do desastre que a direita, a certa altura, achou prudente silenciar. Os números de famílias e pessoas não incluem os que sobrevivem, entre a precariedade e a miséria total de seu teto e seu chão, em locais onde pesquisadores não entram.
Já na fermentação que preparou o golpe de 64, o “problema de moradia” teve uma influência de repente equiparada ao da reforma agrária. O número incalculável e crescente de imóveis desocupados chegou a evidências revoltantes, de 63 para 64.
No começo do acúmulo, contra a dificuldade de aumentos indiscriminados dos aluguéis e dos despejos, sujeitados à lei do inquilinato. Depois, pela propaganda anti-Jango de que o golpe comunista daria aos inquilinos a propriedade de suas moradias de aluguel.
O afoito ministro da Justiça, Abelardo Jurema, respondeu com o anúncio de uma próxima reforma urbana que desapropriaria todos os imóveis desocupados. Outra reforma vazia, mas fez crescer muito a agitação fomentada pelos colecionadores de casas e apartamentos vazios (costume entre donos de meios de comunicação da época) e respectivas, ou nem tanto, madames.
O então presidente do Sindicatos das Empresas de Jornais e Revistas, deputado Chagas Freitas, chegou a ter uma imobiliária para administrar seus mais de 500 imóveis.
A abolição da escravatura, a volta das tropas homicidas de Canudos, o “Bota Abaixo” da modernização urbana do Rio por Pereira Passos (a propósito, “A Revolta da Vacina”, do sempre lembrável Nicolau Sevcenko, é excelente) deram origem às favelas e abriram a série longa de fases e episódios agudos do “problema de moradia”.
Nenhum fez mudar coisa alguma, exceto a Lei do Inquilinato pelos militares, para favorecer aos proprietários os aumentos e os despejos de quem não pudesse pagá-los.
Os governos Lula e Dilma foram os primeiros a dedicar verbas e esforços de fato significativos à redução da carência de moradias com as condições básicas da dignidade humana. A constatação, porém, de uma qualquer deficiência em algum das centenas de milhares de imóveis entregues é motivo de escarcéu impresso e em telas, com a responsabilização dos dois governantes, não das construtoras que seguiram a praxe de roubar no material e na obra.
Muito simples e muito brasileiro: se Lula e Dilma não dedicassem dinheiro e esforço a reduzir a miséria habitacional, não seriam criticados nem igualados aos antecessores, todos poupados porque alheios às desgraças nacionais.
O Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, MTST, não nasceu só para chatear. Tem causa como origem e causa como razão de ser.
As ocupações no centro de São Paulo não aumentaram à toa, em menos de cinco anos, de 42 para 70. Nem ocorrem e aumentam só aí. São frutos ácidos da tragédia social e de descaso governamental. Frutos estes, por sua vez, da lucrativa sociedade entre poder público e poder privado que desgraça o Brasil.

A “tríade do mal” no STF e a imprensa que elogia só quem concorda com ela

A “tríade do mal” no STF e a imprensa que elogia só quem concorda com ela. Por Lenio Streck

 
Ministros atacados pela Quanto É
PUBLICADO ORIGINALMENTE NO CONJUR
Leio que a revista IstoÉ fez uma matéria desancando os ministros Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Motivo: o teor de seus votos em determinados julgamentos como o caso Maluf, habeas corpus de José Dirceu, etc.
A revista chama os três de “tríade do mal”. E não poupa impropérios. Para a revista, os três ministros, entre outras decisões absurdas, teriam dado um “duro golpe” contra a “lava jato”. Isto porque, na terça-feira, 24, por 3 votos a 2, a 2ª Turma do STF decidiu tirar das mãos do juiz Sergio Moro trechos das delações premiadas da Odebrecht que tratam de pagamentos ilícitos ao ex-presidente Lula. Diz a revista que “se for mantida a decisão da 2ª turma do STF, o país estará retrocedendo em pelo menos 10 anos no enfrentamento da corrupção”. A revista julgou os três ministros e já os condenou.
Nada de novo. Virou moda. Jornalistas e jornaleiros palpitam sobre a Constituição e sua hermenêutica. Resultado: Formou-se um imaginário pelo qual só é bom juiz aquele que julga de acordo com o que uma pretensa opinião pública estaria apoiando. Como certa mídia representaria essa “opinião das ruas”, o bom ministro ou o bom magistrado é aquele que julga de acordo com essa “opinião”.
Dizendo em bom português: dane-se a segurança jurídica, dane-se a lei e a Constituição. Os fins justificam os meios. Se a Constituição diz x e isso vai contra o que um determinado grupo defende, pronto: a Constituição é logo desancada e se transforma em um mal que atravanca o progresso. Como se uma democracia não tivesse que, exatamente, usar a lei para submeter os desejos dos indivíduos que compõem a nação.
Que os jornalistas da revista IstoÉ nada saibam sobre Direito e digam qualquer coisa, tecendo aleivosias a membros do STF, é até compreensível. Useira e vezeiro. O que é inadequado (para ser bem eufemista) é parte da comunidade jurídica desconhecer o valor de uma Constituição (digo isso porque na matéria há opiniões colhidas de juristas). Qualquer livro de Direito — até mesmo os resumos e resumões — mostra que a Constituição é um remédio contra o que maiorias eventuais querem. Despiciendo mostrar, de novo, a metáfora de Ulisses e as sereias. Ele só se salvou porque seus grumetes o amarraram ao mastro e o acorrentaram. As correntes de Ulisses são salvadoras.
Mas, no Brasil, não há correntes para amarrar Ulisses. Isto porque, aqui, Ulisses é um suicida. Inexoravelmente, nosso Ulisses pindoramense quer se atirar nos braços das sereias. Mesmo sabendo que morrerá. Só que o Ulisses tupiniquim não se dá conta — ou até se dá — de que seu suicídio levará um país inteiro para o fundo mar. Porque as correntes representam a salvação do Direito e pelo Direito. Mesmo que se diga: “mas se cumprirmos a Constituição e o devido processo legal à risca, muitos corruptos escaparão”. Ora, ora, combater crimes é desejo de todos e não monopólio de alguns. Mas o combate tem de ser um bom combate, com respeito às regras do devido processo legal e aos ditames da lei.
Triste ver parte da imprensa se comportando desse modo. Na especificidade da decisão recente sobre a retirada da competência sobre delações do âmbito de Moro, é consabido que o juiz de Curitiba adotou uma tese que pode ser chamada de “pamcompetencismo”. De forma artificial, ele se tornou competente para todo e qualquer assunto desde que ligado a Petrobras. E, agora, o STF ousou discordar dessa tese. Não duvido que, pelo andar da carruagem, em breve, até os assaltos a postos de gasolina com a marca Petrobras deverão ser julgados por Moro. Ou a qualquer posto de gasolina, uma vez que a Petrobras distribui gasolina pelo Brasil afora. É só o que está faltando, se me permitem uma blague.
Democracia impõe limites. Inclusive nas críticas. A imprensa é livre, mas tem de arcar com as consequências. Afirmar que os três ministros (Lewandowski, Toffoli e Gilmar) são a tríade do mal implica responsabilidade. E, atenção: isso serve também para os ministros não nominados pela reportagem. Não se pode, sob pretexto de criticá-los, passar dos limites. E, atenção de novo, não nos iludamos. Porque no futuro isso acontecerá com outros ministros e juízes em geral. Bastará que julguem contra o que certos repórteres pensam! Os hoje elogiados se tornarão malditos e vice-versa! Tão velho quanto a Bíblia!
Post scriptum: Dica de pauta para IstoÉ: “o escândalo pelo escândalo”!
Se os repórteres da IstoÉ estão sem assunto, quem sabe possam ir atrás desta matéria do Estadão? Título: O escândalo pelo escândalo. Pode render muito e servir à cidadania. A certa altura, lê-se:
“O dado mais revelador dessa sanha punitiva que move uma parte da Polícia Federal e do MPF é o número de inquéritos que foram concluídos sem indiciamento: 1.256 dos 1.729. Ou seja, 73% das investigações da PF sobre corrupção entre 2013 e 2017 resultaram em nada. Um inquérito é encerrado sem indiciamento quando a polícia não reúne provas suficientes para indicar a materialidade de um crime, vale dizer, a sua ocorrência, e a autoria”.
A chave para a matéria pode ser “sanha punitivista”!
.x.x.x.x
 é jurista, professor de Direito Constitucional e pós-doutor em Direito. Sócio do escritório Streck e Trindade Advogados Associados: www.streckadvogados.com.br.