quarta-feira, 7 de março de 2018

"Conversando com Correa" recebe Noam Chomsky

"Conversando com Correa" recebe Noam Chomsky

 

 
06/03/2018 10:58
Reprodução/Youtube
 
Na estreia de seu programa “Conversando com Correa”, transmitido pela RT na última quinta-feira (01.03), o ex-presidente do Equador, Rafael Correa, recebeu o intelectual e ativista político norte-americano Noam Chomsky, uma das mentes mais brilhantes do nosso tempo. 

Em 28 minutos, Chomsky dá uma verdadeira aula de geopolítica. Não só define “imperialismo”, como analisa o imenso poder das corporações norte-americanas hoje no mundo. Ele também comenta a retórica belicista de Donald Trump em relação à Coreia do Norte, Venezuela e os impactos disso na América Latina. 

Confira o primeiro episódio (em espanhol) abaixo:




Créditos da foto: Reprodução/Youtube

Artigo | É preciso questionar a Justiça para não repetir erros históricos

EQUÍVOCOS

Artigo | É preciso questionar a Justiça para não repetir erros históricos

"A corporação dos juízes não é dona da verdade", alerta professor da COPPE/UFRJ e ex-presidente da Eletrobras

Brasil de Fato | Rio de Janeiro (RJ)
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Criticar a Justiça é um "direito democrático dos cidadãos" / Fábio Pozzebom/ABr
Conheci pessoalmente a ministra Carmém Lúcia, hoje presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), em uma reunião com o governador Itamar Franco, contra a privatização do setor elétrico, que voltou à baila com o governo Temer. Ela era procuradora-geral do Estado de Minas Gerais e teve uma posição progressista naquele tempo. 
A grande imprensa interpretou uma recente declaração da ministra dizendo que a Justiça é inquestionável de acordo com o ritual estabelecido pela lei. Ora, a crítica às decisões judiciais, seja lá de que instância for, juiz singular ou colegiado, é um direito democrático dos cidadãos e é intelectualmente natural, não apenas no contraditório jurídico formal, mas nos campos filosófico e político. A corporação dos juízes não é dona da verdade. Comete erros, como historicamente pode ser comprovado. 
No Brasil, na década de 1930, houve o famoso caso dos irmãos Naves, condenados à prisão sem terem cometido crime, objeto de um filme de longa metragem de Luis Sergio Person, em 1967.
Os dois irmãos, Sebastião José Naves e Joaquim Roza Naves, ainda jovens, confessaram, sob tortura, terem cometido um assassinato que não ocorreu. Eram pessoas pobres. O delegado de polícia tinha convicção sem provas. Naquele tempo, não havia o aforismo da convergência, mas havia indícios apontando para eles. Os irmãos, embora inocentes, pois o suposto assassinado reapareceu vivo anos depois, ficaram presos por oito anos por erro da Justiça.
No século XIX, na França, o capitão judeu Dreyfus foi vítima de uma condenação por alta traição, acusado de revelar segredos militares em uma carta para os inimigos alemães. Indignado, Émile Zola escreveu o livro J’accuse defendendo Dreyfus, que ficou na prisão por cinco anos. Tardiamente, sua condenação foi revista, constatando-se sua inocência.
Nos Estados Unidos, na década de 1970, Angela Davis, professora de filosofia, comunista e militante do movimento negro, foi acusada de conspiração no estado da Califórnia e presa por um ano e meio, depois absolvida por um júri popular. Seu caso causou uma reação popular e de intelectuais progressistas.
Foi ainda mais dramático o caso do engenheiro judeu Julius Rosenberg e da sua esposa Ethel, na década de 1950, nos EUA. Foram condenados pela Justiça e executados na cadeira elétrica, sob a acusação de terem repassado o segredo da bomba atômica aos soviéticos, jamais comprovada. Entre outros, Albert Einstein se manifestou em defesa do casal. Pesava contra eles o estigma de serem comunistas e ligados à União Soviética, que de ex-aliada dos EUA na Segunda Guerra Mundial, tornou-se arqui-inimiga na Guerra Fria que se seguiu.
Naquela época, houve uma atuação anticomunista estimulada pelo senador Joseph McCarthy, que liderou a Comissão de Atividades Antiamericanas no Congresso, perseguindo pessoas com posição de esquerda, prendendo-as ou fazendo-as perder o emprego. Criou-se uma lista negra, inclusive de artistas de Hollywood. Entre outras críticas, houve o filme Boa noite e Boa Sorte, dirigido por George Clooney. Nestes exemplos de erros da Justiça no mundo, vemos preconceito contra os mais pobres, racismo, antissemitismo, anticomunismo, perseguição à esquerda.
Voltando ao Brasil, está em debate a chamada Lava Jato e operações similares da Justiça, com procuradores da República e a Polícia Federal. Um erro óbvio foi o que resultou na humilhante prisão de reitor Luiz Carlos Cancellier, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sem motivo relevante, o que levou ao seu dramático suicídio. 
O caso de maior repercussão política é o do apartamento triplex que o ex-presidente Lula teria recebido da empresa OAS como propina. Problema: o apartamento não é do ex-presidente, tendo sido colocado recentemente em penhora por uma juíza independente, Luciana Correa Torres de Oliveira, de Brasília, devido a uma dívida da OAS. Apesar disso, três desembargadores do Tribunal Federal da 4ª Região, com votos escritos idênticos, confirmaram o erro da Lava a Jato, condenando Lula.  
Aliás, um erro que beneficia muitos juízes e procuradores, inclusive da Lava a Jato, está no recebimento de auxílio-moradia sem direito moral a esse benefício concedido, por um erro do STF. 
*Luiz Pinguelli Rosa é mestre em engenharia nuclear, doutor em física e professor titular e emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ). Membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), foi presidente da Eletrobras entre 2003 e 2004.

Edição: Thalles Gomes

Brasil em descompasso de espera

Brasil em descompasso de espera

O tempo foi passando, os escândalos seguiram se sucedendo e boa parte do primeiro escalão do governo Temer está sendo processado, condenado ou cumprindo na prisão. Mas nada disso é relevante, pois o que interessa é que a credibilidade da política econômica seria recuperada. Só que não!

 
07/03/2018 10:24
Beto Barata/PR
 
A proximidade do pleito de outubro próximo começa a deixar um pouco agitado e ansioso o campo da direita e da centro-direita em nosso País. Afinal, ao contrário do que havia sido prometido desde a derrota de Aécio Neves na disputa presidencial em 2014, não foi suficiente o êxito em chancelar o golpeachment aprovado pelo Congresso Nacional. O PSDB questionou o resultado das urnas eletrônicas, uma vez que tinha certeza de que ganhariam as eleições. Eduardo Cunha foi eleito Presidente da Câmara dos Deputados e assumiu a missão de infernizar a vida da Presidenta recém-eleita. O resultado de tudo isso foi o afastamento da vitoriosa no pleito.

A ampla campanha de apoio midiático e o suporte político de boa parte de nossas elites empresariais apareciam como a garantia de que tudo se resolveria no dia seguinte à retirada de Dilma Roussef do Palácio do Planalto, em razão daquela medida inconstitucional. A chegada do time dos sonhos no comando da economia era comemorada por todos os simpatizantes da turma dos endinheirados. Afinal, “la crème de la crème” tinha certeza de que nada melhor do que dois legítimos banqueiros para botar ordem na bagunça.

Meirelles e Goldfajn são apresentados como uma espécie de unanimidade para a solução de todos os problemas brasileiros. Agora sim, a competência técnica e a seriedade profissional seriam guindadas ao primeiro plano do Ministério da Fazenda (MF) e do Banco Central (BC). Pouco ou quase nada se falava respeito da participação do ex presidente internacional do Bank of Boston na presidência do Conselho de Administração da JBS. Além disso, a grande imprensa permanecia calada frente aos escândalos bilionários dos perdões gentilmente oferecidos pelo CARF (órgão do MF) às sonegações praticadas pelo Banco Itaú. O inferno são os outros.

Aposta no golpeachment e decepção posterior.
O tempo foi passando, os escândalos seguiram se sucedendo e boa parte do primeiro escalão do governo Temer está sendo processado, condenado ou cumprindo na prisão. Mas nada disso é relevante, pois o que interessa é que a credibilidade da política econômica seria recuperada. Só que não! As consequências da estratégia de aprofundamento do austericídio foram implacáveis. O desemprego explodiu a níveis jamais conhecidos até então. A redução do ritmo da atividade econômica empurrou o Brasil em direção ao precipício da maior e mais longa recessão de nossa História.

Como bons economistas que são, a duplinha dinâmica encarregada de implementar o desastre sabia muito bem o que estavam provocando. A manutenção dos juros na estratosfera desde meados de 2016 e a opção pelo garroteamento das despesas orçamentárias não poderiam levar a outra quadro que não a estagnação generalizada. Na verdade, a intenção era exatamente essa. Ambos conheciam o final da estória dessa combinação explosiva de juros altos e arrocho fiscal. A intenção era mesmo provocar a quebradeira generalizada de forma premeditada, pois ela seria a única receita para impedir a elevação dos preços. Uma loucura!

Ocorre que a expectativa gerada na maioria dos apoiadores do golpe era exatamente a oposta. Os meses se sucediam e o milagre da retomada da economia em “bases responsáveis” não aparecia no horizonte. Muito pelo contrário. A compressão da renda das famílias, a expansão da pobreza e o ressurgimento da miséria em níveis impressionantes contribuíram para abafar a demanda. Com isso, é óbvio, os preços cederam e a inflação caiu. A recessão inquestionável acabou obrigando o próprio COPOM a promover a redução tardia da SELIC. Mas a cumplicidade da direção do BC frente aos crimes cometidos pelo oligopólio da banca contra a grande maioria da sociedade garantiu a continuidade do regime de espoliação financeira.

“Deixou de piorar” e “fundo do poço”.
O desconforto dos colunistas econômicos dos grandes meios de comunicação era evidente. Afinal, tinham que dialogar com sua base de leitores, que haviam acreditado piamente naquilo que se revelou como um enorme estelionato jornalístico. Dali para frente, a saída foi forçar a barra a cada nova publicação oficial de dados. Mas revelou-se difícil essa tarefa inglória de retirar leite de pedra. O discurso assumiu o tom do hilário “deixou de piorar”. Até que, finalmente, veio a boa notícia a respeito do PIB de 2017. Após 2 anos sucessivos de queda, finalmente a economia havia oferecido um crescimento modesto de 1%.

No entanto, as perspectivas não se revelam nada seguras quanto à possível continuidade de tal ritmo. O resultado foi obtido graças ao extraordinário desempenho oferecido pela agricultura, que cresceu 13% ao longo dos 12 meses. Serviços e indústria permaneceram calados, com “crescimento” de praticamente 0%. Além disso, o item que mais puxou o crescimento permaneceu sendo o consumo, o que evidencia a continuidade de um modelo frágil e pouco sustentável. 

O comportamento mais relevante para análises prospectivas refere-se ao investimento. E nesse quesito fica mais do que evidenciado o compasso de espera que atravessa a economia brasileira. A taxa de investimento do PIB permanece bastante distante dos 25% que boa parte dos analistas considera essencial de ser atingida. Em 2017 ela ficou em apenas 15,6%. Essa taxa só é superior ao que foi apurado em 1996, ou seja, vivemos um recuo de 22 anos em aspecto essencial de nossa capacidade econômica.

O resto é disputa de metade do copo cheio ou vazio. O governo e os jornalões chapa-branca tentam vender a impressão de que uma criação de algumas dezenas de milhares de emprego é um avanço. Mas nada comentam a respeito da permanência de um estoque de quase 13 milhões de desempregados. A equipe econômica e alguns de seus colunistas especializados de plantão disputam o momento em que afinal teríamos tocado o fundo do poço, mas os índices oficiais resistem a tal afirmação categórica.

Compasso de espera e eleições de outubro.
O desempenho da indústria é cristalino a esse respeito. Depois de comemorar enfaticamente quatro meses de crescimento do setor, agora os dados do IBGE relativos a janeiro apontam para uma nova queda no produto industrial. Assim, o crescimento acumulado de setembro a dezembro do ano passado (4,3%) foi quase revertido com a queda (2,4%) observada no primeiro mês de 2018. Na verdade, o fato é que boa parte das vendas ocorre com base em estoques acumulados e o crescimento observado na produção é realizado apenas com base na recuperação da capacidade ociosa. Não há ampliação das plantas nem contratação de força de trabalho.

O fato concreto é que a retomada do crescimento da economia em bases sustentáveis exige aumento expressivo do investimento. E isso pressupõe confiança do empresariado no cenário futuro. O desmonte provocado pela equipe impôs um quadro grave de incerteza e insegurança. Só agora parece que começa a cair a ficha dos que se iludiram com os imensos prejuízos provocados pela irresponsabilidade criminosa praticada pelos liberaloides de plantão. Volta a frequentar as páginas dos jornais aquilo que os economistas críticos desse modelo não cansávamos de alertar. A retomada da economia depende de que seja recuperado o protagonismo do Estado à frente das grandes decisões estratégicas.

Não bastaram as fadinhas mágicas das expectativas. O Brasil não só estagnou, como recuou muito e caminhou bastante para trás. A economia brasileira só deixará o atual compasso de espera em que nos encontramos à medida que foram se tornando mais claros os horizontes de curto e médio para os empresários. Afinal, esse governo já terminou e os responsáveis pela economia não se atreverão a mexer uma palha para retomar investimentos públicos ou adotar estímulos de políticas públicas na direção de um projeto de desenvolvimento. Boa parte dos integrantes sairão para concorrer a cargos eletivos e os remanescentes não terão credibilidade alguma para encerrar esse triste fim de feira.

Ao que tudo indica, as definições quanto aos cenários para o próximo quadriênio só virão mesmo com os resultados de outubro. Permanecem as dúvidas quanto à participação de Lula ou não no pleito. Se insistirem nesse escandaloso cerceamento, abrem espaço para o “risco Bolsonaro”. Por outro lado, pipocam aqui e ali sinais importantes de mudança de avaliação no interior das classes dominantes quanto à óbvia necessidade de flexibilizar as amarras impostas pela EC 95 e pela regra de ouro. Ganha força a ideia de um referendo revogatório para zerar o jogo imposto por Temer e iniciar uma nova caminhada. Mas até lá, tudo indica que continuaremos a afundar ainda um pouco mais no pântano que tem caracterizado o atual quadro de imobilismo.

 

* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.


Créditos da foto: Beto Barata/PR


Fonte: Carta Maior

Política A narrativa golpista e os caminhos para derrotá-la: 5 - Uma reciclagem da narrativa golpista em crise?

Política

A narrativa golpista e os caminhos para derrotá-la: 5 - Uma reciclagem da narrativa golpista em crise?

Um contradiscurso, fruto de certo fortalecimento e da atuação da mídia alternativa, emergiu e se mostrou capaz de desnudar, ao menos em parte, o deliberado enviesamento da cobertura da imprensa corporativa

 
06/03/2018 11:46
Reprodução/Youtube
 
A narrativa golpista, a despeito da força inicial demonstrada na legitimação do golpe, entrou em um processo de crise explicitado pela impopularidade das lideranças golpistas, pela rejeição das reformas neoliberais e, principalmente,pela forte ascensão  de Lula nas pesquisas, indicando, inclusive, a possibilidade de uma vitória inédita no primeiro turno das eleições presidenciais.  Um contradiscurso, fruto de certo fortalecimento e da atuação da mídia alternativa, emergiu e se mostrou capaz de desnudar, pelo menos em parte, o deliberado enviesamento da cobertura da imprensa corporativa. Esse contradiscurso, apesar de um alcance ainda pequeno da mídia alternativa diante da absurda concentração midiática, sobretudo da TV Globo, tem sido capaz de abalar a credibilidade da narrativa golpista. Sobretudo, ele se mostra mais coerente e muito mais sensível à experiência sofrida pela maioria da população brasileira após o golpe parlamentar de 2016.

Dados recentes de uma pesquisa divulgada pela Vox Populi, no dia 2 de fevereiro de 2018, confirmam essa tendência de crise da narrativa golpista, indicando uma forte deslegitimação das autoridades do judiciário empenhadas em condenar Lula e impugnar a sua candidatura à presidência. Dos entrevistados, 56% consideram o julgamento de Lula político, contra 35% que o consideram realizado dentro dos marcos jurídicos normais;54% dizem que ele deveria poder ser candidato a presidente (contra 37%), e 49% avaliam que ele não deve ser preso (contra 36%). E o mais impressionante: 62%, quase dois terços, opinaram que seus governos tiveram mais acertos do que erros, contra 29% que têm uma opinião contrária.

A pesquisa do Instituto Ipsos, realizada no mês de fevereiro, antes da intervenção militar no Rio, indica esse mesmo cenário: o juiz Moro apareceu, pela primeira vez, com um índice de rejeição de 51%, contra apenas 39% de aprovação. A presidente do STF, Carmem Lúcia, apresentou um índice de 49% de rejeição e de apenas 23% de aprovação. Segundo o diretor do Instituto, a aprovação de 42% a Lula seria ainda fortemente superior à de Alckmin (20%) e de Bolsonaro (24%), tendo uma rejeição de 56%, portanto, menor que a deles: Alckmin teria uma rejeição de 68%, e Bolsonaro, já de 58%.

No entanto, esse conjunto de elementos, embora muito expressivo, não significa o aniquilamento dessa narrativa. Com sua força midiática, bem estruturada e legitimada por agrupamentos à direita, a narrativa golpista age, no momento, no sentido de retomar sua credibilidade. A jogada mais clara é a inserção de um novo e potente repertório no noticiário: o combate à violência e à criminalidade. Para que esse novo repertório se legitime, há um alinhamento entre as forças/grupos dominantes (Mídia – Judiciário – Forças do establishment político mais conservadoras) em favor de uma visão de mundo dominante, com a conformação e consolidação de uma cadeia de reciprocidade que se retroalimenta e define o que importa e o que não importa na notícia sob esse enfoque, criando uma agenda e determinando fortemente o que se discute.

Como demonstra o tom dos telejornais - sobretudo o Jornal Nacional -, a Rede Globo retomou a aliança abalada, mas nunca perdida, com Michel Temer. A militarização emerge, nesse momento, como a ação salvadora capaz de resgatar uma população refém da violência. Já no carnaval, esse foi o repertório que dominou a cobertura, ressaltando uma situação extrema e sem controle. Nossa relação com o real é mediada pelos meios de comunicação, portanto, nossa percepção de certos fenômenos (como a violência e suas manifestações) é dada pela cobertura feita por esses meios. 

Pois bem, a cobertura do Jornal Nacional no carnaval trouxe ao primeiro plano esse viés de violência extrema e sem controle, apesar de dados de fontes respeitáveis mostrarem que não, que aquele não foi o carnaval mais violento do Rio de Janeiro. No entanto, isso pouco importa, pois o que domina é a impressão que se tem e que se sobrepõe à experiência concreta. E a imprensa corporativa, representada aqui pelo Jornal Nacional, trabalha isso de modo magistral, recuperando medos que assolam a população, trabalhando enquadramentos e operando o silenciamento como política editorial para garantir que a violência se instaure e que a militarização seja aceita como a resposta possível.

Nesse momento, observando-se as edições do Jornal Nacional, sobretudo a partir do carnaval, vamos encontrar esse cenário, que tem uma marcação bem precisa e aspectos que podemos pontuar aqui, como se segue.  

- Silenciamento como política editorial - Essa estratégia não se esgota apenas na ocultação ou na censura a fatos. É um trabalho muito bem elaborado discursivamente, com objetivos bem claros. Quando um repertório como crise econômica sai de cena, num momento histórico em que o desemprego bate recorde e há queda na remuneração dos trabalhadores, ou quando o desemprego é exposto de forma lateral, apenas numericamente, sem contextualização ou desdobramentos, está em vigor uma política de silenciamento. 

O silêncio trabalha, portanto, para que se construa um único sentido na interpretação e na compreensão dos acontecimentos. No período pós-carnaval, por exemplo, vieram à tona os dados fundamentais sobre o desemprego e a queda de remuneração dos trabalhadores informais em comparação com aqueles com carteira de trabalho, dados que foram silenciados, ainda que tenham sido marginalmente mencionados. Pelo silenciamento, o impacto desses números é neutralizado.

Há silenciamento também em relação aos excessos e abusos dos militares nas favelas. Não se tem, pela mídia corporativa, notícias sobre isso, e a população afetada (pobres moradores das favelas) não tem voz. 

- Descontextualização- O repertório violência é tratado a partir do binômio violência (ordem) x segurança - ou seja, é preciso adotar medidas de força para acabar com a violência e garantir a segurança dos cidadãos de bem. O tráfico - no Rio de Janeiro - aparece como agente dessa violência, mas uma recuperação histórica do problema não tem lugar. A que se liga a violência? Quais suas raízes? Há ligação com a crise, ela pode explicar o suposto aumento?

A corrupção como repertório perde eficácia, apesar de manter o mesmo formato (é um evento seletivo, que se refere apenas a um grupo específico, no caso, Lula e o PT). Não é um repertório que desapareceu: a operação seletiva da Polícia Federal contra Jacques Wagner bem evidencia isso. Esse repertório perde alguma centralidade, nesse momento, mas será retomado, com certeza. E o repertório crise econômica também sai de cena (para ser redimensionado, não tenham dúvidas), pois não há qualquer interesse em mostrar que agora, verdadeiramente, o país vive uma crise econômica grave, e apesar do aumento pífio do PIB (festejado pela mídia corporativa), a realidade de mais de 12 milhões de desempregados e uma crescente e assustadora falta de perspectivas agride a sociedade brasileira.

- Enquadramento - O novo repertório é “violência”, e a “moldura” para enquadrá-lo é: a ordem (numa dimensão militar) é imprescindível para garantir a segurança. Como feito na propaganda nazista ou de regimes repressivos, alguns conceitos e ideias precisam ser destruídos, como respeito aos direitos humanos. Isso é secundário na proposta maior que é manter a ordem para garantir a segurança da população. 

E como esse tema é tratado? A ausência de contextualização é uma marca, e o tema da violência é desvinculado da crise social (desemprego, miséria, ausência de políticas sociais para as populações carentes) e tratado sob a ótica bruta da violência e da punição. O circuito das drogas não alcança os bairros ricos.

Quatro aspectos se destacam nesse enquadramento:

Fragmentação - não é trazida a perspectiva de um todo, o fato reportado aparece quase sempre deslocado, sem outros elementos que o liguem a processo conjuntural.

Evidências tomadas como fatos – o noticiário toma casos de violência como prova irrefutável de que existe uma situação sistemática de violência, fora de controle, e que somente a ordem poderá restaurar a paz e a segurança. Nesse momento, é importante a “voz de autoridade” - autoridades judiciais, militares - para corroborar esse aspecto.

Pathos ou a emoção no discurso: é um elemento marcante e constantemente presente na cobertura da violência. É necessário trazer uma carga dramática efetiva para que o público seja sensibilizado. E é claro que a emoção é trabalhada e também trazida no noticiário a partir de determinado viés.

Ausência de pluralidade de vozes: o enquadramento do repertório define que vozes serão trazidas à tona na cobertura. Dessa forma, aparecem somente vozes oficiais (autoridades) e especialistas para atestar o “caos” e ressaltar a necessidade de medidas mais duras. As críticas das populações mais atingidas pela intervenção são silenciadas, assim como a voz predominantemente crítica dos especialistas em segurança pública, no Jornal Nacional. Nesse molde, a intervenção militar parece ter apoio unânime e inquestionável.

Mascaramento da realidade: toma fôlego quando, nos relatos da mídia corporativa, a desigualdade e o aumento da pobreza deixam de ser apontados como fatores geradores da criminalidade. Há a construção de um imaginário sociodiscursivo que modela a forma como o público em geral percebe o tema violência. 

É inegável, portanto, o poder de agenda da mídia corporativa: de acordo com a pesquisa Ibope realizada entre 7 e 10 de dezembro de 2017, o tema segurança não é o prioritário para a população.Ele aparece em nono lugar, atrás de saúde, aumento do salário-mínimo, controle da inflação, geração de empregos e redução de impostos, educação, combate à corrupção e diminuição dos gastos do Estado. Mas ele foi sobrevalorizado na cobertura do Jornal Nacionalpara justificar sua prioridade, indo ao centro da cena.

Nessas teias de sentido, a mídia corporativa vai procurando refazer a narrativa golpista, com nova roupagem e novos temas, influenciando a opinião dos cidadãos, criando agendas que passam a pautar esse espaço e estando legitimada como instância autorizada a transmitir a informação.  Essa narrativa em crise, mas reciclada, faz circular um sistema de valores, operando num processo de seleção-construção de notícias, impostas e disseminadas como as únicas possíveis. Nesse processo, a perspectiva histórica e a contextualização são relegadas, construindo-se uma visão de mundo única, para ser rapidamente absorvida, sem espaço a outras vozes ou outras perspectivas.

Assim midiatizado, pretende-se que o debate político vá se convertendo num grande espetáculo, em que o público é forçosamente homogeneizado pelo viés único reiteradamente marcado da narrativa golpista.


Créditos da foto: Reprodução/Youtube

"Constituição não pode ser rasgada por contrariar as forças políticas"

7 de março de 2018 - 12h46 

"Constituição não pode ser rasgada por contrariar as forças políticas"


Foto: Carlos Humberto/Época
  
Portanto, a decisão desta terça-feira (6), da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de negar o habeas corpus preventivo requerido pela defesa de Lula, apesar de ter sido unânime, pode não ser definitiva.

O principal ponto de controvérsia é o que trata do princípio da presunção de inocência, previsto na Constituição Federal, que a interpretação era de que um réu só deveria cumprir a sentença de prisão após transitado em julgado, ou seja, após esgotados os recursos até a última instância. No entanto, em fevereiro de 2016, em votação também de um habeas corpus, o plenário do Supremo entendeu que o artigo 283 do Código de Processo Penal não impede o início da execução da pena após condenação em segunda instância.

A decisão alterou a interpretação jurisprudencial, transformando o "pode" em "deve" estabeleendo que um réu deverá cumprir a sentença de prisão imediatamente após esgotados os recursos na segunda instância.

"A questão está em aberto no Supremo. O tribunal está com muitas idas e vindas em relação a isso. Só depois da decisão do STF teremos uma definição. Não se pode achar que essa decisão já permite a prisão", afirmou o jurista e professor emérito da USP, Dalmo Dallari.

O tema deve ser debatido com o recurso apresentado pelo ex-presidente Lula. Apesar da ministra Cármen Lúcia, presidente da Corte, ter reafirmado que não pretende colocar em votação o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) 43 e 44, apresentadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN) e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, pedindo a suspensão da execução antecipada da pena após decisão no segundo grau.

As ações foram relatadas pelo ministro Marco Aurélio Mello, que também é contrário à pena antecipada e já liberou o voto para o Plenário, pressionando a presidente, ministra Cármen Lúcia, para que coloque o tema em pauta.

Alguns ministros já manifestaram que a pauta deve ser reaberta para não gerar insegurança jurídica sobre o tema. Isso porque o recurso de Lula não pode ser avaliado sem que tais ações não sejam discutidas pelo plenário.

No entendimento do ministro Ricardo Lewandowski, por exemplo, a prisão só pode ocorrer após esgotados todos os recursos e instâncias.

Para Lewandowski, que adiantou o voto das cautelares ao site Conjur, defende que a Constituição determina que só após trânsito em julgado alguém poderá ser considerado culpado. Segundo o ministro, trata-se de cláusulas pétreas, ou seja, que não podem ser reformadas de modo a reduzir ou retroceder direitos e garantias fundamentais.

“A presunção de inocência integra a última dessas cláusulas, representando talvez a mais importante das salvaguardas do cidadão, considerado o congestionadíssimo e disfuncional sistema judiciário brasileiro”, afirma o ministro.

Lewandowski afirma ainda que a legislação brasileira não prevê a prisão automática em segunda instância, podendo ocorrer somente em casos excepcionais, a depender do caso particular do condenado.

“Não consigo ultrapassar a taxatividade desse dispositivo constitucional, que diz que a presunção de inocência se mantém até o trânsito em julgado. Isso é absolutamente taxativo, categórico; não vejo como se possa interpretar tal garantia.”

O STF está dividido sobre o tema. Há dois anos, a corte rejeitou os pedidos de liminar das ADCs. No entanto, a composição foi alterada com a morte do ministro Teori Zavascki e a chegada de Alexandre de Moraes. Houve ainda mudança na posição do ministro Gilmar Mendes. Em setembro, assume a Presidência o ministro Dias Toffoli, para quem a execução de pena só deve ocorrer depois de julgamento no Superior Tribunal de Justiça.


Do Portal Vermelho, com informações da RBA e Conjur

MUITA ATENÇÃO: Empresários e MBL têm plano para criar campanha pró-intervenção federal

Sociedade

Liberdade?

Empresários e MBL têm plano para criar campanha pró-intervenção federal


por José Antonio Lima — publicado 07/03/2018 11h33
O grupo propõe ocupações militares, fim do sigilo advogado-cliente e "guerrilha" para criar narrativa positiva à ação do Exército
Carl de Souza / AFP
Vila Kennedy
Mulher e criança na Vila Kennedy, em 23 de fevereiro, ao lado de militares
O Brasil 200, um grupo de empresários aliados ao Movimento Brasil Livre (MBL), montou um plano para criar uma campanha favorável à intervenção federal decretada pelo presidente Michel Temer no Rio de Janeiro. O projeto inclui a instituição de medidas radicais na área de segurança pública, ao menos uma delas inconstitucional, acoplada a uma campanha de comunicação "de guerrilha" pró-intervenção. As informações estão em documento divulgado nesta quarta-feira 7 pelo jornal Folha de S.Paulo.
O documento é uma apresentação de PowerPoint de 24 páginas, intitulado Plano Nacional Emergencial de Segurança e Combate ao Crime. Há cinco objetivos, sendo o mais destacado deles "reduzir o impacto do crime no desenvolvimento econômico". Há no início da apresentação um esboço do sistema de segurança público brasileiro e recomendações genéricas a respeito de mudanças que devem ser realizadas.
A maior parte do documento se dedica a defender mudanças na legislação penal e nas práticas de segurança pública. Entre as propostas estão ocupações militares por forças especiais do Exército e da Marinha no Rio de Janeiro, o fim do sigilo advogado-cliente (uma garantia constitucional que não pode ser modificada) e do Estatuto do Desarmamento, a redução da maioridade penal e o fim das medidas socioeducativas a menores infratores. 
O grupo quer ainda acabar com a progressão de regime, com os indultos aos presos, com o auxílio-reclusão pago a dependentes de presos nos regimes fechado e semiaberto e com o limite de 30 anos de cadeia previsto no Código Penal, entre várias outras propostas.
Não fica claro quem é o responsável pela elaboração das propostas. Entre os integrantes do Brasil 200 há duas pessoas ligadas à área, o procurador Marcelo Monteiro, professor de Direito Processual da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e Roberto Motta, identificado como ex-consultor do Banco Mundial e consultor da área de segurança.
A parte final do documento é dedicada a uma estratégia de comunicação que tem como objetivo "criar uma campanha de engajamento" da população do Rio de Janeiro "evocando o espírito patriótico e aumentando assim a percepção positiva da operação".
Um dos itens a ser aplicado é uma "cobertura de guerrilha" que envolveria a criação de um programa de notícias, o "MBL News", no Rio de Janeiro para "passar a sensação de segurança e normalidade". Haveria ainda monitoramento do debate virtual para "identificar e contra-atacar as narrativas contrárias à operação". Outra estratégia seria a realização de entrevistas do integrante do MBL Arthur do Val, responsável pelo canal de Youtube "Mamãe Falei", com moradores do Rio que apoiam a intervenção "para desconstruir a narrativa que o Exército estaria oprimindo moradores".
Na mesma toada, a ideia do grupo é promover uma visita de Michel Temer a "áreas pacificadas" para "prestigiar as tropas e inspirar patriotismo". 
O Movimento Brasil Livre é um grupo próximo a Michel Temer. O PMDB, hoje MDB, partido do presidente, foi um dos vários que financiou o MBL na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff, como mostrou reportagem do portal UOL publicada em 27 de maio de 2016. Já no poder, em setembro de 2016, Temer pediu a consultoria do MBL para tornar as reformas trabalhista e da Previdência mais palatáveis para a população.
O Brasil 200 é formado por uma maioria de empresários, gente que "resolveu tomar o lado do Brasil e não se omitir da construção de uma agenda política que ponha a nação em primeiro lugar."
Integram o grupo os empresários Alberto Saraiva (Habib's), Alexis Fontayne (Solepoxy), Antonio Carlos Pipponzi (Raia Drogasil), Cleber Moraes (Schneider Eletric), Edgar Corona (SmartFit e BioRitmo), Ericsson Luef (Hemmer), Flavio Rocha (Riachuelo), Geraldo Rufino (JR Diesel), Giuliano Donini (Rosa Chá), João Apolinário (Polishop), José Victor Oliva (Holding Clube), Luciano Hang (Havan), Marcelo Alecrim (ALE Combustíveis), Pedro Thompson (Estácio), Ronaldo Pereira Júnior (Óticas Carol), Sebastião Bomfim (Centauro) e Roberto Justus (Grupo Newcomm). Em suas redes sociais, o MBL promove rotineiramente as publicações do Brasil 200.
Leia a íntegra do documento, conforme divulgado pela Folha: