sábado, 20 de janeiro de 2018

O despertar das bestas

O despertar das bestas

Os desembargadores do TRF-4 deveriam ler os comentários dos leitores da Folha ao vigoroso artigo de Mário César Carvalho, no qual ele reage ao espetáculo deprimente encenado ontem em Curitiba com Sérgio Cabral sendo exibido acorrentado aos fotógrafos pelos “policiais da Lava Jato”, este troço disforme que se formou sob a batuta de Sérgio Moro e dos garotos dallagnol, tal como se fez neste blog, inclusive nos conceitos terríveis sobre o ex-governador.
A humilhação das correntes nos pés tem um parentesco óbvio com a condução coercitiva, mecanismo que a Lava Jato usou e abusou até ele ser vetado em caráter provisório pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.
A condução coercitiva tinha como função espezinhar o investigado, apesar de os procuradores, a Polícia Federal e até juízes alegarem que era para evitar que os investigados combinassem versões sobre os fatos investigados. O problema é que a lei não prevê o uso da condução coercitiva para esse caso. Ela só é autorizada quando o investigado se recusa a depor, o que não era o caso na Lava Jato.

O caso das correntes é pior porque não há justificativa alguma para essa medida medieval.
Da defesa da civilização do texto, mesmo favorável à Lava Jato, logo abaixo, desce-se à barbárie dos comentários. Há prazer, há alegria sádica em ver um ser humano assim, exibido como até a um animal aprisionado chocaria ver. “Bolas de ferro”, sugerem, “garrote”.
É bom que suas excelências vejam a bestialidade, a imundície que as “Mãos Limpas” brasileira trouxeram à tona na sociedade. O quanto de brutalidade, de estupidez, de selvageria brotou da ação espetaculosa de uma Justiça que deixou de lado a presunção de inocência,  o equilíbrio silencioso do Juiz, o rigor do Direito Penal, onde não se autorizam suposições, e uma sentença que já se determinara muito antes que o processo chegasse a Curitiba.
Correntes nos pés é humilhação porque remete ao passado escravocrata do Brasil, ao tempo em que capitães do mato desfilavam com negros arrastando correntes nas ruas do Rio, Salvador e Recife para que eles não ousassem mais fugir. Era uma lição muito clara: “Veja só o que acontece com quem desafia os senhores de escravos”, escreve Mário César.
Então, senhores desembargadores, os senhores se disporão ao papel de feitores, de bispos da Inquisição que apenas assentem, obsequiosos, ao magister dixit do impiedoso (exceto para os seus) Papa Moro, que ergueu uma turba de incendiários, de linchadores, uma matilha sedenta de sangue e de morte?
Marcelo Auler, em seu blog, escreve sobre os bastidores do julgamento que farão e observa que, no Judiciário, existe desconforto com a transbordante autoridade de Moro até sobre seus colegas juízes, ainda bem. Mas desconforto maior deve haver com a onda de furor que ele ergueu e que se expressa num bolsonarismo que não é majoritário, mas é assustadoramente expressivo.
Reflitam, porque este é um caminho que leva ao nazismo, onde a estrela era amarela, mas bastava para os campos de tortura e extermínio.

Os três juízes e as três promotoras da mídia

Os três juízes e as três promotoras da mídia

Não são apenas Lula e a liberdade das eleições que estarão em jogo na quarta-feira.
É, também, o papel das três grandes revistas brasileiras – Veja, Época e – sobrevivendo com as verbas de Temer – a Istoé – como “força tarefa” da Lava Jato.
Desde o “powerpoint” da Veja, na semana da eleição de 2014, lançada para tentar eleger Aécio Neves as três tornaram-se peças semanais de implacável acusação seletiva. Aliás, o beneficiário daquela capa que, na ocasião, não funcionou o suficiente para alcançar a vitória do hoje desaparecido – alguém lê algo sobre ele e suas malas? – senador mineiro.
Não é diferente hoje e é provável que tenham, neste momento, edições antecipadas prontas, à espera da condenação que seria seu carnaval antecipado. Das três, a Época é quem coloca algumas fichas na necessidade de ter munição futura, contando que não se complete o aniquilamento de Lula, pronta a atacar sua família (aliás, a mesma que, em outros tempos, dizia que ele abandonava). A Istoé,  que perdeu faz tempo todas as estribeiras, já o coloca atrás das grades. Mas é a Veja quem vai ao ponto: pressionar, com seu poderio, os desembargadores para que não “afinem” na quarta-feira.
E usa, como o quis fazer com Celso de Mello no julgamento dos embargos infringentes do chamado “Mensalão”, estampando o seu rosto na capa para, previamente, apontá-los à execração no caso de se aventurarem a desobedecer o diktat do tribunal da mídia.
Daquela vez, todos sabem, não funcionou. As circunstâncias, porém, eram outras: ainda não havia o golpe, os prejuízos políticos já tinham sido “contabilizados” e, sobretudo, não havia a figura imperial de Sérgio Moro, transformado do “Il Duce” do Judiciário.
Quarta-feira, portanto, será também o dia de verificar o quanto – e se totalmente – a mídia conseguiu fazer do Judiciário uma extensão de seu poder de manipulação. E que ele, como ela o faz, pretende se substituir ao povo brasileiro e dizer que ele não pode escolher o que ela não quer que escolha.

O caricato presidente de si mesmo

O caricato presidente de si mesmo

Não vale a pena analisar objetivamente a entrevista de Michel Temer à Folha de S. Paulo, pela simples razão que ela aborda quase que exclusivamente um assunto menor: ele próprio. A caricatura fotográfica que lhe faz o jornal é perfeita: Temer é uma deformidade na história.
No universo de jogadas, espertezas, arranjos políticos e vantagens em que  ele habita, é natural que se considere o centro. Só neste sentido, o do egoísmo medíocre, cabe chamá-lo de um Berlusconi tropical, como o faz, hoje, André Singer. Além, claro, do fato de só ter ascendido ao poder por obra e desgraça da Lava Jato, como aquele o foi pela Mani Puliti.
Não vou sair da Presidência com essa pecha de um sujeito que incorreu em falcatruas. Não vou deixar isso.
Vai, Temer. Sairá pelas mesmas falcatruas que os levaram até ela e por novas. Com a diferença que as primeiras reuniam a pior escória política ansiosa pelo poder total e as mais recentes, nem isso, porque estar a seu lado contamina inapelavelmente quem quer que seja.
Seus capitais são minguantes, embora ainda ambicionados.
Um, vale cada vez menos e, apenas, em moeda local, paroquial: os cargos. O outro, este sim,  é  moeda que tem valor crescente: o tempo de televisão na campanha eleitoral, do qual todos pretendem, porém, eliminar sua efígie adunca e desprezada.
O valor de Temer, aquele que o levou ao cargos, em parte já foi resgatado, com o arrocho nas contas públicas, a dissipação do petróleo do pré-sal e a amputação de direitos trabalhistas. Poucos ainda creem que possa entregar a reforma da Previdência e a Eletrobras e ninguém, em são consciência, acha qie pode falar em reforma tributária, com um conteúdo que “depene” o Governo Federal o suficiente para que um presidente coerente com o país possa fazer dele uma alavanca do desenvolvimento.
Temer é o retrato acabado do lixo produzido pelo que disseram ser a limpeza da política.
Sim. Assim, sim, o batismo que lhe deu Singer é perfeito. Mas, ao contrário do seu padrinho italiano, Temer não tem votos para viver.