segunda-feira, 12 de março de 2018

Militares aderem ao Golpe canalha!

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E se a opinião pública fosse contra a prisão após segunda instância?

Estado Democrático de Direito

E se a opinião pública fosse contra a prisão após segunda instância?

 

 
08/03/2018 12:43
CARLOS MOURA/STF
 
Calma. O título é provocativo. É claro que pesquisas empíricas tipo “você concorda ou não?” não devem guiar o raciocínio do jurista. Entre pesquisas e a Constituição, sempre fico com a CF. Ou seja, entre o clamor das ruas e o ronco da CF, fico com o último.

Bom, a pesquisa da qual falarei tem (até) um resultado contraintuitivo. Mas tenham a pachorra de ler até o final esta coluna e me digam se não é interessante contrapor teses contra teses (mesmo que em tese). Ao trabalho.

Estava com uma coluna concluída quando li, no sábado pela manhã, dois textos: um de Jorge Galvão e outro tratando da pesquisa sobre o que os brasileiros pensam sobre a prisão a partir da segunda instância. Isso me levou a escrever a de hoje.

Galvão faz uma bela e precisa crítica ao neoconstitucionalismo, mostrando seu viés pragmatista e subjetivista, sem amarras com o texto constitucional. E que o neoconstitucionalismo pretende ser “representativo”, como se fosse buscar nos anseios populares aquilo que o leva para decidir. Diz o articulista, ainda, que “[e]sse tipo de abordagem, no entanto, acaba por minar a própria ideia de Estado de Direito, na medida em que afrouxa os limites do raciocínio jurídico ao permitir o uso de argumentos de políticapelos juízes, que passam a declarar a inconstitucionalidade de atos estatais não por ferirem direitos, mas por se mostrarem contrários aos projetos de nação de um ou outro magistrado”.

Perfeito o raciocínio. Também o artigo mostra dois exemplos “de posturas neoconstitucionalistas”, como visto nas posições do ministro Luiz Fux nas ADCs 43 e 44, quando disse que a execução da pena após condenação em 2º grau seria justificada para preservar o direito fundamental da sociedade em ver aplicada a sua ordem penal, ainda que em detrimento de eventual direito do acusado. Raciocínio similar foi feito pelo ministro Roberto Barroso no julgamento do AgRExt 1.054.490, em que, após diagnosticar que, atualmente, há certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, convidou os demais colegas a refletirem sobre a autorização de candidaturas avulsas em eleições majoritárias como forma de aperfeiçoar o nosso sistema político, concluindo que “aprimorar as instituições faz parte do núcleo de nossa missão constitucional”.

Quero cotejar/juntar o texto de Jorge Galvão com a pesquisa publicada no mesmo dia pela ConJur.

“De acordo com o levantamento, promovido entre 24 e 26 de fevereiro com 2 mil pessoas em 18 municípios, 48% das pessoas ouvidas são contra a prisão logo após a decisão por tribunal, enquanto 28% querem ver os acusados presos imediatamente.”

O que o texto de Galvão tem a ver com a pesquisa? Tudo. Se o neoconstitucionalismo quer ser “representativo” e substituir o direito posto por apreciações que “emanam da sociedade” ou algo desse quilate (na acepção de Dworkin, seriam raciocínios de política), então a todo momento o Direito se tonaria plebiscitário. Portanto, neoconstitucionalistas (e derivativos), para serem coerentes, deveriam demonstrar o “clamor das ruas”. Que sentido teria isso? Para mim, nenhum, porque acabaria com o caráter contramajoritário da Constituição. Todavia, para quem quer ser “representativo”, no mínimo isso daria um trabalhão.

Ou seja, neoconstitucionalistas e teleologistas (também os realistas) em geral têm calcado sua justificativa para (i) fragilizar a Constituição na presunção da inocência e, (ii) no desdenho pela clareza do artigo 283 do CPP, em uma espécie de clamor social (?), algo como “sopesando direitos ou interesses individuais versus o interesse público”, deve-se optar pela “sociedade” (como saber o que é isso, ninguém diz — na maioria das vezes, baseiam-se na opinião publicada pela mídia). Pois se fôssemos cair nas armadilhas do empirismo (e o neoconstitucionalismo é empirismo na veia), poderíamos perguntar: “E então? Se a maioria da população está de acordo com a CF e o CPP, vocês não deveriam puxar o freio?”.

Mas, é claro, como não sou empirista, não preciso desse tipo de pesquisa e prefiro um bom Direito, traduzido a partir de uma Constituição normativa como a nossa. Aliás, se o clamor social ou a “realidade social” valem mais do que a Constituição, por qual razão precisamos de uma Constituição? E se os anseios sociais podem ser “compreendidos” e/ou “traduzidos” pelo Judiciário, por qual razão precisamos de parlamento? E quando o clamor social se voltar contra o próprio Judiciário?

Na verdade, a Constituição não é apenas o remédio contra maiorias e “clamor social”; já disse aqui que, entre o “neoconstitucionalista” e “neofilósofo contemporâneo” Merval Pereira e a CF, fico com a CF, sempre; e a Constituição é também um anteparo às pesquisas e estatísticas, pela simples razão de que essas apontam sempre para resultados sazonais. Além disso, há sempre a possibilidade de manipulação de números, como já demonstrei (aquiaqui e acolá) na questão das estatísticas sobre os números do STF, em que o conceito de ativismo foi trazido à baila por números pelos quais se poderia dizer absolutamente o contrário. Aliás, como fiz. Estatísticas servem para tudo... E para nada. Volto sempre à “teoria do tiro no pato”: dou um tiro no pato e erro em um metro à esquerda; dou outro tiro e erro à direita. Na média, matei o pato.

De minha parte, fico com meu conservadorismo constitucional, sem praticar dualismos metodológicos à la Jellinek. Não dá para contrapor uma pretensa realidade política (ou social) a um sistema de normas, como se fosse possível fazer essa cisão. Herman Heller foi pioneiro ao propor uma conexão real entre as duas perspectivas, como bem demonstra Marcelo Cattoni (no belo livro Contribuições para uma Teoria Crítica da Constituição, Arraes Editores). Veja-se que esses dualismos — ainda bem presentes no Brasil — pretendem explicações empírico-sociológicos para problemas jurídicos normativos, deixando de lado a necessária mediação hermenêutica. Nesse sentido, argumentos punitivistas pro societate nada têm a ver com a ideia, em Häberle, de uma "sociedade aberta de intérpretes da Constituição", em que se reconhece o papel crítico mediador, permanente, da doutrina jurídica em favor dos princípios constitucionais. "As críticas aos julgados", dirá Häberle, "compõem, em uma comunidade onde o controle de constitucionalidade está institucionalizado, o contrapeso imprescindível no âmbito da divisão dos poderes em face do direito constitucional pretoriano do controle de constitucionalidade"[1]. Mais ainda, o neoconstitucionalismo e as teorias correlatas — e aqui se encaixa o realismo retrô brasileiro — não passam de instrumentos pelos quais a moral, a política e a economia querem predar o Direito. Funciona assim: apesar de a lei ou a CF dizerem x, nós entendemos y, porque y é melhor para os interesses do país. E como se afere "o que é isto — o que é bom para o povo"? Bom, aí entra uma boa dose de "iluminismo" e "iluminação".

Para não perder a viagem, e exercitar minha Leer (Lesão por Esforço Epistêmico Repetitivo), transcrevo o quadro abaixo demonstrando o que dizem o CPP e a CF sobre a presunção da inocência e a prisão a partir do segundo grau. Atenção: nem preciso de pesquisa para dizer que o artigo 283 é claro e está em perfeita consonância com a CF. Não consigo entender de que modo é possível fazer uma interpretação conforme a CF do dispositivo exatamente para negar o que ele diz. Parece mais uma interpretação em desconformidade a CF. Em vez de verfassungskonforme Auslegung, parece que estão fazendo uma interpretação desconforme a Constituição — tendo como parâmetro ela mesma. Quem conhece o conto Sereníssima República, de Machado de Assim, pode compreender melhor o modo como Caneca ganhou a eleição do adversário Nebraska. Como disse o filólogo contratado por Caneca, vocês não entenderiam: “É a coisa mais demonstrável do mundo. Mas não demonstrarei isso”.

table

Peço desculpas pela singeleza de minha proposição. E não é contraintuitiva. Exsurge da clareza dos textos. É que não consigo ver outra coisa no artigo 283 do que isso mesmo que estou vendo.

Numa palavra: não sustento a clareza do artigo 283 do CPP porque, contingencialmente, a pesquisa está a favor dessa clareza. Não. A vantagem do constitucionalismo e de uma hermenêutica adequada é a de que devemos manter o Direito, mesmo que a pesquisa aponte em direção contrária. Ou contratemos o filólogo que defendeu Caneca.

Só devemos ter muito cuidado, como já avisou Friedrich Müller: um dia os textos que hoje maltratamos podem bater de volta (Sie können zurückschlagen).



[1] HÄBERLE, Peter. Recht aus Resenzionen. Verfassungsgerichtbarkeit zwischen Politik und Rechtwissenschaft. Königstein: Athenäum, 1980, p. 12
Créditos da foto: CARLOS MOURA/STF

Putin fala sobre uma eventual guerra nuclear

Poder e Contrapoder

Putin fala sobre uma eventual guerra nuclear

Em entrevista difundida esta semana nos meios locais, o presidente russo declarou que "se alguém tomar a decisão de destruir a Rússia, temos o legítimo direito de responder"

 
08/03/2018 11:44
 
 
“A decisão sobre o uso de armas nucleares só se pode tomar em resposta a um ataque com mísseis”. Esta é a frase mais eloquente da recente entrevista do presidente russo Vladimir Putin, para o documentário Miroporiádok 2018, do jornalista Vladimir Soloviov, que foi recentemente difundido no país.

“Quero dizer a vocês, na Rússia e no exterior, que nossos planos de uso – embora espero que isso nunca aconteça de fato –, os planos teóricos de uso (das armas nucleares), são para responder a um ataque, e em nenhuma outra ocasião”.

E logo ressaltou: “isso significa que a decisão sobre o uso de armas nucleares só pode ser tomada em caso de que nosso sistema de alerta de ataques com mísseis registre um lançamento, e mais que isso, que também dê coordenadas precisas sobre as trajetórias de voo, assim como o tempo da queda da ogiva em nosso território”.

Em outro momento da entrevista, Putin diz que “se alguém tomar a decisão de destruir a Rússia, temos o legítimo direito de responder. Sim, seria uma catástrofe para a humanidade, uma catástrofe global, mas eu, na minha condição de cidadão russo e de líder do Estado russo, quero lançar esta pergunta: para que necessitaríamos um mundo assim, sem a Rússia?”.

O mandatário lembrou que a bomba nuclear não apareceu pela primeira vez na Rússia, e sim nos Estados Unidos. “Nunca utilizamos armas nucleares, e os Estados Unidos as utilizou contra o Japão”. Neste sentido, Putin precisou que em muitos livros japoneses se omite este fato e se diz que a bomba foi lançada pelos aliados. “Que aliados? A União Soviética era um aliado dos Estados Unidos naquele momento, mas ninguém nos informou sobre aquele ataque”, disse o presidente durante a entrevista, e logo perguntou “que garantias temos de que isso não ocorrerá novamente?”.

Inovação em armamento
Na semana passada, durante sua mensagem anual nas duas Câmaras da Assembleia Federal, Putin apresentou os inovadores avanços do Exército russo.

Ao mesmo tempo, o mandatário insistiu em dizer que “o crescente potencial militar da Rússia não visa ameaçar ninguém, e sim dar uma garantia de paz firme ao nosso planeta, porque este poderio mantém e seguirá mantendo um equilíbrio estratégico de forças no mundo, o que ainda é um fator preponderante para a segurança internacional, assim tem sido desde depois da Segunda Guerra Mundial até hoje em dia”.

Do Neoliberalismo ao Chavismo: 29 anos do 'Caracazo' na Venezuela

Do Neoliberalismo ao Chavismo: 29 anos do 'Caracazo' na Venezuela


O 'Caracazo' foi o produto de uma síntese das insatisfações, das injustiças e do sufocamento de nível extremo vivenciado pelo povo venezuelano durante o período em que vigoraram as políticas neoliberais do Pacto de Punto Fijo

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Há 29 anos, nos dias 27 e 28 de fevereiro de 1989, acontecia na Venezuela o que ficou conhecido como “Caracazo” ou “Sacudón”, quando estourou uma rebelião popular onde milhares de pessoas saíram espontaneamente às ruas do país saqueando o comércio como forma de protesto contra as medidas neoliberais impostas pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e implementadas pelo então presidente da época, Carlos Andrés Pérez. Esse episódio é considerado como o fato histórico responsável pelo desencadeamento da Revolução Bolivariana, comandada anos depois por Hugo Chávez.
“Caracazo”: uma rebelião popular
A população venezuelana estava há décadas à mercê do modus operandi da oligarquia local, caracterizado por uma intensa corrupção, exploração, desigualdade social, demagogia, dependência externa e abuso de poder. A manutenção dessa agenda política conservadora e antidemocrática foi possibilitada graças ao Pacto de Punto Fijo, estabelecido em 1957 e articulado pelos EUA em conjunto com os partidos tradicionais e conservadores que subordinavam a democracia e o sistema político aos interesses das oligarquias que se alternavam no poder, impedindo a entrada de outras organizações políticas.
O “Caracazo” foi portanto o produto de uma síntese das insatisfações, das injustiças e do sufocamento de nível extremo vivenciado pelo povo venezuelano durante o período em que vigoraram as políticas neoliberais do Pacto de Punto Fijo. Para se ter uma ideia, nesse período histórico a estrutura social do país se encontrava extremamente debilitada gerando uma vulnerabilidade social de grandes proporções onde cerca de 3,5 milhões de crianças viviam em situação de pobreza, 83% da população carecia de serviços básicos, 5% do empresariado concentrava 70% da produção do país, 70% das pessoas viviam abaixo da linha da pobreza, 30% viviam literalmente em estado de pobreza absoluta, o PIB (Produto Interno Bruto) encolheu em 20%, o salário mínimo perdeu 48% de seu valor e o desemprego oscilou entre 25% a 30%, conforme dados do governo¹. Um horripilante quadro social que pode ser avaliado como uma crise humanitária, onde uma em cada cinco pessoas passava fome no país.
Eleito pela segunda vez, Carlos Andrés Pérez assumiu o seu segundo mandato como presidente da Venezuela no dia 2 de fevereiro de 1989. Dias após a sua chegada ao governo, o presidente anunciou um pacote de medidas que agravou ainda mais a situação do país: aumento abusivo do preço da gasolina, da passagem de ônibus e dos alimentos. Tais aumentos foram o estopim para que povo venezuelano se insurgisse contra a falsa democracia e as medidas econômicas neoliberais que beneficiavam somente a parcela rica da sociedade.
A rebelião popular foi a saída possível e necessária para desatar as amarras da repressão. Cansados de tamanho sufocamento e sem condições econômicas para comprar alimentos e produtos básicos de subsistência, uma multidão de explorados e exploradas saíram espontaneamente às ruas em um protesto violento, saqueando o comércio em várias cidades do país numa busca desesperada pela própria sobrevivência. As manifestações começaram na cidade de Guarenas, localizada a 15 quilômetros da capital Caracas, e se estenderam por diversas outras cidades do território nacional.
A reação do governo de Carlos Andrés Pérez foi a de suspender as garantias constitucionais, decretando o toque de recolher e impulsionando um massacre comandado pelo exército que utilizou 4 mil militares, 4 milhões de munições e vários tanques de guerra para conter os protestos populares, resultando em uma das repressões mais sangrentas da história venezuelana. Mesmo depois que os saqueios tiveram fim, os militares continuaram disparando contra casas e edifícios. O número de mortos e feridos foi tão grande que os hospitais não deram conta de atender tamanha demanda. Ainda nos dias de hoje não se sabe ao certo o número de vítimas, no entanto, números oficias do governo da época apontam a morte de 300 pessoas, 2.000 mil desaparecidas e outras milhares de feridas. Entretanto, números extraoficiais alegam a morte de pelo menos 3.000 pessoas.
O início da Revolução Bolivariana
Fato é que o “Caracazo” modificou drasticamente os rumos da sociedade venezuelana, sendo que a partir desse fato histórico abriu-se uma nova janela de oportunidades. No ano seguinte ao massacre, em 1990, pela primeira vez na história do país um presidente em exercício ia a julgamento por acusações de corrupção, resultando em prisão anos depois.
No entanto, antes mesmo da prisão de Pérez, a crise social se aprofundava e no interior do exército surgiam disputas e tensionamentos internos. Foi então que no fatídico dia 4 de fevereiro de 1992, o então Tenente Coronel do exército, Hugo Rafael Chávez Frías, liderou uma rebelião de caráter cívico-militar. O golpe fracassou pois não havia organização suficiente para sustentá-lo. Hugo Chávez fez então um memorável discurso televisivo em rede nacional, onde assumiu as consequências do levante militar, num tempo onde ninguém assumia responsabilidade nenhuma sobre as questões políticas pelas quais passava o país. O discurso, que durou pouco mais de um minuto, foi suficiente para atrair o afeto e a simpatia do povo venezuelano, que vinha sendo enganado há tempos pelos discursos demagógicos, populistas e falaciosos dos oligarcas do puntofijismo.
Em certa oportunidade, em um discurso realizado no Cuartel de La Montaña, Hugo Chávez fez questão de diferenciar a tentativa de golpe de 1992 dos golpes costumeiramente perpetrados pelas elites de vários países latino-americanos:
“Golpistas são os que se unem à oligarquia para atropelar seu próprio povo, golpistas são os que pretendem instalar na Venezuela uma ditadura, golpistas e apátridas são os que se ajoelham ao imperialismo norte-americano. Nós somos anti-imperialistas, revolucionários, bolivarianos, e a cada dia somos mais e somos em maior profundidade.”
Em 2002, durante o décimo aniversário da rebelião cívico-militar do 4 de fevereiro de 1992, Hugo Chávez resgatou a importância histórica do “4F” (assim ficou reconhecido o 4 de fevereiro no país) e sintetizou o que significou a data:
“Claro, esse dia demos um golpe mortal no Pacto de Punto Fijo e lá estão eles debatendo-se entre os mortos políticos da história que não retornarão. Então, o 4 de fevereiro foi isso, a morte de um regime deslegitimado, pervertido e podre que não trazia benefício nenhum para a Venezuela. Mas o 4 de fevereiro ao mesmo tempo gerou a força que foi capaz de parir a nova Pátria.”

Não há crise humanitária na Venezuela, diz especialista em direitos humanos da ONU

EUA lançam conto de fadas 'humanitário' contra Maduro

Após acordo com oposição, Venezuela adia eleição presidencial para 20 de maio

 
Reprodução/Telesur

'Caracazo': população na rua e repressão violenta do governo
Após o “4F”, Chávez esteve preso por 2 anos, o que serviu para catapultar sua popularidade, forjando no imaginário coletivo um personagem histórico que foi capaz de assumir responsabilidades e lutar contra as injustiças vividas pelo povo venezuelano. Chávez teve sua liberdade de volta durante o governo do então presidente eleito Rafael Caldeira e, logo depois, em 1998, venceu as eleições presidenciais da Venezuela com 56,2% dos votos, com uma campanha focada num projeto estratégico baseado na participação popular via poder constituinte.
A partir de então, ao longo de 19 anos de governo – primeiro com Chávez e agora com Nicolás Maduro – o chavismo sustenta 23 vitórias eleitorais, sendo derrotado em apenas duas ocasiões. Esse número expressivo de vitórias é justificado pelas transformações políticas, econômicas e sociais proporcionadas pelos governos chavistas, sendo que os indicadores socioeconômicos da Venezuela melhoraram exponencialmente durante esse período:
- O Gini² – índice utilizado pelo Banco Mundial para medir a desigualdade social – passou de 0,498 para 0,394 (quanto mais próximo de zero melhor), sendo que o índice brasileiro ficou em 0,520 (3º pior da América Latina) se comparado no mesmo período.
- O IDH³ (Índice de Desenvolvimento Humano) – medida utilizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) para classificar os países pelo seu grau de “desenvolvimento humano” – da Venezuela ficou na colocação 71º entre 188 países, a frente inclusive do Brasil e da média dos índices dos países latino-americanos.
- O desemprego⁴ caiu de 14% em 1999 para 5,5% em 2014.
- A taxa de analfabetismo⁵ foi reduzida de 9,1% (antes do chavismo) para 4,7% em 2015.
- A expectativa de vida⁶ aumentou de 72 anos em 1996 para 75 anos em 2014.
- A pobreza⁷ foi reduzida de 49,4% para 26,4% em 2010.
- A Venezuela passou a ser o 2º país na América Latina com maior proporção de estudantes universitários⁸, cerca de 10,5 milhões ou 34% da população, ficando atrás apenas de Cuba.
Novo “Caracazo” à vista?
Apesar de todos os avanços da Revolução Bolivariana a Venezuela vive nos dias de hoje uma crise econômica e uma instabilidade social que tem trazido enormes dificuldades ao país. Ao contrário do que se diz nos grandes meios de comunicação, a Venezuela não passa hoje por uma crise humanitária tal como na época do “Caracazo”. Todavia, a situação é alarmante uma vez que as forças imperialistas comandadas pelos EUA em coordenação com países europeus e latino-americanos tal como Colômbia, possuem por objetivo levar a Venezuela a um novo colapso, no sentido de enfraquecer o chavismo, retomar o controle político do país e submete-lo aos interesses norte-americanos, tal como já ocorre com Brasil, Argentina, Colômbia, Peru e diversos outros países latino-americanos.
Trata-se portanto de uma restauração conservadora de caráter neoliberal no continente latino-americano, após um período em que os governos de esquerda foram predominantes em vários países. As táticas para submeter as nações latino-americanas aos interesses norte-americanos são várias e dependem da realidade de cada país. No entanto, independentemente da tática, o papel dos grandes meios de comunicação é sempre crucial pois é através deles que as forças imperialistas e as oligarquias locais buscam legitimar suas intervenções.
No Haiti (2004), por exemplo, houve participação direta do exército norte-americano, que sequestrou o presidente eleito Jean-Bertrand Aristide e a “opinião pública” afirmou que o presidente havia renunciado voluntariamente. Em Honduras (2009) as forças armadas nacionais se incumbiram de realizar o serviço, mas também houve influência direta norte-americana uma vez que o Chefe do Estado Maior, Romeo Vázquez, e o Chefe da Força Aérea, General Luis Prince Suazo, foram graduados pela School of the Americas e a base militar de Honduras, operada por soldados norte-americanos, foi utilizada para levar o presidente eleito Manuel Zelaya. No Paraguai (2012) o presidente Fernando Lugo sofreu um impeachment sendo acusado de ser o responsável pelo enfrentamento entre campesinos e policiais, onde morreram 17 pessoas. A polícia paraguaia no entanto recebeu uma doação em equipamentos militares no valor de 2 milhões de dólares e o Chefe da Polícia Nacional, Paulino Rojas, recebeu treinamentos no FBI. No Brasil (2016) não houve, a princípio, participação direta dos militares. O golpe teve caráter jurídico, onde a presidenta eleita Dilma Rousseff foi destituída por supostos “crimes de responsabilidade”. Tal como revelado pelo Wikileaks, a presidente Dilma Rousseff e seus principais assessores foram monitorados pelo governo estadunidense e a estatal Petrobras também fez parte deste pacote. Documentos internos do governo dos EUA que foram publicados pelo Wikileaks dizem que Sergio Moro, juiz responsável por coordenar os trabalhos da Operação Lava Jato, participou de cursos de treinamentos para agentes judiciais e policiais federais brasileiros nos EUA.  
No entanto, a situação da Venezuela é ainda mais complicada. O país passou por uma tentativa fracassada de golpe em 2002, liderada também por militares egressos da School Of Americas, entretanto o povo venezuelano acabou por reconduzir o presidente Chavez ao poder. Uma das táticas que vem sendo utilizada mais recentemente é conhecida no meio militar como Guerra de 4ª Geração (4GW) ou Guerra Assimétrica. Esse tipo de guerra faz referência a última fase da guerra na era da tecnologia, informática e das comunicações globais. Segundo o sociólogo chileno Daniel Martinez Cunil, nas guerras de 4ª geração “desaparece o conceito usual de campo de batalha e toda a sociedade atacada torna-se a mesma. As mensagens emitidas pela mídia serão um fator determinante para influenciar a opinião pública, tanto no âmbito interno quanto internacionalmente, pois a propaganda constitui a arma estratégica e operacional dominante nesse tipo de guerra. As ações táticas visarão a cultura do inimigo, predispondo a população contra seus governos. Isso permitirá que um pequeno número de combatentes ataquem e causem grandes danos a elementos importantes de natureza civil, na retaguarda inimiga.”.
A Guerra de 4ª Geração tem como arma estratégica as operações de ação psicológica midiática. Em outras palavras, significa dizer que há uma produção e disseminação de notícias, manchetes, imagens, gifs e demais conteúdos midiáticos que atraem a curiosidade e excitam os sentidos das pessoas no sentido de manipular suas consciências através de imagens imbuídas de crenças e conceitos. Através de um bombardeio de informações fragmentadas, as pessoas deixam de analisar o sentido e a intenção (O que é? Porque? Para que?) de cada informação, convertendo-se em meros repetidores de frases feitas (Ex: “A Venezuela vive uma ditadura”).
O bombardeio midiático é acompanhado ainda de outros métodos que visam a desestabilização do país, tais como: espionagem,  financiamento do paramilitarismo, estímulo à corrupção, golpe militar, utilização de dispositivos diplomáticos e comunicacionais para legitimar intervenções humanitárias, sabotagem do preço do barril de petróleo, embargo de bens, sanções econômicas, manipulação do preço do dólar, corte no abastecimento de alimentos e medicinas e ações terroristas tais como as praticadas durante os 40 dias de terror que o país viveu em 2017, quando aconteceram os ataques das chamadas “guarimbas” que são grupos terroristas financiados pelos EUA.
O objetivo principal é levar a Venezuela a um desgaste econômico, político e social que justifique uma intervenção “humanitária” por parte dos EUA e a partir daí reorganizar todo o aparato estatal para servir a seus interesses. A principal motivação norte-americana é mais uma vez o petróleo e as demais riquezas naturais existentes na Venezuela. O país possui a maior reserva de petróleo do mundo (estimada em 300.878.033 milhões de barris), a 4ª reserva de ouro (estimada em 4,3 mil toneladas), a 9ª maior reserva de agua doce (1.320 km³), 6ª maior reserva de gás natural (8.287.000.000.000 m³), além de possuir quinze dos dezessete minerais mais utilizados do mundo, entre eles o coltan, que possui o preço mais elevado que o ouro e o diamante e é utilizado para fabricação de novas tecnologias e dispositivos eletrônicos.
Por fim, diante das dificuldades históricas produtivas do país, da dependência econômica do petróleo, somado a todas as ameaças, interesses e intervenções externas, não é descartável a hipótese de um novo colapso no país. No entanto, o novo “sacudón” se daria por outros motivos e sob outras condições. Ao contrário do que aconteceu no passado, o governo que se encontra no poder hoje não tem por objetivo colocar o povo venezuelano em uma situação de miséria e superexploração, muito pelo contrário. O chavismo busca, antes de mais nada, a construção e a defesa de uma pátria livre e soberana, através de uma democracia direta, inclusiva e participativa.

* Caio Clímaco é cientista do estado pela UFMG, mestrando em Ciencias para el Desarrollo Estrategico na Universidade Bolivariana da Venezuela

Fontes:

Todos esperam por Lula

Todos esperam por Lula

Por: Fernando Horta 

Em entrevista para o Valor, o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos diz ser errada a atitude de Lula de se manter candidato. A entrevista tem muito pouco a mais, além disto. Talvez tenha sido apenas por esta declaração que ele deu entrevista no Valor.

Ciro, ataca Lula pessoalmente e diz que qualquer coisa é mais fácil do que "o PT apoiar alguém". Certamente tentando um irracional duplo mortal carpado na retórica. Ofende, mas quer o apoio.

Manuela diz que Lula é grande, mas a esquerda é maior e segue com ou sem Lula. Comentário que é certo do ponto de vista de um comunista, mas não de um latino-americano. Comentário desnecessário e que apenas mostra que Manuela ainda não está pronta para a campanha que o partido lhe jogou.

O psol lança Boulos, que fica num movimento pendular entre o think tank Paula Lavigne e o apreço de Lula. O psol já levantou o tom contra Lula, já baixou, mas os fiadores da candidatura Boulos estão entre os "antilulistas" viscerais, e nisto há uma contradição insanável com Boulos. O psol parece apostar na "estrela da base" para jogar o grande jogo no lugar do craque consagrado. A história mostra que são poucas as chances de isto dar certo, e imensas as de Boulos sair inviabilizado politicamente.

A verdade é que todos orbitam Lula como abutres na carniça.

Sozinhos, dada a incompetência de seus partidos nos últimos anos, não chegam sequer a 10% dos votos. O mesmo acontece com qualquer nome do pt que não seja Lula.

A esquerda toda foi incompetente e agora o lugar comum é culpar o pt "por não ter dado espaço para novas lideranças". O discurso é esquizofrênico, de um lado se insurge contra um suposto domínio oligárquico da esquerda e do outro acusa a mesma oligarquia pelo insucesso das esquerdas. É como falar contra "painho" e depois pedir-lho "bênção".

Todos os candidatos de esquerda, entretanto, sonham com a possibilidade de serem escolhidos por Lula como "seu candidato" e, assim, terem a única chance de irem ao segundo turno. A luta é, portanto, se fazer "unicamente viável" e esperar a cavalaria lulista para poder sair da defensiva.

Todos, entretanto, agem errado.
E Lula, "para variar", age corretamente.

Lula não deve se decidir, nem se afastar. Se fizer isto legitima os absurdos da direita e do judiciário e inviabiliza qualquer candidatura da esquerda. Por se manter como alvo, Lula VIABILIZA e ajuda a todos os candidatos da esquerda. Ainda que alguns, por falta de capacidade interpretativa da realidade, não consigam entender. 

O nível de desrespeito, ilegalidade e arbitrariedade estão tão altos no Brasil que se Lula saísse da disputa agora, todos os candidatos da esquerda, tanto os atuais quanto qualquer um que viesse a surgir, seriam abatidos pelo complexo mídia-judiciário. E se sobrevivessem cairiam para a tropa de choque de Temer e Etchegoyen.

Ao caminhar serenamente para as eleições, Lula caminha para seu destino. Destino, que, como disse Wanderley em tom desesperado, "ninguém sabe qual é". Ninguém, nem a direita. Nem os fascistas e nem mesmo o judiciário. Lula neste momento cumpre 4 papéis: 
(1) mantém-se como alvo das ilegalidades e assim escudo de toda a esquerda, 
(2) causa consternação e dúvida em todas as esferas do golpe,
 (3) mantém acesa as esperanças de ação política dos mais pobres (evitando a alienação política por desilusão) e
 (4) aumenta exponencialmente os custos das arbitrariedades.

Todos os outros candidatos de esquerda, por ignorância ou má fé, não cumprem rigorosamente nenhum papel além de papagaios a se autodestruírem. A verdade é que a esquerda não apresenta nenhum quadro alternativo à altura da tarefa que está posta. Por sorte, a direita também não tem ninguém minimamente capaz.

O que eu diria a todos os envolvidos, e em especial a Wanderley Guilherme, é um conselho de minha avó:

 "Se não sabe como ajudar, ao menos não atrapalhe".
__._,_.___

'Síndrome do impostor', um problema trazido à tona pelas mulheres

Sociedade

Especial - Dia Internacional da Mulher

'Síndrome do impostor', um problema trazido à tona pelas mulheres

por Dimalice Nunes e Tory Oliveira — publicado 08/03/2018 00h10, última modificação 08/03/2018 18h37
O fenômeno derruba a autoestima e faz com que profissionais bem-sucedidas sintam-se uma “fraude” na vida profissional
Pixabay
Síndrome do Impostor
Ansiedade generalizada, falta de auto-estima, depressão e frustração são alguns dos sintomas mais reportados entre as que sofrem com o problema
Um fantasma ronda a autoestima de mulheres, especialmente daquelas que ocupam cargos de destaque no mundo empresarial: sentir-se com frequência uma impostora, uma verdadeira fraude, indigna de receber tanto destaque em sua área de atuação, a despeito de todos os elogios, feedbacks positivos e outras provas de reconhecimento. 
Consagrada no senso comum pelo termo "síndrome do impostor", o fenômeno não é exclusivo ou inerente ao gênero feminino, mas tem sido debatido sobretudo entre as mulheres. Ao mesmo tempo, identificar, entender e batalhar para minimizar tais pensamentos auto-depreciativos também pode ser uma poderosa ferramenta na luta por mais equidade entre os gêneros no ambiente corporativo. 
A chamada síndrome do impostor foi descrita pela primeira vez em 1978, pelas psicólogas norte-americanas Pauline Clance e Suzanne Imes, ambas pesquisadoras da Universidade Estadual da Georgia, no artigo The Imposter Phenomenon in High Achieving Women: Dynamics and Therapeutic Intervention.
O trabalho é resultado de cinco anos de pesquisas com 150 mulheres altamente bem-sucedidas: detentoras de títulos de doutorado, respeitadas em suas áreas profissionais ou estudantes reconhecidas pelo bom desempenho acadêmico. No entanto, apesar das notas máximas, títulos e prêmios recebidos, essas mulheres não se consideram inteligentes ou capazes. Na verdade, diz o estudo, elas estão convencidas de que todos os outros estão enganados a respeito de suas habilidades. Acreditam que todo o sucesso é fruto do acaso, da sorte ou de algum erro no processo.
Muitas estudantes, afirmam Clance e Imes, literalmente fantasiam que só foram aceitas na universidade devido a algum erro. Ou que tiraram boas notas em um exame por sorte. E o pior: elas temem que, a qualquer momento, alguém descobrirá que são impostoras ou uma fraude.
Ansiedade generalizada, falta de auto-estima, depressão e frustração relacionada com a impossibilidade de atingir padrões de excelência auto-impostos são alguns dos sintomas mais reportados entre as mulheres que participaram do estudo.
Além de afetarem o desempenho e a produtividade, essas condições atuam como barreiras internas "invisíveis", impactando o bem-estar e a saúde mental, explica a doutora em Psicologia pela UnB, Renata Muniz Prado, cujas pesquisas focam-se na identificação e promoção do talento feminino. 
 "As pessoas acometidas pela síndrome do impostor não desfrutam seus sucessos, gastam muita energia para manter-se em alta performance pois criam padrões elevados para si mesmo, e tendem ao perfeccionismo, o que pode resultar tanto em excesso de preparo para o trabalho com mais anos de estudos e formações, como levar à procrastinação", afirma. 
Acostumada aos holofotes desde criança, prestigiada mundialmente por seu talento e duas vezes reconhecida como Melhor Atriz na premiação do Oscar, Jodie Foster confessa que tudo parecia um mero golpe de sorte. Por muito tempo, temerosamente fantasiou que viriam até sua casa, bateriam na porta e pediriam o prêmio de volta.
A aclamada poeta Maya Angelou já havia escrito 11 livros, mas ainda debatia-se com a sensação de que era uma fraude. "Toda vez eu pensava: agora eles vão descobrir. Eu enganei todo mundo e eles vão descobrir". 
Sheryl Sandberg, braço-direito de Mark Zuckerberg na bilionária Facebook, também confessa: "Tem dias que acordo me sentindo uma fraude, sem ter certeza que eu deveria estar onde estou".
A psicóloga Beatriz Nóbrega, hoje consultora, atuou por quase 20 anos em altos cargos na área de recursos humanos e percebeu a síndrome de impostora ainda no início da carreira. “Meu primeiro salário como trainee era equivalente a remuneração do meu pai à época e comecei a me questionar se eu valia aquilo tudo e se eu merecia tudo aquilo”, lembra.
Beatriz Nóbrega
'Comecei a me questionar se eu valia aquilo tudo', lembra Beatriz
Assim como Beatriz, a hoje consultora Regina Nogueira também sentiu a síndrome do impostor ainda no início: há 25 anos se tornou a diretora mulher mais jovem de uma grande multinacional. “Meu receio de achar que não estava correspondendo era tanto que passei a me vestir diferente, a ter uma postura mais formal, na tentativa de me adequar ao cargo, fantasiosamente. Achava que não ia dar conta e que se eu mudasse de postura, brincasse menos, estaria mais credenciada a merecer o cargo”, relembra.
A engenheira Catalina Jaramillo, 33 anos, é co-fundadora da startup Viajala.com.br. Dos cinco sócios da empresa, quatro são homens e franceses - Catalina é a única mulher e colombiana. Foi justamente na hora de empreender que veio a sensação de não estar no lugar certo.
Então diretora de importação em uma empresa de design e luxo, ouviu do chefe que empreendimento digital era coisa de gente nerd, que ela jamais pertenceria a esse mundo. “Somos poucas as mulheres que empreendem e menos ainda as que trabalham com tecnologia, um meio impregnado de estereótipos que nos fazem duvidar de nós mesmas o tempo todo”, afirma.
Problema não acontece só com mulheres 
Renata Prado alerta, porém, para não considerar a síndrome do impostor uma questão exclusivamente feminina ou mais prevalente em mulheres. Parte da confusão pode ser explicada pelas primeiras descrições do fenômeno.
"Os primeiros estudos foram realizados com mulheres e, por muito tempo, buscou-se entender os fatores responsáveis pela síndrome do impostor nelas, como internalizações de estereótipos de gênero. Mas hoje sabe-se que ocorre em ambos, igualmente", explica. 
"As mulheres estão cada vez mais assumindo cargos elevados em empresas e os homens começam a se deparar com emoções que talvez nunca antes tinham pensado e sentido. Com o passar do tempo, acredito que esta síndrome atingirá o mesmo numero de pessoas, sem distinção de gênero", afirma o mestre em Psicologia pela PUC-RS, Fernando Elias José.
A própria autora do estudo de 1978, Pauline Clance, revisou-o em 1993, concordando que é incorreto entender a síndrome do impostor como uma questão unicamente feminina.
Clance até mesmo questiona o uso do termo "síndrome" para se referir ao problema. De fato, a problemática descrita não cabe na definição psicológica clínica de "síndrome". No artigo original, Clance usou a expressão "fenômeno do impostor", mas caso pudesse voltar no tempo, utilizaria ainda outra palavra. 
"Se pudesse fazer tudo de novo, chamaria de "experiência do impostor", porque não se trata de uma síndrome, complexo ou doença mental, é algo que quase todo mundo experiencia", afirmou em entrevista para o livro Presence, da também psicóloga Amy Cuddy. 
No entanto, o fato de as mulheres de forma geral ainda receberem menos oportunidades ao longo da carreira e vivenciarem mais intensamente os estereótipos de gênero a fim de chegar aos cargos de maior prestígio ajudam a explicar essa associação. 
Outra alternativa oferecida por Cuddy é que homens são menos propensos a confessar aos amigos ou desabafar nas redes sociais quando sentem-se uma fraude. Para Clance, existe uma pressão cultural para os homens não compartilharem seus medos e inseguranças. 
Além disso, Renata Paparelli, doutora em Psicologia Social pela USP e docente na área de saúde mental relacionada ao trabalho na PUC-SP, acrescenta que as situações descritas na síndrome do impostor, quando retiradas da esfera do indivíduo e levadas para um contexto mais amplo do mundo do trabalho, podem ser identificadas como outra questão, mais coletiva, chamada de “neurose de excelência”.
O fenômeno, explica, é criado pelas novas formas de organização do trabalho, que se afastam da lógica taylorista/fordista de uma hierarquia rígida e de uma clara separação entre trabalhadores e patrões para misturar-se com a chamada “gestão flexível”.
Nela, a figura do chefe é simbolicamente substituída por uma meta e, o trabalhador, é convocado a agir de modo “excelente”, o que muitas vezes pode significar horas extras ou levar o trabalho para casa. “Essa gestão e seleção por competências acabam se tornando uma seleção de pessoas que são de um determinado jeito, que ‘vestem’ a camisa da empresa. Só que nem todos são assim. Nesse sentido, muitos trabalhadores sequestrados por essa lógica organizacional ficarão o dia todo pensando em como podem melhorar, sentindo-se menos do que são”, explica.
Ela ressalta, porém, que no, caso das mulheres, essa questão torna-se ainda mais grave. “Se hoje é exigido do homem que seja um atleta de alto desempenho na empresa, no caso da mulher isso é ainda mais forte. E como ela é desqualificada constantemente no processo de divisão de gênero no trabalho, essa neurose incide de maneira diferente nos dois gêneros, com as mulheres sentindo isso de forma mais clara”, afirma.
Como deixar de se sentir uma fraude 
E o que fazer para parar de sofrer com o fenômeno do impostor?  
O livro "Clube da Luta Feminista", de Jessica Bennett, dá algumas dicas práticas para mitigar os efeitos nocivos de se sentir uma fraude: trocar experiências com amigos e amigas, procurar não dar ouvidos para a "vozinha negativa interior" e preparar-se mais como forma de prevenir qualquer possível insegurança. 
Beatriz reconhece que o sentimento de falta de merecimento pode tê-la boicotado algumas vezes, principalmente ao descaracterizar ou minimizar os elogios recebidos. Para contornar a insegurança, a psicóloga criou um método: passou a reunir em uma pasta - hoje virtual - os elogios de clientes, chefes, subordinados e pares. É a esse material que ela recorre quando precisa relembrar seu próprio valor.
O sentimento de inadequação e falta de merecimento fez com que Regina deixasse de se posicionar como gostaria, especialmente em ambientes dominados por homens. A ex-executiva buscou ajuda profissional e aprendeu a olhar de forma positiva para os próprios resultados. “A partir daí, tive noção de que podia driblar esse tipo de situação. Tornei o resultado do meu trabalho incontestável. Foquei nas tarefas e nas demandas que tinha, sem me importar com o entorno”.
No caso de Catalina, a sensação de não estar no lugar certo nunca a impediu de avançar nos seus projetos. Ela acredita que valorizar o próprio trabalho e reconhecer seus méritos é um dos caminhos para driblar a síndrome da impostora, e não atribuir o sucesso à “pura sorte”.
“Se comparamos objetivamente nossas competências e êxitos com os dos homens que possuem os mesmos cargos, é mais fácil nos darmos conta do quanto somos qualificadas e merecemos o mesmo sucesso. É um exercício diário”, finaliza.
Fonte: Carta Capital