quarta-feira, 31 de julho de 2013

Aonde está Amarildo?

Desaparecimento do pedreiro Amarildo mobiliza comunidade da Rocinha

30/7/2013 13:12
Por Anne Vigna, com agência Pública - do Rio de Janeiro


O caso está sendo investigado pelo delegado Orlando Zaccone, da 15ª DP (Gávea), ainda sem conclusão
O caso está sendo investigado pelo delegado Orlando Zaccone, da 15ª DP (Gávea), ainda sem conclusão
Não é preciso passar muito tempo junto à família de Amarildo para entender que a UPP da Rocinha se envolveu em um problema bem grande. Amarildo não é uma pessoa que poderia desaparecer sem que sua família perguntasse por ele, não é o pai de quem os filhos esqueceriam facilmente, não é o sobrinho, tio, primo, irmão, marido por quem ninguém perguntaria: onde está Amarildo?
Neste pedaço bem pobre da Rocinha, onde nasceu, cresceu, viveu e desapareceu Amarildo, “muitos são de nossa família”, diz Arildo, seu irmão mais velho, apontando os quatro lados da casa. Em uma caminhada pela comunidade na companhia de um sobrinho de Amarildo, a repórter da Pública conheceu algumas primas, depois umas sobrinhas, tomou um café com as tias lá em cima, de onde desceu acompanhada de irmãos e filhos de Amarildo. De todos ouviu a descrição de Amarildo como “um cara do bem” que, por desgraça, tornou-se famoso – e não por sua característica mais marcante, o bom coração.
As casas são ligadas por escadas antigas, feitas possivelmente por seus avós que vieram da zona rural de Petrópolis para o Rio com os três filhos ainda bem pequenos. “A Rocinha nessa época ainda era mato e poucas casas de madeira, uns barracos como se diz, e nada mais”, diz Eunice, irmã mais velha de Amarildo.
A curiosidade da repórter sobre o passado da família é o suficente par que ela pegue o telefone, para ligar para uma tia avó, “a única que pode saber alguma coisa sobre a história é ela”, diz. A tia-avó, que também vive na Rocinha, confirma por telefone o que Eunice já sabia: a “tataravó era escrava, possivelmente em uma fazenda de Petrópolis, mas não se sabe mais do que isso”.
Eunice diz ter retomado as origens familiares ao fazer de sua casa um centro de Umbanda. É aqui, na parte debaixo da casa, a mais silenciosa, que ela recebe as pessoas que querem saber de seu irmão. “Temos a mesma mãe, mas nosso pai não é o mesmo. Minha mãe gostava de variar”, comenta, rindo.
Ali, na casa construída por ela, moram pelo menos 10 pessoas, entre crianças e adultos. Na cozinha, as panelas são grandes como numerosas são as bocas. No primeiro quarto, três mulheres comem sentadas na cama. Em outro quarto, duas sobrinhas estão em frente ao computador, trabalhando na página do Facebook feita para Amarildo, seguindo os cartazes virtuais de “onde está Amarildo?” que vêm de várias partes do país.
Entre onze irmãos
A mãe de Amarildo teve 12 filhos e trabalhou muito tempo como empregada doméstica na casa de uma atriz famosa do bairro do Leblon. “Essa atriz quis adotar um de nós mas a minha mãe nunca quis”, lembra o irmão Arildo, 3 anos mais velho do que ele. Sobre o pai de ambos, não se sabe onde nasceu, apenas que era pescador, com barco na Praça XV, no centro do Rio, onde conheceu a sua esposa. Os netos não se lembram como nem quando, mas ele se acidentou em um naufrágio e acabou morrendo em consequência de um ferimento na perna. Amarildo tinha um ano e meio. Mas, adulto, Amarildo, tinha paixão pela pesca. “Era a única coisa que ele fazia na vida, quando não estava trabalhando ou nos ajudando: ia pescar sozinho ou com um primo nas rochas de Sao Conrado. Voltava com muitos peixes”, conta orgulhoso, Anderson, o mais velho dos seus seis filhos.
As varas de pescar de bambu, que ele mesmo fazia, estão encostadas em casa desde o dia 14 de julho, um domingo, quando os policias da Unidade de Polícia Pacificadora da Rocinha o levaram “para verificação”. Ele tinha acabado de limpar os peixes trazidos do mar e Bete, apelido de Elizabete, sua esposa há mais de 20 años, esperou que ele voltasse da UPP para fritar os peixes “como tantos domingos”, ela conta, o olhar perdido. Foram 20 anos de união, seis filhos, a vida dividida em um único cômodo que servia de dormitório, cozinha e sala.
Semanas após o desaparecimento do marido, Bete se esforça para conseguir contar como conheceu o “meu homem”, ela diz, evocando a lembrança do jovem que se sentou ao lado dela em um banco em Ipanema: “Eu não saía muito desde que cheguei de Natal (Rio Grande do Norte) para trabalhar como empregada em uma família. No domingo, ia caminhar um pouco no bairro. Ele veio conversar comigo, nos conhecemos, e ele me trouxe para a casa de sua mãe aqui na Rocinha. Nunca mais saí”, conta.
Bete trouxe os dois filhos que vieram com ela do Nordeste sem criar problema com Amarildo. “Ele adora crianças”, ela diz. O que as duas menorzinhas da família confirmam: “É o tio Amarildo que nos leva para a praia de de Sao Conrado, ele que nos ensinou a nadar”. Ela apenas sorri, sempre fumando, e sem disfarçar a tristeza conta que está preocupada com a filha mais nova, de 5 anos. “Ela sempre estava com o pai”, suspira. No começo, Bete lhe disse que o pai tinha ido viajar e que, por hora, ele não voltaria. A pequena conserva a esperança de filha que sempre acreditou nas palavras do pai, e ele lhe prometeu um bolo grande no próximo aniversário.
“Era um menino e pulou no fogo”
Aos 11 anos, Amarildo se tornou o heroi da comunidade ao se meter em um barraco em chamas para salvar o sobrinho de 4 anos. “Era um menino, e pulou no fogo. Me salvou e também tentou salvar a minha irmã, que tinha 8 anos. Não conseguiu tirá-la de lá, ela morreu, e eu fiquei meses no hospital”, lembra Robinho, hoje com 34 anos, a pele marcada pelas cicatrizes desta noite de incêndio.
Aqui, Amarildo é conhecido por todos como “Boi”, por ser um homem forte que carregava as pessoas que precisavam de socorro para descer as escadas e chegar com urgência a um hospital. “Uns dias antes de desaparecer, ele carregou no colo uma vizinha, e a salvou. É uma ótima pessoa, sempre ajudava os outros – numa emergência ou numa mudança”, conta a cunhada Simone, sem conter as lágrimas. “Eu tenho muita saudade dele, principalmente do seu sorriso. Meu marido não fala nada, mas eu o conheço, está com muita raiva. Na primeira noite, ficou debruçado na janela a noite toda, esperando o irmão voltar”, diz, emocionada.
Toda a família está com raiva. E dessa vez ninguém quer ficar quieto, mesmo sabendo dos riscos da denúncia. Vários familiares foram ameaçados por policiais. “Por que foram atrás dele? Estamos voltando à ditadura?”, pergunta a prima, Michelle. “Ele trabalhou toda a vida, quando não trabalhava, nos ajudava, ou ia pescar para a sua família. Ninca se meteu com ninguém”, comenta, revoltada.
Boi era pedreiro havia 30 anos e ganhava meio salário mínimo por mês. “Por isso, às vezes carregava sacos de areia aos sábados para ganhar um pouco mais”, comenta Anderson, mostrando os tijolos que o pai comprou com o dinheiro extra para fazer um puxadinho no segundo andar na casa: “Na verdade, ele ia ter que voltar a fazer a fundação aqui de casa porque está caindo, eu e meu irmão íamos ajudar”, detalha.
- Ele era meu pai, irmão, amigo, era tudo para mim – diz, escondendo as lágrimas quando chega a irmã mais nova, de 13 anos.
Os familiares vivem em suspense, à espera das notícias que não chegam. Não desistem: organizam-se como podem com vizinhos, amigos e outras vítimas da polícia. Negaram uma oferta do governo do Estado do Rio de Janeiropara entrar no programa de proteção à testemunha. Preferiram continuar na Rocinha, sua comunidade. Na próxima quinta-feira, dia 1 de agosto, farão mais uma manifestação na Rocinha, onde estarão presentes familiares de outros desaparecidos por obra de outros policiais em outras favelas. “Temos que lutar para que essa impunidade não continue. Queremos justiça por Amarildo e para todos nós que convivemos agora com essa polícia”, revolta-se a sobrinha Erika.
Aos 43 anos, Amarildo desapareceu sem que a família tenha direito sequer a uma explicação oficial, como tantos outros de tantas favelas brasileiras vítimas de violência policial. Mas dessa vez, ninguém vai se calar. Onde está Amarildo?
Como levaram Amarildo
A Operação Paz Armada, que mobilizou 300 policiais, entrou na Rocinha nos dias 13 e 14 de julho para prender suspeitos sem passagem pela polícia depois de um arrastão ocorrido nas proximidades da favela. Segundo a polícia, 30 pessoas foram presas, entre elas Amarildo. Segundo uma testemunha contou à reporter Elenilce Bottari, do Globo, ele foi levado por volta das 20 horas do dia 14, portando todos os seus documentos: “Ele estava na porta da birosca, já indo para casa, quando os policiais chegaram. O Cara de Macaco (como é conhecido um dos policiais da UPP) meteu a mão no bolso dele.
Ele reclamou e mostrou os documentos. O policial fingiu que ia checar pelo rádio, mas quase que imediatamente se virou para ele e disse que o Boi tinha que ir com eles”, disse a testemunha.
Assim que soube, Bete foi à base da UPP no Parque Ecológico e chegou a ver o marido lá dentro. “Ele me olhou e disse que o policial estava com os documentos dele. Então eles disseram que já, já ele retornaria para casa e que não era para a gente esperar lá. Fomos para casa e esperamos a noite inteira. Depois, meu filho procurou o comandante, que disse que Amarildo já tinha sido liberado, mas que não dava para ver nas imagens das câmeras da UPP porque tinha ocorrido uma pane. Eles acham que pobre também é burro”, contou Bete ao Globo.
O caso está sendo investigado pelo delegado Orlando Zaccone, da 15ª DP (Gávea), ainda sem conclusão.




Extraído do Correio do Brasil

Enecom PI 2013

O que preocupa os jovens comunicadores

30/7/2013 14:36
Por Venício A. de Lima - de Minas Gerais


A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um megaevento organizado periodicamente pela igreja católica em diferentes países
A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um megaevento organizado periodicamente pela igreja católica em diferentes países
A Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um megaevento organizado periodicamente pela igreja católica em diferentes países. Mobiliza milhares de jovens e tem orçamento de muitos milhões de reais. Multidões, debaixo de chuva e frio, acompanharam a peregrinação do novo papa Francisco entre 23 a 28 de julho na JMJ do Rio de Janeiro.
A JMJ constitui o que se denomina media events, isto é, “parte espetáculos, parte festivais, parte textos, parte performances” em simbiose com uma maciça cobertura midiática e a consequente confirmação ritual de poderes estabelecidos, sendo exemplos clássicos as coroações, casamentos e funerais de monarcas ou líderes religiosos.
Enquanto a JMJ saturava a cobertura da grande mídia, cerca de seiscentos estudantes de jornalismo, publicidade, relações públicas e cinema, da maioria das unidades da federação e com idade entre 19 e 23 anos, enfrentavam a situação oposta: uma temperatura média acima de 30 graus centígrados e alojamentos improvisados em salas de aula para discutir “A qualidade de formação do comunicador social”, tema geral do 34º Encontro Nacional dos Estudantes de Comunicação Social, Enecom PI 2013, que ocorreu de 20 a 27 de julho, no campus da distante Universidade Federal do Piauí, em Teresina.
Aparentemente, nem mesmo a mídia local ofereceu cobertura ao Enecom – que não foi considerado “notícia” merecedora de inclusão na pauta. O evento, todavia, estava nas redes sociais e tinha seu próprio blog. Além disso, mantinha a tradição de ser “feito por e para estudantes, desde seu projeto político à busca estrutural e financeira de como realizá-lo”. Vale dizer, com o mínimo possível de recursos financeiros e a total dedicação de seus organizadores.
Debate organizado
Participei do Enecom PI 2013, como convidado de uma mesa sobre “Democratização da Comunicação”, um dos quatro painéis realizados no evento.
Chamou minha atenção a “metodologia” utilizada. O painel é dividido em “perfis” a serem apresentados por diferentes expositores, não necessariamente professores. Sobre a “Democratização da Comunicação” foram quatro perfis: 1. Por que a democratização da comunicação tem tudo a ver com você?; 2. Novas leis para um novo tempo: marcos regulatórios pelo mundo; 3. Construindo outras vozes; e 4. Das redes às ruas: a internet e a mobilização social da juventude.
Feitas as exposições, os presentes (excluídos os expositores) se reúnem em suas respectivas “brigadas” (nas quais já estão agrupados todos os participantes do encontro) e debatem os temas levantados pelos expositores, ou não. Depois de 30 minutos, um ou mais representante de cada brigada coloca seus comentários para todos. Retorna-se, então, aos expositores (panelistas) para uma rodada final de observações.
Políticas públicas
Após as canônicas exposições iniciais dos convidados, a novidade foi que o debate nas brigadas revelou uma animadora autonomia não só frente às exposições, mas também “pés no chão” em relação à realidade brasileira do setor. Alguns pontos:
1. Diagnósticos e críticas não interessam mais. Precisamos discutir alternativas.
Como viabilizar a construção de alternativas locais de jornais populares? Quem teria mais credibilidade nos assuntos de interesse local, o Jornal Nacional da Globo ou um jornal produzido na comunidade? Quem os financiará? Quais parcerias coletivas são possíveis para viabilizar, por exemplo, a contratação “por serviço”, do maquinário ocioso de grandes jornais ou de gráficas?
2. A internet é importante, mas a maioria dos brasileiros ainda não tem acesso a ela. A banda larga é cara e de má qualidade. Precisamos criar alternativas complementares à internet.
A importância das rádios comunitárias é amplamente reconhecida. É necessário priorizar uma nova legislação que impeça a criminalização e o fechamento de rádios já existentes e amplie o seu alcance.
3. Não basta ser um canal de televisão público ou educativo para uma emissora se constituir em alternativa à mídia comercial dominante.
É preciso exigir dos órgãos fiscalizadores (Ministério das Comunicações) o cumprimento das obrigações dos canais não comerciais e transformá-los em espaços de veiculação de programação alternativa de qualidade.
4. A explicação midiática “pós-moderna” da total fragmentação de interesses e objetivos das manifestações de jovens não deve ser aceita sem discussão.
Por detrás da aparente fragmentação existem insatisfações comuns como, por exemplo, uma demanda por participação na construção de políticas públicas. Surge aqui a necessidade de se instalarem os conselhos de comunicação como espaço de interferência na destinação de recursos públicos nos planos estaduais de comunicação.
Com “os pés no chão”
O indispensável diálogo com os jovens é muitas vezes surpreendente. Os observadores de gabinete, analisamos movimentos de jovens sem conhecer o que de fato pensam esses sujeitos coletivos.
Mesmo levando-se em conta que boa parte de participantes dos Enecoms são jovens diferenciados porque envolvidos em militância estudantil, é gratificante observar que eles não estão – como em geral se acredita – “deslumbrados” com os falaciosos superpoderes das redes sociais virtuais. Na verdade, estão com “os pés no chão” e preocupados em encontrar formas factíveis de exercício profissional em suas respectivas áreas de formação, sem abrir mão de interferir politicamente nas transformações do país.
Ignorados pela grande mídia, no calor estorricado do Piauí, jovens futuros comunicadores sociais brasileiros “fazem” mais um Enecom e mostram saber muito bem o que querem.
Estão no caminho certo.
Venício A. de Lima é jornalista e sociólogo, professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado), pesquisador do Centro de Estudos Republicanos Brasileiros (Cerbras) da UFMG e autor de Política de Comunicações: um Balanço dos Governos Lula (2003-2010), Editora Publisher Brasil, 2012, entre outros livros.

Extraído do Correio do Brasil

terça-feira, 23 de julho de 2013

Denúncia referente ao JAMPA DIGITAL

Clique:

http://www.youtube.com/watch?v=n-spleIaYsQ

CGU confirma fraude e superfaturamento no JAMPA DIGITAL

CGU confirma fraude no Jampa Digital e atesta superfaturamento de R$ 2,7 milhões



Documento contém 124 paginas e foi usado como base para relatória da PF


Parte do relatório que mostra o sobrepreço nos contrato entre a Ideia Digital e a PMJP (Crédito: WSCOM)
A reportagem do Portal WSCOM teve acesso ao relatório da Controladoria Geral da União do caso Jampa Digital e após minuciosa analise detectou que a pericia realizada em todo material apreendido pela Polícia Federal durante operação desencadeada em João Pessoa e na Bahia confirmou que houve fraude no processo. De acordo com o relatório e após examinar notas fiscais, anotações, agendas, emails e outros documentos, a CGU confirma que houve fraude do projeto Jampa Digital o que ocasionou um dano ao erário público de R$ 2.712.628, 76 (dois milhões, setecentos e doze mil, seiscentos e vinte e oito reais e setenta e seis centavos).
Ainda segundo o relatório (Vê relatório completo anexo na matéria), o prejuízo aos cofres públicos se deu pela falta de pregão eletrônico para a compra dos equipamentos utilizados no Jampa Digital e no superfaturamento na venda destes equipamentos feita pela Ideia Digital a Prefeitura de João Pessoa.

Relatório da CGU sobre o caso Jampa Digital (Crédito: WSCOM)
De acordo com levantamento feito pela CGU, tudo mediante os documentos apreendidos, os contratos entre a Ideia Digital e a Prefeitura de João Pessoa, a época comandada pelo atual governador Ricardo Coutinho, foram superfaturados em até 364%.
Para se ter uma ideia, os equipamentos comprados pela Ideia Digital junto aos seus fornecedores pelo valor de R$ 863.416, 81, foram vendidos a prefeitura por R$ 2.702.668, 00, ou seja, com um sobrepreço de 213%. Noutro contrato o superfaturamento foi de 245%, já que a Ideia comprou os equipamentos por R$ 525.977, 66 e vendeu a Prefeitura da Capital por R$ 1.816. 065, 00.

Relatório da CGU sobre o caso Jampa Digital usado pela Polícia Federal (Crédito: WSCOM)
Ainda segundo o relatório da CGU, o projeto do Jampa Digital, que consta do portal de convênios do Governo Federal, tem como autores funcionários da Ideia Digital, que mais tarde venceria a licitação para implantar o projeto.
O relatório diz ainda que foram apreendidos na sede da empresa Ideia Digital, em Salvador, documentos oficiais da Prefeitura de João Pessoa sem assinaturas. “O que indica que a empresa Ideia Digital possuía um amplo acesso a documentos junto a PMJP”, diz o documento.

 
Marcos Wéric
WSCOM Online

Morreram mas deixaram saudades imorredouras

Clique:


http://br.esporteinterativo.yahoo.com/noticias/morre-djalma-santos--um-dos-maiores-laterais-da-hist%C3%B3ria-do-nosso-pa%C3%ADs-002227440.html



http://br.omg.yahoo.com/blogs/notas-omg/morre-o-cantor-e-compositor-pernambucano-dominguinhos-225854491.html

Textos recomendados

No portal www.wscom.com.br   há dois pequenos, porém profundos, textos de Rui Leitão com os seguintes títulos:

"DEU COM OS BURROS NÁGUA"    E   "O REI ESTÁ NU"

domingo, 21 de julho de 2013

Leitura indispensável


Mercosul, a nova Alca e a China

 

por Samuel Pinheiro Guimarães [*]

Resistir – Portugal

18/07/2013

 

1.     Todo o noticiário sobre Mercosul, Aliança do Pacífico, Parceria Transpacífica e China tem a ver com um embate ideológico entre duas concepções de política de desenvolvimento econômico e social.



2. A primeira dessas concepções afirma que o principal obstáculo ao crescimento e ao desenvolvimento é a ação do Estado na economia.



3. A ação direta do Estado na economia, através de empresas estatais, como a Petrobrás, ou indireta, através de políticas tributárias e creditícias para estimular empresas consideradas estratégicas, como a ação de financiamento do BNDES, distorceria as forças de mercado e prejudicaria a alocação eficiente de recursos.



4. Nesta visão privatista e individualista, uma política de eliminação dos obstáculos ao comércio e à circulação de capitais; de não discriminação entre empresas nacionais e estrangeiras; de eliminação de reservas de mercado; de mínima regulamentação da atividade empresarial, inclusive financeira; e de privatização de empresas estatais conduziria a uma eficiente divisão internacional do trabalho em que todas as sociedades participariam de forma equânime e atingiriam os mais elevados níveis de crescimento e desenvolvimento.



5. Esta visão da economia se fundamenta em premissas equivocadas. Primeiro, de que todos os Estados partem de um mesmo nível de desenvolvimento, de que não há Estados mais e menos desenvolvidos. Segundo, de que as empresas são todas iguais ou pelo menos muito semelhantes em dimensão de produção, de capacidade financeira e tecnológica e de que não são capazes de influir sobre os preços. Terceiro, de que há plena liberdade de movimento da mão-de-obra entre os Estados. Quarto, de que há pleno acesso à tecnologia que pode ser adquirida livremente no mercado. Quinto, de que todos os Estados, inclusive aqueles mais desenvolvidos, seguem hoje e teriam seguido no passado esse tipo de políticas.



6. Como é óbvio, estas premissas não correspondem nem à realidade da economia mundial, que é muito, muito mais complexa, nem ao desenvolvimento histórico do capitalismo.



7. Historicamente, as nações hoje altamente desenvolvidas utilizaram uma gama de instrumentos de política econômica que permitiram o fortalecimento de suas empresas, de suas economias e de seus Estados nacionais. Isto ocorreu mesmo na Inglaterra, que foi a nação líder do desenvolvimento capitalista industrial, com a Lei de Navegação, que obrigava o transporte em navios ingleses de todo o seu comércio de importação e exportação; com a política de restrição às exportações de lã em bruto e às importações de tecidos de lã; com as restrições à exportação de máquinas e à imigração de "técnicos".



8. Políticas semelhantes utilizaram a França, a Alemanha, os Estados Unidos e o Japão. Países que não o fizeram naquela época, tais como Portugal e Espanha, não se desenvolveram industrialmente e, portanto, não se desenvolveram.



9. Se assim foi historicamente, a realidade da economia atual é a de mercados financeiros e industriais oligopolizados em nível global por megaempresas multinacionais, cujas sedes se encontram nos países altamente desenvolvidos. A lista das maiores empresas do mundo, publicada pela revista Forbes, apresenta dados sobre essas empresas cujo faturamento é superior ao PIB de muitos países. Das 500 maiores empresas, 400 se encontram operando na China. Os países altamente desenvolvidos protegem da competição estrangeira setores de sua economia como a agricultura e outros de alta tecnologia. Através de seus gigantescos orçamentos de defesa, todos, inclusive a Alemanha e o Japão, que não poderiam legalmente ter forças armadas, subsidiam as suas empresas e estimulam o desenvolvimento cientifico e tecnológico. Com os programas do tipo "Buy American" e outros semelhantes, privilegiam as empresas nacionais de seus países; através da legislação e de acordos cada vez mais restritivos de proteção à propriedade intelectual, dificultam e até impedem a difusão do conhecimento tecnológico. Através de agressivas políticas de "abertura de mercados" obtém acesso aos recursos naturais (petróleo, minérios etc) e aos mercados dos países periféricos, em troca de uma falsa reciprocidade, e conseguem garantir para suas megaempresas um tratamento privilegiado em relação às empresas locais, inclusive no campo jurídico, com os acordos de proteção e promoção de investimentos, pelos quais obtém a extraterritorialidade. Como é sabido, protegem seus mercados de trabalho através de todo tipo de restrição à imigração, favorecendo, porém, a de pessoal altamente qualificado, atraindo cientistas e engenheiros, colhendo as melhores "flores" dos jardins periféricos.



10. A segunda concepção de desenvolvimento econômico e social afirma que, dada a realidade da economia mundial e de sua dinâmica, e a realidade das economias subdesenvolvidas, é essencial a ação do Estado para superar os três desafios que tem de enfrentar os países periféricos, ex-colônias, algumas mais outras menos recentes, mas todas vítimas da exploração colonial direta ou indireta. Esses desafios são a redução das disparidades sociais, a eliminação das vulnerabilidades externas e o pleno desenvolvimento de seu potencial de recursos naturais, de sua mão de obra e de seu capital.



11. As extremas disparidades sociais, as graves vulnerabilidades externas, o potencial não desenvolvido caracterizam o Brasil, mas também todas as economias sulamericanas. A superação desses desafios não poderá ocorrer sem a ação do Estado, pela simples aplicação ingênua dos princípios do neoliberalismo, de liberdade absoluta para as empresas as quais, aliás, levaram o mundo à maior crise econômica e social de sua História: a crise de 2007. E agora, Estados europeus, pela política de austeridade (naturalmente, não para os bancos) que ressuscita o neoliberalismo, atacam vigorosamente a legislação social, propagam o desemprego e agravam as disparidades de renda e de riqueza. Mas isto é tema para outro artigo.



12. Assim, neste embate entre duas visões, concepções, de política econômica, a aplicação da primeira política, a do neoliberalismo, levou à ampliação da diferença de renda entre os países da América do Sul e os países altamente desenvolvidos nos últimos vinte anos até a crise de 2007. Por outro lado, é a aplicação de políticas econômicas semelhantes, que preveem explicitamente a ação do Estado, que permitiu à China crescer à taxa média de 10% a/a desde 1979 e que farão que a China venha a ultrapassar os EUA até 2020. Ainda assim, há aqueles que na periferia não querem ver, por interesse ou ideologia, a verdadeira natureza da economia internacional e a necessidade da ação do Estado para promover o desenvolvimento. Nesta economia internacional real, e não mitológica, é preciso considerar a ação da maior Potência.



13. A política econômica externa dos Estados Unidos, a partir do momento em que o país se tornou a principal potência industrial do mundo no final do século XIX e em especial a partir de 1945, com a vitória na Segunda Guerra Mundial, e confiante na enorme superioridade de suas empresas, tem tido como principal objetivo liberalizar o comércio internacional de bens e promover a livre circulação de capitais, de investimento ou financeiro, através de acordos multilaterais como o GATT, mais tarde OMC, e o FMI; de acordos regionais, como era a proposta da ALCA e de acordos bilaterais, como são os tratados de livre comércio com a Colômbia, o Chile, o Peru, a América Central e com outros países como a Coréia do Sul. E agora as negociações, altamente reservadas, da chamada Trans-Pacific Partnership - TPP, a Parceria Transpacífica, iniciativa americana extremamente ambiciosa, que envolve a Austrália, Brunei, Chile, Malásia, Nova Zelândia, Peru, Singapura, Vietnã, e eventualmente Canadá, México e Japão, e que, nas palavras de Bernard Gordon, Professor Emérito de Ciência Política, da Universidade de New Hampshire, "adicionaria milhares de milhões de dólares à economia americana e consolidaria o compromisso político, financeiro e militar dos Estados Unidos no Pacifico por décadas". O compromisso, a presença, a influência dos Estados Unidos no Pacifico isto é, na Ásia, no contexto de sua disputa com a China. A TPP merece um artigo à parte.



14. Através daqueles acordos bilaterais, procuram os EUA consagrar juridicamente a abertura de mercados e obter o compromisso dos países de não utilizar políticas de desenvolvimento industrial e de proteção do capital nacional. Não desejam os Estados Unidos ver o desenvolvimento de economias nacionais, com fortes empresas, capazes de competir com as megaempresas americanas, por razões óbvias, entre elas a consequente redução das remessas de lucros das regiões periféricas para a economia americana. Os lucros no exterior são cerca de 20% do total anual dos lucros das empresas americanas!



15. Nas Américas, a política econômica dos Estados Unidos teve sempre como objetivo a formação de uma área continental integrada à economia americana e liderada pelos Estados Unidos que, inclusive, contribuísse para o alinhamento político de cada Estado da região com a política externa americana em seus eventuais embates com outros centros de poder, como a União Européia, a Rússia e hoje a China.



16. Assim, já no século XIX, em 1889, no mesmo ano em que Deodoro da Fonseca proclamou a República, na Conferência Internacional Americana, em Washington, os Estados Unidos propuseram a criação de uma união aduaneira continental. Esta proposta, que recebeu acolhida favorável do Brasil, no entusiasmo pan-americano da recém-nascida república, foi rejeitada pela Argentina e outros países.



17. Com a I Guerra Mundial, a Grande Depressão, a ascensão do nazismo e a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos procuraram estreitar seus laços econômicos com a América Latina, aproveitando, inclusive, a derrota alemã e o retraimento francês e inglês, influências históricas tradicionais.



18. Em 1948, na IX Conferência Internacional Americana, em Bogotá, propuseram novamente a negociação de uma área de livre comércio nas Américas; mais tarde, em 1988, negociaram o acordo de livre comércio com o Canadá, que seria transformado em Nafta com a inclusão do México, em 1994; e propuseram a negociação de uma Área de Livre Comércio das Américas, a ALCA, em 1994.



19. A negociação da ALCA fracassou em parte pela oposição do Brasil e da Argentina, a partir da eleição de Lula, em 2002 e de Kirchner, em 2003 e, em parte, devido à recusa americana de negociar os temas de agricultura e de defesa comercial, o que permitiu enviar os temas de propriedade intelectual, compras governamentais e investimentos para a esfera da OMC, o que esvaziou as negociações.

20. O objetivo estratégico americano, todavia, passou a ser executado, agora com redobrada ênfase, através da negociação de tratados bilaterais de livre comércio, que concluíram com o Chile, a Colômbia, o Peru, a América Central e República Dominicana, só não conseguindo o mesmo com o Equador e a Venezuela devido à eleição de Rafael Correa e de Hugo Chávez e à resistência do Mercosul às investidas feitas junto ao Uruguai.

21. Assim, a estratégia americana tem tido como resultado, senão como objetivo expresso, impedir a integração da América do Sul e desintegrar o Mercosul através da negociação de acordos bilaterais, incorporando Estado por Estado na área econômica americana, sem barreiras às exportações e capitais americanos e com a consolidação legal de políticas econômicas internas, em cada país, nas áreas de propriedade intelectual, compras governamentais, defesa comercial, investimentos, em geral com dispositivos chamados de OMC – Plus, mais favoráveis aos Estados Unidos do que aqueles que conseguiram incluir na OMC, que, sob o manto de ilusória reciprocidade, beneficiam as megaempresas americanas, em especial neste momento de crise e de início da competição sino-americana na América Latina.



22. Na execução deste objetivo, de alinhar econômica, e por consequência politicamente, toda a América Latina sob a sua bandeira contam com o auxílio dos grupos internos de interesse em cada país que, tendo apoiado a ALCA no passado, agora apoiam a negociação de acordos bilaterais ou a aproximação com associações de países, tais como a Aliança do Pacífico, que reúne países sul-americanos e mais o México, que celebraram acordos de livre comércio com os EUA.



23. Hoje, o embate político, econômico e ideológico na América do Sul se trava entre os Estados Unidos da América, a maior potência econômica, política, militar, tecnológica, cultural e de mídia do mundo; a crescente presença chinesa, com suas investidas para garantir acesso a recursos naturais, ao suprimento de alimentos e de suas exportações de manufaturas e que, para isto, procuram seduzir os países da América do Sul e em especial do Mercosul com propostas de acordos de livre comércio; e as políticas dos países do Mercosul, Argentina, Brasil, Venezuela, Uruguai e Paraguai que ainda entretém aspirações de desenvolvimento soberano, pretendem atingir níveis de desenvolvimento social elevado e que sabem que, para alcançar estes objetivos, a ação do Estado, i.e. da coletividade organizada, é essencial, é indispensável.

 

 

Estados Unidos, Venezuela e Paraguai

— 26 notas para compreender a batalha actual

por Samuel Pinheiro Guimarães [*]

1.     Não há como entender as peripécias da política sul-americana sem levar em conta a política dos Estados Unidos para a América do Sul. Os Estados Unidos ainda são o principal ator político na América do Sul e pela descrição de seus objetivos devemos começar.



2. Na América do Sul, o objetivo estratégico central dos Estados Unidos, que apesar do seu enfraquecimento continuam sendo a maior potência política, militar, econômica e cultural do mundo, é incorporar todos os países da região à sua economia. Esta incorporação econômica leva, necessariamente, a um alinhamento político dos países mais fracos com os Estados Unidos nas negociações e nas crises internacionais.



3. O instrumento tático norte-americano para atingir este objetivo consiste em promover a adoção legal pelos países da América do Sul de normas de liberalização a mais ampla do comércio, das finanças e investimentos, dos serviços e de "proteção" à propriedade intelectual através da negociação de acordos em nível regional e bilateral.



4. Este é um objetivo estratégico histórico e permanente. Uma de suas primeiras manifestações ocorreu em 1889 na I Conferência Internacional Americana, que se realizou em Washington, quando os EUA, já então a primeira potência industrial do mundo, propuseram a negociação de um acordo de livre comércio nas Américas e a adoção, por todos os países da região, de uma mesma moeda, o dólar.


5. Outros momentos desta estratégia foram o acordo de livre comércio EUA-Canadá; o NAFTA (Área de Livre Comércio da América do Norte, incluindo além do Canadá, o México); a proposta de criação de uma Área de Livre Comércio das Américas – ALCA e, finalmente, os acordos bilaterais com o Chile, Peru, Colômbia e com os países da América Central.



6. Neste contexto hemisférico, o principal objetivo norte-americano é incorporar o Brasil e a Argentina, que são as duas principais economias industriais da América do Sul, a este grande "conjunto" de áreas de livre comércio bilaterais, onde as regras relativas ao movimento de capitais, aos investimentos estrangeiros, aos serviços, às compras governamentais, à propriedade intelectual, à defesa comercial, às relações entre investidores estrangeiros e Estados seriam não somente as mesmas como permitiriam a plena liberdade de ação para as megaempresas multinacionais e reduziria ao mínimo a capacidade dos Estados nacionais para promover o desenvolvimento, ainda que capitalista, de suas sociedades e de proteger e desenvolver suas empresas (e capitais nacionais) e sua força de trabalho.



7. A existência do Mercosul, cuja premissa é a preferência em seus mercados às empresas (nacionais ou estrangeiras) instaladas nos territórios da Argentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai em relação às empresas que se encontram fora desse território e que procura se expandir na tentativa de construir uma área econômica comum, é incompatível com objetivo norte-americano de liberalização geral do comércio de bens, de serviços, de capitais etc que beneficia as suas megaempresas, naturalmente muitíssimo mais poderosas do que as empresas sul-americanas.



8. De outro lado, um objetivo (político e econômico) vital para os Estados Unidos é assegurar o suprimento de energia para sua economia, pois importam 11 milhões de barris diários de petróleo sendo que 20% provêm do Golfo Pérsico, área de extraordinária instabilidade, turbulência e conflito.



9. As empresas americanas foram responsáveis pelo desenvolvimento do setor petrolífero na Venezuela a partir da década de 1920. De um lado, a Venezuela tradicionalmente fornecia petróleo aos Estados Unidos e, de outro lado, importava os equipamentos para a indústria de petróleo e os bens de consumo para sua população, inclusive alimentos.

10. Com a eleição de Hugo Chávez, em 1998, suas decisões de reorientar a política externa (econômica e política) da Venezuela em direção à América do Sul (i.e. principal, mas não exclusivamente ao Brasil), assim como de construir a infraestrutura e diversificar a economia agrícola e industrial do país viriam a romper a profunda dependência da Venezuela em relação aos Estados Unidos.



11. Esta decisão venezuelana, que atingiu frontalmente o objetivo estratégico da política exterior americana de garantir o acesso a fontes de energia, próximas e seguras, se tornou ainda mais importante no momento em que a Venezuela passou a ser o maior país do mundo em reservas de petróleo e em que a situação do Oriente Próximo é cada vez mais volátil.



12. Desde então desencadeou-se uma campanha mundial e regional de mídia contra o Presidente Chávez e a Venezuela, procurando demonizá-lo e caracterizá-lo como ditador, autoritário, inimigo da liberdade de imprensa, populista, demagogo etc. A Venezuela, segundo a mídia, não seria uma democracia e para isto criaram uma "teoria" segundo a qual ainda que um presidente tenha sido eleito democraticamente, ele, ao não "governar democraticamente", seria um ditador e, portanto, poderia ser derrubado. Aliás, o golpe já havia sido tentado em 2002 e os primeiros lideres a reconhecer o "governo" que emergiu desse golpe na Venezuela foram George Walker Bush e José María Aznar.



13. À medida que o Presidente Chávez começou a diversificar suas exportações de petróleo, notadamente para a China, substituiu a Rússia no suprimento energético de Cuba e passou a apoiar governos progressistas eleitos democraticamente, como os da Bolívia e do Equador, empenhados em enfrentar as oligarquias da riqueza e do poder, os ataques redobraram orquestrados em toda a mídia da região (e do mundo).



14. Isto apesar de não haver dúvida sobre a legitimidade democrática do Presidente Chávez que, desde 1998, disputou doze eleições, que foram todas consideradas livres e legítimas por observadores internacionais, inclusive o Centro Carter, a ONU e a OEA.



15. Em 2001, a Venezuela apresentou, pela primeira vez, sua candidatura ao Mercosul. Em 2006, após o término das negociações técnicas, o Protocolo de adesão da Venezuela foi assinado pelos Presidentes Chávez, Lula, Kirchner, Tabaré e Nicanor Duarte, do Paraguai, membro do Partido Colorado. Começou então o processo de aprovação do ingresso da Venezuela pelos Congressos dos quatro países, sob cerrada campanha da imprensa conservadora, agora preocupada com o "futuro" do Mercosul que, sob a influência de Chávez, poderia, segundo ela, "prejudicar" as negociações internacionais do bloco etc. Aquela mesma imprensa que rotineiramente criticava o Mercosul e que advogava a celebração de acordos de livre comércio com os Estados Unidos, com a União Européia etc, se possível até de forma bilateral, e que considerava a existência do Mercosul um entrave à plena inserção dos países do bloco na economia mundial, passou a se preocupar com a "sobrevivência" do bloco.



16. Aprovado pelos Congressos da Argentina, do Brasil, do Uruguai e da Venezuela, o ingresso da Venezuela passou a depender da aprovação do Senado paraguaio, dominado pelos partidos conservadores representantes das oligarquias rurais e do "comércio informal", que passou a exercer um poder de veto, influenciado em parte pela sua oposição permanente ao Presidente Fernando Lugo, contra quem tentou 23 processos de "impeachment" desde a sua posse em 2008.



17. O ingresso da Venezuela no Mercosul teria quatro consequências: dificultar a "remoção" do Presidente Chávez através de um golpe de Estado; impedir a eventual reincorporação da Venezuela e de seu enorme potencial econômico e energético à economia americana; fortalecer o Mercosul e torná-lo ainda mais atraente à adesão dos demais países da América do Sul; dificultar o projeto americano permanente de criação de uma área de livre comércio na América Latina, agora pela eventual "fusão" dos acordos bilaterais de comércio, de que o acordo da Aliança do Pacifico é um exemplo.



18. Assim, a recusa do Senado paraguaio em aprovar o ingresso da Venezuela no Mercosul tornou-se questão estratégica fundamental para a política norte americana na América do Sul.



19. Os líderes políticos do Partido Colorado, que esteve no poder no Paraguai durante sessenta anos, até a eleição de Lugo, e os do Partido Liberal, que participava do governo Lugo, certamente avaliaram que as sanções contra o Paraguai em decorrência do impedimento de Lugo, seriam principalmente políticas, e não econômicas, limitando-se a não poder o Paraguai participar de reuniões de Presidentes e de Ministros do bloco. Feita esta avaliação, desfecharam o golpe. Primeiro, o Partido Liberal deixou o governo e aliou-se aos Colorados e à União Nacional dos Cidadãos Éticos – UNACE e aprovaram, a toque de caixa, em uma sessão, uma resolução que consagrou um rito super-sumário de "impeachment". Assim, ignoraram o Artigo 17 da Constituição paraguaia que determina que "no processo penal, ou em qualquer outro do qual possa derivar pena ou sanção, toda pessoa tem direito a dispor das cópias, meios e prazos indispensáveis para apresentação de sua defesa, e a poder oferecer, praticar, controlar e impugnar provas", e o artigo 16 que afirma que o direito de defesa das pessoas é inviolável.



20. Em 2003, o processo de impedimento contra o Presidente Macchi, que não foi aprovado, levou cerca de três meses enquanto o processo contra Fernando Lugo foi iniciado e encerrado em cerca de 36 horas. O pedido de revisão de constitucionalidade apresentado pelo Presidente Lugo junto à Corte Suprema de Justiça do Paraguai sequer foi examinado, tendo sido rejeitado in limine.

21. O processo de impedimento do Presidente Fernando Lugo foi considerado golpe por todos os Estados da América do Sul e de acordo com o Compromisso Democrático do Mercosul o Paraguai foi suspenso da Unasur e do Mercosul, sem que os neogolpistas manifestassem qualquer consideração pelas gestões dos Chanceleres da UNASUR, que receberam, aliás, com arrogância.



22. Em consequência da suspensão paraguaia, foi possível e legal para os governos da Argentina, do Brasil e do Uruguai aprovarem o ingresso da Venezuela no Mercosul a partir de 31 de julho próximo. Acontecimento que nem os neogolpistas nem seus admiradores mais fervorosos – EUA, Espanha, Vaticano, Alemanha, os primeiros a reconhecer o governo ilegal de Franco – parecem ter previsto.



23. Diante desta evolução inesperada, toda a imprensa conservadora dos três países, e a do Paraguai, e os líderes e partidos conservadores da região, partiram em socorro dos neogolpistas com toda sorte de argumentos, proclamando a ilegalidade da suspensão do Paraguai (e, portanto, afirmando a legalidade do golpe) e a inclusão da Venezuela, já que a suspensão do Paraguai teria sido ilegal.



24. Agora, o Paraguai procura obter uma decisão do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul sobre a legalidade de sua suspensão do Mercosul enquanto, no Brasil, o líder do PSDB anuncia que recorrerá à justiça brasileira sobre a legalidade da suspensão do Paraguai e do ingresso da Venezuela.



25. A política externa norte-americana na América do Sul sofreu as consequências totalmente inesperadas da pressa dos neogolpistas paraguaios em assumir o poder, com tamanha voracidade que não podiam aguardar até abril de 2013, quando serão realizadas as eleições, e agora articula todos os seus aliados para fazer reverter a decisão de ingresso da Venezuela.

26. Na realidade, a questão do Paraguai é a questão da Venezuela, da disputa por influência econômica e política na América do Sul e de seu futuro como região soberana e desenvolvida.

 

*Samuel Pinheiro Guimarães Neto (Rio de Janeiro, 1939) é um diplomata brasileiro.Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade do Brasil (atual UFRJ) em 1963, ingressou no Itamaraty nesse mesmo ano.1 É mestre em economia pela Boston University (1969).Foi secretário-geral das Relações Exteriores do Ministério das Relações Exteriores de 9 de janeiro de 2003 até 20 de outubro de 2009, tendo sucedido Osmar Vladimir Chohfi. Foi então empossado como ministro-chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE).3 Deixou o cargo em 31 de dezembro de 2010, no final do Governo Lula. Em 19 de janeiro de 2011, o embaixador foi designado Alto-Representante Geral do Mercosul tendo como funções a articulação política, formulação de propostas e representação das posições comuns do bloco 4 . Na função, Samuel Pinheiro coordenava a implementação das metas previstas no Plano de Ação para um Estatuto da Cidadania do Mercosul, aprovado em Foz do Iguaçu em 16 de dezembro de 2010. Renunciou ao cargo, contudo, em 28 de junho de 2012.Foi professor da Universidade de Brasília (UnB), entre 1977 e 1979. Atualmente, é professor do Instituto Rio Branco (IRBr/MRE), onde leciona a disciplina "Política Internacional e Política Externa Brasileira" aos diplomatas recém-ingressados na carreira.