Oavião da Polícia Federal que transportou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entre São Paulo e Curitiba pousou por volta das 22h deste sábado (7) no Aeroporto Internacional Afonso Pena, em São José dos Pinhais (PR). As informações são da UOL.
O ex-presidente conversou com seus advogados e, em seguida, foi levado à superintendência da PF em Curitiba de helicóptero, onde começará a cumprir pena de 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Ele deve ficar detido em sala especial na sede da corporação.
Mais cedo, Lula passou por exame de corpo de delito na sede da Polícia Federal em São Paulo. O ex-presidente se entregou à Justiça em São Bernardo do Campo (SP), quase 48h após sua ordem de prisão ser decretada pelo juiz Sergio Moro.
Estudantes africanos fazem ato na Unilab, criada por Lula
Estudantes africanos indignados com a prisão de Lula, se reuniram em frente a Unilab para um ato em defesa da democracia e do ex-presidente. Os jovens consideram Lula quase como um pai, já que foi ele quem criou a universidade em 2010.
Alunos da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), no Ceará, se mobilizou na tarde desta sexta-feira (06) para defender Lula, o criador da instituição de ensino.
Com uma proposta avança de ensino e uma constante troca cultural, a Unilab faz a conexão entre o Brasil e os países africanos falantes da língua portuguesa a partir do intercâmbio entre alunos.
Hoje, a universidade tem cerca de 3,3 mil estudantes, graças ao ex-presidente Lula. E além dos países africanos, outras 11 nacionalidades também fazem parte da instituição como: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste.
Segundo a diretora interina do campus de São Francisco do Conde, Fábia Barbosa Ribeiro,"o presidente Lula foi o presidente que trouxe uma visibilidade para a importância da relação do Brasil com os países do continente africano, durante seu governo essas relações foram estreitadas de todos os pontos de vista".
Ela destaca também que “o impacto foi extremamente positivo do ponto de vista de um olhar para o continente africano, mas também das relações do Brasil com a África. Somos os maior país do mundo em população negra afrodescendente. São Francisco do Conde é o município da Bahia que mais se identifica como negro e pardo”.
Veja abaixo as fotos do ato em defesa da democracia e de Lula:
Sem autorização, mas por excelência, reproduzo o texto do jornalista gaúcho Moisés Mendes, em seu Facebbok:
“A decisão que Lula tomar amanhã ou depois será bem tomada. Tão bem tomada quanto a de hoje, quando mandou um recado a Sergio Moro. Não marque hora para me prender, nem tente me seduzir com celas especiais.
Pois deixem que Lula continue sendo conduzido por sua intuição. Não caiam numa armadilha ingênua e egoísta proposta pela direita e aceita por parte da esquerda.
É a armadilha quase infantil de que a prioridade agora, se Lula for preso, e mesmo que não seja, é buscar uma alternativa à sua candidatura.
É ingênua porque nada se ganha apressando uma definição sobre frentes e candidaturas herdeiras de Lula. Ganha-se o quê?
Alguém imagina Manuela D’Ávila e Guilherme Boulos sendo indicados, em meio à consternação, como sucessores de Lula? E saindo em disparada para saber quem chega na frente? Não sairiam. Os dois são solidários a Lula porque dependem dele.
E o debate sobre alternativas é egoísta e quase neoliberal porque, em nome da ideia utilitária da viabilização de uma frente ou de um nome, há muita gente disposta a abandonar Lula e sua resistência.
Abandonar o poder simbólico e real de um Lula lutando contra Sergio Moro, o Supremo de Jucá, o Quadrilhão, o pato da Fiesp e a imprensa é desprezar o que as esquerdas têm hoje de mais valioso.
Lula carrega as esquerdas nas costas. Hoje, o mundo ficou sabendo mais uma vez que é assim. Mas parte das esquerdas prega que se abandone Lula para cuidar da funcionalidade da vida no paraíso da próxima eleição.
Abreviar o processo é ofender a trajetória de Lula e sua capacidade única de afrontar o golpe e denunciá-lo também para os que nos olham de longe. Lula resiste mais do que todos nós. Muito mais. Ele pôs o dedo na cara dos que o perseguem e nos perseguem.
Mas alguns querem se livrar de Lula em nome de candidaturas estepes? Aquietem-se com seus planos B. Procurem pensar, tentem, mas não pensem em voz alta. Respeitem Lula.”
Moisés tem toda razão. Os líderes, nestes momentos, precisam sentir a voz muda de seu melhor companheiro, aquele que não o abandona e o que menos dele quer: o sentimento profundo das massas humanas, que não aparece nas tevês, nas páginas dos jornais e, quase nunca, nas estruturas políticas.
Enterro do estudante se transforma em protesto contra a ditadura
O assassinato de opositores não era nenhuma novidade nos primeiros anos do regime militar. Contudo, naquele dia a morte de um garoto de apenas 18 anos, durante um protesto estudantil no Rio de Janeiro, galvanizaria a oposição democrática e popular e faria eclodir o maior movimento de contestação à ditadura desde a sua implantação em 1964.
Por Augusto C. Buonicore*
Um tiro na tarde
Tudo começou com uma manifestação de estudantes contra o preço e as más condições do restaurante Calabouço. Este não foi o primeiro protesto daqueles jovens que, em geral, eram secundaristas filhos de famílias empobrecidas. Muitos, além de suas refeições diárias, faziam ali pequenos serviços para complementar a renda. Portanto, o seu perfil era bem diferente em relação ao daqueles que frequentavam as universidades brasileiras.
Os jovens do Calabouço, como de hábito, foram atacados pela Polícia Militar. Mas, desta vez, eles não estavam dispostos a apanhar ou correr. Por isso, tomaram a decisão de reagir à altura e o fizeram com paus e pedras. A polícia, desprevenida e assustada, recuou diante desse primeiro confronto. Logo em seguida voltou à carga com redobrada violência, utilizando bombas de efeito moral e tiros. A ordem para a fuzilaria partiu do general Osvaldo Niemeyer Lisboa. No conflito que se estabeleceu um rapaz caiu mortalmente ferido. Seu nome é Edson Luís de Lima e Souto. Estávamos em 28 de março de 1968.
Artur Poerner no seu livro O poder jovem resumiu assim a breve vida do garoto assassinado: “Tratava-se de um menino ainda – completara 18 anos no dia 24 de fevereiro –, parecia baixinho, a pele morena e os cabelos bem pretos e lisos de caboclo nortista. Os dentes – tinha-os estragados, como a maioria dos jovens de nosso país. Órfão de pai, viera havia três meses de Belém do Pará para cursar o Instituto Cooperativo de Ensino, anexo ao Calabouço, onde passava a maior parte do dia, inclusive auxiliando em serviços burocráticos da secretaria e de limpeza no estabelecimento, pois não conseguia emprego. As esperanças que o trouxeram ao Rio estavam ali agora, transformadas no sangue que manchava a camisa branca empunhada pelos seus colegas”.
O oficial que comandava a tropa, sem medo de parecer ridículo, afirmou que a “Polícia Militar atirou por se encontrar numericamente em situação inferior aos estudantes, inclusive em quantidade de armas”. O general Niemeyer foi afastado de seu posto para que as investigações supostamente pudessem ser feitas de maneira isenta. No entanto, ninguém seria punido pela morte do estudante. A impunidade para os “crimes do Estado” seria uma das marcas do regime instalado em 1964.
Em editorial, o Correio da Manhã revelava toda a sua indignação: “Não agiu a Polícia Militar como força pública. Agiu como bando de assassinos (...). A Guanabara, cidade civilizada e centro cultural do Brasil, não perdoará os assassinos”. O general-presidente Costa e Silva quando assumiu o cargo, no começo de 1967, prometeu solenemente abrir o diálogo com os trabalhadores e estudantes descontentes. Acenou até mesmo com a possibilidade da eleição de um civil em 1971. Meses mais tarde ficou claro que o único diálogo que o regime conhecia era o da violência.
Os estudantes se recusaram a entregar o corpo de Edson Luís às autoridades, temendo que ele pudesse desaparecer. Por segurança, ele foi levado à Assembleia Legislativa onde foi realizada uma longa e tensa vigília. O governo estadual proibiu a presença da Polícia Militar no local, mas ela desobedeceu às ordens e realizou atos de provocação, atirando bombas de gás lacrimogêneo e prendendo populares. O clima ficou explosivo.
A notícia da morte do estudante correu de boca em boca. As escolas e teatros cariocas foram fechando suas portas. “A impressão que se tem hoje, evidentemente exagerada, é de que todo o Rio de Janeiro passou pelo velório. Nunca a Assembleia havia recebido a visita de tantas celebridades”, escreveu Zuenir Ventura. As filas eram intermináveis e também os discursos. Coroas de flores chegavam a todo momento. Um espírito de indignação tomou conta da cidade. Mataram um estudante. E agora? Neste luto, começa a luta
O enterro de Edson Luís foi a primeira grande manifestação contra o regime militar. Mais de 50 mil pessoas tomaram as ruas numa última homenagem ao estudante morto. Eram universitários, secundaristas, professores, artistas, clérigos, profissionais liberais. Havia também muitos elementos populares. Uma faixa se destacava: “Mataram um estudante. Ele poderia ser seu filho”. Das janelas caíam flores e papel picado. Parecia uma reprodução da “marcha da família com deus pela liberdade” com sinais invertidos. Foi a explosão incontida das frustrações de amplos setores das camadas médias que haviam apoiado o golpe – em nome da liberdade e da luta contra a corrupção – e agora viam suas expectativas serem traídas pelos generais.
No cortejo, os estudantes, como de praxe, queimaram uma bandeira dos Estados Unidos e cantaram o hino nacional brasileiro. Sob o caixão foi colocada a bandeira brasileira. Nada mais justo, pois o corpo do pequeno Edson, naquele momento, representava o grito represado de toda uma nação agrilhoada.
Diante da casa de Carlos Lacerda ouviram-se vaias e gritos de “fascista” e “abaixo a Frente Ampla” – frente política que congregava Lacerda, Jango e JK. Sinais evidentes da radicalização que vivia o movimento estudantil, particularmente sua vanguarda. Ironicamente nas semanas seguintes o governo militar acusaria a Frente Ampla de ter incentivado aquela manifestação.
Sem condições de reprimi-la, o regime tentou escondê-la. Naquele cair de tarde e começo de noite as luzes da cidade, misteriosamente, não foram acesas. Esforço inútil. Durante todo o trajeto, os motoristas acendiam os faróis e muitos comerciantes forneciam velas e lanternas. A multidão também transformava os jornais do dia em archotes, que queimavam rapidamente. O improviso acabou dando mais grandiosidade à cena. Ninguém se esqueceria daquele dia. No final, a massa presente fez um juramento solene: “Neste luto, começou a luta!”.
O assassinato teve impacto imediato na maioria dos estados, inflamando o movimento estudantil e oposicionista. Em Goiânia a Polícia Militar invadiu a Catedral Metropolitana, onde se celebrava uma missa em memória de Edson, e feriu à bala vários estudantes. O secundarista e engraxate Ornalino Cândido da Silva de apenas 16 anos veio a falecer devido aos ferimentos. Ele parecia muito com uma das principais lideranças secundaristas da cidade: Euler Ivo. Isso criou certa confusão quanto à identidade do morto.
Em Brasília também ocorreram confrontos violentos entre estudantes e policiais. Outro jovem levou um tiro no peito. Nos dois casos, seguindo o exemplo dos cariocas, os estudantes enfrentaram a polícia com pedras e paus. A fase de só fugir ou apanhar havia passado. “Dente por dente, olho por olho” era a nova palavra de ordem que surgia nas ruas. Nem sempre isso correspondia à real correlação de forças existente.
A morte de Edson Luís também provocou cisão nas próprias fileiras do regime ditatorial. No dia seguinte ao assassinato, o general Mourão Filho – presidente do Superior Tribunal Militar e um dos principais expoentes do golpe de 1964 – declarou: “É incrível que a polícia atire contra estudantes, em uma democracia (sic). Estou indignado, fora de mim, com tais acontecimentos (...) quando se permite que policiais atirem contra estudantes, não podemos ficar tranquilos em casa, pois fatos como esses poderiam atingir qualquer pessoa de nossas famílias”.
Lacerda, rompido com o regime desde 1965, aproveitou o momento para elevar o tom de suas críticas. “A violência tornou-se norma nas relações entre o governo e o povo. (...) Ninguém deseja a baderna, mas ninguém suporta a crueldade e a covardia. É inaceitável que o Exército trate os estudantes como uma horda de inimigos (...). O Brasil está ultrajado pela orgia da violência (...). É tempo de fazer a revolução pela qual a mocidade anseia, a revolução pela educação e o voto”. Em breve ele constaria da lista de novas cassações e seria preso.
1º de abril: Nada a comemorar
O próximo encontro entre estudantes e a repressão já estava marcado. Seria por ocasião das comemorações do quarto aniversário do golpe militar. No dia 31 de março, hipocritamente, o general-presidente Costa e Silva afirmou: “Eles querem sangue, mas o país prosseguirá sem sangue porque não estamos com a ideia de violência. Nós queremos a paz”. Paz foi uma coisa que não houve nos dias – e anos – que se seguiram.
O Correio da Manhã narrou o que aconteceu naquele fatídico dia: “Por cinco horas e meia (...) mais de cinco mil elementos da PM agrediram, com violência nunca vista, estudantes e populares participantes do movimento de protesto na Guanabara”. Continuou o jornal: “O Rio converteu-se num campo de batalha. A polícia caçava pelas ruas estudantes, intelectuais e homens do povo, como se fossem representantes de uma nação inimiga”. Um detalhe: desta vez o número de policiais ferido foi tão grande como o de civis. Escreveu Zuenir Ventura: “poucas vezes a polícia apanhou tanto no Rio de Janeiro”.
Segundo Poerner, 60 manifestantes e 39 policiais ficaram feridos e mais de 321 pessoas foram presas. Mas, a luta continuava bastante desigual: pedras contra balas. Outros dois jovens tombaram mortos na Guanabara: David de Souza Neiva e Jorge Agripino de Paula. Quatro ficaram feridos à bala. O I Exército ocupou as ruas da cidade e Costa e Silva ameaçou: “custe o que custar a ordem será mantida”. Falava-se na decretação do Estado de Sítio e mesmo na promulgação de um novo ato institucional, ainda mais draconiano que os anteriores. Esta era a única forma de diálogo que a ditadura conhecia.
A missa de 7º dia de Edson Luís também foi marcada pela violência. Como se preparasse o cenário para uma tragédia, o governo estadual decretou ponto facultativo e feriado bancário. Foi sugerido aos comerciantes que não abrissem suas lojas. Desde as primeiras horas, a cidade foi tomada pelo exército. Havia um odor insuportável de pólvora saturando o ambiente. Na missa da manhã, encomendada pela Assembleia Legislativa e ocorrida na Candelária, as pessoas foram cercadas e massacradas pela cavalaria quando saíam pacificamente da igreja. A mesma coisa ameaçava se repetir à noite.
Dom José de Castro Pinto, vigário-geral, foi pressionado para que a missa noturna não ocorresse. O clérigo se manteve firme e realizou o ato religioso ao lado de mais 15 padres. Nas ruas que davam acesso à igreja, policiais e soldados intimavam os que desejavam entrar. Precisava ter muita coragem para romper o cerco armado. Bombas de gás lacrimogêneo eram lançadas a esmo. O cheiro do gás tomou conta do interior do templo que estava completamente lotado. Todos ali temiam pelo pior. A Candelária virou uma verdadeira praça de guerra.
Visando a proteger os que saíam da igreja, os padres formaram um cordão de isolamento que separava o povo dos cavalarianos enfurecidos. À frente do estranho cortejo estava o vigário-geral. Apenas quatro anos antes a cúpula da igreja católica abençoava os golpistas e agora protegia os contestadores do regime. As coisas, realmente, estavam mudando no país.
A Frente Ampla – rechaçada pelos estudantes no enterro de Edson Luís – pagaria a conta pelos acontecimentos daqueles dias. Em abril, no dia seguinte à missa, uma portaria do ministro da Justiça proibiu sua existência e estabeleceu pena de prisão para quem, estando banido ou cassado, fizesse qualquer pronunciamento político. “O governo foi ao cerne da crise estudantil ao decidir proscrever a Frente Ampla, jogando-a na clandestinidade. As manifestações de rua provaram que a semeadura da Frente Ampla estava caindo em terreno favorável (...). A linha da agitação correspondeu inteiramente à linha de ação política da Frente Ampla”, afirmou alguém ligado ao regime.
A morte de Edson Luís ocasionou uma mudança de posição política de amplos setores das camadas médias em relação ao movimento estudantil. Elas passaram a reconhecer nele certo papel de vanguarda de suas aspirações democráticas. De um apoio difuso passou-se a um apoio ativo.
Após a missa, a diretiva da União Metropolitana dos Estudantes (UME) foi para que os estudantes voltassem para dentro das universidades. Vladimir Palmeira, então presidente da entidade, afirmou: “Ultrapassada a última fase de manifestações a palavra de ordem é retornar às escolas, promovendo assembleias para o debate político dos acontecimentos e para a estruturação das medidas necessárias ao atendimento das reivindicações específicas da classe estudantil”.
O recuo foi provisório. Dentro de mais alguns meses o movimento estudantil e popular tomaria novamente as ruas nas maiores manifestações de enfrentamentos à ditadura militar: a sexta-feira sangrenta e a passeata dos cem mil. Esse é assunto para alguma de minhas próximas colunas.
Bibliografia
DIRCEU, José & PALMEIRA, Vladimir. Abaixo a ditadura: movimento de 68 contado por seus líderes. Rio de Janeiro: Garamond, 1998.
MARTINS FILHO, João Roberto. Movimento estudantil e ditadura militar (1964-1968). São Paulo: Papirus, 1987.
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REIS FILHO, Daniel Aarão & MORAES, Pedro de. 68: a paixão de uma utopia. São Paulo: FGV, 1988.
SAES, Décio. Classe média e sistema político no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz, 1985.
SANFELICE, José Luís. Movimento estudantil: a UNE na resistência ao golpe de 64. Campinas (SP): Autores Associados, 1986.
SIRKIS, Alfredo. Os carbonários: memórias da guerrilha perdida. São Paulo: Global, 1992.
SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Castelo a Tancredo. São Paulo/Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
VALLE, Maria Ribeiro do. 1969: o diálogo é a violência. Campinas (SP): Unicamp, 1999.
VENTURA, Zuenir. 1968: O ano que não terminou. São Paulo: Nova Fronteira, 1988.
*É historiador, diretor de publicações da Fundação Maurício Grabois. E autor dos livros Marxismo, história e a revolução brasileira: encontros e desencontros e Meu Verbo é Lutar: a vida e o pensamento de João Amazonas e Linhas Vermelhas: marxismo e os dilemas da revolução. Todos publicados pela Editora Anita Garibaldi.
No corpo do post, a transmissão ao vivo do ato religioso pelos 68 anos que faria, viva, Marisa Letícia, mulher do ex-presidente Lula, diante do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo.
Um líder arrosta seu destino, e o destino nunca é duro demais aos predestinados.
Esta predestinação não nasce com os homens e mulheres, como supõem os deterministas.
Nasce com a vida e se confirma ou se dissolve a cada decisão que se toma, conforme a capacidade que se tem de absorver e encarnar o coração e os anseios de seu povo.
Há algo mais, também, de que se embebe alguém para ser líder: a história dos que lhe antecederam e o sonho que pertencerá aos dias de seus sucessores.
O Lula que ouvi falar, hoje, em seu discurso diante do Sindicato dos Metalúrgicos, com todos os sofrimentos que se poderia compreender num homem de 72 anos, era um líder de um povo, não um político como tantos.
Não era um derrotado, à beira de ser enjaulado. Derrotados se lamentam, e nada mais distante de um lamento do que suas palavras.
Ao contrário, eram História, como que a repetir as da trágica Carta Testamento de Getúlio Vargas:
Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no meu pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta.
Que mais perto disso que a promessa de andar por milhões de pernas, por falar por milhões de bocas, que viver por milhões de vidas?
Ironia fina que só a realidade pode nos dar, a de ver o partido que nasceu renegando o caudal histórico em que o getulismo navegou viver a tragédia da perseguição que sofre Lula, porque este é o fado inevitável de qualquer um que siga o destino que lhe é imposto, o de representar o povo brasileiro.
A diferença, bendida diferença, é que o que se imaginava ser o féretro de Lula foi o Lula mais vivo que nunca carregado em triunfo por uma multidão.
Os vencedores, ou os que se crêem vencedores, porém, estão presos, irremediavelmente presos ao crime a que seu ódio os levou. Não têm mais como assumir os discurso da civilização, porque usaram a lei para produzir a barbárie.
De sua semeadura, só a flor fétida do fascismo brotou.
No Dia do Jornalista, o que mais se ouviu hoje foi jornalista repetindo nos estúdios das TVs, principalmente da Globo News, uma frase emblemática do momento vivido pela chamada geande imprensa nacional. “Aqui do alto”, diziam os jornalistas, como se estivessem dentro dos helicópteros.
Eles não estavam no alto. Quem estava no alto era o helicóptero com um câmera e eventualmente com um repórter. Mas a maioria que dizia “aqui do alto” estava na verdade nos estúdios.
No Dia do Jornalista, a Globo fez a cobertura em São Bernardo do Campo do alto, como se o telespectador só pudesse ver o que acontecia sob o ponto de vista de alguém embarcado.
Por que isso? Porque a Globo desistiu de fazer cobertura por terra em determinadas circunstâncias. A Globo ajudou a fomentar o ódio e fez com que seus jornalistas passassem a enfrentar a reação de quem está no chão. Quase tudo é pelo ar.
É triste e condenável, porque jornalista algum deve ser atacado, sob quaisquer pretextos. Mas o preço que a Globo paga pela adesão ao golpe acaba recaindo sobre seus profissionais.
Os comentaristas de fato embaraçados no golpe, e não nos helicópteros, passaram o dia no estúdio dizendo bobagens. Um deles, Octavio Guedes, disse que o Brasil vive uma democracia porque numa ditadura não seria possível que drones sobrevoassem o sindicato de São Bernardo… Ah, bom.
No Dia do Jornalista, os protagonistas foram os drones e os helicópteros. A Globo só consegue fazer jornalismo beija-flor.