quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Diretoria da Petrobrás aumenta em 400% a sua remuneração e oferece zero de reajuste aos trabalhadores

 Trabalho

Diretoria da Petrobrás aumenta em 400% a sua remuneração e oferece zero de reajuste aos trabalhadores

 

 
30/07/2020 14:40

 

 
Rio de Janeiro, 29 de julho de 2020 - Após os congressos regionais dos sindicatos filiados à Federação Única dos Petroleiros (FUP) e ao Congresso Nacional da federação (Confup), a categoria decidiu reivindicar um reajuste baseado no IPCA, do IBGE, do período entre 1°de setembro de 2019 a 31 de agosto de 2020. Além disso, os petroleiros estão reivindicando um adicional de 2,2%, relativo a perdas inflacionárias do período entre 1° de setembro de 2016 e 31 de agosto de 2019. Os cálculos foram feitos pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE).

No entanto, a gestão da Petrobrás resolveu oferecer reajuste zero para a categoria, dando como justificativa a crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19 e as perdas que a empresa teve. Entretanto, o Conselho de Administração da companhia aprovou um reajuste milionário na remuneração da diretoria da empresa, de quase R$ 11 milhões. Com isso, o provisionamento para pagamento da diretoria passou de R$ 32,4 milhões para R$ 43,3 milhões. Cada um dos nove diretores executivos da empresa poderá ter rendimentos mensais que atingem R$ 400 mil entre abril deste ano e março de 2021 - quatro vezes o valor atual médio.

A diretoria alega que não houve reajuste da remuneração fixa e que tal aumento se trata de "remuneração variável", o Prêmio Por Perfomance (PPP), baseado no lucro obtido pela empresa em 2019. Mas o fato é que a companhia registrou prejuízo bilionário, de R$ 48,5 bilhões, no primeiro trimestre, e isso não influenciou a decisão da diretoria de reajustar seus ganhos.

A mesma diretoria ainda propôs um corte de 25% na remuneração dos trabalhadores da Petrobrás em abril, alegando a crise econômica provocada pela pandemia. Para cargos gerenciais, entretanto, a companhia propôs apenas uma postergação do pagamento dos adicionais pela função gerencial, situação que gerou mal estar entre os trabalhadores. Vários sindicatos entraram na Justiça para impedir o corte de salários.

O reajuste dos ganhos da diretoria gerou mal estar até mesmo na reunião que o aprovou. Segundo matéria do Valor Econômico, o BNDESPar foi contrário ao benefício neste momento.

"Os trabalhadores já pagaram no mês de abril, com cortes de direitos e redução salarial. Foram mais de 20 mil trabalhadores que tiveram que engolir uma redução de 25%, e milhares de outros petroleiros de áreas operacionais foram sumariamente desimplantados do turno, com impactos de 50% em seus vencimentos", afirmou o coordenador geral da FUP, Deyvid Bacelar.

A FUP denunciou na época que se a Petrobrás suspendesse a distribuição de dividendos aos acionistas e o pagamento de reajustes, bônus e programas de remunerações variáveis para os gestores, pouparia R$ 4,406 bilhões, praticamente o dobro dos 2,4 bilhões que anunciou que economizaria com as medidas de cortes.

"A Petrobrás exige sacrifício dos trabalhadores e protege os interesses da diretoria e dos acionistas, a quem destinou mais R$ 1,7 bilhão em plena pandemia. Lembrando que eles já haviam recebido R$ 9 bilhões em 2019. Só para ter uma ideia do que isso representa para os trabalhadores, os R$ 10,7 bilhões pagos aos acionistas equivalem a quase o dobro do que a Petrobras investe em SMS", reforçou Bacelar.

"O Capital no século XXI": documentário mostra o crescimento das desigualdades no mundo

 Cinema

"O Capital no século XXI": documentário mostra o crescimento das desigualdades no mundo

O freio ao capitalismo sem limites depende, antes de tudo, da mobilização cidadã, segundo o economista Thomas Piketty

 
21/07/2020 17:38
Créditos da foto: (Divulgação)

 
“Defendo o controle do capital e a superação do capitalismo. Só assim nos projetaremos no século XXI.”

A frase é do mais lido e debatido economista do mundo, o francês Thomas Piketty, no documentário “Le Capital au XXIe siècle”, que está passando em Paris há algumas semanas.

O filme resume – em imagens de filmes de ficção, cenas de documentários e entrevistas em diversos países – 400 anos de capitalismo e as principais teses do livro homônimo, best-seller mundial lançado em 2013. A obra transformou Thomas Piketty no mais respeitado crítico do sistema capital(Divulgação)ista.


Por que o capitalismo precisa ser superado ? Simplesmente porque como seu denso livro de mil páginas demonstra em detalhes, o sistema capitalista é, por natureza, uma máquina de fabricar desigualdades.

Millionaires for Humanity

No ritmo atual, segundo o economista, as sociedades ocidentais reproduzirão em pouco tempo as abissais desigualdades de um século atrás. Elas haviam sido atenuadas, com maior ou menor intensidade, graças à luta dos trabalhadores e sindicatos e também a políticas de Estado, como o New Deal de Franklin Roosevelt, que lançou numerosos projetos públicos subvencionados pelo Estado federal, reformas financeiras e regulamentação, com o objetivo de superar a crise econômica e social de 1929.

Recém-eleitos, Trump e Macron – como Reagan fizera na década de 1980 – deram verdadeiros presentes fiscais, diminuindo os impostos dos milionários. Menos egoístas, 83 milionários do mundo assinaram, há duas semanas, uma carta aberta publicada no site « Millionaires for Humanity » pedindo para pagar mais impostos, a fim de financiar parte dos estragos da crise do Covid-19. Eles querem que os mais ricos paguem mais, « imediatamente », « de maneira permanente », a fim de contribuir com a retomada da normalidade econômico-social pós-Covid-19.

Essa carta foi publicada antes da reunião dos ministros de Finanças do G20 e da cúpula europeia extraordinária sobre a retomada do crescimento da União Europeia. No texto, eles pedem que os governos « aumentem os impostos de gente como nós. Imediatamente, substancialmente e de maneira permanente. »

Nenhum milionário brasileiro assinou a carta.

Brasil tem desigualdade da Belle Époque europeia

Realizado por Justin Pemberton e Thomas Piketty, o documentário tem entrevistas com especialistas como o economista Joseph Stiglitz (Prêmio Nobel de Economia), o economista francês Gabriel Zucman, o cientista político Ian Bremmer, a jornalista do “Financial Times”, Gillian Tett, além do próprio Piketty.

O filme faz uma retrospectiva da evolução das sociedades ocidentais em direção a patamares cada vez menores de desigualdade. O crescimento de uma classe média no pós-guerra, as conquistas sociais dos trabalhadores e a criação do salário mínimo permitiram grandes avanços.

Na Belle Époque (nos anos 1910), 1% da população que detinha os maiores patrimônios possuía mais de 60% do capital privado nacional na Europa, contra 45% nos Estados Unidos. Nessa época, 90% da população não possuía praticamente nada.

Segundo Piketty, o Brasil atual é um país, do ponto de vista da repartição da renda e do patrimônio, ainda mais desigual do que a Europa de antes da Primeira Guerra [1914-1918]. Os 50% mais pobres no Brasil em termos de renda têm apenas 10% da renda total,enquanto os 10% mais ricos têm mais de 50% do total. Se olharmos a propriedade, é ainda mais grave. Os 50% mais pobres têm 2% ou 3%, enquanto os 10% mais ricos têm 70% a 80%.

Ele estima que as elites brasileiras cometem um erro histórico ao não promover uma distribuição de renda eficaz. Segundo Piketty, uma política de redistribuição de renda traria certamente crescimento econômico ao país. Ele pensa que as políticas sociais implantadas nos governos do PT foram financiadas pela classe média e não pelos mais ricos pois não houve uma reforma tributária para estabelecer impostos mais progressivos.

Mas, como ouvi Fernando Henrique Cardoso afirmar na Maison de l’Amérique Latine, em janeiro de 2019, « no Brasil, as pessoas não veem com bons olhos a melhor distribuição das riquezas ».

Será que foi por isso que ele preferiu nem tentar entrar neste terreno polêmico ? Como foi mostrado em reportagens, no governo de FHC uma criança morria de fome a cada cinco minutos no Brasil.

Hoje, o Brasil não tem muita chance de sair do atual modelo pois Bolsonaro é visto por Piketty como um “Trump piorado”.

O economista afirmou recentemente em entrevista que a crise atual pode contribuir para uma mudança da ideologia dominante no sistema econômico, na Europa, nos EUA, e memo no Brasil, indo em direção de uma economia mais igualitária, mais social e mais sustentável.

« Espero que esse choque nos conduza nessa direção. Mas vai depender da mobilização de cada um ».

Depende, antes de tudo, da mobilização cidadã.

Leneide Duarte-Plon é co-autora, com Clarisse Meireles, de « Um homem torturado, nos passos de frei Tito de Alencar » (Editora Civilização Brasileira, 2014). Em 2016, pela mesma editora, a autora lançou « A tortura como arma de guerra-Da Argélia ao Brasil : Como os militares franceses exportaram os esquadrões da morte e o terrorismo de Estado ». Ambos foram finalistas do Prêmio Jabuti. O segundo foi também finalista do Prêmio Biblioteca Nacional

Assista ao trailer:





Sua Voz na Conjuntura: Cuba vence a pandemia e dá exemplo de internacionalismo solidário Ref: Carta Maior, em 21/7/2020

 

Sua Voz na Conjuntura: Cuba vence a pandemia e dá exemplo de internacionalismo solidário

 

 
21/07/2020 13:57

 

 
OUÇA AGORA:



SUA VOZ NA CONJUNTURA - Internacional

Cuba vence a pandemia e dá exemplo de internacionalismo solidário

EMILIANO JOSÉ
 - Jornalista, professor universitário, ex-deputado estadual na Bahia e ex-deputado federal.

Por Joaquim Palhares, Saul Leblon e Carlos Tibúrcio .

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A ilha socialista das Américas, com seu extraordinário sistema de saúde pública, deu plena assistência ao seu povo e apoio a vários países - a Itália, entre eles.

Isso, apesar da intensificação do bloqueio econômico por parte do imperialismo dos Estados Unidos.

"Toda a nossa política tem que girar em torno do bloqueio, que objetiva nos sufocar", me disse o dirigente cubano Jorge Lezcano em uma recente visita a Havana.

Florestan Fernades, 100 anos Ref: Carta Maior, em 22/7/2020

 Memória

Florestan Fernades, 100 anos

Comentário sobre a trajetória política e a obra acadêmica do sociólogo, cujo centenário se comemora neste mês

 
22/07/2020 13:53

Florestan Fernandes em foto de 1995 (Eder Luiz Medeiros/Folhapress)

Créditos da foto: Florestan Fernandes em foto de 1995 (Eder Luiz Medeiros/Folhapress)

 
Como conciliar rigor acadêmico e militância política é uma questão que tem atormentado, senão mesmo paralisado, muitos intelectuais do nosso tempo. São poucos os que, como Florestan Fernandes, conseguiram satisfazer as demandas, por vezes contraditórias, desses dois tipos de envolvimento.

A maioria acabou por sucumbir ao desafio, ou abandonou o trabalho intelectual para dedicar-se à política, ou sacrificou a militância às exigências da academia. Esse dilema é peculiar ao nosso tempo, quando o intelectual se profissionalizou e suas atividades como professor, pesquisador e escritor tornaram-se cada vez mais absorventes, em detrimento do engajamento político. Por isso, muitos intelectuais deixaram de crer na cultura engajada e o próprio termo passou a ser suspeito. Para isso, também contribuiu a polarização causada pela Guerra Fria, que levou a enfrentamentos e perseguições, reduzindo o espaço de liberdade dentro da universidade.

No Brasil dos anos 60, a universidade pagou seu preço. Vários intelectuais de renome foram afastados de seus cargos com enorme dano para o ensino e a pesquisa -entre eles Florestan Fernandes, que ocupava então uma cátedra de sociologia da Universidade de São Paulo. Anos depois, com a anistia, muitos voltaram à universidade. Outros preferiram continuar seu trabalho à margem dela. Essa foi a escolha de Florestan Fernandes.

Terminada a repressão militar, uma outra forma de repressão mais insidiosa se instalou. A competição acadêmica continuou o trabalho de repressão que o Estado iniciara. Os trabalhos de Florestan foram alvo de críticas. Florestan sentiu-se isolado: “Cheguei a pensar que não era reprimido pela ditadura, mas por meus antigos companheiros”, confessou. Mas continuou, com o mesmo vigor, a publicar seus livros, mantendo-se sempre fiel às suas ideias e à militância política. Embora tenha sido sempre um espírito livre, avesso a disciplinas partidárias e cioso de sua independência, ele aceitou em 1986 o convite do PT para concorrer a deputado federal. Foi eleito por uma ampla margem de votos.

A prática cultural engajada que caracterizava os anos 60 –e que subsiste com grandes dificuldades nas regiões onde a profissionalização do intelectual foi tardia ou incompleta– tende a desaparecer entre nós. Cada vez mais encerrado na torre de marfim da academia, consumido pela burocratização, às voltas com relatórios e pareceres, à caça de bolsas e convites para participar de encontros internacionais, obrigado a seguir modas de momento, o intelectual dos nossos dias raramente se enquadra nos modelos gramscianos.

É preciso lembrar, no entanto, que os intelectuais que conseguiram resolver de maneira satisfatória o dilema trabalho intelectual e militância foram os que exerceram maior impacto na cultura. Esse é o caso de Florestan Fernandes, professor, autor e político, crítico implacável das elites brasileiras, incansável porta-voz dos interesses do povo. Florestan é, sob todos os pontos de vista, um marco na história da cultura brasileira. Um exemplo para as novas gerações.

Florestan entrou para a universidade no momento em que esta, com a criação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, iniciava um processo de democratização, visando a criar uma nova elite intelectual. De família modesta, trabalhando desde criança –como engraxate, ajudante de alfaiate, garçom– para ajudar no seu sustento, nunca esqueceu de suas origens. Estas, em parte, explicam suas preferências metodológicas, sua temática, seu programa e sua vocação socialista. Não foi por acaso que ele foi encontrar em intelectuais progressistas – C. Wright Mills, ThorsteinVeblen, Max Weber, Karl Mannheim e Karl Marx– o material com o qual elaborou uma síntese original.

Suas opções teóricas encontraram apoio no momento político do pós-guerra, quando vários setores da população se mobilizaram nas lutas pelo desenvolvimento e pela democracia que caracterizaram a era Vargas e o período JK e culminaram no momento reformista do governo João Goulart.

Depois da Revolução Cubana em 1959, o clima na América Latina era de otimismo, reforma e mobilização popular. No Chile, Eduardo Frei e depois Salvador Allende pareciam inaugurar uma nova era. Na Europa, intelectuais como Sartre faziam da militância uma profissão de fé. Nada mais natural que no Brasil muitos intelectuais seguissem essa trajetória. Os sonhos e as ilusões desse período, no entanto, se dissiparam diante da realidade dos golpes militares e da repressão. Hoje vivemos outros tempos e tudo isso pode parecer remoto. Mas a história desse período é essencial para compreender a vida e a obra de Florestan Fernandes.

Cinquenta anos se passaram desde o momento em que ele iniciou sua atividade intelectual na USP. Nesse período, ele publicou mais de 35 livros e numerosos artigos. Em todos eles revela uma profunda preocupação com a criação de uma sociedade mais humana, isto é, mais democrática e mais livre. A sociologia foi sempre para Florestan um instrumento para a consecução desse ideal. Por isso se preocupou tanto em aperfeiçoar os seus métodos.

Podem-se distinguir alguns temas fundamentais na sua obra. A luta contra o racismo, que se evidencia em “Integração do Negro na Sociedade de Classes” e “O Negro no Mundo dos Brancos” (1970); a análise da formação da sociedade brasileira em “A Revolução Burguesa no Brasil” (1975); a avaliação crítica da sociologia em “Fundamentos Empíricos da Explicação Sociológica” (1963), “Ensaios de Sociologia Geral e Aplicada” (1960), “A Sociologia numa Era de Mudança Social” (1963), “Elementos de Sociologia Teórica” (1970) e “A Sociologia no Brasil” (1977); a preocupação com a educação em “A Educação e Sociedade no Brasil” (1966) e “Universidade Brasileira: Reforma ou Revolução?” (1975); a crítica ao governo militar e à Nova República nos ensaios de “Circuito Fechado” (1976), “A Ditadura em Questão” (1982), “A Nova República” (1986); finalmente, seu interesse pela América Latina levou-o a publicar “Capitalismo Dependente e Classes Sociais na América Latina” (1973) e “Da Guerrilha ao Socialismo –A Revolução Cubana” (1979), e “Poder e Contra-Poder na América Latina” (1981).

Tão importante quanto suas pesquisas foi seu trabalho de professor. Conhecido internacionalmente como o responsável pela criação de um grupo de pesquisadores notáveis, que vieram a reformular a sociologia no Brasil, conferindo-lhe um rigor que jamais tivera. Florestan teve, entre seus alunos, intelectuais do porte de Fernando Henrique Cardoso, Octavio Ianni, Paul Singer, Maria Sylvia de Carvalho Franco, Luis Pereira, Eunice Durham e muitos outros.

Recentemente, em 1993, numa entrevista à Folha, Florestan reafirmava sua fé no socialismo, que ele encara como um processo constantemente em transformação, e na democracia, que ele vê como uma conquista das classes populares e não como dádiva das elites ou do Estado. Pode-se concordar ou não com ele, mas é impossível deixar de admirar sua coragem, seu espírito incansável, a consistência de suas posições e, principalmente, o admirável equilíbrio entre militância política e rigor científico que conseguiu realizar.

Emília Viotti da Costa (1928-2017) foi professora Emérita da USP, autora de diversos livros de referência como Da Senzala à Colônia.

*Publicado originalmente em 'A Terra é Redonda'