quarta-feira, 16 de agosto de 2017

IRRESPONSÁVEIS VÃO ACABAR COM 140 ANOS DE PAZ NA AMÉRICA LATINA

IRRESPONSÁVEIS VÃO ACABAR COM 140 ANOS DE PAZ NA AMÉRICA LATINA


A presidente legítima Dilma Rousseff, deposta pelo golpe de 2016, vê o risco de que um ciclo de 140 anos de paz na América Latina chegue ao fim.

“Eu acredito que a visão que se divulga no Ocidente a respeito da Venezuela é irresponsável. Acho um absurdo o tratamento da imprensa internacional à Venezuela. Vão criar, aqui na América Latina, depois de 140 anos de paz, um grande conflito armado, assim como fizeram no Iraque e no Afeganistão”, disse ela, em sua entrevista à BBC.

Dias atrás, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ameaçou intervir militarmente para derrubar o governo de Nicolás Maduro.

A Venezuela, que tem as maiores reservas de petróleo do mundo, tenta resistir.

No Brasil, que tem o pré-sal, golpe parlamentar subordinou o País aos interesses norte-americanos.

Leia, abaixo, reportagem do Opera Mundi:

Visão do Ocidente sobre Venezuela é 'irresponsável', diz Dilma Rousseff

A ex-presidente do Brasil Dilma Rousseff afirmou, nesta sexta-feira (11/08), em entrevista à emissora britânica BBC, que considera “irresponsável” a visão do Ocidente sobre a Venezuela e apontou como “absurdo” o tratamento da imprensa internacional ao país.

“Eu acredito que a visão que se divulga no Ocidente a respeito da Venezuela é irresponsável. Acho um absurdo o tratamento da imprensa internacional à Venezuela. Vão criar, aqui na América Latina, depois de 140 anos de paz, um grande conflito armado, assim como fizeram no Iraque e no Afeganistão”, disse.

Dilma foi questionada sobre se acreditava que Maduro era responsável pela situação na Venezuela. Não vou culpar apenas o Maduro. Existe um conflito. É que nem o que fizeram com o Saddam Hussein. O criminoso era o Saddam Hussein. Mataram-no da forma mais bestial possível. Quando fizeram isso, destamparam a caixa de pandora e saíram todos os monstros possíveis”, afirmou.

A ex-presidente brasileira defendeu a negociação para o conflito da Venezuela. “Eu não acho que a questão é ficar falando mal do Maduro. Na Venezuela estão lidando com forças sociais reais. Se querem guerra civil, terão. Com ou sem Maduro. Há um conflito lá. Não posso ser irresponsável e ser a favor de que o conflito seja resolvido intensificando a contradição. Ou tenta-se construir uma solução pacífica ou vai ter guerra civil. Os dois lados estão armados.”

A Venezuela atravessa um período de aguda crise política, que culminou com a eleição da Assembleia Constituinte, convocada por Maduro sob protestos da oposição e de parte da comunidade internacional.  Após a realização da votação, os EUA impuseram sanções a funcionários do governo venezuelano, incluindo o presidente.


… temos algo a sugerir. Cada vez mais gente lê Opera Mundi, mas a publicidade dos governos, com o golpe, foi praticamente zerada para a imprensa crítica, e a publicidade privada não tem sido igualmente fácil de conseguir, apesar de nossa audiência e credibilidade. Ao contrário dos sites da mídia hegemônica, nós não estamos usando barreiras que limitam a quantidade de matérias que podem ser lidas gratuitamente por mês. Queremos manter o jornalismo acessível a todos. Produzir um jornalismo crítico e independente custa caro e dá trabalho. Mas nós acreditamos que o esforço vale a pena, pois um jornalismo desse tipo é essencial num mundo que preza a democracia. E temos certeza de que você concorda com isso.

Diva Guimarães, Otto, Johnny Hooker e a nova onda de contestação

Protestos

Diva Guimarães, Otto, Johnny Hooker e a nova onda de contestação

por Jotabê Medeiros — publicado 13/08/2017 00h30, última modificação 11/08/2017 13h17
Artistas e cidadãos rompem diques de opinião conformada e de opressão secular
Fernando Maia/Uol/Folhapress
Diva Guimarães
Diva Guimarães fez a Festa Literária de Paraty chorar...
O fascismo não é impedir de dizer, é obrigar a dizer, disse o ensaísta e sociólogo francês Roland Barthes. Desde a assunção do golpe de 2016, começaram a ser construídos ambientes controlados na sociedade brasileira para legitimar a narrativa da legalidade do regime e cristalizar a ideia de que reivindicações sociais, culturais e políticas, no clima forjado de “reconstrução nacional”, são inoportunas.
Dizer qualquer coisa fora dos roteiros estabelecidos passou a culminar com um tipo de criminalização do “dissidente”.
Essas barreiras começaram a ruir com diversas manifestações espontâneas de desobediência civil. Seu desabamento foi inaugurado com ações como a de Thiago Rocha, estudante de História da UFRJ, que, ao ser instado a dar entrevista ao vivo à TV Globo, em maio de 2016, iniciou com um “Primeiramente, Fora Temer!” 
Na semana passada, uma senhora negra de 77 anos, Diva Guimarães, do Paraná, rompeu mais uma comporta desse bloqueio: ela pediu a palavra em um debate na Festa Literária de Paraty (Flip) e deu uma traulitada mortal no racismo velado brasileiro.
Diva falou durante 13 minutos na mesa A Pele Que Habito, depois do ator Lázaro Ramos e da jornalista portuguesa Joana Gorjão Henriques. Quando concluiu, dezenas estavam às lágrimas. Sua fala foi gravada na íntegra pela organização da Flip e viralizou na internet. 
O discurso de Diva Guimarães alastrou-se como fogo no mato seco por conta da verdade límpida do relato, que escancarou a segregação dentro da Igreja Católica. Vinda de família pobre, sem condições de subsistência, foi levada aos 7 anos para ser criada em uma instituição de freiras.
Ali, ela descobriu que as crianças negras só trabalhavam e a discriminação era regra. “Existia um rio – aquele maldito rio abençoado por Jesus –, diziam as freiras, em que os brancos se banhavam primeiro e os negros, por serem preguiçosos, entravam por último e só colocavam as palmas das mãos e dos pés.
Era isso o que as freiras contavam para a gente, para explicar a diferença da cor da pele entre brancos e negros”, disse a professora dona Diva. 
A contundência de Diva alcançou ainda maior impacto por conta da simplicidade de suas descrições do racismo que sofreu e vem sofrendo desde que se conhece por gente. “Você entra em uma loja e escuta ‘posso lhe servir?’, mas isso não é para servir você, é para ficar andando atrás de você para ver se vai roubar”, afirmou, em entrevista ao jornal O Globo
As ações espontâneas de desobediência civil desafiam o racismo, o golpismo e também o espírito de corpo. Na semana passada, o secretário municipal de Cultura de São Paulo, André Sturm, foi retumbantemente vaiado no Memorial da América Latina por uma plateia de cineastas.
O também cineasta Sturm certamente contava com um ambiente sob controle quando subiu ao palco para discursar, mas a vaia ultrapassou os 15 minutos. Entre os créditos para tal rejeição, André Sturm contabiliza ações nocivas na secretaria, especialmente no âmbito democrático.
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André Sturm, vaiado durante mais de 15 minutos por ações antidemocráticas, entre elas um ataque ao Plano do Livro (Foto:Fábio Guimarães/Fotoarena)
No fim de julho, ele desferiu um violento ataque às instâncias democráticas de organização cultural: com um decreto assinado pelo prefeito João Doria, publicado no dia 21 no Diário Oficial da Cidade de São Paulo, Sturm feriu de morte o Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Biblioteca (PMLLLB).
O decreto de Doria estabeleceu que a composição do conselho do PMLLLB será agora escolhida por ele, Sturm, e não mais por instâncias de representação das diferentes cadeias produtivas do livro. 
O ato de Doria, evidentemente causado por um pedido do secretário, tem pinta de retaliação: em 11 de maio, ao participar da primeira reunião do conselho do PMLLLB, Sturm bateu boca com os conselheiros e destratou um deles: “Eu leio mais livro que você. Tenho certeza”, afirmou, antes de sair da reunião.
Pouco tempo antes, tinha ameaçado “quebrar a cara” de um agente cultural da Zona Leste que o interpelou, devido à subvenção atrasada de um centro cultural.
Sturm, que já teve a sede da secretaria ocupada por coletivos da periferia, colhe os louros do que plantou (na reportagem “O secretário que derreteu”, de junho, CartaCapital já chamava atenção para os pendores autoritários do secretário).
Nos últimos dias, essa tendência de Sturm se acentuou. Primeiro, mudou a seu próprio critério a catalogação de livros nas bibliotecas municipais. Agrupou todos os autores por sobrenome. No caso da Biblioteca Álvaro Guerra, a única divisão que sobrou na não ficção é “policial”, e a prefeitura colocou Detetives Selvagens, do chileno Roberto Bolaño, nessa categoria. 
A compositora Liana Yuri, frequentadora da Biblioteca Viriato Correa, na Vila Mariana, em São Paulo, ficou chocada ao saber dos funcionários que Sturm ordenara que retirassem centenas de livros do acervo por serem “velhos”.
“A bibliotecária me falou baixinho que salvou um deles da queima: As Veias Abertas da América Latina, de Eduardo Galeano”, afirmou Liana em sua página no Facebook. 
Em territórios de unanimidade ideológica, como a Rádio Jovem Pan, uníssono da extrema direita, é muito raro que alguma coisa saia do roteiro. Mas, no último dia 21, ao participar do programa Morning Show, apresentado por Edgar Piccoli, o cantor e compositor pernambucano Otto furou o bloqueio.
Contrapôs-se com energia à opinião do comentarista Augusto Nunes, defendendo o governo Dilma e dizendo que o País deve desculpas à presidenta afastada. 
“Dilma não foi vítima. Ela é uma mulher forte. Quem deveria estar preso está solto. A democracia foi quem perdeu. É um buraco tão grande que se criou neste país que estamos pagando agora. Bala que dispara contra o tempo sempre volta”, afirmou o cantor. 
Rebatido pelos comentaristas da emissora, ele seguiu firme. “Eu não tenho partido, tenho posições minhas. A única coisa que vai ajudar é uma eleição direta”, afirmou. “Eu sou de esquerda. Meu partido é a esquerda, e o seu? É a direita”, disse, em resposta a uma pergunta do jornalista Augusto Nunes.
“O sistema deste país deve desculpas não apenas à presidenta, mas para todos. Todo mundo sabe que ela estava no meio de macacos. Dilma era uma pessoa honesta, não precisava sair daquele jeito”, afirmou Otto.
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Otto:em território conflagrado,defendeu Dilma e acusou a conivência com um golpe de Estado (Foto:Ana Branco/Ag.O Globo)
O rapper, romancista e poeta Ferréz, autor do premiado Capão Pecado e outros livros, diagnosticou que a maior violência desta época é que se tenta fazer com que a periferia negue aquilo em que acreditou, uma vida de igualdade de oportunidades, de eliminação das diferenças sociais, de distribuição de renda.
Tentam fazer as pessoas se envergonharem daqueles que foram os maiores acertos de um período: a distribuição de renda, os avanços educacionais, culturais e legislativos. 
A onda de contestação estende-se também ao campo comportamental. O músico pernambucano Johnny Hooker causou polêmica ao criticar Ney Matogrosso e o que ele acredita ser uma negligência do astro em relação aos temas caros ao universo LGBT. 
Ney, em entrevista à Folha de S.Paulo, dissera o seguinte: “Que gay o caralho, eu sou é um ser humano”. 
Johnny recebeu uma saraivada de críticas, como é regra em qualquer artista jovem que critica uma vaca sagrada da MPB. Muita gente não o perdoou por afrontar Ney, um artista que encarou o mundo macho e machista da música brasileira vestido de plumas e rebolando em plena ditadura militar, à frente dos Secos & Molhados, e que, portanto, merecia mais respeito. 
Mas o posicionamento de Johnny Hooker parece ir um pouco além do puro confronto geracional. “Em 2017, é legal ser gay no Brasil? Não é legal ser gay no Brasil. O Brasil mata um LGBT a cada 25 horas”, afirmou o pernambucano.
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E Jonny Hooker fez Ney Matogrosso rosnar
“Entendi o que Ney falou, precisamos humanizar. Mas não acho que a sociedade brasileira veja os LGBTs como seres humanos.”
Em entrevista ao Correio da Bahia, Johnny Hooker foi ainda mais fundo. “É muito fácil ver um conservador falando isso. É só isso, essa é a discussão? É o mito do brasileiro cordial”, afirmou. “E também tem a coisa da figura de autoridade, né? A gente é colonizado até nisso. Como é que no Brasil as pessoas ficam inquestionáveis acima de qualquer colocação?”

Prepotência e resignação

Prepotência e resignação

por Mino Carta — publicado 14/08/2017 00h15, última modificação 11/08/2017 11h53
De exceção em exceção, as máfias fazem o que bem entendem e o povo sofre em silêncio. Caberia motivá-lo a quantos se dizem de esquerda. Fracassaram
Rovena Rosa / Agência Brasil
Lula
Lula vai excitar as praças do Nordeste. O candidato invencível. Seria também milagreiro
Ensina o professor Pedro Serrano que um Estado de Exceção pode permitir-se todas e quaisquer exceções. Tal a situação em que o Brasil precipita depois do golpe de 2016. E as exceções se multiplicam, cada vez mais daninhas. Não há lei que não possa ser desrespeitada, donde o primeiro resultado é a transformação da Justiça em injustiça. A exceção implica a cínica operação de legalizar o ilegal.
Não se justifica a surpresa, diante de um golpe perpetrado pelos Três Poderes da República com o apoio incondicional da propaganda midiática encabeçada pela Globo e de policiais transformados em jagunços da casa-grande. Deu no que deu e não se enxerga a mais pálida chance de mudança, muito pelo contrário. As máfias fazem o que bem entendem.
No momento, confirmado no Planalto o presidente ilegítimo e corrupto, trata-se de manter a casa-grande no poder excepcional concedido pela nossa Idade Média pelo tempo que lhe aprouver. E lá vem a perspectiva do golpe do parlamentarismo, já premiada pelos beneplácitos da Globo e da afinadíssima dupla Michel Temer e Gilmar Mendes. O nihil obstat eclesiástico.
O Brasil já passou por isto, quando a casa-grande, então apoiada pelas Forças Armadas, pretendeu limitar o poder de João Goulart, o vice de Jânio Quadros renunciatário e seu substituto constitucional. O parlamentarismo durou dois anos, revogado finalmente por um plebiscito histórico que devolveu o País ao presidencialismo.
O parlamentarismo na marra não passou de prólogo do golpe de 1964. A manobra esboçada no momento nasce da ausência de um candidato viável da reação e as quadrilhas no poder não querem correr riscos. Certo é que alguma exceção será lançada ao atual mar de lama e o parlamentarismo parece ser a opção excogitada por enquanto.
Parlamentarismo à francesa, à italiana, à alemã? Talvez à moda da casa. Vale lembrar a noite que a Câmara dos Deputados viveu dia 2 de agosto. Espetáculo deprimente a representar o país primitivo. Com raras exceções, surgiram na arena figuras de ópera-bufa, carentes no comportamento e na lida com o vernáculo, uma grei de paus-mandados. Pergunta um leitor na seção de cartas desta edição: e seria esta a casa da democracia? Trata-se, é verdade factual, de um circo mambembe.
Tentemos imaginar o que seria o parlamentarismo interpretado por esta trupe. De saída, além do ridículo de suas encenações, o instrumento obediente às quadrilhas para perpetuar o Estado de Exceção, sem previsão quanto à duração da desgraça. A bem das máfias. E o Brasil que se moa. De volta aos tempos da colônia, súdito genuflexo, posto à venda a preço de banana. 
A ditadura varguista durou menos do que aquela garantida pela casta dos quatro-estrelas. O PSDB chegou ao poder com a eleição de FHC, comprou votos para reelegê-lo. Vinha com um projeto de comandar ao menos por 20 anos. Durou menos do que os governos do PT, abatido pelo golpe de 2016, cujo objetivo era prender Lula, demolir seu partido e impor um Estado de Exceção com o propósito de durar ad infinitum. Instaurado o parlamentarismo, com estes Judiciário e Legislativo, o Executivo será como a casa-grande deseja.
MST e MTST
MST e MTST, solitários movimentos de uma esquerda que soube cumprir sua missão (Fotos: Marcus Leoni / Folhapress e Paulo Liebert / Estadão Conteúdo)
Pergunto aos meus desolados botões: é pessimismo demais? Não é não, respondem, mestos. O povo mostra-se incapaz de reagir, inclinado como sempre à resignação. A história oferece explicações para tanta inércia, nada acontece por acaso. Às nossas costas a terra predada pela colonização portuguesa, três séculos de escravidão, et cetera et cetera. Resultado, desequilíbrio social monstruoso. A registrar o cuidado bem-sucedido dos donos da mansão senhorial em manter a maioria na miséria e na ignorância, embora também eles estejam muito longe do saber. O Estado de Exceção baseia-se nesta situação, que, de resto, jamais permitiu uma autêntica democracia.
Ocorre-me a importância de fortes partidos de esquerda para o progresso político e econômico de países com democracia madura. Do trabalhismo britânico ao comunismo italiano, e não são os únicos exemplos. No Brasil, a esquerda fracassou. Ou porque quem se disse de esquerda mentia, ou porque foi incompetente. Cabe a partidos, tanto de inspiração marxista quanto social-democrática ou fabiana, chegar às massas para politizá-las. Não foi o que se deu por aqui.
O povo brasileiro é doutrinado pela Globo, até as telenovelas prestam-se à obra maligna, para não falar da vulgaridade reinante no vídeo do plim-plim e outros mais. Os movimentos dos sem-terra e dos sem-teto são inegavelmente de esquerda, honra a João Pedro Stedile e Guilherme Boulos. O PT, no entanto, no poder portou-se como todos os demais. Lula e Dilma deram alguns passos significativos no sentido social, tiraram milhões de brasileiros da miséria e os incluíram na sociedade de consumo. Nem por isso os conscientizaram.
O anúncio de que Lula prepara-se a um périplo por diversas praças brasileiras convém ao País. Pelo ex-presidente tenho uma amizade incondicional e nunca deixarei de estar ao seu lado. Recordo que este roteiro esclarecedor que ele se dispõe a cumprir eu o sugeria em abril de 2015. Lula é um grande líder, e não excluiria que fosse capaz de milagres. De todo modo, volto à conclusão do editorial da semana passada: o PT não existe sem Lula, mas Lula não é o PT.

A floresta como moeda de troca de Temer MAIS UM CRIME.


Meio Ambiente

A floresta como moeda de troca de Temer

por Deutsche Welle — publicado 15/08/2017 00h35, última modificação 14/08/2017 16h38
Em meio às negociações para se salvar, Temer levou ao Congresso projeto de lei que corta em quase um terço área de floresta nacional no Pará
Fotos: Clauber Cleber Caetano / PR
Temer e Blairo Maggi
Temer e o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, em plantação de algodão em Lucas do Rio Verde (MT), na semana passada
Por Sam Cowie
O presidente Michel Temer está contando com o apoio da bancada ruralista no Congresso para levar adiante um projeto de lei que (PL 8.107) visa alterar os limites da Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará. A proposta prevê a diminuição de sua área em 350 mil hectares (27%).  
Se o projeto – enviado por Temer à Câmara em julho – for aprovado, os milhares de hectares em questão deixariam de ter o status de Floresta Nacional e passariam a ser Área de Proteção Ambiental.
A trocar de status reduzirá o nível de proteção ambiental da área. Com isso, não haveria mais restrições a atividades rurais e à mineração, e aqueles que ocuparam a região ilegalmente poderiam obter o título das terras. "Isso transmite uma mensagem de que vale a pena ocupar terras públicas", afirma Elis Araújo, pesquisadora do instituto Imazon.
Ambientalistas acusam o presidente Michel Temer de usar a PL 8.107 e outras medidas como moeda em troca de apoio da poderosa bancada ruralista
A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) – entidade que representa os interesses do agronegócio – reúne 231 deputados e 25 senadores de diversos partidos e foi fundamental para que Temer se salvasse em votação na Câmara dos Deputados no início de agosto.
"De todas as bancadas no Congresso, a ruralista foi a mais leal. Isso significa que ela vai ficar ainda mais poderosa", afirma Marcio Astrini, coordenador de políticas públicas no Greenpeace Brasil. "O que já era ruim vai ficar pior."
O projeto de lei estipula que apenas terras ocupadas antes de a Floresta Nacional de Jamanxim ser declarada uma unidade de conservação, em 2006, poderiam ser regularizadas. Araújo, no entanto, diz temer que a regra seja alterada pelo Congresso, dominado por interesses agrícolas. "Será a primeira regra a cair", afirma.
O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) constatou que o desmatamento da Amazônia aumentou 29% de agosto de 2015 a julho de 2016, após cair continuamente a partir de 2005.
Alterações no Código Florestal feitas em 2012, que anistiaram aqueles que haviam participado do desmatamento ilegal, são citadas como um dos motivos para o recente aumento. O salto no desflorestamento levou a Noruega a cortar pela metade sua contribuição ao Fundo Amazônia, do qual antes era a maior doadora.
Anistia à grilagem
Especialistas afirmam que o desmatamento em massa está sendo cometido por grupos criminosos organizados e bem financiados, muitas vezes ligados a governos municipais.
Ao se apropriarem de grandes áreas de terras do Estado, eles teriam como objetivo destiná-las à criação de gado, ao cultivo de soja ou à mineração. Os grupos costumam contratar trabalhadores em condições análogas à escravidão para derrubar as árvores, que então são vendidas.
Em julho, Temer sancionou a chamada Medida Provisória (MP) da grilagem, que, segundo críticos, perdoa todas as ocupações realizadas por tais grupos criminosos. A MP prevê anistia para quem ocupou terras públicas até 2011.
Michel Temer
Temer em colheitadeira: ruralistas são parte fundamental de sua base
Ao se pronunciar sobre a medida no Congresso, o senador Romero Jucá, um dos aliados mais próximos de Temer e que apoiou a MP, falou numa dívida histórica com milhares de famílias que migraram para a Amazônia nos anos 1970 e 1980 e nunca receberam títulos das terras.
Críticos, no entanto, rechaçaram tal alegação de responsabilidade social, apontando que a nova lei concede anistia àqueles que ocuparam propriedades de até 2,5 mil hectares.
"Essas demonstrações de impunidade, de anistia, de que crimes compensam vai motivar e incentivar o avanço do crime para mais perto da floresta, resultando em mais desmatamento", diz Astrini.
Aumento da violência
Os grupos criminosos responsáveis pelo desmatamento em massa frequentemente recorrem à violência ou ameaças para expulsar populações locais que tentam resistir à ocupação e ao desmatamento.
Um relatório anual da organização de direitos humanos Global Witness, divulgado em julho, apontou que 49 ambientalistas foram mortos no Brasil no ano passado – 16 deles ligados à indústria madeireira. O número de homicídios colocou o Brasil no topo do ranking como o país mais perigoso do mundo para quem luta pelos direitos ligados à terra e a proteção do meio ambiente.
Somente no primeiro semestre deste ano, 37 pessoas foram mortas em conflitos de terras no Brasil, segundo a Comissão Pastoral da Terra. No Pará, dez trabalhadores rurais foram executados pela Polícia Militar em abril e maio deste ano. No mesmo mês, 13 indígenas da etnia gamela foram atacados por pistoleiros ligados a fazendeiros no Maranhão.
Araújo atribui o aumento da violência em parte à legislação impulsionada por Temer, a qual, segundo ela, deu luz verde a grileiros. "Os grupos criminosos usam a violência para expulsar populações locais ou pequenos agricultores sem título da terra", diz.
Entretanto, agricultores e indígenas não são os únicos atingidos pela violência. Em julho, caminhões do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) foram alvos de uma emboscada e incendiados entre Altamira e Novo Progresso, no Pará, perto da Floresta Nacional do Jamanxim.
O ataque aconteceu depois de Temer vetar, em junho, a MP 756, que reduziria a área de conservação em 37%. O veto veio após críticas de ativistas ambientais, entre eles a modelo Gisele Bündchen. A medida provisória foi, então, substituída pelo PL 8.107.

O professor Gilmar faz escola

Judiciário

O professor Gilmar faz escola


TSE
Gilmar Mendes
Gilmar Mendes: suas opiniões são públicas
Notório apreciador dos holofotes, Gilmar Mendes não se cansa de tentar influir no jogo político. Na segunda-feira 7, em entrevista à Rádio Gaúcha, o ministro do Supremo Tribunal Federal voltou a defender a revisão do acordo de colaboração premiada firmado pela Procuradoria-Geral da República com os irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da JBS.
Com o seu peculiar destempero, o magistrado foi além: descreveu o procurador-geral Rodrigo Janot como o “mais desqualificado” da história a assumir a chefia do Ministério Público Federal. 
Curiosamente, a declaração foi feita um dia antes de a defesa de Michel Temer, investigado por corrupção passiva e obstrução da Justiça, solicitar ao STF a suspeição de Janot, acusado de mover uma perseguição contra o presidente.
Na peça, o advogado Antonio Claudio Mariz de Oliveira aponta uma entrevista concedida pelo procurador-geral em julho, na qual ele promete manter o ritmo de seus trabalhos até 17 de setembro, quando deixa o cargo. “Enquanto houver bambu, lá vai flecha.

Não é de hoje que Mendes e Janot trocam ataques mútuos. Em março, o ministro do STF demonstrou uma inédita preocupação com os vazamentos de informações sigilosas da Operação Lava Jato e acusou a Polícia Federal e a PGR de antecipar à mídia os alvos de inquéritos resultantes das delações da Odebrecht, uma “forma de chantagem implícita ou explícita” dos citados.
Em afiada réplica, Janot acusou o magistrado, mesmo sem citá-lo nominalmente, de sofrer de “disenteria verbal” e “decrepitude moral”. “Procuramos nos distanciar de banquetes palacianos. Fugimos dos círculos de comensais que cortejam desavergonhadamente o poder político”, emendou.

Mendes é assíduo frequentador de jantares promovidos por caciques do PSDB e do PMDB, entre eles Michel Temer. Em 27 de junho, na véspera da escolha de Raquel Dodge para a Procuradoria-Geral da República, teve um encontro fora da agenda com o presidente.
No domingo 6, o peemedebista voltou a receber o magistrado no Palácio do Jaburu, em nova reunião às escondidas. Na noite da terça-feira 8, foi a vez de Dodge visitar Temer. Mais um convescote sem previsão na agenda do Planalto. 
Alvo de diversos pedidos de impeachment protocolados por juristas no Senado, sempre a questionar a atuação política do juiz e suas constantes manifestações fora dos autos, Mendes jamais sofreu qualquer censura efetiva pela sua incontrolável verborragia.
Na verdade, parece ter feito escola, a julgar pela proliferação de magistrados de todas as instâncias que dão pitacos sobre processos pendentes de julgamento. O mais recente episódio deu-se com Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, publicada no domingo 6, o desembargador comentou a sentença do juiz Sergio Moro que condenou Lula a 9 anos e meio de reclusão: “É tecnicamente irrepreensível, fez exame minucioso e irretocável da prova dos autos e vai entrar para a história do Brasil”.
Detalhe: está pendente de julgamento, na 8ª Turma da Corte que preside, a apelação apresentada pela defesa do ex-presidente.

O Código de Ética da Magistratura, em seu artigo 12, não deixa margem para dúvidas sobre o comportamento esperado de um juiz nessas ocasiões. Segundo o texto, na sua relação com os meios de comunicação, o magistrado deve “comportar-se de forma prudente e equitativa”, e cuidar de “abster-se de emitir opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos, sentenças ou acórdãos, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos, doutrinária ou no exercício do magistério”.
A lei parece muito clara ao dizer que o juiz só fala nos autos e, fora deles, deve portar-se de forma cautelosa, mesmo que não venha a julgar o caso específico, até para não interferir na atuação dos colegas.
Embora não vá julgar a apelação, se houver um incidente de inconstitucionalidade, Lenz poderá participar da análise de uma questão prejudicial, no âmbito do Órgão Especial, observa o advogado Lenio Luiz Streck, professor de Direito Constitucional, com pós-doutorado pela Universidade de Lisboa.
“Neste caso, por já ter antecipado o seu juízo, ele poderia ser declarado impedido. Talvez o desembargador não tenha se atentado para isso, ao conceder essa entrevista”, afirma. “Para mim, a questão é mais simbólica. O que pensa um réu quando o presidente da Corte de Apelação diz que a sentença que o condenou é irrepreensível? Como vai acreditar em um julgamento justo?”. 
Mestre em Direito pela USP e deputado federal pelo PT de São Paulo, Paulo Teixeira critica as conclusões de Lenz, que, na mesma entrevista ao Estadão, admitiu não ter lido os autos do processo. “Ora, como um desembargador pode se manifestar publicamente sobre um processo sem ao menos ter lido? Baseado apenas no que ouviu dizer?”, indaga.
Em tom irônico, Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula, reconheceu que a sentença de Moro de fato entrará para a história, mas pelas “grosseiras violações a direitos fundamentais”. 
Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC de São Paulo, observa que a determinação do Código de Ética não tem sido respeitada nos últimos anos, sem qualquer sanção aos infratores. “O juiz não pode falar sobre processo pendente de julgamento, tampouco exercer atividade partidária, mas pode falar, como cidadão, sobre qualquer outro tema”, diz.
“Hoje vemos uma seletividade na aplicação da norma. No Conselho Nacional de Justiça, há processos contra magistrados que se manifestaram, como cidadãos, contra o impeachment de Dilma Rousseff, ao passo que para outros casos, mais graves, de manifestações sobre processos em andamento, não há nenhum tipo de apuração.” 
Em junho, a Corte Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro arquivou o procedimento disciplinar instaurado contra quatro magistrados que, no dia 17 de abril, data da abertura do impeachment de Dilma pela Câmara dos Deputados, questionaram a legalidade do processo em carro de som na Praia de Copacabana. Haverá, contudo, um reexame pelo CNJ.

“O Brasil é outro mundo”, resumiu Herta Daubler-Gmelin, ministra da Justiça na Alemanha entre 1998 e 2002, em entrevista à agência Deutsche Welle. “Não é comum ver juízes interferirem nas disputas políticas cotidianas na Alemanha. Isso não pode acontecer de forma alguma, compromete a neutralidade do juiz, sua independência e até jurisdição”, afirmou.
Ao mesmo tempo mostrou-se surpresa com a sobrevivência política de Temer. “Nunca aconteceria na Alemanha de um presidente sob suspeita de corrupção, com denúncia apresentada pela própria Procuradoria-Geral da República, não renunciar imediatamente ao cargo.” 
Não apenas na Alemanha. Na verdade, a situação é impensável em qualquer democracia madura.