quarta-feira, 15 de junho de 2016

O resgate secreto de Giocondo Dias

O resgate secreto de Giocondo Dias

Na última parte de sua entrevista, José Salles explica como conseguiu retirar Giocondo Dias do país após o cerco dos militares e conta detalhes de reunião histórica do Comitê Central do PCB
Atualizada às 22h25

Opera Mundi publica, neste domingo, a última parte de uma longa entrevista concedida, em janeiro de 2015, pelo militante do PCB José de Albuquerque Salles, para um projeto em andamento de um livro. Na primeira parte, Salles falou sobre a conjuntura política por volta de 1964, quando Jango foi derrubado. Na segunda, Salles comentou o processo de estruturação da repressão durante o regime militar e avaliou como disputas políticas internas atrapalharam a organização do partido na resistência contra a ditadura. Agora, ele conta como conseguiu retirar o militante Giocondo Dias do país. Além disso, Salles escreveu um artigo, que acompanha esta entrevista, chamado "Apontamentos para a memória do Partidão".
“Tenho uma carta aqui, para um amigo, um conterrâneo baiano”, disse o homem, anônimo, para o alfaiate. O encontro surpresa aconteceu em sua pequena loja , localizada em Madureira, no subúrbio do Rio. Ele negou prontamente conhecer a pessoa procurada. Sem discutir ou apresentar outro argumento, o visitante desconhecido insistiu com elegância. “Tudo bem. Deixarei a carta aqui. Não se aborreça, não”. E foi embora.
Naquele ano de 1975, o Brasil vivia o período mais duro de repressão contra o Partido Comunista Brasileiro (PCB), chamado à época de Partidão. Neste clima de terror iminente, de linha dura da ditadura, qualquer palavra dita da maneira errada pelo homem que carregava a carta poderia assustar o alfaiate e encerrar a conversa antes da hora. Sem ligação com nenhum partido ou envolvimento com política, o alfaiate de Madureira não se arriscaria a receber dentro de casa o desconhecido.
A história começara antes, na França, quando o o homem anônimo recebeu as instruções de como proceder. “Eu pedi pra esse francês - que eu esqueço o nome, sei que ele morava na Ilha de Saint Louis: ‘Olhe, não diga claramente. Se você dizer claramente, o cara vai te mandar embora’”, conta José de Albuquerque Salles, integrante do Comitê Central do PCB, que escreveu a carta e sugeriu o modo de ela ser entregue em Madureira.
A entrega do documento era parte do plano de resgate de Giocondo Dias, militante comunista desde os anos 1930 e uma das principais lideranças do PCB à época, que conseguira se refugiar no subúrbio carioca, isolado dos demais companheiros. Após a queda das gráficas e de quase todos os membros da Direção no Brasil, o cerco militar se aproximava de Giocondo, e sua morte era um risco iminente. 
Fora do Brasil, Salles tentava localizar o amigo e companheiro de militância.
“Eu me lembro que nós tomamos a decisão de pegá-lo. Não foi decisão da direção não”, explica Salles. “Eu tenho uma opinião muito elogiosa sobre o Dias, sobre a capacidade política dele. E éramos muito amigos. Pesou a valorização política e eu disse: então vou buscar!"
Do exílio, onde dividia sua morada entre as cidades de Moscou e Paris, Salles planejava encontrar Dias no Brasil, convencê-lo da fuga e, por meio de uma fronteira, retirá-lo. Para aumentar a segurança da ação, a operação de resgate era secreta, sem participação ou apoio estrutural do PCB. A ajuda veio apenas do Partido Comunista Soviético que, além de fornecer recursos financeiros, mobilizou o Partido Comunista Argentino para apoiar a operação.
“Minha ideia geral era localizá-lo", conta Salles. Como não sabia exatamente onde ele estava e qual era a segurança do apoio com que Dias contava, Salles planejou um recuo  recuo para outro lugar. Não era possível contar com o partido no Brasil, e era preciso tirá-lo do Brasil, pela fronteira. 
Reprodução/YouTube

Salles conseguiu retirar Giocondo Dias do país em meio à ditadura militar
Encontrar o paradeiro de Giocondo no período de clandestinidade, no entanto, não era fácil. Uma das estratégias para pesquisa, à distância, era enviar mensageiros "civis", sem participação na organização partidária, com cartas endereçadas para pessoas-chave, com quem Dias mantinha amizade ou outro tipo de relação.  A ideia de procurar o alfaiate, que não tinha qualquer ligação com o PCB, veio de Armênio Guedes, dirigente do Partido, que lembrou da amizade de Dias com o costureiro do subúrbio carioca.
“O Armênio, que era muito amigo dele [Giocondo Dias], me disse: ‘olha, talvez ele esteja com o alfaiate em Madureira’. Disse que era muito amigo dele e tal”, conta Salles. “Ele [Giocondo Dias] teve a habilidade de saltar para algum tipo de recuo não vinculado à organização partidária. Tinha que ser artesanal, fora dos circuitos que podiam estar contaminados. Ele teve essa inteligência”, completa.

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A carta foi escrita pelo próprio Salles, com informações que só poderiam ser reconhecidas por Dias, e deixada com o alfaiate em agosto de 1975. A resposta chegou em Paris, na França, em janeiro de 1976, por meio de uma caixa postal via caixa postal, método que ampliava a segurança das trocas.
A carta-resposta chegou às mãos de Salles, que estava em Moscou para uma reunião de cúpula do PCB, por meio do hoje senador paulista Aloysio Nunes (PSDB-SP). Atualmente um dos principais quadros do campo conservador da política brasileira, naquele momento Nunes era um militante comunista de absoluta confiança dos líderes do partido.
“Ele pegou um avião levando a carta para mim em Moscou, em janeiro de 76. Eu me lembro da Praça Vermelha, num frio danado. E o Aloysio com sapato de sola comum, brasileiro, morrendo de frio. Ele era muito engraçado, muito espirituoso. Tá numa direita doida, né? Mas éramos muito amigos. Ele foi casado com uma prima minha. Chegamos a morar juntos em Paris”, conta Salles.
Localizado, Dias foi informado sobre as intenções de retirá-lo do país para garantia de sua própria segurança, e topou sair clandestinamente do Brasil. Por solicitação dos soviéticos, os comunistas argentinos estavam organizados para fazer todo o esforço necessário ao sucesso da operação.
“Não discutiram, não sugeriram, não propuseram. Foram extremamente profissionais", lembra Salles. "Aí eu fui para lá, fiquei três meses. Fevereiro, Março e Abril, quando os argentinos me deram um casal, que também não tinha militância política, já de certa idade". Esse casal teria a missão de pegar Dias no Rio de Janeiro e levá-lo à Argentina, que ia entrar em um carrão e ir até o Rio, através da Zulma [Taveiros Guimarães], irmã do Albertinho [Alberto Passos Guimarães Filho]”, relata. 
Segundo Salles,  praticamente todos que participaram no resgate o fizeram mesmo sem nunca terem visto Dias antes, apenas por amor à causa, sem pedirem remuneração alguma pela participação. O dinheiro enviado pelos soviéticos foi usado, entre outras operações, para a compra de um Ford Falcon na Argentina. O casal foi ao Rio de Janeiro com o veículo. Na capital fluminense, com apoio de Zulma, encontraram Dias que, com um documento argentino falso, conseguiu passar pela fronteira do Brasil no retorno do casal para solo portenho.
“Ele chegou fraco, magrinho. Contente de ter sobrevivido, mas tenso, nervoso. Porque ele sabia que tinha responsabilidade nas quedas. E não sabia como a direção ia tratar ele. Conversamos um pouco. Quando eu volto atrás, me arrependo de não ter conversado mais, ter uma postura mais calorosa”, lamenta.
Da Argentina, Salles e Dias foram para Assunção, no Paraguai. De lá, pegaram um avião para Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia. Em outro avião, foram para Quito, no Equador, onde passaram a noite. No dia seguinte, um avião da Air France os levou para a cidade de Genebra, na Suiça, onde encontraram Armênio Guedes e Zuleika Alambert, dirigentes comunistas que já estavam exilados.
A primeira reação dos companheiros – os quais sequer sabiam do resgate – com o sucesso da operação foi de alegria. Fora do país, Dias não corria mais risco de morte.
Em reunião realizada em Moscou após o resgate, influenciado por Luís Carlos Prestes, o Comitê Central chegou a abordar a possível aplicação de uma punição contra Dias por conta da queda da maior parte dos integrantes do Comitê Central. Alguns integrantes da cúpula comunista responsabilizavam Dias pelo ocorrido. Salles se opôs. “Resolvi não apoiar isso", lembra. Na sua avaliação, um porcesso do gênero poderia acabar com Dias politicamente. "Seria injusto com ele.”
Giocondo Dias, o Cabo Vermelho, foi uma das vozes contra a luta armada no Comitê Central do PCB (Foto: PCB.org)
Giocondo Dias, o Cabo Vermelho, foi uma das vozes contra a luta armada no Comitê Central do PCB (Foto: PCB.org)
A decisão de Salles também era uma estratégia de defesa política. Além de não querer destruir seu amigo, ele avaliou que a eventual saída de Dias do Comitê Central fortaleceria o grupo que se articulava em torno de Prestes. Para Salles, isso deixaria o Comitê Central "totalmente na mão de Prestes e do grupo dele."
Caso Salles
O sucesso da operação secreta para o resgate de Dias projetou o aumento da força política de Salles dentro do Comitê Central. No final de 1978, foi eleito Coordenador da Comissão Executiva do Comitê Central do partido. Após a eleição, problemas de saúde e uma pressão arterial que chegou a 18x16 o forçaram a tirar alguns dias de férias, com sua companheira, para descansar no México, onde estavam instalados sua mãe e seu irmão.
Antes disso, deixou, entre as orientações aos partidários com quem trabalhava para que mantivessem contato com Victória Monofi. Filha de um importante importador de grãos argentino, a jovem era amiga de Marieta, noiva de Salles. Na época, ele pretendia articular, com o pai da moça, a exportação de grãos da Argentina para países socialistas.
“A Victória chegou e pediu um dinheiro. O que eu poderia até emprestar. Ao lado disso, ela pediu um passaporte. Isso foi um absurdo. Ela não falou comigo e eu não pedi para ninguém dar passaporte. Era um negócio extremamente restrito”, conta Salles.
As acusações que recaíram sobre a amiga da noiva de Salles eram de que a jovem argentina havia pedido dinheiro e um passaporte falso. Além disso, alguns líderes do PCB acreditavam na possibilidade de que Victória estivesse envolvida com drogas. Nenhuma das suspeitas foi confirmada.
“Nunca ninguém a viu (Victória) portando ou usando drogas. Nunca ninguém do CC ou que eu conheça, disse isto. Nunca foi presa. No processo de discussão, ninguém disse isto. O pessoal do Prestes disse que ela lhes tinha dito que tinha a ver com drogas. Não sou grande conhecedor da moça, Não a propus para coisa nenhuma e não posso ser responsabilizado por qualquer miséria que ela tenha dito. Em nenhum momento, no caso Salles, ninguém deu a informação que a tinha visto com drogas, usando ou portando, ou vendendo. Nem que ela tenha sido presa; nem que talvez tenha acontecido isto”, explica Salles.
Luís Carlos Prestes, ao lado de sua filha, Anita Prestes, e Marly Viana e seu marido, o espanhol Ramon Peña, abriram guerra contra Salles. Sob a acusação de que ele envolvera-se com traficantes de drogas, reuniram o Comitê Central em fins de 1978 ou início de 1979 (há versões contraditórias sobre a data), em Praga (Hungria), para, entre outras decisões, propor a investigação do caso e discutir a expulsão de Salles do PCB.
Anita, Prestes e a Marly foram para a reunião do Comitê Central com duas propostas. Uma era expulsar Salles do Partido. A outra, substituir o Comitê Central por uma comissão até o próximo Congresso, com membros indicados pelo próprio Prestes.  As propostas foram negada por ampla maioria e, por 17 votos a 4, o Comitê Central votou contra a saída de Salles.
“Nunca tive amigos que tenham a mais leve proximidade com drogas, nunca usei, e nunca nem vi , em minha vida. Foi eleita uma comissão no CC para investigar, e fui absolvido, pois nem a mais leve acusação foi comprovada”, destaca Salles. Sem punições formais, o resultado concreto daquela reunião, no entanto, acabou se materializando em uma dura crítica da cúpula de dirigentes sobre a atuação de Salles na direção do Partido. O episódio freou sua ascensão política dentro do PCB.
Após estar reunião do Comitê Central e o período no cargo de Coordenador da Comissão Executiva, José Salles não mais se candidatou a nenhum cargo de direção dentro do Partido. Continuou sendo reeleito membro do Comitê Central por quase dez anos, até meados da década de 80. “Passei à condição que o Armênio Guedes chamava de comunista avulso, sem partido”, conta. Salles passou um tempo a trabalho na Rússia, cursou a Faculdade de Relações Internacionais das Belas Artes e, na França, trabalhou no seu doutorado, que não concluiu. Desde então, diz conversar muito sobre política com seus amigos, sejam comunistas ou não.

Fonte: Opera Mundi

Itamaraty exonera diplomata que enviou mensagens ao exterior com alerta sobre golpe no Brasil


Itamaraty exonera diplomata que enviou mensagens ao exterior com alerta sobre golpe no Brasil


Coordenador-geral de Ações Internacionais de Combate à Fome, Milton Rondó Filho havia enviado telegramas a postos fora do país sobre possível golpe
Atualizada em 15/06 às 09h54
O Ministério das Relações Exteriores exonerou de seu cargo nesta terça-feira (14/06) o diplomata Milton Rondó Filho, que em março enviou mensagens a embaixadas e representações brasileiras no exterior sobre a possibilidade de um golpe de Estado no Brasil. 
A informação sobre a exoneração de Rondó, ministro de segunda classe que atuava como coordenador-geral de Ações Internacionais de Combate à Fome da Secretaria Geral das Relações Exteriores, foi publicada no Diário Oficial da União desta terça. Ele perde o posto de coordenação, mas continua diplomata.

Há quase três meses, Rondó recebeu uma advertência do Itamaraty, ainda sob a liderança do então chanceler Mauro Vieira, e perdeu o direito de emitir documentos após ter enviado, no dia 18 de março, telegramas a postos diplomáticos do Brasil no exterior alertando para a ocorrência de um possível golpe contra a presidente brasileira, Dilma Rousseff.
Segundo matéria do jornal O Globo, na primeira mensagem enviada, o Itamaraty pedia que cada embaixada ou representação indicasse um servidor, preferencialmente um diplomata, para ser responsável por “apoiar adequadamente” o diálogo entre o Itamaraty e as sociedades civis do Brasil e de cada local.

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Em seguida, outro comunicado foi enviado, desta vez com a reprodução de uma nota da Abong (Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais), que agrega 250 ONGs. O texto expressava “profunda preocupação” com o momento do Brasil, que segundo as entidades era de “resistência democrática”.
Outra mensagem trazia o texto “Carta aos Movimentos Sociais da América Latina”, em que organizações sindicais, sociais e populares do Brasil denunciavam um “processo reacionário (...) contra o Estado Democrático de Direito”.
De acordo com a matéria de O Globo, no mesmo dia, o secretário-geral do Itamaraty, Sérgio Danese, enviou um documento às embaixadas e representações solicitando que os comunicados anteriores fossem desconsiderados.
O Itamaraty também, afirmou, na época, que as mensagens haviam sido enviadas sem autorização superior.
Procurado para maiores esclarecimentos sobre a exoneração de Rondó, o Itamaraty informou, por meio de mensagem, que a exoneração se trata de "substituição natural de um ocupante de cargo em confiança, e da movimentação habitual de membro do Serviço Exterior Brasileiro". Segundo o comunicado, a pasta designará nova função para o diplomata.

Fonta: Opera Mundi

A vida em um trailer: sem dinheiro para casa própria, moradia sobre duas rodas vira opção para mais pobres nos EUA

A vida em um trailer: sem dinheiro para casa própria, moradia sobre duas rodas vira opção para mais pobres nos EUA


Em 1975, 9 milhões de norte-americanos viviam em trailers, e hoje já chegam a 20 milhões; parques para habitações móveis acolhem casais pobres, cujos ganhos anuais eram, em 2011, metade da renda média nacional
No minúsculo jardim que cerca sua casa, Francisco Guzman não tem o direito de deixar objetos caírem no chão. Também não pode dispensar o lixo antes do dia da coleta nem ouvir música. “Se eu quiser ter um animal de estimação, ele não deve passar dos 40 cm de altura. E se quiser acolher alguém, mesmo meu irmão ou minha mãe, preciso pedir autorização ao gerente. É incrível, mas ainda assim estou em minha casa!”. Guzman e sua esposa possuem realmente uma moradia, um trailer de dois quartos, mas alugam o terreno num parque de casas móveis em Aurora, Colorado.
Para ocupar um dos 440 terrenos, o jovem casal paga US$ 500 por mês, além de mais US$ 250 de prestação pelo empréstimo de oito anos contraído para adquirir sua moradia de três cômodos e 75 m2. A arquitetura é típica dos trailers dos anos 1970: teto plano, paredes externas de alumínio e fachada branca encardida pelo tempo. “O aluguel inclui água corrente, rede de esgoto e coleta de lixo; há até uma pequena piscina coletiva”, esclarece o jovem. “Eu preferiria, é claro, ter uma casa de verdade, com um jardim de verdade, sem vizinhos a cinco metros de distância. Mas por esse preço, em Aurora, é impossível”. A renda dos Guzman é modesta: entre um emprego num posto de gasolina para ele e alguns turnos numa empresa de limpeza para ela, os dois ganham US$ 2 mil por mês. 



Wikicommons

Parque de trailers em West Miami, na Flórida

É muito pouco para viver nesse subúrbio residencial sem beleza nem atrativos, mas perto da dinâmica capital do Estado, Denver, onde os preços dos imóveis aumentaram 50% desde 2012. Em outubro de 2015, em Aurora, nenhuma casa estava para alugar por menos de US$ 1 mil, e a mais barata para comprar precisava de reforma completa e custava US$ 130 mil. Na mesma ocasião, um trailer de tamanho equivalente, construído em 1973, estava à venda por US$ 14,5 mil, com os aluguéis nos parques oscilando entre US$ 400 e US$ 600 por mês. “No momento, todos os terrenos estão ocupados. É preciso entrar numa lista de espera. Mas a rotatividade é grande e a coisa pode ser rápida”, assegura-nos o gerente do Friendly Village.
Aurora tem nove parques grandes e mais de 2,5 mil terrenos para trailers. Quase todos estão situados nas imediações da Avenida Colfax, num bairro periférico e pouco atraente da cidade: Hillcrest Village, propriedade da empresa Equity Lifestyle Property, líder do setor com 140 mil lotes no país; Green Acres, que só abriga idosos; Foxbridge Farm, Cedar Village, Meadows etc. Nem esses nomes evocadores de um panorama campestre[1]nem os esforços dos moradores para decorar suas fachadas com bandeirinhas norte-americanas, estátuas da Virgem Maria ou flores conseguem disfarçar a monotonia do urbanismo.
Como os bairros populares, os parques de trailers são concebidos contrariando a trama urbana clássica, separados do resto da cidade, com sistema de limpeza, sinalização e administração próprios. Ruelas mais ou menos bem asfaltadas ladeiam lotes retangulares dispostos perpendicularmente à via principal e separados uns dos outros por uma pequena cerca, uma corrente ou mesmo um simples risco no chão. Cada moradia é identificada por um número que figura no endereço de seus ocupantes, junto com o nome do parque. “Às vezes, gostaríamos de não dizer que vivemos num parque, mas, quando veem nosso endereço, todos ficam sabendo”, lamenta Guzman. “E isso pode causar problemas. Alguns pensam: ‘Hum, ele mora num parque de trailers, não vou contratá-lo porque terei problemas’”.
Habitações sociais sem custo para o governo
Adquirir um trailer nos Estados Unidos é operação simples e barata. Diferentemente de uma casa comum, construída no próprio local por pedreiros, eletricistas, carpinteiros, encanadores etc., ele é inteiramente feito numa fábrica por operários semiqualificados. Sai da linha de montagem pronto para uso, a um preço que desafia qualquer concorrência. E, como se desgasta e se desvaloriza com o tempo (à semelhança de um carro), os modelos 1960 ou 1970 podem ser negociados por menos de US$ 10 mil. No caso dos modelos mais novos, o menor preço é US$ 25 mil (70 m2), frete incluso. Vinte milhões de norte-americanos, dos quais 23% aposentados, vivem hoje nesse tipo de alojamento contra nove milhões em 1975. Os Estados Unidos têm sete vezes mais trailers (8,6 milhões de unidades) que moradias de aluguel social (1,2 milhão)[2]. Acolhem casais pobres, cujos ganhos anuais eram, em 2011, metade da renda média nacional (US$ 26 mil contra US$ 52 mil)[3]. Funcionam como casas populares a custo zero para os poderes públicos, que não precisam construir nada, mas dão muito lucro aos fabricantes.
“O problema não é comprar um trailer, é descobrir um lugar para instalá-lo”, adverte um empregado da loja Clayton Homes, a primeira a vender “casas pré-fabricadas” nos Estados Unidos. A esmagadora maioria das cidades norte-americanas aplica regras de zoneamento rigorosas, que limitam as possibilidades de instalação em terrenos particulares a alguns setores bem precisos e já saturados. Como esses alojamentos têm a fama de desvalorizar os terrenos próximos, os prefeitos evitam cuidadosamente sua proliferação. A menos que se disponham a ir para as zonas rurais, muitos proprietários se veem, então, obrigados a recorrer aos parques particulares, que abrigam 12 milhões de norte-americanos[4].


Reprodução/Facebook

Trailer de 1986
À medida que nos aproximamos do Novo México, onde a proporção de casas móveis no volume total de alojamentos ultrapassa 15%, os trailers vão se fazendo mais presentes. Espalham-se ao longo das grandes rodovias e das estradas rurais, onde há menos construções e as regras de zoneamento são mais frouxas. Em Trinidad, agrupam-se em uma dezena de parques situados na periferia da cidade, em terrenos baratos. De dimensões modestas, esses aglomerados não lembram acampamentos militares e não têm o caráter impessoal dos parques de Aurora. Em muitos deles, encontramos o proprietário, que não mora longe.
Cidadezinha de oito mil habitantes perdida nas montanhas baixas do Colorado, perto da divisa com o Novo México, Trinidad conheceu seus momentos de glória no início do século XX graças à exploração de carvão e à chegada da ferrovia. Mas, desde a Segunda Guerra Mundial, o município perdeu 40% de sua população e só restam uns poucos vestígios da antiga prosperidade: o velho grand hôtel da rua principal, a majestosa biblioteca construída em 1904 graças a uma doação do barão do aço Andrew Carnegie e a locomotiva a vapor exposta no estacionamento do supermercado. “Empregos não existem. Vivo aqui há cinco anos e nunca vi um contrato de trabalho de mais de dois meses”, confirma Jacqueline Johnson. Por muito tempo funcionária de um hospital de Las Vegas, ela deixou Nevada após se separar do marido, em 2010. Foi então morar com uma meia-irmã, que residia num quarto de motel. “No começo, passamos dois anos no mesmo cômodo, com o fogão encostado na cama. Depois, alugamos este trailer por US$ 550 mensais. É muito caro, mas temos três quartos e uma cozinha de verdade, podendo comer ao ar livre quando o tempo está bom”.
Uma comunidade propícia a fofocas
Com benefícios sociais e alguns bicos, as irmãs ganham cerca de US$ 2 mil por mês. “Pagas as contas e a alimentação, não nos resta quase nada. E só temos um carro para as duas”. Um grande problema: dali, não se pode ir a lugar nenhum a pé, afora um restaurante chinês e seu self-service aberto o dia inteiro. “Quando preciso do carro e minha irmã ainda não chegou, fico louca da vida”, confessa Jacqueline. “Mas aqui todos se conhecem e sempre há um vizinho para nos dar carona. Um parque de trailers é uma verdadeira comunidade”.
Segundo Harry Vallejos, chega a ser “uma pequena família”. Esse aposentado mora no parque Cedar Ridge de Trinidad, onde paga US$ 250 por mês. Com uma doença que reduz sua capacidade de movimento, passa a maior parte do tempo no parque e conhece todos os moradores. Pode dizer o que cada um faz, sua situação familiar e suas opiniões políticas: Annie McDaniel, que com 91 anos não pode mais dirigir e recebe a visita da filha duas vezes por semana; o casal Harold e Hannelore Thomason, de 85 anos, que já mora no local há quatro décadas etc…
Wikicommons

Parque Meadow Lanes em Ames, no Estado de Iowa, durante enchente em 2010
A vida num parque de trailers não oferece a intimidade de uma casa comum, onde as pessoas podem se refugiar no quintal, nem o anonimato de um prédio de apartamentos. Com um simples olhar pela janela, o morador fica sabendo se o vizinho está em casa ou foi trabalhar, se tem visitas ou se sua calha entupiu. Não é raro ouvir vozes estridentes e batidas de portas. Essa vida comunitária, ao mesmo tempo que enseja uma sociabilidade de vizinhança, favorece igualmente a disseminação de boatos e fofocas.
Cedar Ridge abriga cerca de vinte casas, a maior parte ocupadas por proprietários idosos. Os raros moradores mais jovens – como a família chegada há pouco do Texas e um homem que só ocupa seu trailer alguns meses por ano – despertam suspeitas dos mais velhos. “Há um ir e vir sem fim na casa deles e eu preciso prestar muita atenção no que é meu”, confidencia Vallejos, que assegura, no entanto, viver “na melhor comunidade das redondezas”.
Por nada no mundo esse aposentado moraria no parque Almar, que goza de má reputação. Na primavera de 2015, a polícia matou lá um rapaz negro que se escondera numa barraca abandonada. O caso, que causou furor nas TVs locais, continua na lembrança de todos. “Patrulhamos constantemente esse lugar, ora eu, ora meu marido”, garante a gerente para tranquilizar os potenciais locatários. “Meu filho trata da manutenção e faz rondas, e sua namorada também. O pai de Nicky [uma moradora do parque] é inspetor de polícia e meus irmãos também moram aqui… Todo mundo vigia todo mundo. Não é raro eu expulsar algum locatário por mau comportamento!”. Segundo ela, o parque Lakeside é que deveria ser evitado.



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Aberto há quinze anos, este se resume a um vasto quadrado de terra e cascalho que se transforma em lama quando chove. O lote custa US$ 150 por mês; pagando-se mais US$ 300, é possível ter também um trailer velho de três quartos. Fato curioso em Trinidad, vários terrenos estão vazios, embora seu custo seja o mais baixo da cidade. “Ninguém quer morar lá. Há problemas de drogas, brigas, tiros. É muito ruim para o bairro”, analisa uma vizinha, proprietária de uma casa despretensiosa a 200 metros do parque. Quando lhe pedimos que relate fatos concretos, ela hesita, diz “ouvir sirenes frequentemente” e termina por declarar, irritada, que “não gosta de jornalistas”. Antes do fim da conversa, admite nunca ter posto os pés naquele parque e não conhecer nenhum de seus locatários.
Trailer trash
Chamados pejorativamente de trailer trash (lixo de trailers), esse tipo de moradia e seus habitantes sempre tiveram uma imagem negativa nos Estados Unidos. Embora abriguem 8,7% de afro-americanos, são associados ao subproletariado branco, aos “refugos brancos”[5], mais ou menos como os bairros de casas populares, no imaginário norte-americano, são associados aos negros. A história começou no período entreguerras, quando os vendedores ambulantes, os trabalhadores agrícolas e os operários da construção civil que percorriam o país em carroças eram acusados de ofender a boa moral e não pagar impostos nas cidades onde se instalavam. Em 1937, a revista Fortune ainda torcia o nariz para essas “colônias superpovoadas de sórdidos hotéis itinerantes”[6].

 Parque de trailers em West Memphis, Arkansas
A população dessas habitações mudou a partir dos anos 1950 com a entrada no mercado de trailers de três metros de largura (antes, tinham apenas 2,40): a partir de então, não era mais preciso passar pelo primeiro quarto para chegar ao segundo. Num contexto de crise de moradia, esse ganho de intimidade levou muitos norte-americanos de renda modesta, em especial idosos e jovens casais de funcionários, a fazer dos trailers seu domicílio fixo e permanente. Os fabricados hoje medem até cinco metros de largura; existem modelos de luxo em parques para aposentados da Flórida e da Califórnia, com vista para as marinas e campos de golfe. De resto, oficialmente não são mais chamados trailers, e sim de “casas pré-fabricadas” (manufactured homes).
Todavia, uma distorção semântica orquestrada por alguns industriais raramente consegue mudar sua imagem: eles continuam a ter má reputação. Na televisão, os noticiários locais cobrem o tempo todo as desgraças (tiroteios, incursões policiais, venda de drogas…) que ocorrem nos parques. Na internet, encontramos o Trailer Park Boys, um programa transmitido há quinze anos no Canadá e nos Estados Unidos. Realizada na forma de um falso documentário, essa série apresenta personagens imbecis e violentos que dividem seu tempo entre pequenos delitos e a cadeia. No cinema, filmes de sucesso como “Meninos Não Choram” (1999) e “Rua das Ilusões” (2002), que conta a juventude do rapper Eminem, também põem em cena lugares onde a violência é onipresente. Mesmo o quadro um pouco mais leve que o escritor Russell Banks pinta de uma comunidade de New Hampshire, em seu livro “Trailerpark” (1981), retoma os temas das drogas e do álcool.
Com tal imagem na cultura popular, não espanta que inúmeros habitantes de Trinidad tenham sua opinião dos ocupantes dos trailers. “Dizem as maiores barbaridades sobre nós”, lamenta uma moradora de Lakeside, que prefere ficar no anonimato. “A maior parte das pessoas aqui é honesta e trabalha duro; é um bom lugar para viver. Mas há muitos trailers para alugar e os ocupantes mudam. Nada mais normal então que apareçam maus elementos. Agora, temos jovens que fumam maconha o dia inteiro. Eles têm um cachorro bravo que late sempre que alguém passa”. A moça censura ainda a proprietária, uma professora aposentada que mora também em Trinidad, por certa irresponsabilidade na escolha dos locatários, dos quais nenhuma garantia seria exigida: “Ela só quer encher os terrenos vazios e pouco se importa com quem vem morar aqui. De qualquer modo, não liga nada para o parque. Quando há um problema, nunca aparece; não cumpre sua obrigação”.
Expulsos em 72 horas
Segundo Dave Anderson, diretor executivo da associação All Parks Alliance for Change, que defende os interesses dos proprietários de trailers, esse caso é típico das moradias situadas em zonas rurais. “Nas áreas metropolitanas”, explica, “onde é alta a densidade demográfica e os preços dos terrenos são caros, o risco para os ocupantes é que os aluguéis aumentem com frequência ou que alguém os expulse para favorecer um projeto imobiliário mais lucrativo. Nas comunidades rurais, esses problemas realmente não existem. Mas os pequenos proprietários possuem capital muito limitado para administrar seus parques e nem sempre conseguem fazer os reparos necessários quando surgem graves problemas de água ou esgoto”. Mas viver num parque familiar, em uma cidade pequena, não deixa a pessoa, forçosamente, livre de aumentos repentinos. Por exemplo, em Almar de Trinidad, os aluguéis subiram 10% em novembro último, passando de US$ 220 para US$ 245 sem razão aparente, e isso quando já tinha ocorrido um aumento há dois anos…
É uma das primeiras coisas que Frank Rolfe ensina aos alunos de sua “universidade dos trailers”: na maioria dos Estados, nenhuma lei impede um proprietário de parque de aumentar seus aluguéis, desde que avise os locatários com algumas semanas de antecedência. Esse diplomado em Economia pela Universidade da Califórnia em Stanford fez fortuna investindo, com seu sócio Dave Reynolds, em terrenos para trailers. Partindo do nada em 1996, orgulha-se de ser hoje o sexto maior empresário do setor, com 170 parques espalhados pelo país. “Exceto na Califórnia, na Flórida e no estado de Nova York, onde as leis são favoráveis demais aos locatários”, explica.
Reprodução
Divulgação de um dos trailers vendidos pela empresa 
Clayton Homes 
Ansiosos por transmitir sua experiência, Rolfe e Reynolds dão um curso intensivo de três dias, por US$ 2 mil, no qual ensinam os rudimentos da gestão de um parque: não permitir atrasos de aluguel, cobrar multas por infração às regras, evitar a instalação de lavanderias ou serviços coletivos que possam gerar custos inúteis, expulsar locatários indesejáveis... “Os alunos são geralmente executivos cinquentões decepcionados com os lucros de seus investimentos na Bolsa. Esse é um bom momento para entrar no mundo dos negócios, pois nossa economia está em crise há anos e há forte demanda por moradia barata”, analisa lucidamente Rolfe. O método dos dois compadres segue o das imobiliárias quando ocorrem operações de renovação urbana: eles compram parques, sobretudo os de “mamãe e papai”, pertencentes a pequenos proprietários que não os exploram bem, melhoram sua aparência, instalam alguns serviços suplementares e pedem aluguéis mais elevados.
Os locatários ficam impotentes diante desses aumentos. Desde que passaram a medir três metros de largura, os trailers são difíceis de transportar: um carro não basta, é preciso utilizar um caminhão especial, quase sempre mais largo que as estradas comuns. A operação custa vários milhares de dólares; muitos residentes preferem, assim, comprar um trailer novo a deslocar o velho. A imobilidade dessas casas “móveis” fragiliza os ocupantes, que não podem ameaçar ir embora quando o proprietário cuida mal do terreno ou aumenta o aluguel.
Emily Montoya[7] não sabe onde acharia o dinheiro necessário caso precisasse sair de Raton, uma cidadezinha de 6,5 mil habitantes no norte do Novo México, onde aluga um terreno por US$ 150 ao mês. A jovem, que mora com os filhos e o companheiro, não trabalha e o casal não tem nenhuma poupança. No entanto, talvez precise se mudar logo. O Parque das Colinas Encantadas – situado ao lado do cemitério municipal… – foi posto à venda: US$ 320 mil por oito hectares de terreno e 46 lotes. “Fiquei sabendo disso um dia ao voltar para casa: avistei uma tabuleta de ‘vende-se’ na entrada”, conta. “Ignoramos quem vai comprar ou o que será feito disto aqui; só não ignoramos que nos falta dinheiro para a mudança”.
Os vizinhos de Emily temem a mesma coisa, pois, no Novo México, a lei pouco protege os locatários de parques. Eles podem ser expulsos em 72 horas caso não paguem o aluguel; em um mês, caso não respeitem as regras ou “perturbem os outros”; e, quando um parque fecha suas portas, recebem simplesmente um aviso prévio de 60 dias. “Em alguns Estados, como Minnesota, se você precisa mudar e sua casa está em condições ruins demais para ser deslocada, o proprietário tem de lhe pagar uma compensação financeira. Às vezes, você pode até se juntar aos outros moradores para comprar o terreno a preço de mercado e fundar uma cooperativa. Contudo, quase sempre não existe garantia alguma para os locatários”, diz Anderson. O parque de Raton muito provavelmente permanecerá aberto: o lugar não atrai incorporadores e o melhor a fazer quando se possui um terreno situado em zona liberada para trailers ainda é alugar os lotes um a um.
Na Califórnia, a situação é inversa: a lei protege bem locatários, mas os incorporadores são muitos. Em vinte anos, o Estado viu desaparecer mais de quatrocentos terrenos, engolfados pela sanha do mercado imobiliário[8]. Desde 2012, quatrocentos moradores de Palo Alto lutam contra o desaparecimento de seu parque, o mais antigo do Vale do Silício, onde o aluguel custa US$ 1 mil (contra o triplo para uma casa modesta na cidade). Depois de aceitar o fechamento, a prefeitura mudou de opinião diante da amplitude que o caso assumiu. Ela agora apoia os moradores e chegou a fazer uma oferta de compra do terreno: US$ 38 milhões por 1,8 hectares 117 lotes. O proprietário recusou, já que, segundo os corretores, o lugar vale mais de US$ 50 milhões.9
O caso, por enquanto, está nas mãos da justiça. À espera de uma decisão, os moradores do parque Buena Vista de Palo Alto não sabem prever seu futuro, assim como os residentes das “colinas encantadas” de Raton. Como explica Anderson, “os donos de trailers possuem identidade dupla. Ao mesmo tempo proprietários e locatários, não são protegidos pelas leis que regem tradicionalmente as relações entre locadores e locatários nem pelos direitos concedidos aos proprietários”. Para se defender, só podem contar com eles mesmos.

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Publicado originalmente pelo Le Monde Diplomatique Brasil


[1] “Hillcrest Village” significa literalmente Aldeia no Alto da Colina; “Meadow”, Pradaria; “Cedar Village”, Aldeia dos Cedros etc
[2] American Housing Survey, 2013; “Mobile homes, the low-cost housing hoax” [Trailers, a fraude das casas baratas], relatório do Center for Auto Safety, Grossman Publishers, Nova York, 1975
[3] Ibidem
[4] Gary Rivlin, “The cold, hard lessons of mobile home U.” [As duras e impiedosas lições dos trailers U.], The New York Times, 16 mar. 2014.
[5] Cf. Sylvie Laurent, Poor White Trash. La Pauvreté Odieuse du Blanc Américain [Pobre refugo branco. A pobreza odiosa do branco norte-americano], Presses de la Sorbonne, Paris, 2011
[6] Citado em John Fraser Hart, Michelle J. Rhodes e John T. Morgan, The Unknown World of the Mobile Home [O mundo desconhecido dos trailers], The Johns Hopkins University Press, Baltimore and London, 2002.
[7] O companheiro de Montoya, um mexicano que mora legalmente nos Estados Unidos, não está registrado junto ao proprietário do parque, daí ela preferir usar um pseudônimo
[8] Katie Kramon, “California’s affordable mobile home parks vanishing” [Parques de trailers a preços acessíveis estão desaparecendo na Califórnia], Peninsulapress.com, 11 mar. 2015.

Fonte: Opera Mundi