quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Privatizá-las-ei porque são públicas!

14/09/2016 10:31 - Copyleft

Privatizá-las-ei porque são públicas!

O governo Temer pretende marcar uma declaração de intenções, um compromisso mais explícito de sua parte para com a agenda liberal desmontista.


Paulo Kliass
Caroline Antunes
"Bebo-o porque é líquido, se fosse sólido comê-lo-ia"
(frase atribuída ao ex Presidente Jânio Quadros)
 
O governo Temer acaba de apresentar, em evento solene realizado no Palácio do Planalto, mais um de seus “alicerces fundamentais” para o tão ansiosamente aguardado processo de retomada do crescimento da economia. O discurso entusiasmado do Presidente pode ser resumido na expressão de realizar uma “abertura extraordinária” da infraestrutura brasileira à iniciativa privada.
 
Tudo foi realizado de modo a seguir exatamente o roteiro que estava previsto e prescrito no famoso documento “Ponte para o futuro”, apresentado ainda durante o ano passado pela Fundação Ulysses Guimarães, vinculada ao PMDB. À época, a entidade era - e ainda continua sendo - presidida por Wellington Moreira Franco, que foi nomeado no final de maio pelo chefe de governo para ocupar a Secretaria Executiva do estratégico “Programa de Parcerias de Investimento” (PPI), ligado à Presidência da República. 
 





Vale ressaltar o registro de que esse importante órgão de formulação do peemedebismo já foi presidido pelos seguintes dirigentes do partido ao longo dos últimos 17 anos: i) Renan Calheiros (1999/2001); ii) Moreira Franco (2001/2007); iii) Eliseu Padilha (2007/2015); e iv) Moreira Franco (2015/atualmente). Essa lista dá a relevância do cargo e a capacidade de influenciar a formulação de políticas públicas.
 
O documento foi apresentado como uma alternativa de programa de governo, ainda durante o primeiro ano do segundo mandato da Presidenta Dilma, com o intuito explícito de operar como uma tentativa de qualificação do então vice presidente junto aos setores mais vinculados ao sistema financeiro e ao grande capital. A estratégia do impeachment estava em marcha e a legitimação do postulante a ocupar o Palácio do Planalto se materializava nas proposições apresentadas ao longo do texto.
 
Por ali se lançavam as intenções de romper com a política de relações diplomáticas e de comércio exterior do período anterior, escancarando a preferência unilateral de submissão aos interesses dos Estados Unidos. No mesmo material estavam lançadas as bases para a reforma fiscal envolvendo congelamento das despesas de natureza social, com o intuito único de recuperar uma mitológica relação idealizada entre endividamento público e PIB. Além disso, a necessidade de uma reforma previdenciária limitadora das despesas da União se combina à sugestão de desvinculação de tais políticas da sistemática de reajuste do salário mínimo. No documento também podem ser encontradas as referências para uma necessária reforma trabalhista, com retirada de direitos históricos dos trabalhadores, em nome de uma suposta redução do tão criticado quanto desconhecido “custo Brasil”.
 
Finalmente, à página 18 encontramos a senha para privatização:



(...) “executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime anterior de concessões na área de petróleo, dando-se a Petrobras o direito de preferência” (...)



A primeira etapa do PPI prevê a entrega de 25 projetos de natureza variada ao setor privado. A lista é longa e envolve um conjunto amplo de setores, sendo a grande parte associada a atividades de infraestrutura e logística. O registro tragicômico se deve ao fato de que a maioria dos projetos estava na fila para serem lançados ainda durante a gestão anterior, de quem o governo atual sempre se disse crítico, pretendendo guardar uma distância e uma suposta diferença.
 
Os projetos estão assim distribuídos:
 
- aeroportos - 4
- terminais de carga - 2
- rodovias - 2
- ferrovias - 3
- campos de petróleo (vários)
- ativos da Cia Pesquisa de Recursos Minerais (vários)
- empresas de distribuição de energia - 6
- usinas hidroelétricas - 3
- empresas de água e saneamento – 3
 
Durante a cerimônia não foi adiantada nenhuma informação relativa aos editais nem mesmo a respeito das condições previstas para os processos de privatização. Apenas foram mencionadas as datas estimadas em que o governo pretende apresentar os editais e realizar os leilões. Como os 4 aeroportos já estavam com seus processos bem avançados, as datas previstas para esses leilões caem no primeiro semestre do ano que vem. Todos os demais foram agendados preventivamente para o segundo semestre de 2017 e início de 2018.
 
A equipe encarregada pelo PPI anunciou que os projetos deverão contar com uma generosa disponibilidade de recursos públicos. Um total estimado em R$ 30 bilhões para financiamento será colocado à disposição dos interessados do capital privado para viabilizar seus empreendimentos. A origem do montante será distribuída entre o BNDES, a CEF e o FI-FGTS. Durante o evento nada foi mencionado a respeito, mas é sabido que tais linhas de financiamento contam com taxas de custeio bastante subvencionadas, fato esse que deve sobrecarregar ainda mais os custos financeiros do Tesouro Nacional. Essa era, aliás, uma das mais pesadas críticas que os atuais integrantes da equipe econômica faziam ao governo anterior.
 
Por outro lado, nada foi dito tampouco a respeito do detalhamento das regras de realização dos leilões e do estabelecimento de condições mínimas para a aceitação das proposições. Afinal, é mais do que reconhecida a tendência à minimização dos valores dos ativos patrimoniais em momentos de recessão econômica. Como os contratos preveem duração de 30 anos ou mais, aquilo que pode se converter em bom negócio para o empreendedor privado nesse momento tende a se revelar uma péssima opção para o Estado.
 
A esse respeito vale a pena também observar outra passagem do documento do PMDB. Aqui se observa a intenção de oferecer todo o tipo de vantagem e garantia ao capital privado, seja em termos de condições financeiras para a realização dos investimentos, seja para retirar obstáculos de natureza jurídica, administrativa ou ambiental á realização plena da acumulação de capital. Na verdade, trata-se de uma operação muito delicada, envolvendo claramente um elevado risco para o próprio Estado e para a Nação a médio e longo prazos.
 
(...) “promover a racionalização dos procedimentos burocráticos e assegurar ampla segurança jurídica para a criação de empresas e para a realização de investimentos, com ênfase nos licenciamentos ambientais que podem ser efetivos sem ser necessariamente complexos e demorados” (...)
 
Ao que tudo indica, tal operação pretende marcar uma declaração de intenções do chefe do governo, um compromisso mais explícito de sua parte para com a agenda liberal desmontista. O governo Temer passa por um momento de crise em sua base de apoio, onde os setores do capital financeiro não mais parecem dispostos a oferecer todo e qualquer apoio às medidas encaminhadas pelo Executivo. Há uma cobrança cada vez mais generalizada pelos meios de comunicação a respeito de um suposto relaxamento com a questão fiscal, um mui temido descontrole dos gastos orçamentários. Por outro lado, os grupos do conservadorismo mais radical reclamam do pouco empenho do governo e de sua base no Congresso Nacional em avançar as propostas de reforma previdenciária, de teto para o gasto público e da flexibilização trabalhista.
 
Na verdade, em uma conjuntura marcada pela crise e pela recessão como a atual, não é nada recomendável promover a venda de patrimônio público. Mesmo sob a lógica liberal, é sabido que os ganhos para as finanças públicas são muito reduzidos em razão do rebaixamento patrimonial generalizado que se observa por toda parte. O único argumento plausível seria a ilusão com a tal das “expectativas dos empresários”. Mas esses só fazem mover seu instinto animal caso vislumbrem retornos elevados para seus investimentos. Com a atual política monetária que nos mantém como campeões mundiais absolutos no quesito “ganho financeiro”, o capital só irá para atividade produtiva se contar com mais benesses e generosidades por parte do setor público. E isso significa maiores gastos por parte do Estado ou menores receitas pra o fisco com tais operações de privatização.
 
Assim, face a uma eventual indagação a respeito de qual a verdadeira razão para transferir esse patrimônio, a única resposta que resta ao dirigente político no atual momento é aquela do tipo janista: “Ora, privatizo porque são públicas”. Pano rápido e ponto final!




* Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.
 


Créditos da foto: Caroline Antunes




Falta uma palavra no power point de Dallagnol


15/09/2016 00:00 - Copyleft

Falta uma palavra no power point de Dallagnol

Munidos de um power point colegial, os promotores da Lava-Jato tentam impedir que as urnas de 2018 submetam o nome de Lula ao escrutínio popular.

por: Joaquim Palhares - Diretor de Redação

Ricardo Stuckert
O conflito com as ruas e com as urnas está inscrito na natureza constitutiva do golpe em curso no Brasil, cuja fidelidade pertence aos detentores da riqueza, não ao país, tampouco a sua gente
 
A agenda de expropriação de direitos e alienação de patrimônio público que define essa endogamia não pode ser submetida às urnas  --nas quais já foi derrotada em quatro eleições presidenciais sucessivas. Menos ainda à convivência política com aquele que personifica esse antagonismo na alma e no coração do povo brasileiro: Luiz Inácio Lula da Silva, uma liderança de carne e osso, com os limites da carne e do osso, mas ainda assim a maior liderança popular da nossa história, porque levou mais longe o compromisso com a igualdade social.
 
Pepe Mujica, em uma de suas viagens ao Brasil, carimbou no golpismo, então ascendente, uma advertência lapidar: ‘Devemos desconfiar sempre dos que pretendem corrigir o voto popular'.
 
Munidos de um power point colegial, e de uma retórica de macarthismo imberbe, os proficientes promotores da Lava Jato se avocaram nesta quarta-feira, mais uma vez, o papel execrado por Mujica.





 
Na condição caricata, acentuada pela retórica de polícia política, lançaram-se ao  derradeiro esforço de entregar a encomenda contratada desde o início à Operação Lava Jato: impedir que a urna eletrônica de 2018 submeta mais uma vez o nome de Lula ao escrutínio popular.
 
A derrubada da Presidenta Dilma foi o degrau anterior dessa buliçosa empreitada, que está condenada a ir além de todos os limites constitucionais
 
Por uma razão bastante forte: o projeto golpista não é incompatível apenas com uma disputa em terreno limpo contra Lula e contra o que ele representa.
 
Ele é alérgico ao contato direto com o povo, com a soberania do povo, pelo simples fato de que nasceu para ir contra a cidadania o povo. 
O passo seguinte dessa escalada –não é temerário prever--  conduzirá ao enjaulamento do processo político, trazendo para o quórum seguro de uma escória parlamentar, a eleição do sucessor de Temer, pelo voto indireto, protegido do veredito da sociedade e blindado contra o clamor da rua.
 
Delações coagidas e culpas presumidas, amarrotadas em um power point infantilizado, avultam dos labirintos jurídicos da Lava Jato, onde o desejável combate à corrupção foi abastardado em alavanca partidária de execração política para o banir lideranças e forças populares incompatíveis com o Brasil das elites.
 
A destruição da  maior liderança popular da história brasileira é um imperativo da empreitada grosseiramente previsível.
 
Para cumpri-la empunha-se a lei do vale tudo.
 
O senhor Dallagnol condensou essa determinação omnívora --peculiar ao código de uma comunidade legal que defende ‘provas’ obtidas por meios ilegais--  em uma sentença desconcertante: 'Não temos prova, temos a convicção'.
 
Qual ? 
 
A de que Lula era o cérebro, o ‘comandante máximo’, o general de todo o suposto esquema  de corrupção na Petrobras --que começou antes de seu governo, mas isso não vem ao caso, nem cabe nos esquematismos de um power point colegial.
 
Vem ao caso, porém, na defesa do Estado de Direito.
 
Quando um Ministério Público se propõe acusar tão gravemente  um ex-presidente da República e admite que o único elemento embasa-lo é a sua convicção, não as provas, o Estado de Direito grita.
 
E deveria ser ouvido.
 
Ao senhor Dallagnol cumpriria uma voz da Suprema Corte advertir que 'convicção' quem forma é o juiz. Tão somente o juiz. 
 
Pelo menos no Estado de Direito em vigor no país é assim.
 
Não o era na OBAN, durante a ditadura. Não. Ali, nas salas de tortura, um delegado, Sergio Paranhos Fleury, formava suas convicções. E as executava, como sentenças inapeláveis, com as próprias mãos. 
 
Hoje a imprensa coorporativa também possui convicções e as executa, com suas próprias manchetes.
 
O senhor Dallagnol não é juiz; Moro não é seu o seu xará; a República de Curitiba não é a OBAN.
 
Mas arvora-se,  neste caso, o direito de condenar, repita-se, um ex-presidente da República como 'general supremo' de um esquema de corrupção, no qual teria auferido propinas no valor de R$ 3,7 milhões. 
 
Apenas um dos supostos subalternos seus  --pois todos o seriam na fábula macartista dos promotores de power point— como lembra a jornalista Helena Chagas, citando Pedro Barusco, pagou só de multas à Lava Jato, cerca de U$S 100 milhões de dólares.
 
Que ‘general’ é esse, cujo soldo é cem vezes inferior ao de um soldado?
 
Seria apenas ridículo, se não fosse um atentado à democracia.
 
A precariedade evidenciada no amadorismo de um power point é tamanha que o juiz Moro, em nome da sua reputação, terá dificuldade em aceitar a denúncia ancorada em retórica adjetiva, a dissimular a inexistência de provas efetivas. 
 
Mas Moro o fará, pela simples razão de que para isso se constituiu a Lava Jato. Ademais, aceitação não é condenação. 
A falta de provas, todavia, deveria constranger um guardião do Estado de Direito.
 
Ela avulta não apenas da frase descabida de Dallagnol. Mas sobretudo, do fato de não se ter requerido a prisão de Lula.
 
Não faz sentido o Ministério Público Federal não pedir a prisão do réu tipificado como comandante máximo do exército de corruptos da nação. Não o fez porque não tem provas e os indícios não são relevantes de molde a justificar o requerimento.
 
Além disso, parte das acusações que foram apresentadas no dia de ontem estão na competência da Suprema Corte.
 
Se o nome disso tudo não é golpe será preciso inventar um outro mais forte para designá-lo. 
 
Quem sabe: GOLPE !
 
O conjunto acentua as tintas da crise estrutural vivida pela sociedade brasileira em que ao esgotamento do modelo econômico se junta a falência de seu sistema político que contaminou a isenção do judiciário, arrebatado agora por centuriões que se avocam a tarefa de ‘corrigir o voto popular’.
 
Nenhum simplismo de power point resolverá essa encruzilhada, diante da qual se joga o destino brasileiro no século XXI.
 
A crise em curso  requer  uma repactuação democrática da sociedade e do seu o desenvolvimento, razão pela qual não encontra remédio no passado -- e tampouco no anacronismo violento de um  presente espremido na                                  restauração neoliberal que se pretende impor à  nação.
 
Para impedir que o Brasil escorra no ralo conservador é inadiável acelerar a construção de uma frente ampla, assentada em forças populares e democráticas, que se ofereça às ruas e às urnas como uma alternativa crível ao ajuste baseado na liquefação da renda assalariada, na sonegação do futuro à juventude, no atropelo da Constituição e do  Estado de Direito 
 
É o que já previa nos albores do golpe a professora Maria da Conceição Tavares, em entrevista premonitória à Carta Maior, que convidamos à leitura atenta nesta edição ('Com Cunha ou sem Cunha, com eles o Brasil vai para o ralo').
 
Com ela, Carta Maior reafirma seu compromisso de se constituir na caixa de ressonância da recusa à naturalização do golpe e do arrocho ecoados pelo aparato midiático dominante.
 
Para exercer esse papel, a mídia independente só conta hoje com um aliado: seus leitores e leitoras.
 
Exortamos os democratas e progressistas a se tornarem parceiros dessa trincheira, através da qual é possível acrescentar a palavra que falta no power point do senhor Dallagnol : farsa !

Discrepância entre acusações verbais e formais contra Lula levanta dúvidas sobre Lava Jato, diz AP

Discrepância entre acusações verbais e formais contra Lula levanta dúvidas sobre Lava Jato, diz AP

Imprensa internacional repercute acusações do Ministério Público Federal contra ex-presidente; segundo artigo no jornal La Jornada, intenção é 'demonizar' PT
A agência de notícias norte-americana Associated Press afirmou, nesta quarta-feira (14/09), que a "discrepância" entre as declarações dos procuradores do MPF (Ministério Público Federal) sobre o papel do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no esquema de corrupção na Petrobras e as acusações de fato apresentadas contra ele levantam dúvidas sobre o futuro das investigações da Operação Lava Jato.
Nesta quarta, o procurador da República Deltan Dallagnol afirmou que o ex-presidente era o "comandante máximo do esquema de corrupção identificado na [Operação] Lava Jato". Em entrevista coletiva à imprensa, ele detalhou a denúncia contra Lula, a esposa dele, Marisa Letícia, e mais seis pessoas.
Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Segundo matéria da AP, caracterização de suposto papel de Lula na Lava Jato foi "impressionante"
Segundo a matéria da AP, embora as acusações fossem esperadas, a caracterização do suposto papel de Lula no esquema, com apresentações de Power Point tentando explicar as denúncias contra o ex-presidente, foi “impressionante”.
A agência afirma que, apesar da “litania” (ladainha) de acusações, Lula está sendo acusado apenas de lavagem de dinheiro e corrupção, crimes que são negados pela defesa do ex-presidente.
“A discrepância entre as acusações verbais na quarta-feira [feitas pelos procuradores] e aquilo de que Silva foi realmente acusado levantaram muitas perguntas sobre o futuro da investigação”, diz o texto.
O artigo da AP cita o advogado Cezar Britto, ex-presidente da OAB, que afirma que "as duras palavras [dos procuradores] indicam que as provas [contra Lula] não devem ser tão sólidas". "Parece que os procuradores estão querendo o apoio da sociedade em lugar de procurar mais provas", diz Britto.
'Demonizar o PT"
Em artigo no jornal mexicano La Jornada nesta quinta-feira (15/09), o escritor brasileiro Eric Nepomuceno qualificou a entrevista coletiva de Dallagnol como um “espetáculo oferecido a uma imprensa que há muito tempo esqueceu o verbo ‘perguntar’”.
A apresentação das denúncias, segundo ele, teve “palavras contundentes, em um discurso altamente politizado, no qual faltou só um detalhe: provas”.
O escritor afirma que a “sanha messiânica” do juiz Sergio Moro, “que atua muito mais como acusador do que como magistrado”, indica que a denúncia contra Lula será aceita a menos que ocorra algo “inexplicável”.
 

Após pressão de órgão anticorrupção, ministro de Energia argentino se desfaz de ações da Shell

Venezuela não assumirá presidência do Mercosul, decidem países do bloco

Venezuela diz que decisão de não passar Presidência do Mercosul ao país é 'desespero de burocratas'

 
Nepomuceno cita também os advogados do ex-presidente, para quem a conduta política de Moro e Dallagnol “é parte de algo mais ambicioso: impedir que Lula da Silva tente voltar ao poder e, de quebra, demonizar o PT”.
Agência Efe

Procurador da República Deltan Dallagnol apresenta denúncias contra ex-presidente Lula
Pode ficar fora das eleições de 2018
O jornal britânico The Guardian também repercutiu as acusações contra Lula nesta quarta-feira. Segundo a publicação, esta é a primeira vez que o ex-mandatário, que segue como político mais popular do país, é acusado formalmente de envolvimento na Lava Jato.
O texto lembra que uma possível condenação pode deixar Lula de fora das próximas eleições presidenciais e que, apesar das acusações, o ex-chefe de Estado aparece na liderança de pesquisas de intenção de voto no pleito de 2018.
A publicação faz referência às políticas sociais que tiraram da pobreza e conduziram à classe média milhões de pessoas durante o governo de Lula, que deixou a Presidência com 83% de aprovação e com uma economia que crescia a 7,5%.
'Farsa de má qualidade'
Um artigo no site português Esquerda.net sobre a entrevista coletiva de imprensa do MPF afirma que a apresentação, “evidentemente concebida para ter um grande impacto teatral, acabou decorrendo em tom de farsa de má qualidade.”
Segundo o texto, a entrevista coletiva foi tão "constrangedora" que suscitou críticas até do "mais reacionário colunista anti-Lula", Reinaldo Azevedo, que classificou o evento como um "espetáculo".
O site explica que as acusações foram apresentadas em um arquivo de Power Point com setas e gráficos, “mas a profusão de slides não apresentou evidências que suportassem a nova acusação”.
O texto critica também o arquivo apresentado, considerado “confuso” e feito de forma “pouco cuidada”, que já teria se tornado motivo de piada e fonte de memes nas redes sociais.

Brasil-China: complementaridade ou dependência?


Brasil-China: complementaridade ou dependência?

O novo governo estimula uma parceria iniciada na era PT cujas consequências são, em grande medida, deletérias
por Alessandra Cardoso — publicado 15/09/2016 04h51
Beto Barata / PR
Michel Temer e Xi Jinping
Michel Temer e Xi Jinping, o presidente da China. Parceria segue em frente
Em comentário sobre os recentes acordos de investimentos da China no Brasil, um negociador afirmou que “as relações bilaterais ganham novos galhos onde antes havia apenas o tronco”.
De fato, os anúncios das intenções de investimentos chineses no País indicam que, a despeito da crise política que se instalou e da crise econômica que dela se alimentou, continuam sendo dados passos objetivos para que as empresas privadas e estatais chinesas ampliem ainda mais seus investimentos no Brasil.
Os investimentos anunciados em eventos de negócios paralelos à reunião do G20 na China são um desdobramento das negociações bilaterais que já vinham sendo conduzidas pelos governos Lula e Dilma e, evidentemente, dos fortes e específicos interesses da China no Brasil e na América Latina.
De ambos os lados, tais relações bilaterais têm sido assumidas pela diplomacia como mutuamente benéficas, complementares e baseadas em laços de solidariedade sul-sul. Narrativa esta, inclusive, reforçada no âmbito dos BRICS, também como meio de promover formas de liderança internacional alternativas.
A nós cabe perguntar: que tronco é esse e quais galhos e frutos dele brotarão?
Já é consensual entre pesquisadores a percepção de que os laços comerciais entre a China e a América Latina são baseados na demanda chinesa por um conjunto relativamente limitado de recursos naturais: o cobre do Chile, as commodities em geral, em especial minério de ferro e petróleo, do Brasil, Venezuela, Colômbia, Peru e Argentina. Em contrapartida, os elevados fluxos de comércio da China para a região são dominados por bens manufaturados de média e alta tecnologia.
Há um outro consenso já formado de que o ciclo de preços das commodities, expresso na elevação dos volumes transacionados e valores a partir de 2002, com pico em 2011, e fortes evidências de esgotamento nos três últimos anos, guarda relação direta com a dinâmica de crescimento da economia chinesa.
Alguns estudiosos vão além e argumentam que, por trás da demanda chinesa por commodities, em especial de minerais, esteve um ciclo de negócios puxado pelo incremento na sua produção industrial a qual alimentou a rápida urbanização e o desenvolvimento de infraestrutura conduzidos pelo Estado chinês. Um ciclo que se esgotou, pelo menos na intensidade com que se expressou na primeira década deste século. 
Já no Brasil, o boom de commodities e seu fim têm nos mostrado como foram desiguais e perigosos os fluxos comerciais, principalmente de commodities, com a China. Dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI) apontam que o Brasil acumulou superávit de US$ 46 bilhões com os chineses entre 2009 e 2015, vendendo commodities.
Entre os efeitos ainda pouco compreendidos para o Brasil deste intenso fluxo comercial baseado em recursos naturais estão a sobrevalorização do real e a perda de competitividade de vários segmentos da produção manufatureira, retroalimentada pelo aumento das importações de manufaturados chineses – de 4% em 2001 para 21% em 2015, segundo a CNI. Esses efeitos explicam, em parte, a atual e profunda crise econômica brasileira. 
Tão perverso quanto foram os impactos sociais e ambientais produzidos por essa corrida por minérios e terras patrocinada pela demanda chinesa, o desastre do Rio Doce, com o rompimento de uma barragem da Samarco-Vale-BHP em Mariana (MG) é uma síntese perfeita do que significa essa corrida pela extração de volumes sempre recordes de minérios, a custos cada vez mais menores.
Em vez de termos uma maior reflexão sobre a natureza desse ‘tronco’ e quais efeitos e consequências das relações construídas entre Brasil e China, estamos vendo essa parceria ser acriticamente e irresponsavelmente adubada pelo atual governo para que produza longos galhos, atendendo aos interesses chineses: a infraestrutura necessária para garantir fluxos contínuos e cativos de recursos naturais para a China e de bens manufaturados da China ao Brasil e região. 
Além da oferta de extenso “cardápio” de investimentos em infraestrutura – incluindo concessões, outorgas e privatização – o governo brasileiro deu perigosos passos no campo da regulação. A aprovação da Medida Provisória Nº 727 alçou os investimentos em infraestrutura à condição de prioridade nacional, garantindo-lhes celeridade na liberação das licenças necessárias.
Na prática, a nova legislação impõe um regime de aceleração (fast tracking) do licenciamento ambiental aos projetos de infraestrutura. Isso, diante do quadro de crescente fragilidade das capacidades e recursos dos órgãos ambientais e daqueles que protegem os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais, significará ainda maiores violações dos direitos ambientais e também desses grupos e das demais populações afetadas por grandes obras que têm no licenciamento a única via de avaliação, mitigação e compensação dos impactos causados.
Criou-se, ainda, uma nova institucionalidade, o Conselho do Programa de Parcerias de Investimentos da Presidência da República, com o papel e o poder de coordenar e “enquadrar” os demais órgãos e entes públicos para viabilizar a execução célere e rentável dos projetos que interessarem aos investidores. 
Do lado da China, algumas das principais escolhas no “cardápio”, cuja oferta soma US$ 269 bilhões, foram esclarecedoras:
i) Construção da ferrovia transoceânica, negociada ainda em 2015 e com projeto de análise de viabilidade econômica concluído, que abrirá a rota de exportação pelo Pacífico, barateando custos de transporte de minérios e grãos para a China;
ii) Acordo entre a China Communication and Construction Company Internacional (CCCC) e o grupo WPR para investimento no terminal multicargas de uso privado em São Luis (MA), para transporte de grãos, celulose e fertilizantes.
iii) Acordo para a criação de um Fundo de Investimento do Desenvolvimento da Agricultura do Brasil e China que participará da cadeia do setor agrícola brasileiro, especialmente em serviços agrícolas e melhoramento de infraestrutura, incluindo armazenamento, logística e portos.
iv) Aquisição de 50,1% da Rio Bravo Investimentos pelo grupo Fosun. A Rio Bravo é uma administradora de investimentos que, entre outros serviços, monta e administra fundos e carteiras de infraestrutura para investidores institucionais e pessoas físicas, com foco em projetos de energia e logística.
O “menu” oferecido aos chineses, juntamente aos serviços adicionais de mudança de regulação e institucionais para viabilizar projetos a toque de caixa, coadunam com as fortes preferências dos investidores por infraestruturas que visam ampliar o escoamento de commodities para a China e de manufaturas para o Brasil e região.
A complexidade das relações comerciais e de investimentos Brasil-China ficaram em grande medida nubladas pela narrativa dos interesses sul-sul que contribuiu para mascarar uma relação de fortes assimetrias que aprofundam a dependência histórica do País, e latino-americana, por exportações de commodities, e exponenciam seus inúmeros impactos. 
*Alessandra Cardoso é assessora política do Inesc. Convidada do Grupo de Reflexão sobre Relações Internacionais/GR-RI.
Fonte: Carta Capital