sábado, 7 de julho de 2018

LULA MANDA RECADO: TEMER VENDE O PAÍS EM LIQUIDAÇÃO

O fator Bolsonazi, a direita envergonhada e a “tempestade perfeita”

O fator Bolsonazi, a direita envergonhada e a “tempestade perfeita”

Marcelo Camargo/Agência Brasil
O presente cenário pré-eleitoral permite que se digam duas coisas com algum fundamento:
1. Na ausência de Lula como candidato, não se pode descartar a possibilidade de que o candidato fascista consiga alcançar seu objetivo.
2. A parcela do campo político e da opinião pública que manifesta repúdio à ideias, à conduta e à "persona" do Bolsonazi, mas ao mesmo tempo endossa ou tolera a perseguição judicial desonesta que deve culminar com o veto à candidatura de Lula, contribui na prática para o avanço e talvez até para o triunfo dessa figura tão detestável.
O postulante da extrema-direita, a esta altura, parece consolidado em setores expressivos do eleitorado. Calcula-se entre 15% e 20% a parcela dos que se identificam com o estilo truculento do Bolsonazi, o baixo nível moral e intelectual de suas declarações, a farsa do "antipolítico", o ódio a tudo o que cheire a esquerda, o estilo palhaço à la Trump. Para essa faixa, não existe argumento ou fato novo, nem debate nem nada, capaz de abalar a decisão de voto. Soma-se a isso a adesão crescente da alta burguesia à alternativa fascista, no fenômeno que meu amigo Gilberto Maringoni acaba de sintetizar em um brilhante comentário intitulado, em modo autoexplicativo, "O empresariado ligou o foda-se".
Bolsonazi cresce no vácuo deixado pela incompetência do chamado "mercado" em encontrar candidato viável, capaz de agregar um verniz de respeitabilidade ao projeto de destruição nacional e vandalismo social que constitui a essência da aventura golpista. Geraldo Alckmin, tido até algum tempo atrás como o nome "natural" para estabilizar a supremacia dos "donos do PIB" (os banqueiros da Avenida Paulista, os oligarcas do agronegócio, a Rede Globo), naufraga a olhos vistos. É claro, talvez ainda exista a chance de, no desespero, mobilizar-se o aparato midiático para salvar o "picolé de chuchu", numa derradeira operação repescagem. Mas não se vê quem acredite nessa possibilidade. Os demais nomes do neoliberalismo puro são risíveis (Flavio Riachuelo Rocha, Álvaro Dias, Henrique Meireles). Nem vou perder tempo aqui em comentá-los.
A opção que resta aos setores do grande capital até agora imunes à tentação fascista (que, em contraste com o título do clássico filme de Buñuel, não é discreta nem charmosa), é aquela mesma, Marina Silva, a silenciosa pescadora de águas turvas, sempre disponível para desempenhar seu papel no script do conservadorismo disfarçado.
Não resolve muito, né? Em eleições anteriores, a pessoa já mostrou sua fragilidade como liderança política, algo que deve se expor com evidência ainda maior no momento complicado que vivemos. Não é à toa que anda tão calada. Desta vez, ela adentrará a arena dos leões sem o aditivo emocional da tragédia aérea que vitimou Eduardo Campo, de quem era vice em 2014. Ainda assim, não se pode descartar que Marina, alavancada pela mídia e pela grana, acabe amealhando um contingente de votos suficiente para levá-la ao segundo turno. Para isso, são necessárias duas condições: a falta absoluta de outras opções à direita capazes de serem abraçadas por quem costuma comer com garfo e faca, e um curto-circuito eleitoral no campo da esquerda.
Sim, curto-circuito, esse é o fantasma que ronda a esquerda/centro-esquerda, os progressistas, os antigolpistas ou como se prefira chamar o lado dos que desaprovam o retrocesso geral em marcha no país. A candidatura de Ciro Gomes é um fato consumado, nada o fará voltar atrás, e seu apelo certamente crescerá na medida em que dissemine a ideia de que, no final da estrada, o nome de Lula estará ausente na maquininha do voto. Um eventual apoio do PT (e de Lula) a Ciro – o que lhe daria um impulso fortíssimo e, com certeza, o favoritismo no segundo turno – aparece no momento como algo improvável, e existem motivos sólidos para isso.
Não se pode condenar o PT por insistir em apresentar candidato próprio. É o maior partido do país, tem toda uma história, uma identidade, uma presença na vida brasileira que se mantém como referência, comprovada em pesquisas, apesar do linchamento político de que a agremiação tem sido vítima há muitos anos e contra o qual pouco conseguiu fazer. Lula, mesmo preso, lidera qualquer pesquisa em que seu nome seja incluído. A renúncia uma candidatura petista, ainda mais em favor de um Ciro cujo comportamento sinaliza mais ambiguidade do que firmeza, pode ter consequências graves, com efeitos muito além do contexto eleitoral.
A expectativa é de que Lula indique outro nome petista no momento em que se materializar o veto da burguesia à sua presença nas urnas. Não se sabe em que medida o maior líder popular da história brasileira conseguirá transferir os 30% de preferências atribuídas a ele nas pesquisas a outro candidato ou candidata, a tempo de garantir para @ substitut@ uma vaga no segundo turno. Sua condição de prisioneiro impede que percorra o país para pedir votos, como fez em favor de Dilma Rousseff em 2010. E entre os nomes até agora cogitados no PT, todos eles portadores de grandes virtudes, não aparece, contudo, nenhum que sinalize maior atratividade junto aos eleitores, ainda mais quando se pensa num pleito nacional.
Desenha-se, assim, o risco de uma "tempestade perfeita", um pesadelo que vai além da esquerda para envolver todos os que são efetivamente antifascistas. Na disputa para definir quem enfrentará a besta-fera (mais besta do que fera) no segundo turno, Ciro e @ "petista X apoiad@ por Lula" se neutralizariam mutuamente. O curto-curcuito, com a involuntária contribuição de uma (também inevitável) candidatura de Guilherme Boulos correndo por fora, sem chances, e talvez ainda a de Manuela d'Ávila, abriria espaço para a ascensão de uma Marina Silva fraquíssima. Sem propostas, carisma ou coerência, a candidata verde-evangélica chegaria ao segundo turno cambaleante, diante de um adversário empoderado por uma robusta votação e pelo entusiasmo crescente de amplas parcelas da burguesia e da classe média paneleira – os órfãos do tucanato, agora em aberta lua-de-mel com o fascismo.
A experiência na política, reforçada pelos piores calafrios, indicará ao campo progressista, claramente, o que fazer num segundo turno a ser disputado nesse cenário de catástrofe. Será a hora de tampar o nariz, fechar os olhos e, com a outra mão, enfiar rapidamente o dedo no excremento, escolhendo o mal menor. Mas quantos serão os brasileiros e brasileiras dispostos a um exercício tão sofisticado de racionalidade maquiaveliana?
As abstenções, em uma paisagem tão melancólica, tendem a disparar a níveis sem precedentes. Quanto menor o comparecimento às urnas, maiores as chances daquele que elogia o estupro e aplaude torturadores. E não faltarão os eleitores que, imersos no analfabetismo político e no clima de confusão geral que a fascistaiada é perfeitamente capaz de criar nas redes sociais, transitem de um voto à esquerda no primeiro turno para o embuste de uma opção "anti-sistêmica" no segundo.
Evidentemente, não creio que qualquer raciocínio, muito menos um cálculo hipotético como o aqui apresentado (e que pode virar fumaça em poucos dias ou semanas), possa induzir setores liberais que se deixaram levar pela histeria antipetista mas, ainda assim, continuam encarando a si mesmos como "democratas", a alterarem sua postura rígida, cruel, impermeável a fatos e a argumentos, diante da condenação e do veto à candidatura de Lula, mesmo depois de amplamente demonstrada sua inocência e a dimensão inominável da atrocidade jurídica cometida contra ele.
Mas aqui se trata de uma realidade objetiva, mais do que de intenções e sentimentos. Essa gente, tão limpinha e educada, muitos deles nossos antigos parceiros na luta contra a ditadura militar e pelas "diretas-já", fãs de FHC e potenciais eleitores de Marina, o liberalismo "civilizado" pode dar o empurrão decisivo para o mergulho do Brasil nas trevas do fascismo.

Aos autoritários a história: qual o legado da ditadura para a educação no Brasil?

Aos autoritários a história: qual o legado da ditadura para a educação no Brasil?
Segunda-feira, 11 de junho de 2018

Aos autoritários a história: qual o legado da ditadura para a educação no Brasil?

Foto: Ditadura Militar/Arquivo
Nos últimos tempos, vozes da sociedade civil tem evocado a imagem de um fantasma – para não dizer assombração – guardado no baú da memória brasileira: intervenção militar! Pior ainda, estão vestindo o vilão com roupas de herói. Algo que representou uma mancha sangrenta na nossa história tem sido reproduzido, por alguns, como uma possível salvação para os problemas nacionais, como se a terceirização de nossas decisões a um regime autoritário auxiliasse na superação dos obstáculos do país. A letra de Chico Buarque ganha um tom profético para os dias atuais: “Num tempopágina infeliz da nossa históriapassagem desbotada na memória/ das nossas novas gerações”.
Pois bem, para evitar o desbotamento da nossa memória e fugir das fórmulas fáceis para problemas complexos, vamos pedir uma ajuda da história – sem ter a pretensão de esgotar o tema – para responder a essa questão: qual foi o legado do regime civil militar para a educação no Brasil? Será que a frase “a educação era boa na ditadura” encontra respaldo na realidade? Embora haja vários pontos que possam ser tratados sobre a ditadura de 1964, como o aumento da dívida externa, as inúmeras torturas e mortes de cidadãos contrários ao regime, a extinção de partidos políticos, a perseguição de intelectuais e artistas da época,entre outros,vamos focar no tema da educação, considerando a importância desse assunto, inclusive, para que equívocos do passado não se repitam no presente.
Podemos começar nossa conversa apontando a retirada do ensino de filosofia nas escolas. Essa atitude revela suas intenções ao considerarmos que a transmissão de uma matéria que fortalece a autonomia do pensamento e pode levar ao contato com ideias consideradas “subversivas” não era interessante para o regime militar. A retirada dessa disciplina resultou na criação, por meio do decreto-lei 869 de 1969, de uma matéria que se tornou obrigatória do ensino primário à pós-graduação: Educação Moral e Cívica (EMC). A EMC tinha o objetivo de unificar a ideologia dos alunos, sustentando os valores da ditadura e cultivando ideias nazi-fascistas, como o culto à pátria e à obediência. A imposição ideológica era tamanha que o golpe de 64 era chamado, pelo governo, de “revolução gloriosa”, algo que nos remete à novilínguade 1984, do escritor George Orwell.
A EMC tinha o objetivo, ainda, de efetuar a regeneração moral de uma sociedade supostamente prejudicada pela “infiltração comunista”, tendo Deus como fonte dessa base moral. As disciplinas de História e Geografia, de elevada importância para a construção de um pensamento crítico, também foram retiradas do currículo e substituídas pela matéria Organização Social e Política no Brasil (OSPB). A OSPB, criada por Anísio Teixeira antes do golpe civil militar, foi desvirtuada pela ditadura e utilizada para sufocar a propagação de ideias opostas. A própria eliminação da representação estudantil e a proibição de entidades como a União Nacional dos Estudantes (UNE) demonstra a ausência de espaço para quaisquer posicionamentos divergentes.
Essa retirada, entretanto, não se limitou aos conteúdos da grade curricular, mas também ocorreu em relação às verbas ao ensino. Houve uma paulatina diminuição no investimento em educação. A Constituição de 1967 acabou com a obrigatoriedade da União e dos estados de investirem um percentual mínimo em educação, quebrando o denominado orçamento vinculado (qualquer semelhança com o fim do orçamento vinculado para o campo educacional realizado pelo desgoverno Temer, através da PEC do Teto de Gastos, talvez, não seja mera coincidência). A obrigação da União em investir, no mínimo, 12% do PIB em educação, prevista na Constituição de 1946, foi revogada com a Constituição outorgada de 1967. Para dimensionar essa queda, apontamos que em 1970 o percentual de investimento na área foi de 7,6%, em 1975 de 4,6% e 5% do PIB em 1978[1].
A redução de investimento foi acompanhada por uma política de arrocho salarial dos professores, que passaram por um processo de proletarização da sua categoria. O professor de nível primário, da rede estadual de São Paulo, tinha o salário médio por hora correspondente a 8,7 vezes o salário mínimo, em 1967. Em 1979, esta média havia baixado para 5,7 vezes. No Rio de Janeiro a situação foi ainda mais agravante, destacando-se que o salário dos professores equivalia a 9,8 vezes o salário mínimo em 1950, despencando para 4 vezes em 1960 e atingindo 2,8 vezes o salário mínimo em 1977[2]. Dessa forma, o salário dos professores, que no fim da década de 40 era próximo ao dos magistrados, passou a corresponder, em algumas regiões, a pouco mais que um salário mínimo. Que ótima forma de valorizar a educação, não?
O projeto de alfabetização “De Pé no Chão Também se Aprende a Ler”, encabeçado por Paulo Freire – que a partir de um método próprio, alfabetizava trabalhadores rurais em um período de 45 dias – foi extinto e substituído pelo programa MOBRAL (Movimento Brasileiro de Alfabetização), que teve pouca eficácia no letramento dos analfabetos brasileiros. Em relação ao ensino superior, a reforma efetuada – inspirada no modelo universidade-empresa – foi responsável pela departamentalização das universidades, dificultando a união entre ensino e pesquisa[3]. As diretrizes dessa reforma foram estabelecidas pelos acordos do MEC com a USAID (United StatesAgency for InternationalDevelopment), possibilitando aos EUA pautar uma educação no Brasil sintonizada com os interesses da política norte-americana.
Prosseguindo em nosso sintético mapeamento histórico, destacamos que uma das alterações mais profundas realizadas durante a ditadura foi a obrigatoriedade da educação profissional aos alunos do 2º grau (ensino médio).
A partir da promulgação da Lei 5.692/71, toda escola pública e privada deveria oferecer apenas o ensino profissional aos estudantes do ensino médio. O argumento usado pelos militares era de que o país precisava de mão de obra qualificada para suprir as demandas do mercado de trabalho e, para tanto, deveria abandonar o ensino clássico e propedêutico e oferecer, exclusivamente, o ensino técnico. Essa política foi inspirada pela Teoria do Capital Humano, que enxerga a educação como um capital a ser investido, pautada em uma concepção produtivista de ensino. Aqui podemos visualizar a educação não como um instrumento de formação e desenvolvimento das potencialidades humanas, mas sim como mero criado a serviço de um ente abstrato denominado mercado.
Nesse ponto, podemos nos perguntar se os seres humanos eram ensinados com máquinas ou ensinadoscomo máquinas[4]. Muitos especialistas apontam que a real intenção do regime militar com a reforma era diminuir a demanda pelo ensino superior, criando uma restrição à continuidade dos estudos, já que os alunos poderiam ingressar no mercado sem ter acesso às universidades.
Na prática, a reforma instituída pela Lei 5.692/71 serviu para intensificar ainda mais a dualidade estrutural da educação no Brasil, que oferece distintas educações para diferentes classes sociais. Essa dualidade significa que os filhos das elites recebem uma educação de conteúdos clássicos e propedêuticos, para acessarem o ensino superior e, posteriormente, formar a classe dirigente da sociedade. Em outro sentido, os filhos dos trabalhadores e das classes populares recebem uma educação aligeirada, para ingressarem mais rapidamente no mercado e exercerem trabalhos manuais.
A intensificação dessa dualidade, que reforça a divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual, pode ser confirmada ao observarmos que as escolas particulares da época burlavam essa profissionalização e continuavam preparando seus alunos para os vestibulares que davam acesso ao ensino superior, por meio da transmissão da educação geral. Já os estudantes da escola pública, que eram obrigatoriamente escolas profissionalizantes, encerravam seus estudos precocemente pela falta de acesso aos conteúdos de cultura geral que permitissem o ingressonas universidades. Desse modo, a ditadura intensificou a utilização da educação como ferramenta de reprodução das classes sociais.
A própria reforma acabou sendo um fracasso, já que os militares não ofereceram infraestrutura necessária para a transformação das escolas em estabelecimentos profissionalizantes. Acreditaram que a criação de uma lei – sem a construção de laboratórios, oficinas e preparação de docentes sintonizados com a lógica do ensino profissional – seria capaz, por si só, de concretizar uma efetiva modificação. A precariedade de alguns estabelecimentos era tamanha que houve colégios que utilizavam, no curso de datilografia, uma cartela com teclas desenhadas, pela falta de máquinas de escrever[5].
Sobre a referida reforma devemos fazer, ainda, um adendo. Não há um erro em prestigiar, também, o ensino profissional nas escolas, considerando que um saber prático, que desenvolve as competências manuais, é tão importante quanto o saber intelectual. Em outras palavras, saber-fazer também é saber. O equívoco está em fragmentar a educação brasileira, impondo o acesso do ensino profissional em detrimento do ensino clássico e propedêutico.
Após essa breve retrospectiva histórica, não podemos dizer que a educação não foi importante para a ditadura no Brasil. Na realidade, essa era uma área de grande relevância para os militares. Entretanto, resta-nos perguntar qual educação era importante? A ditadura visava a oferecer uma educação tecnicista, voltada para a satisfação das demandas do mercado de trabalho, ainda que esse ideal fosse de encontro com uma educação voltada à formação do indivíduo e ao desenvolvimento de um pensamento crítico. Dito de outra forma, o regime militar era frontalmente contra uma educação capaz de ampliar a liberdade dos cidadãos. Além de estar vinculada a uma concepção produtivista, a pauta do ensino servia, ainda, para reafirmar os valores do regime e impedir o contato com pensamentos que colocassem em cheque a lógica deste, criando um terreno infértil para a pluralidade de pensamento e fértil para ideias autoritárias.
Apesar dos incontáveis danos que o regime militar causou à educação no Brasil – deixando marcas que perduram até os dias atuais – destacamos que esses ataques resultaram em uma maior organização da classe dos professores e professoras, que lutaram como podiam contra os retrocessos da ditadura. Assim, apesar de tantos pesares, que a memória desse passado sombrio e os atuais retrocessos que temos vivenciado sirvam não para enfraquecer nossa luta, mas sim para fortalecer nossa união e resistência. A história ainda não terminou de ser escrita…
Matheus Silveira de Souza é Mestrando em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP). Pesquisa temas relacionados à Políticas públicas de educação, relações entre educação e trabalho e educação profissional.

[1] SAVIANI,Dermeval. O legado educacional no regime militar. Caderno Cedes, vol. 28, n. 76, pag. 291-312. Campinas, 2008.
[2] CUNHA, L.A. Movimentos sociais, sindicais e acadêmicos. In: CUNHA, L.A. Educação, Estado e democracia no Brasil. São Paulo: Cortez; Niterói: UFF; Brasília, DF: FLACSO do Brasil, 1991
[3] GADOTTI, Moacir. 50 anos depois. Como reverter o golpe na educação popular? Audiência púbica sobre os reflexos do golpe militar na educação brasileira. Brasília, 2014.
[4] MARX, Karl. Manuscritos econômico-filosóficos; tradução Jesus Ranieri. São Paulo: Boitempo, 2010.
[5] Agência Senado. Reforma tornou ensino profissional obrigatório em 1971. Publicado em 03/10/2017

Pedir ditadura não é ignorância, é medo de perder privilégios, diz historiadora

Pedir ditadura não é ignorância, é medo de perder privilégios, diz historiadora
Segunda-feira, 25 de junho de 2018

Pedir ditadura não é ignorância, é medo de perder privilégios, diz historiadora

Imagem: militantes pró-ditadura fazem protesto na Paulista, em São Paulo, em 31/3/18 | Foto: Daniel Arroyo/Ponte
Matéria originalmente publicada na Ponte.org
Não é de hoje que pedidos de intervenção militar aparecem nas ruas do país. Mas esse discurso ganhou força no fim de maio, quando caminhoneiros entraram em greve e, entre protestos contra preços de combustíveis e pedindo o fim da corrupção, muitas pessoas voltaram a defender, em uníssono, que o caminho para tirar o Brasil da crise seria a volta do regime militar.
Um levantamento do Terra, com termos procurados no Google, mostrou que o número de buscas pela expressão “intervenção militar” quadruplicou em maio de 2018 (3,17 milhões de buscas) em relação ao mesmo período de 2017 (669 mil).
 é melhor a violência de um regime autoritário a um ideal democrático que implique em perda de privilégios
A explicação não é a ignorância, mas a indiferença, na visão da historiadora Marília Bonas, coordenadora do Memorial da Resistência de São Paulo. “Como alguém exposta a opiniões de todos os tipos de pessoas todos os dias em função do lugar em que trabalho, queria dizer que é muito fácil acusar quem pede intervenção militar de ignorante do que foi a ditadura. Lamento dizer que o buraco é mais embaixo. Vivemos num mundo brutal e violento, onde se tortura e se mata pelas mais diversas razões”, conta a coordenadora do museu. Muita gente sabe, sim, o que foram as torturas e ignomínias desse período e não se sensibiliza por isso”.
Segundo Marília, parte da população entende que, no atual momento político, é melhor a violência de um regime autoritário a um ideal democrático que implique em perda de privilégios”. Para ela, “a fantasia de meritocracia de uma boa parte da sociedade faz acreditar que mesmo aquele que não tem privilégio algum vai perder o pouco que tem com a manutenção da democracia em tempos de crise”.
O Memorial da Resistência nasceu da pressão da sociedade civil para transformar o edifício que sediou o Deops/SP (Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo), um dos principais centros de tortura de São Paulo, em um lugar de memória que abordasse as violências cometidas nos períodos ditatoriais brasileiros.
O Memorial é hoje o único museu que trata o tema no Brasil junto aos mais diversos públicos e conta com intensa programação de exposições, atividades educativas e acervo digital de depoimentos e lugares de memória da repressão e resistência no país.
Para a diretora do Memorial, “a saída democrática implica em se responsabilizar pelo país, em eleger novas lideranças, fazer uma nova política, olhar a corrupção estruturante e estrutural. No entanto, dá trabalho e depressão discutir isso em meio a um mar de fake news e palpiteiros de portal de notícia. Está todo mundo cansado, desiludido, pedindo ajuda”.

‘É como pedir para ser amordaçado’

Para o militante e filósofo político Edson Teles, “desde que saímos da ditadura militar, o fantasma da intervenção militar está presente”. Mesmo com documentos revelados recentemente sobre escândalos de corrupçãoexecuções sumárias, ainda há grupos defensores do retorno da ditadura.
“Quando vejo essas manifestações só consigo pensar na nossa luta por fazer uma justiça de transição, que é composta por conhecer e revelar a verdade, garantir a memória e reflexão do que foi a ditadura e colocar no banco dos réus os que torturaram e mataram as pessoas que lutaram contra a ditadura, para mostrar que eles [torturadores] que estavam errados e não quem era contra”, conta o militante e ex-preso político Ivan Seixas.
Preso junto ao pai e torturado aos 16 anos, Seixas alega que o que mais o incomoda é ver trabalhadores pedindo pela volta do regime militar. “É como pedir para ser amordaçado e privado de sua liberdade. É um absurdo”, lamenta.
Para Ivan, “vivemos numa sociedade manipulada por uma mídia fascista, pisamos num terreno mais fértil ainda para a direita fazer essa pregação. Esses pedidos de intervenção militar são frutos da ignorância das pessoas. É obvio que há infiltrações das forças de direita nessas manifestações, eles precisam passar a ideia de que está tudo ruim, ‘porque tem muita corrupção’ e só tem uma solução: os militares”.
Eu espero muita luta para o nosso país. Hoje a luta não necessariamente precisa ser armada e clandestina, como em minha época. Ela vai ser uma luta na base, sabemos que ao colocarmos em xeque a ditadura deles, vai ter muita violência e repressão, mas enquanto houver espaço, precisamos lutar para não fecharem a repressão em cima da classe trabalhadora”, conclui Seixas.