segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Lei de abuso de autoridade impõe regras de conduta a juízes, promotores e policiais

A LEI É PARA TODOS

Lei de abuso de autoridade impõe regras de conduta a juízes, promotores e policiais

Entra em vigor hoje nova legislação com objetivo de evitar que agentes do Estado atuem de forma intimidatória e abusiva contra cidadãos
  13:25
Compartilhar:    
   
JOSÉ CRUZ/AGÊNCIA BRASIL
Contestada no STF, nova lei de abuso de autoridade pune crimes dos agentes de Estado contra os cidadãos
São Paulo – Entrou em vigor hoje (3) a nova lei de abuso de autoridade. Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em setembro, a legislação torna crime uma série de condutas por parte de agentes de Estado como policiais, juízes e promotores.
A lei foi questionada por associações de magistrados, policiais, auditores fiscais e integrantes do Ministério Público com pedido de liminar ao Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro Celso de Mello é relator de ao menos quatro ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) contra a norma, mas não há prazo definido para que o assunto seja julgado.
Bolsonaro chegou a vetar 33 pontos da nova lei, mas 18 desses vetos acabaram derrubados pelo Congresso Nacional.
A lei de abuso de autoridade prevê, por exemplo, punição de multa ou até mesmo prisão para condutas como negar habeas corpus quando manifestamente cabível (um a quatro anos de prisão, mais multa) ou proibir acesso aos autos do processo ao interessado ou seu defensor (seis meses a dois anos de prisão, mais multa).
Além de penas de prisão e multa, diversos pontos preveem sanções administrativas, como a perda ou afastamento do cargo, e cíveis, como indenização. Para incorrer em crime, a lei prevê que as condutas sejam praticadas com a finalidade de beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou com o objetivo de prejudicar alguém, ou ainda “por mero capricho ou satisfação pessoal”.
Para o advogado e cientista político Jorge Folena de Oliveira, do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), os protestos contra a nova legislação são resultado de corporativismo.
“Todos os profissionais têm suas responsabilidades. Um motorista de ônibus que causar um acidente por excesso de velocidade vai ser responsabilizado. Assim como um cozinheiro que se descuidar do preparo adequado dos alimentos. Da mesma forma, um promotor ou um juiz não pode atuar para além das suas atribuições, sem ser responsabilizado”, afirmou em entrevista ao Jornal Brasil Atual, em outubro.

Acima da lei

A legislação anterior, de 1965, tipificava apenas abusos cometidos por policiais. A nova lei inclui todos os agentes de Estado, e não apenas juízes e procuradores. Sem a previsão de responsabilização legal, esses agentes acreditavam estar acima da lei, avalia Oliveira. Ele citou outros casos de abuso para ilustrar o que a nova lei busca coibir, dentre eles, como o uso indevido das conduções coercitivas pelos integrantes da Lava Jato.
O advogado explicou que essa ferramenta é utilizada quando uma pessoa, diante de uma convocação, se recusa a comparecer por mais de uma vez diante do juiz ou da autoridade policial. E cita o caso específico do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, levado à força para prestar depoimento em março de 2016, em condução coercitiva autorizada pelo então juiz Sergio Moro.
“O que nós vimos foi um verdadeiro espetáculo patrocinado por promotores e juízes relacionados com a mídia. Conduziram o ex-presidente para um depoimento que sequer ele havia sido comunicado. Se fosse, como ele mesmo disse, compareceria ao juiz que queria ouvi-lo.” Outro caso de abuso cometido por Moro foi a divulgação de conversas de Lula com a então presidenta Dilma Rousseff, naquele mesmo ano. O grampo extrapolava o prazo legal da interceptação concedida pela própria Justiça e, por incluir Dilma, deveria ter sido remetida ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Jorge Folena de Oliveira lembrou outros casos de abuso de agentes do Estado contra cidadãos. “Tivemos um caso de uma juíza decretou a prisão de uma menor numa cela com adultos. É um caso típico de abuso. Pessoas nas comunidades pobres e favelas são violentadas pela polícia, que entram na casa das pessoas, à noite, sem autorização judicial. Outra juíza do Rio de Janeiro, há cerca de dois anos, determinou penhoras judiciais em 7 mil processos, sem examiná-los. Pessoas tiveram contas bancárias, venda de imóveis comprometidas.”

Outros pontos passam a ser crime

–   Invadir ou adentrar imóvel à revelia da vontade do ocupante sem determinação judicial. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
–  Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado sem prévia intimação de comparecimento ao juízo. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
– Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
– Grampear telefone, interceptar comunicações de informática ou quebrar segredo de Justiça sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei. Pena: de dois a quatro anos de prisão, mais multa.
– Divulgar gravação ou trecho de gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir, expondo a intimidade ou a vida privada ou ferindo a honra ou a imagem do investigado ou acusado. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
– Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado. Pena: de seis meses a dois anos de prisão, mais multa.
– Insistir em interrogatório de quem tenha optado por ficar em silêncio ou pedido assistência de um advogado. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
– Manda prender em manifesta desconformidade com a lei ou não soltar alguém quando a prisão for manifestamente ilegal. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.
– Manter presos de ambos os sexos na mesma cela ou espaço de confinamento. Pena: de um a quatro anos de prisão, mais multa.

AVANÇOS Finlândia terá jornada de trabalho de seis horas, quatro dias por semana ENQUANTO O BRASIL....


AVANÇOS

Finlândia terá jornada de trabalho de seis horas, quatro dias por semana

Para a primeira-ministra Sanna Marin, medida beneficia trabalhador e aumenta a produtividade. "Pessoas merecem passar mais tempo com as famílias"
  18:19
Compartilhar:    
   
CREATIVE COMMONS
Sanna é a chefe de Estado mulher mais jovem do mundo. Com 34 anos, a política de centro-esquerda aposta em um modelo que já vem apresentando bons resultados
São Paulo – Conquista relacionada ao bem-estar dos trabalhadores, a jornada de trabalho padrão de seis horas durante quatro dias por semana será adotada na Finlândia. “Acredito que as pessoas merecem passar mais tempo com as famílias, entes queridos, se dedicar a hobbies e outros aspectos da vida, como a cultura”, defendeu a primeira-ministra do país, Sanna Marin.
Sanna é a mulher chefe de Estado mais jovem do mundo. Com 34 anos, a política de centro-esquerda aposta em um modelo que já vem apresentando bons resultados em outro país nórdico, a Suécia, desde 2015. “É importante permitir que os cidadãos finlandeses trabalhem menos. Não se trata de governar com um estilo feminino, mas de oferecer ajuda e manter as promessas aos eleitores”, completou.
A informação foi adiantada pelo periódico britânico Daily Mail, nesta segunda-feira (6). Atualmente, o regime de trabalho no país é de oito horas por dia, cinco dias por semana.
Outra experiência de redução da jornada foi bem sucedida no Japão, um dos países com grande índice de esgotamento por excesso de trabalho. A Microsoft implementou a jornada sueca, agora copiada pela Finlândia. Em todas as experiências realizadas neste sentido, houve aumento de produtividade – em média em 39,9% – e melhora na percepção de qualidade de vida dos trabalhadores.
Antes de assumir o posto de primeira-ministra, quando era ministra dos Transportes, Sanna já defendia a redução de jornada. A proposta foi bem aceita pelos demais ministros do país. Líder da Aliança pela Esquerda no país, o ministro da Educação, Li Andersson, este é importante passo da primeira-ministra no sentido de cumprir com promessas de campanha.

Cultura e Arte: os antídotos para um ano sombrio (2)

Cinema

Cultura e Arte: os antídotos para um ano sombrio (2)

Um bom ano do cinema com filmes nacionais de elevado nível, grandes produções estrangeiras, 'docs' políticos e excelentes diretores que espelham um mundo em transformação

 
31/12/2019 15:41
(Arte/Carta Maior)
Créditos da foto: (Arte/Carta Maior)
 
* LEIA TAMBÉM: Cultura e arte: os antídotos para um ano sombrio **

O espectro de uma nova ditadura ameaçada pelo atual presidente da República. A diversidade de gênero, cores de pele, de classe, de religião e cultura, raízes da nossa rica civilização - perseguida no Brasil. No mundo, um panorama dramático. Crianças refugiadas num campo da Grécia onde se auto-mutilam ou se suicidam tal o sofrimento infligido pelas desgraças que vivem.

Pássaros de Verão

Da América Latina, um filme colombiano se apresenta em sua beleza extraordinária. Chama-se Pássaros de verão. No idioma espanhol, outro cartaz foi comentado por Carta Maior, produzido por Pedro Almodóvar, intitulado Todos já sabem.

 Todos já sabem

Em 2019, presenciou-se por um lado a desconstrução do núcleo famíliar por conta da recessão econômica. Originada e pressionada pelas cìnicamente batizadas de reformas, as cruéis revisões em andamento no Brasil, a família, como no filme exemplar do célebre diretor japonês Hirokazu Kore-eda, vai se deteriorando. A contraparte é a hipócrita imagem familiar de mentira, fora do álbum de fotografias, vendida pelo avanço da religião.

Assunto de família

Os discriminados que vivem nas favelas de Tóquio, é o desconcertante Assunto de família, do festejado Hirokazu Kore-eda, Palma de Ouro em Cannes, ano passado, e cartaz no Brasil durante mais de um mês. Na resenha: "Numa das quadras mais sombrias da história deste país (N.R. o Brasil), quando o jargão Deus, Pátria e Família inesperadamente voltou a ecoar em uma máquina do tempo e nos remete aos idos dos anos 40, o filme do cineasta japonês Hirokazu Kore-eda, Assunto de família (Shoplifters), deixa platéias avançadas e público conservador no mínimo perplexos.''

(Divulgação)Assunto de família

No pacote de excelentes produções estrangeiras, o colombiano Pássaros de verão e Todos já sabem, este de Asghar Farhadi, um dos melhores cineastas iranianos. '' Pode ser visto como curioso dossiê sobre situações conhecidas de todos, porém murmuradas, porque não são comprovadas, até o momento em que os eventos se precipitam e a verdade surge - como ocorre agora, no Brasil,'' é o que diz a resenha. ''A nudez do rei é revelada, as especulações, a fofoca, os murmúrios vêem a luz. É quando as provas – ah, as provas - são apresentadas.''

Todos já sabem
Já Pássaros de Verão ''combina majestosamente o modelo do filme de máfia ao western e à fábula mítico-cultural. Tem sido chamado de O Poderoso Chefão colombiano por sua complexa visão dos laços de lealdade e honra familiar, bem como pela austera administração da violência.''

Pássaros de Verão


Um dos filmes de 2019 comentados por Carta Maior em novembro passado valeu a resenha intitulada AI-5, o filme: para ver, para não esquecer e não se repetir, um dos mais acessados pelos leitores do site na sua versão em rede social. ''Com grande audiência nestes últimos dias - mais de 150 mil visualizações até este momento - está sendo divulgado no streaming  (Youtube) o documentário AI-5 – o dia que não existiu, de 57 minutos, do jornalista paulista Paulo Markun. Ele reproduz, reencenando algumas delas, diversas sequências até hoje pouco conhecidas da última sessão da Câmara dos Deputados antes da promulgação do Ato Institucional número 5.''

 AI-5 – o dia que não existiu

Outro comentário sobre filme importante, este com o tema de escolha de gênero livre, é o de Carlos Alberto Mattos sobre o documentário Bixa travesty. ''Um filme-manifesto em prol da identidade sexual plural com a mira apontada na virilha dos machos,'' ele escreve. ''Nem bem homem, nem bem mulher. Nem gay, nem hetero. Nem viado, nem transgênero. A cantora e ativista Linn da Quebrada é a bixa travesty, designação apta não a definir, mas a aumentar a confusão de gêneros.''

 Bixa travesty

Sobre os exilados da sua terra, o filme libanês da respeitada cineasta Nadine Labaki, Cafarnaum, foi um grande cartaz deste ano lembrado em CMUm menino que quase não existe é a resenha: ''Uma história de privações, raiva e alguma ternura'', Cafarnaum (que significa caos) foi Premio do Júri em Cannes 2018. Pequena grande obra prima.

Cafarnaum

Em Era uma vez em Hollywood, de Quentin Tarantino, o diretor, como é a sua especialidade, não administra a violência com austeridade. Mas ele revisita com talento a Los Angeles de 1969, as avenidas repletas de cinemas funcionando dia e noite, a indústria de filmes ainda trabalhando a pleno vapor, e o ano em que os hippies perderam sua inocência com o brutal assassinato da mulher de Roman Polanski, Sharon Tate e um grupo de amigos da atriz, por Charles Manson e sua família hippie. Um trecho da resenha, Era uma vez uma época vibrante: '' Este é o nono filme dirigido por esse pesquisador de cinema, apaixonado por cinema, historiador do cinema, roteirista, escritor, produtor, ator e diretor de filmes, o penúltimo que, diz ele, vai dirigir antes de se aposentar.''

 Era uma vez em Hollywood

Já quase terminando o ano, Martin Scorsese chegou com a força do seu cinema a bordo de O irlandês onde pela primeira vez Robert de Niro e Al Pacino contracenam em várias sequências com diálogos consistentes e decisivos. Justifica um par de resenhas publicadas em Carta Maior: Pólvora e melancolia e Sobre a lealdade, a violência e o remorso.

 
O Irlandês

Há que lembrar também os comentários de dois filmes afetuosos, realizados com o coração. Eles fornecem boas energias para enfrentar 2020. Um deles é No coração do mundo, um lindo filme brasileiro que vem de Contagem, em Minas Gerais. ''Muito mais adequado seria se No coração do mundo, o belo título de um dos melhores filmes apresentados este ano até agora, fosse No coração do Brasil. O local simbólico não seria propriamente a shangrilá almejada pelos quatro protagonistas de No coração do mundo. Ao contrário: seria um avesso do paraíso na terra, mas seria também a sinalização de que, com este filme, estamos no coração do país.''

(Divulgação)No coração do mundo

O segundo é Varda por Agnès, da estimada cineasta de Paris. A resenha é A despedida da velha senhora. O comentário sobre o comovente filme: ''Agnès Varda morreu a 29 de março último, aos 90 anos, pouco depois de dar por concluído esse filme-testamento, criado como série de TV em dois episódios. Sua última imagem, esvanecendo-se na bruma de uma de "suas" praias, foi o fecho perfeito para uma longa jornada cinema adentro. O frescor de seus filmes, presente aqui em meio a um certo didatismo da abordagem, nos enche de saudade quando a tela se apaga.''

 Varda por Agnès

Nossos votos são para a tela não se apagar em momento algum e em nenhuma circunstância; e que o ano de 2020 seja corajoso e transformador para todos.

Nota do PT sobre o ataque dos Estados Unidos no Iraque

Nota do PT sobre o ataque dos Estados Unidos no Iraque

Sucessivos governos dos EUA e particularmente o atual têm contribuído para agravar os litígios no Oriente Médio
 04/01/2020 12h28 - atualizado às 14h18

O Partido dos Trabalhadores (PT) condena com veemência o ataque no dia 2 de janeiro contra militares iranianos, iraquianos e libaneses nas proximidades do aeroporto de Bagdá por mísseis dos Estados Unidos.
A medida levou à morte do General Quasem Soleimani, comandante das forças “Al Quds” do Irã, além da de sete outras pessoas de várias nacionalidades conforme divulgado até o momento.
Lamentável que o governo brasileiro tenha manifestado apoio a tal ação sob o argumento de combate ao terrorismo. Esse argumento falso encobre a atuação sistemática e criminosa dos EUA no Oriente Medio há muito tempo, estimulando conflitos, desestabilizando a região e colhendo resultados financeiros expressivos para investidores das indústrias armamentista e do petróleo.
Serve ainda como parte da estratégia de campanha do presidente estadunidense à sua reeleição no segundo semestre deste ano. Esperamos que a opinião pública mundial e a estadunidense em particular se posicionem contra este tipo de manobra eleitoral que somente tende a aprofundar o conflito na região gerando mais violações dos direitos humanos e ressentimentos. Sucessivos governos dos EUA e particularmente o atual, têm contribuído para agravar os litígios no Oriente Médio.
Fazemos um chamado pela paz e pelo cumprimento dos acordos multi e plurilaterais, incluindo o acordo nuclear assinado com o Irã durante o mandato do presidente Barack Obama e é fundamental que o governo dos EUA e de seus aliados recuem imediatamente de sua interferência nociva no Oriente Médio.
04 de Janeiro de 2020
Partido dos Trabalhadores

Como funciona um perfil “robô” no Twitter

Terça-feira, 07 de Janeiro de 2020
ISSN 1519-7670 - Ano 19 - nº1068

AGÊNCIA PÚBLICA > REDES SOCIAIS

Como funciona um perfil “robô” no Twitter

Por Ethel Rudnitzki (texto) e Bruno Fonseca (infográficos) em 18/12/2019 na edição 1068
(Foto: Agência Pública – Bruno Fonseca)
Publicado originalmente no site da Agência Pública
O dia 8 de novembro foi especialmente agitado no Twitter por causa da soltura do ex-presidente Lula, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) contra prisão depois de condenação em segunda instância. Apoiadores e opositores do presidente não falavam de outra coisa nas redes.
Opositores agitavam as tags #STFVergonhaNacional, #STFEscritorioDoCrime, #LulaPreso, #PrisaoEm2InstanciaSim, chamavam para manifestação no dia seguinte – #Dia9NasRuas – e pediam aprovação da PEC 410 para revogar a decisão da corte – #PEC410ja. Os apoiadores do ex-presidente postavam as tags #LulaLivre, #LulaInocente, #JustiçaParaLula.
Os dois lados disputavam as posições mais altas no trending topics, assuntos mais comentados do dia no Twitter, com a intenção de pautar o debate público.
O perfil @Sah_avelar participou ferrenhamente desse embate no lado contrário a Lula. A conta fez 870 publicações no dia 8. Uma média de 36 publicações por hora, uma a cada um minuto e meio. De todas essas publicações, 824 (95%) estavam acompanhadas de alguma hashtag crítica à decisão do STF e à soltura de Lula, ajudando a levar a temática para os Trending Topics.
Durante as queimadas na Amazônia, em meados de agosto, @Sah_avelar foi uma das mais ativas na defesa do ministro Ricardo Salles e contra organizações não governamentais. Como mostrou uma reportagem da Agência Pública, o perfil fez 417 publicações entre os dias 21 e 22 de agosto com a hashtag #AmazoniaSemONGs e 157 com a #SomosTodosRicardoSalles. Todas as postagens eram acompanhadas de um texto, muitas vezes sem vínculo com as tags, e o horário da publicação – três horas adiantado em relação ao fuso de Brasília.
A atividade do perfil – alta frequência das publicações, sem pausas, texto padronizado acompanhado de hashtags e links – se encaixa nos critérios para identificação de perfis automatizados descritos por Márcio Moretto Ribeiro, coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital. “Produz muito, com hashtags que não necessariamente estão conectadas com o conteúdo produzido.”
Dessa forma, ainda em agosto, a reportagem da Pública identificou o perfil como um robô destinado a levantar pautas a favor do governo e denunciou a conta ao Twitter, que afirmou que tomaria as providências. Apesar disso, @Sah_Avelar continuava ativa até o início de dezembro, quando foi suspensa pela plataforma.
Máquina de tuitar
O perfil @Sah_Avelar foi criado em setembro de 2009, segue 4,2 mil contas e tem 2,7 mil seguidores. A foto de perfil era de uma jovem vestindo uma camiseta verde e amarela. A descrição se resumia a uma fileira de emojis de coração com as cores da bandeira.
A foto de capa era a imagem de uma multidão com um filtro esverdeado e o título Conservative Core, ou Núcleo Conservador, em tradução livre. Na descrição, um link direciona para um canal de YouTube de mesmo nome.
Nos últimos dez meses, @Sah_Avelar fez 65 mil tuítes. Toda a atividade anterior a isso foi excluída. A primeira publicação disponível é do dia 19 de fevereiro, mas até meados de março não há registros de hashtags publicadas pela conta ou de atividade atípica, sendo que a média de publicações não passava de cinco por dia.
Foi só em 19 de março que a conta publicou a sua primeira tag: #BolsonaroOrgulhaOBrasil. Uma única publicação. Na época, o perfil estava focado em responder a tuítes de políticos e famosos demonstrando sua opinião: elogios aos alinhados com a direita e rejeição aos de esquerda. A partir de 7 de junho, porém, a atividade mudou drasticamente. @Sah_Avelar continuava a apoiar pautas pró-Bolsonaro e de direita, mas em uma escala muito maior. Com publicações a cada 5 minutos, o perfil subiu a tag #CongressoSemRecesso.
Além da alta frequência, as publicações com a tag começavam com um número que corresponde a um horário, três horas adiantado em relação ao de Brasília, e com a palavra “urgente”. Também acompanhavam um link para o canal Conservative Core no YouTube. Muitas vezes o próprio texto das postagens era idêntico. Sah Avelar publicou 172 vezes o texto “urgente – joice faz cena e chorando envia recado a bolsonaro”, levando ao vídeo de mesmo título no canal Conservative Core. Outros trinta textos foram tuitados mais de 100 vezes, com diferentes hashtags, representando 36% do total de publicações feitas pelo perfil no período.
Esse passou a ser, então, o padrão de publicação do perfil @Sah_Avelar. Do dia 5 de novembro ao dia 1º de dezembro de 2019, período monitorado pela reportagem, a conta publicou 9.949 tuítes. Uma média de 368 publicações por dia. Quinze tuítes por hora. Um a cada 4 minutos.
(Foto: Agência Pública – Bruno Fonseca)
Robô-sobe-tag
Além de evidenciar automatização, o padrão das publicações de @Sah_Avelar indica a intenção do perfil: subir hashtags ligadas às pautas de direita. De todas as postagens feitas em novembro, 9.445 (95%) tinham alguma tag. Quase todas elas eram ligadas à pautas da direita.
(Foto: Agência Pública – Bruno Fonseca)
Carlos d’Andréa, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), acredita que, por serem manipuláveis, os trending topics não deveriam ser considerados medidores do debate. “Falar que um tema chegou aos trending topics, hoje, é falar que um conjunto de bots foi direcionado para alavancar aquilo. Não é termômetro nenhum de uma opinião pública em relação àquele tema. É absolutamente artificial e manipulável.”
Rede núcleo conservador
Quase todas as publicações da @Sah_Avelar tinham hiperlinks, presentes em 9.520 dos 9.949 tuítes (95%). Todos levavam a vídeos de YouTube do canal Conservative Core ou a outros canais de direita. O Conservative Core tem 17,3 mil inscritos, mais de 580 mil visualizações e se declara um portal de notícias “para quem não quer perder tempo com besteira e precisa saber o que é importante”. Ele publica de oito a vinte vídeos por dia – segundo sua própria descrição. Nenhum dos seus vídeos do último mês teve mais de mil visualizações.
Os esforços do perfil @Sah_Avelar para divulgar o Conservative Core também se expressam nos textos dos tuítes. Em quase 600 publicações o perfil pediu inscrições no canal. “Colabore com o seu RT [retuíte] e sua inscrição no canal, nos ajuda MUITO com a relevância e alcance!”
Além de @Sah_Avelar, o canal contava com pelo menos outros quatro perfis de Twitter dedicados a divulgar seus vídeos na rede social. @CanalCNews – antes nomeado @sasa_news -, @MyaMyers, @tmr_kyle e @noMatte34020924 têm fotos de perfil e de capa idênticas associadas ao canal. O nome dos perfis também é igual, só muda a numeração: Sasa – Conservative Core 2, 3 e 4.
A dinâmica é conhecida como “botnet”, ou rede de robôs, quando perfis atuam de maneira sincronizada, com mesma atuação – um posta e outros retuitam, ou respondem, ou publicam em seguida algo parecido. “Essa estratégia é muito profissional e rende muito dinheiro em contratos de publicidade”, diz D’Andréa.
(Foto: Agência Pública – Bruno Fonseca)
Um entre milhares
O @Sah_Avelar era apenas um entre milhares de outros perfis automatizados no Twitter. A plataforma afirma que contas falsas ou de spam representam menos de 5% dos usuários ativos mensais – cerca de 16 milhões de contas. Pesquisadores, no entanto, estimam que a proporção seja muito maior.
Muitas dessas contas estão em conformidade com os termos de uso do Twitter, que admite a existência de robôs desde que sigam a sua política de automação. As regras gerais da plataforma resumem: “Não é permitido usar os serviços do Twitter com o intuito de amplificar ou suprimir informações artificialmente ou se envolver em comportamento que manipule ou prejudique a experiência das pessoas no Twitter”.
Segundo a rede social, as contas que violarem essas regras podem ser punidas com diminuição de visualização, sendo removidas da ferramenta de busca do Twitter e até banidas. As publicações identificadas como automatizadas também podem ser excluídas do cálculo dos trending topics. “Desde junho de 2017, conseguimos detectar uma média diária de 130.000 contas que tentaram manipular os trending topics – e tomamos medidas para evitar essa influência”, afirmam em nota oficial.
Em resposta a esta reportagem, o Twitter disse se esforçar proativamente e através de denúncias para checar e identificar contas suspeitas de automação indevida. “De janeiro a junho de 2019, mais de 97 milhões de contas foram desafiadas em todo o mundo por apresentarem comportamento suspeito de spam”. A plataforma não respondeu sobre medidas tomadas especificamente com relação ao perfil @Sah_Avelar. Mas ressaltou que as providências contra contas automatizadas variam caso a caso.
Três dias depois da reportagem entrar em contato com a plataforma – pela segunda vez -, o perfil @Sah_Avelar e o @CanalCCore foram suspensos. Imediatamente após a exclusão, foram criadas contas alternativas. O @CanalCCore virou @CoreCanal e @Sah_Avelar virou @AvelarSah. Os perfis denunciaram as suspensões, reclamando terem perdido seguidores.
O novo @CoreCanal se apresenta na descrição com a frase I’m back, ou “estou de volta”, em tradução livre. Com um dia de atividade, o perfil já tinha feito 284 publicações e acumulava 855 seguidores. A Pública entrou em contato com o responsável pelos perfis, que também administra o canal Conservative Core. Identificado como Caio Giovanetti, ele admitiu fazer uso de automação nas contas. “As hashtags são automáticas utilizando a mais utilizada entre os usuários que eu sigo”, disse. Giovanetti, no entanto, afirma que “a automação usada é lícita”, apesar de ter tido contas suspensas.
Para D’Andréa, as medidas impostas pelo Twitter são insuficientes. “Até que esse processo de denúncia aconteça e que o Twitter verifique se uma conta é artificial, o estrago já foi feito.”
Mas, segundo o coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital, a exclusão de contas de Twitter é mais complexa do que parece. Isso porque, em muitos casos, há administradores reais por trás dos perfis automatizados. “Existem contas híbridas, que estão automatizadas, mas que têm alguém acompanhando, que às vezes publica um conteúdo não programado”, explica Moretto.
Assim, quando a conta é testada pela plataforma ou questionada por uma reportagem, ela pode mudar seu comportamento. “É como se a chave entre ser um robô e ser um perfil orgânico pudesse ser mudada. Então, alguém dizer que aquele perfil não é um robô não garante nada”, completa D’Andréa.
Além disso, a polarização nas redes faz com que usuários reais se comportem de uma maneira que parece automatizada. “Qual a diferença entre um bot e um militante que repassa todas as mensagens que recebe no seu WhatsApp sem ler?”, questiona D’Andréa. “O estrago pode ser maior ou menor, mas o padrão de comportamento é muito parecido.”
***
Ethel Rudnitzki é formada em jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da USP. Na Pública, fez parte do Truco – projeto de fact-checking – durante as eleições de 2018 e produz reportagens sobre redes sociais e desinformação.
Bruno Fonseca é repórter multimídia graduado e mestre pela Universidade Federal de Minas Gerais. Trabalha com infografia, dados, vídeos e animação.