quinta-feira, 1 de novembro de 2018

ACEITAÇÃO DE MORO DEVERIA PROVOCAR ANULAÇÃO DE SENTENÇA DO TRIPLEX, DIZ COMITÊ

MOURÃO CONTRADIZ BOLSONARO E AFIRMA: IMPRENSA NÃO É INIMIGA

Imprensa internacional vincula escolha de Moro à prisão de Lula

01 DE NOVEMBRO DE 2018, 21H40

Imprensa internacional vincula escolha de Moro à prisão de Lula

Veículos tradicionais como Le Monde, El País, Financial Times, BBC, entre outros, criticam o fato de Sérgio Moro ter aceitado o ministério de Bolsonaro, destacando que o juiz foi o responsável pela prisão do ex-presidente
Não poderia ser pior a repercussão internacional da escolha de Sérgio Moro para ser o ministro da Justiça de Jair Bolsonaro. Alguns dos principais veículos espalhados pelo mundo veicularam em seus portais que o juiz só foi convidado para o caro, e com amplos poderes, porque prendeu o ex-presidente Lula e, com isso, facilitou a vitória do militar.
O francês Le Monde, já antes da confirmação, publicou: “Será que foi por ter emprisionado o líder da esquerda brasileira que o magistrado será recompensado por Jair Bolsonaro?”. O título do texto era: “No Brasil, as ambiguidades do juiz anticorrupção Sergio Moro com a extrema direita”.
Com a ratificação de Moro, o Le Monde ironizou as escolhas de Bolsonaro para sua equipe de ministros: “Brasil: militar, juiz anticorrupção, astronauta… os futuros ministros do governo Bolsonaro”, se referindo ao general Augusto Heleno (ministro da Defesa), o astronauta Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e Sergio Moro. O jornal chama Bolsonaro de “extrema direita” e ressalta que Moro condenou Lula.
O El País, da Espanha, colocou em sua manchete: “O juiz que encarcerou Lula da Silva aceita ser Ministro da Justiça de Bolsonaro” e chama o militar de “herói do antipetismo”.
No Financial Times, da Grã-Bretanha, o título da reportagem foi: “Bolsonaro nomeia juiz que ajudou a prender Lula”. Da mesma forma, também do Reino Unido, o The Times afirmou em sua manchete: “Bolsonaro promete emprego sênior para o juiz que prendeu o seu rival”.
O autor da matéria, Stephen Gibbs, por meio de sua conta no Twitter, disse: “No fim da nossa conversa com o juiz Moro, ele falou que não se candidataria para a presidência do Brasil, como muitos tinham-no encorajado a fazer, e que isso atrapalharia a lei. Contudo, ele acaba de aceitar um cargo no governo Bolsonaro como ministro da Justiça”.
O portal da BBC destaca que o “maior escalpo” obtido por Moro foi do “esquerdista Luiz Inácio Lula da Silva, o líder nas eleições antes de sua condenação a 12 anos de prisão por corrupção em abril passado”.
“Grande erro”
Michael Reid, editor da tradicional revista britânica The Economist, definiu a escolha de Moro para o ministério como “um grande erro. Agora a prisão do Lula parece um ato político”. Já o texto da agência notícias AP, dos Estados Unidos, afirma que “Moro condenou políticos de diversos espectros políticos. Mas tomou decisões que muitos interpretam como enviesadas. Para Moro pessoalmente, que agora vai se tornar um político parte de um governo, e para o futuro da Lava Jato, a decisão traz grandes riscos”.
Outra agência de notícias, a Bloomberg, especializada em economia, a indicação menciona os “benefícios para Bolsonaro, que são óbvios: escolher um herói da lei e ordem é uma aposta segura para aumentar o apoio da sua base conservadora”.
Na Itália, por sua vez, onde a Lava Jato sempre é comparada à Operação Mãos Limpas, o site da rede de TVs e rádios RAI veiculou uma reportagem tentando explicar a questão brasileira. “Desde que a Lava Jato começou em 2014, caíram políticos de todos os lados, mas Moro é acusado de ser particularmente impiedoso com a esquerda, especialmente com o ex-presidente Lula”.

BOLSONARO RECONHECE QUE MORO FOI SEU CABO ELEITORAL

O espanto com Moro é a derrota do jornalismo


O espanto com Moro é a derrota do jornalismo. Por Tiago Barbosa

 
Sérgio Moro (Foto: EBC)
A surpresa midiática com a decisão de SErgio Moro de aceitar a recompensa por eleger Bolsonaro é reveladora da metástase do jornalismo hegemônico brasileiro.
É a confissão de cumplicidade e incompetência diante do dever de fiscalizar os atos do juiz e reportar tanto a conduta politica como as arbitrariedades cometidas no curso da Lava Jato.
E nem foram poucas nem discretas.
Moro seguiu o script traçado desde o início da operação para derrubar o PT e encarcerar Lula.
Concentrou a investigação no partido, usou e abusou de vazamentos para influenciar a opinião pública, grampeou ilegalmente a presidenta e levou o ex-presidente a depor sob vara.
Eram nítidas as ações parciais, seletivas e articuladas com objetivo de produzir fatos políticos.
Afetados diretamente – embora conduzidos por uma tibieza suicida chamada de republicanismo -, políticos petistas sempre acusaram o juiz de perseguir a sigla.
E tinham razão. Simples buscas por ano no Google permitem constatar como, desde 2014, receava-se o plano de cassar Dilma, prender Lula e entregar as urnas para a direita.
A mídia independente percebeu as manobras sob o verniz jurídico e, junto a veículos internacionais, denunciou a patranha.
Mas a imprensa hegemônica calou-se. Pior. Marchou, vergonhosamente, para desqualificar qualquer desconfiança sobre a conduta de Moro e tratou como ridículas todas as suspeitas.
Era questão óbvia fazer jornalismo. Mas nenhum veículo de massa cobrou, por exemplo, celeridade do CNJ para julgar desvios de Moro.
A comunidade jurídica nacional e internacional, estupefata, se mobilizou para destroçar a sôfrega sentença contra Lula no caso tríplex. E foi silenciada para o grande público.
O contraponto necessário era transmutado pela mídia nacional em “mimimi” petista – e o barco dos absurdos seguia sem contratempos: atropelo nos prazos processuais, desprezo a provas, subserviência absoluta à decisão morista.
Nenhuma matéria de fôlego na cobertura da mídia tradicional analisava a sério o teor político do conjunto das ações do juiz.
Quando o habeas corpus fugiu do roteiro, Moro teve a petulância de sair das férias e impedir a soltura de Lula – conduta ilegal e antiética sem precedentes na justiça brasileira.
Mas, covarde e conivente, o jornalismo hegemônico brasileiro minimizou. Assim como galgou o ápice da sabujice ao tentar desmerecer uma decisão da ONU a favor de Lula já na véspera da eleição.
Parte expressiva do mundo chiava, autoridades faziam romaria para se solidarizar com o ex-presidente. A situação fedia a injustiça. Mas os jornalistas taparam o nariz e mantiveram o alinhamento lavajateiro.
Não havia questionamento, repercussão. Ninguém emparedava Moro. Nem mesmo o caso Tacla Durán, nitidamente um indício internacional de reprovação à conduta de Moro, mereceu a atenção devida.
Esse jornalismo fez de Moro um intocável, imaculado.
A decisão de aceitar a recompensa por ajudar Bolsonaro – ao impedir o principal concorrente de disputar a eleição – foi descrita pela imprensa internacional de forma precisa: o pagamento com cargo público pelo serviço sujo de usar a justiça com fins políticos.
Inês morta, os artífices do endeusamento do juiz agora fingem surpresa e arrependimento com o descaramento do acordo de Moro com Bolsonaro – assim como parte dos bolsominions desiludidos com os óbvios impropérios anunciados pelo capitão.
Mas, claro, se recusam a reconhecer Lula como preso político e a exigir das autoridades competentes o reparo imediato dos danos causados pelo juiz à justiça e ao eleitorado do país.
São, com raras exceções, cúmplices de uma anomalia institucional e do esgarçamento da democracia brasileira. Ou cínicos cuja omissão proposital e calculada agora fingem desconhecer.
A opção de Moro de fazer política oficialmente e sem a toga só surpreende quem, durante anos, optou por bajular o juiz contra todas as evidências de má conduta esfregadas na cara da sociedade.
O tamanho do espanto, hoje, é a medida exata da corrosão cancerígena do jornalismo à brasileira – ou, muito pior, da falta dele.