segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Casa da América Latina é lançada em Vitória

Casa da América Latina é lançada em Vitória

Entidade chega ao Espírito Santo com representatividade e apoio de cidadãos e organizações capixabas

A noite do dia 31 de janeiro marcou a fundação da Casa da América Latina no Espírito Santo. A entidade, que será uma subsede da Casa da América Latina, de alcance nacional, surge com 66 fundadores, participantes de diversas organizações capixabas. O evento contou com a presença de Valmira Guida, secretária-geral da Casa da América Latina, sediada no Rio de Janeiro, e de Carlos Eugênio “Clemente”, único comandante vivo da Ação Libertadora Nacional (ALN), movimento de resistência à ditadura militar no Brasil liderado por Carlos Marighela.

Não por acaso, o Sindicato dos Estivadores do Estado do Espírito Santo (Setemees) foi escolhido para sediar a assembleia de constituição da Casa no Espírito Santo. Ali foi realizado  o último discurso Marighella, antes de ser assassinado pela ditadura militar a qual combatia em um momento em que os regimes autoritários imperavam em muitos países do continente.

A Casa da América Latina subsede Espírito Santo, terá como objetivo, assim como a entidade nacional, promover a amizade e a solidariedade entre os povos do continente na busca da integração soberana e construção de sociedades justas e fraternas. O subsecretário de Estado da Cultura, Joelson Fernandes, esteve presente e afirmou que o governo está trabalhando para disponibilizar um edifício do Estado inutilizado no Centro de Vitória que seria cedido para sediar a Casa da América Latina no Espírito Santo.

Após fala dos convidados especiais e intervenções dos demais presentes, foi realizada a leitura do estatuto da entidade e a eleição da diretoria e dos conselhos da entidade capixaba, que terá um mandato provisório de um ano e seis meses.

Uma das responsáveis pela mobilização inicial no estado, Fernanda Tardin foi eleita presidente, tendo Cláudio Machado como vice-presidente. Ainda foram eleitos outros dez membros da diretoria, a Comissão Fiscal e os conselheiros. O número de suplentes foi aumentado devido ao grande número de presentes interessados em participar da composição inicial da organização.

A fundação da nova organização representa um sonho antigo dos capixabas. “Desde os anos noventa que se tenta iniciar um processo deste no Espírito Santo e finalmente conseguimos. Foi um momento de forte emoção nos presentes. Arrancamos com grande respaldo e com uma potente mistura entre militantes históricos com vasta experiência de luta e uma grande quantidade de jovens que representam força e renovação na construção deste espaço coletivo”, declarou a nova presidente.

A entidade, que ainda espera a definição do local para sua sede, já recebeu doação de materiais de educação e formação, doados pela direção nacional da Casa da América Latina, pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e pelo Sindicato Estadual dos/das Profissionais de Educação - Núcleo Campos dos Goytacazes (RJ), que estiveram presentes no evento.

“O momento inicial será de capacitação dos membros e de troca de experiências com os membros da Casa da América Latina do Rio de Janeiro, que possuem mais de cinco anos de experiência neste trabalho coletivo. O primeiro mandato será para estruturação do espaço físico e elaboração de projetos, mas também de realização de eventos e debates relacionados com temas e causas importantes para o continente”, afirmou Tardin.

EM DEFESA DA INTEGRAÇÃO CONTINENTAL

Em sua fala, Valmira Guida contou a experiência da Casa da América Latina no Rio de Janeiro e a importância de constituir este tipo de espaço para trazer alguns temas pouco conhecidos no Brasil. Ela destacou que a Casa foi fundada em momento de grande impulso da ideia de integração continental, especialmente difundida pelo governo bolivariano de Hugo Chávez na Venezuela, mas também por Evo Morales, Rafael Correa, Lula e outros líderes da região.

Ela lembrou também de Abreu e Lima, um pernambucano pouco conhecido no Brasil, mas que foi aliado de Bolívar e um dos mais importantes generais a lutar pela liberação da América Hispânica, além de ser um dos primeiros brasileiros a falar dos ideais socialistas. Para Guida, o papel da Casa deve ser também o de resgatar esses importantes personagens da história do continente. “A Casa da América Latina deve fomentar o sentimento internacionalista. Só fortalecendo a integração continental poderemos nos apropriar de toda a riqueza do continente”, afirmou.

Clemente destacou que historicamente o Brasil esteve orientado para a Europa, especialmente à cultura francesa e à economia inglesa, e depois também aos Estados Unidos.  Ele conta que quando jovem queria aprender francês e inglês e ir estudar na Europa. Porém, a Revolução Cubana e a figura de Ernesto Che Guevara criaram uma nova imagem de rebeldia, desta vez própria do continente. "Quando largou o poder, o Che adquiriu a estatura de um dos maiores seres humanos do século. Hoje eu procuro os que querem largar o poder, e não os que querem permanecer nele. Admiro os que ousem largar o poder", provocou Clemente.

Fernanda Tardin afirmou que em seu primeiro encontro a diretoria entendeu que será apenas representante e coordenadora do grupo que acaba de surgir e deve se ampliar ao longo da atuação da entidade no estado. Serão formados coletivos para trabalhar junto a cada diretoria, fortalecendo a participação ampla dos capixabas interessados em compor a Casa da América Latina.

“Nossa cidade é nossa primeira realidade, mas só podemos transformar a realidade se tivermos uma visão geral de nosso continente. Podemos realizar atividades de formação, exibição de filmes, cursos de línguas e de música latino-americana, intercâmbios culturais, acordos bilaterais com povos da América Latina, entre outras atividades, tudo depende do envolvimento da sociedade capixaba, especialmente da juventude”, concluiu Fernanda Tardin. 

Contato:
Fernanda Tardin (Presidente) – 99933-9196

Daniel Dantas e Gilmar Mendes são citados em livro-denúncia


Daniel Dantas e ministro Gilmar Mendes são citados em livro-denúncia

10/1/2014 12:07
Por Redação - de São Paulo

Daniel Dantas volta à tona em um livro-denúncia sobre a investigação da Polícia Federal
Daniel Dantas volta à tona em um livro-denúncia sobre a investigação da Polícia Federal
O livro-denúncia do jornalista Rubens Valente, que chegou às prateleiras nesta sexta-feira, detalha os bastidores da operação policial que investigou os negócios do banqueiro Daniel Dantas, em 2008, e traz documentos inéditos recolhidos durante as investigações. Conduzida pela Polícia Federal (PF), a Operação Satiagraha, expressão em sânscrito que significa “busca da verdade”, causou um alvoroço na República após a prisão temporária de Dantas e outros 23 envolvidos. Após um extenso trabalho de investigação policial, conduzido por Protógenes Queiróz, delegado da PF à época e hoje deputado federal (PCdoB-S), todo o processo foi anulado no Superior Tribunal de Justiça, devido às possíveis ilegalidades cometidas ao longo das investigações.
O material inédito inclui mensagens eletrônicas interceptadas pela PF na casa do consultor Roberto Amaral, que trabalhou para Dantas entre 2001 e 2002, no fim do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Segundo o livro, as mensagens sugerem que Dantas pediu ajuda ao ex-presidente e a outras autoridades para barrar investigações que o Ministério Público conduzia sobre seus negócios na época. Dantas, que controla o grupo Opportunity e administra recursos de investidores brasileiros e estrangeiros, adquiriu participações em várias empresas privatizadas no governo FHC, em especial no setor de telecomunicações.
Parte do dinheiro administrado pelo Opportunity, na época, pertencia a um fundo sediado nas Ilhas Cayman, um paraíso fiscal no Caribe, e as autoridades sempre suspeitaram que políticos e investidores brasileiros participavam desse fundo, o que as leis brasileiras proibiam. Verônica Serra, filha do candidato tucano derrotado em 2010, José Serra, operava uma empresa em sociedade com Verônica Dantas, irmã do banqueiro envolvido na investigação. Segundo apurou o jornalista, Amaral enviou várias mensagens a ajudantes de ordem de Fernando Henrique, na tentativa de falar com o então presidente da República. Não há registro de que esses e-mails foram encaminhados a FHC e lidos por ele, embora este dado seja irrelevante, pois as mensagens poderiam chegar ao então ocupante do Palácio do Planalto por outros meios.
Nas mensagens obtidas por Valente, Dantas era tido como amigo do atual ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes, então chefe da Advocacia-Geral da União. Um trunfo dentro do governo. “Um dos e-mails sugere que Dantas contava com o apoio de Mendes numa disputa com a Agência Nacional de Telecomunicações e para manter na agência um procurador simpático a seus interesses. Em 2008, quando Mendes estava no Supremo e Dantas estava preso, o ministro concedeu habeas corpus para libertá-lo e fez críticas públicas à maneira como as investigações foram conduzidas”, afirma o texto de divulgação do livro, publicado na edição desta sexta-feira do diário conservador paulistano Folha de S. Paulo.
– Eu nunca vi Daniel Dantas. Na Satiagraha, houve abuso na investigação e minhas decisões impuseram uma derrota ao Estado policial – defende-se Mendes, em entrevista à Folha.
Em mensagem a Rubens Valente, o ex-presidente Fernando Henrique disse que sabia da relação de Roberto Amaral com Daniel Dantas e afirmou que nunca tomou medidas para favorecê-lo. A assessoria do Opportunity afirmou que Dantas desconhece as mensagens encontradas pela polícia na residência de Roberto Amaral.
Mensagem cifrada
Dantas e Mendes estão na capa da revista Carta Capital desta semana
Dantas e Mendes estão na capa da revista Carta Capital desta semana
O livro Operação Banqueiro – Uma trama brasileira sobre poder, chantagem, crime e corrupção, além de contar a história de como o banqueiro Daniel Dantas escapou da prisão com apoio do STF, mostra como ele virou o jogo, passando de acusado a acusador. A primeira edição chega às livrarias com 20 mil exemplares de 464 páginas, ao custo de R$ 44,90. Entre as ‘pérolas’ reproduzidas na obra, está uma mensagem de Amaral a Daniel Dantas, cifrada, na qual encaminha uma possível resposta a outra mensagem, que lhe teria escrito o então ministro José Serra. O tom é extremamente mal criado:
“Recebi seu recado lido por amigo comum. Aviso‑lhe: não mais mande‑me (sic) recados neste tom: acho que você estava fora de si quando mandou esta infeliz mensagem. Não sou lambe‑cu acanalhado ou acarneirado. Você sabe disso. Já fiquei seis anos sem falar com você e, se necessário, fico mais vinte. Não sou Roseana ou Sarney. Você precisa de mim e eu não preciso de você. Você vá ser acavalado, acerbo, com quem tem obrigação de aguenta-lo. Quanto à sua bizantina observação sobre D (Dantas), devo dizer‑lhe: Você não sabe de nada — nada mesmo. Ponha isto na sua cabeça. Ele é credor, grande credor. Eu e duas pessoas sabemos disso. Não seja encegueirado e não se deixe embair pelo pequeno Sérgio Andrade (…) Cópia deste vai para a Pessoa”.
Além de Serra, o autor de Operação Banqueiro também fala do papel do então presidente do STF, Gilmar Mendes, na campanha contra a operação policial e a favor de Dantas e desmonta “algumas versões mentirosas alimentadas com o único intuito de anular a condenação do banqueiro a 10 anos de prisão por suborno”, afirma. Em entrevista à revista CartaCapital, que chegou aos assinantes nesta sexta-feira, afirma que “o aspecto mais grave foi a interdição da investigação, a impossibilidade de as autoridades levarem a apuração inteira até o final. Em termos gerais, a regra do jogo do processo penal no Brasil é simples: o delegado aponta evidências, o procurador acusa ou não, o juiz julga”.
– Ao longo do processo, o réu se defende. Em caso de inocência, após o processo o réu pode buscar a punição dos responsáveis por um eventual erro judicial. Mas no caso da Satiagraha, o delegado foi proibido de investigar e o juiz foi impedido de julgar. O sistema foi brutalmente bloqueado, de modo a não funcionar, a não concluir sequer a apuração inicial. Ao longo de 24 anos como repórter, li e acompanhei algumas dezenas de inquéritos policiais. Mas nunca vi uma inversão de fatores tão dramática e na dimensão deste caso. Eu só posso qualificar o rumo dos acontecimentos como espantoso. Que dizer de um cidadão que não chega a ser julgado, mas em poucos meses passa a acusador em um processo contra o próprio delegado e o próprio juiz que o prenderam? É o sonho de todo investigado. As instituições estão em risco quando um acusado consegue impedir que a atribuição de um fato criminoso seja devidamente apurada até o fim pelos órgãos públicos – afirmou.
Leia, adiante, a entrevista de Valente à revista:
– Daniel Dantas não só conseguiu anular na Justiça a operaçao como leis e regras judiciais foram mudadas depois da ação policial, entre elas o uso de algema (a Lei Dantas), que passou a ser disciplinado. De onde provém tanto poder?
– Até 2010, o Opportunity sequer constava nas listas de doadores das principais campanhas eleitorais registradas na Justiça eleitoral. Estranho que uma empresa com tantas relações no meio político não tenha colaborado para eleições até aquele ano. Mas certa vez um advogado de Dantas o descreveu como um indivíduo com boas relações com o Congresso, com os poderosos, uma pessoa “que se vira”. De fato, as relações de Dantas com políticos parece ser um traço fundamental na sua trajetória. Mas isso não explica tudo. No livro procurei descrever as relações de amizade e acadêmicas de advogados de Dantas e do banco Opportunity com o ministro do Supremo Gilmar Mendes. Que durante a presidência do STF disse abertamente se opor ao que chamava de abusos do Ministério Público e da Polícia Federal. As coisas se juntaram. Sem Mendes na presidência do Supremo, nem todo o prestígio de Dantas teria sido capaz de reverter o jogo de forma tão espetacular. A alteração de regramentos se deveu ao empenho pessoal de Mendes, que chegou a convocar um “pacto social” e chamar o presidente da República “às falas”. Ele se tornou um ator fundamental no processo de desqualificação da Satiagraha. Partiu do Supremo o vazamento de um relatório, depois desmontado pelos fatos, que sugeria a existência de grampo sobre autoridades do tribunal. E partiu de Mendes a decisão de acolher a tese de que o juiz Fausto De Sanctis havia se “insurgido” contra o Supremo pelo simples fato de ter ordenado uma segunda ordem de prisão contra Dantas. Como se um juiz não pudesse julgar de acordo com sua consciência. A ideia de uma suposta “rebeldia” comoveu outros ministros do STF, que chegaram a falar em “união” em defesa do tribunal. Como se o Supremo fosse um clube no qual os filiados devem “defender” uns aos outros, e não meramente analisar fatos e provas.
– A introdução de Operação Banqueiro cita excessos e equívocos do delegado Protógenes Queiroz. Essas falhas eram suficientes para anular o processo?
– A defesa do banqueiro se aproveitou dessas falhas. Mas o delegado muito mais acertou do que errou. Ele acertou ao elaborar e colocar em prática um plano que levou à documentação da oferta de suborno e à apreensão do dinheiro que seria usado como propina para ele e outro delegado do caso. Foi uma situação arriscada, que ele soube concluir com sucesso. Acertou ao conseguir uma ampla interceptação de telefones e de comunicações por internet com ordem judicial que trouxe evidências importantes para a investigação. Acertou ao não se dobrar às dificuldades do inquérito, que tratava de temas variados e de certa complexidade técnica. Esses méritos, porém, foram ofuscados pela intensa campanha de desmoralização que ele e a Satiagraha sofreram em diversos níveis e por diferentes meios. Seus erros, por mais banais, acabaram amplificados à exaustão. Por quê? Porque ele era a peça mais fraca do inquérito, havia sido abandonado à própria sorte pela sua instituição, a Polícia Federal. Qualquer jornalista com alguma experiência em processos judiciais sabe que todo e qualquer inquérito policial, todo e qualquer, repito, contém certa dose de erros, imprecisões ou conclusões sem rigorosa base nos fatos. Mas o trabalho de um delegado é apenas uma parte do processo. O sistema judicial possui freios e contrapesos que permitem que as opiniões do delegado sejam verificadas por outras instâncias, a saber: o Ministério Público, o juiz e os advogados dos réus. O beabá de um advogado criminalista é descobrir esses erros e, por meio deles, tentar obter alguma vitória judicial, na estratégia de convencer o Judiciário sobre as “ilegalidades” da polícia. O jornalista isento que ler com paciência o inquérito da Satiagraha vai concluir que os erros cometidos pelo delegado ao longo da operação, talvez o principal deles tenha sido pedir a colaboração de agentes da Abin sem um respaldo superior da direção da Polícia Federal, jamais teriam a capacidade de levar à anulação da operação. Em situações normais de temperatura e pressão, seus erros poderiam ser censurados e corrigidos, mas não teriam qualquer repercussão em termos de legalidade.
– Ao longo da apuração, você encontrou alguma prova ou indício de que o então presidente do STF, Gilmar Mendes, ou algum integrante do tribunal foi grampeado pela Policia Federal ou pela Abin?
– Sob vários pontos de vista (jornalístico, técnico, jurídico e mesmo ético), não é mais possível aceitar que essa suspeita continue a ser veiculada como fato, pois todas as imensas e complicadas investigações desencadeadas por diferentes órgãos públicos jamais localizaram qualquer prova material de grampo telefônico ou ambiental sobre qualquer ministro do STF. Eu cuidei de verificar esse ponto quase à exaustão. Ouvi com atenção e a necessária dose de desconfiança integrantes da Operação Satiagraha, li as conclusões das investigações policiais, vi os laudos do material apreendido. Não há uma linha sequer sobre constatação de grampo contra autoridades do Supremo. Esses são os elementos concretos que integram o processo. Fora disso, só mesmo a paranóia, alimentada por um estranho silêncio das autoridades encarregadas de verificar a existências desses supostos grampos. A Polícia Federal e a Procuradoria Geral da República sabem muito bem que não existe prova alguma dos grampos, mas até hoje, mais de cinco anos depois, jamais vieram a público fazer o desmentido cabal. Nunca prestaram contas das investigações. Esse ato de transparência deveria ter ocorrido há muito tempo, pois instituições e figuras públicas foram colocadas em xeque.
– E quanto as supostas ilegalidades cometidas pela Abin?
– Li e reli várias vezes os diversos depoimentos e documentos que integram a Satiagraha e o inquérito aberto para apurar a participação da Abin. A única conclusão possível é que a Abin não usurpou o papel de investigação consagrado pela Constituição às polícias. A Abin não interceptou nenhum telefonema, não tomou nenhum depoimento e não requisitou ao juiz do caso nenhuma medida de qualquer natureza. Em suma, os agentes da Abin em momento algum conduziram o inquérito. Por todo o tempo a investigação continuou presidida pela autoridade policial, com a devida fiscalização do Ministério Público e sob os olhares do Judiciário. O papel dos agentes da Abin se restringiu a acompanhar e fotografar alvos nas ruas, ler e-mails interceptados por ordem judicial, transcrever conversas interceptadas com ordem judicial. Ou seja, era um papel meramente auxiliar. Um trabalho braçal. No pendrive do delegado Protógenes foram apreendidos também documentos em word produzidos por agentes da Abin sobre algumas autoridades. Esses papéis, que incluem dados delirantes e informações de difícil comprovação, jamais foram anexados à Satiagraha. São imprestáveis como prova, tanto que o delegado não os juntou ao inquérito. E foi apenas esse o papel da Abin. Por que a eventual participação de agentes da Abin em certo ponto do inquérito poderia ser capaz de anular a operação inteira? Não há uma única participação, nem mesmo lateral, de agentes da Abin no episódio do suborno de dois delegados federais. A alegação de que a mera e pontual ajuda de alguns agentes da Abin em qualquer ponto da investigação seja capaz de anular um processo inteiro é inteiramente risível. É, na verdade, um tapa na cara dos cidadãos brasileiros pagadores de impostos e cumpridores das leis. Os advogados falam na teoria importada dos EUA dos “frutos da árvore contaminada”. Diz a tese que um processo gerado por uma prova ilícita deve ser anulado pelo vício na origem. Ocorre que a participação dos agentes da Abin n Satiagraha nada teve a ver com a origem do processo, foi sempre posterior, e portanto a teoria é totalmente inválida.
– Dantas já foi condenado fora do Brasil. Cortes britânicas e norte-americanas se referiram a ele em termos duros e o acusaram de fraude, entre outro crimes. No Brasil, a despeito da anulação posterior (agora em analise no Supremo), ele foi condenado em primeira instancia por suborno. Seu nome também tem sido citado nos principais escândalos da era FHC e Lula. Ele continua, porém, a ser tratado em diversos círculos e por considerável parcela da mídia como um “empresário polêmico”. E apenas isso. Pelo seu livro, conclui-se que ele e mais do que polêmico, certo?
– Dantas e o banco Opportunity aparecem referidos em diversos escândalos nos últimos anos: grampos do BNDES e as privatizações, caso do extinto banco Banestado, investigação privada da Kroll e a Operação Chacal, CPI dos Correios e o ‘mensalão’ e, por fim, a Operação Satiagraha. Essa sequência de acontecimentos coloca o banqueiro como um dos principais personagens da história brasileira contemporânea. Tratá-lo como “polêmico” é um resumo pobre e impreciso. Ele foi acusado e investigado não por suas supostas “polêmicas”, mas por fatos e atos que podem e devem ser averiguados.
– As relações de Dantas com o PSDB foram retratadas em varias reportagens e livros ao longo das ultimas décadas. Operação Banqueiro acrescenta novas e interessantes provas dessa relação umbilical. O banqueiro, por outro lado, sempre se declarou perseguido pelo PT, mas os interesses do Opportunity e do partido se entrelaçam na Satiagraha. Você chegou a buscar explicações para os motivos de os petistas terem saído em apoio ao banqueiro e participarem da força tarefa para desacreditar a operação?
– A Satiagraha veio a público em abril de 2008, no mesmo período de intensas negociações entre os fundos de pensão ligados ao PT, a telefônica Oi e o banqueiro com vistas à criação da gigante da telefonia BrOi. Havia um interesse público e manifesto do governo na criação da nova supertele, uma operação que acabou possível após um ato do próprio presidente Lula. Creio que as investigações da Satiagraha chegaram num péssimo momento para os interesses do governo, que queria logo concluir aquela fusão. Isso pode ter contribuído para a extrema má vontade do governo em relação ao inquérito policial. Por outro lado, Dantas havia conseguido se aproximar de petistas históricos. No livro procurei descrever o papel de dois desses petistas no processo de criação da BrOi. Houve um segundo fato: em 2008, a Polícia Federal havia incomodado muitos interesses de políticos de vários partidos, incluindo petistas e integrantes da base aliada. E a “tolerância” do PT e do governo em relação à PF havia chegado ao ponto máximo um ano antes, quando uma equipe de policiais invadiu a casa do irmão de Lula na Grande São Paulo. Por sua vez, Lula havia superado, do ponto de vista da sua imagem diante o eleitorado, o trauma da acusação do ‘mensalão’, e não estava tão dependente das ações espetaculares da polícia, que davam ao governo um discurso anti-corrupção.
– Dantas recorre a uma teoria conspiratória para se defender. Diz-se vitima da união de interesses políticos e econômicos de integrantes do PT, seu desafeto Luis Roberto Demarco e a Telecom Italia. Ele tem usado esse argumento para tentar influenciar processos contra ele no Brasil. Nos últimos anos, ele e seus advogados se referem a um inquérito em Milão que investigou e puniu funcionários da Telecom Italia por espionagem. Esse inquérito sempre é evocado em diversos processos pelo Opportunity. Ao longo de sua pesquisa, encontrou alguma evidência dessa conspiração ou alguma relação entre os processos no Brasil e a investigação italiana?
– Tive acesso e verifiquei milhares de páginas que integram a investigação realizada na Itália, incluindo os extensos depoimentos dos principais envolvidos. Como digo no livro, o Opportunity enfrenta sérias e talvez incontornáveis dificuldades para demonstrar uma prova objetiva sobre a alegada corrupção de autoridades do Brasil por funcionários da Telecom Italia de modo a “perseguir” o banco brasileiro. Até o momento, essa hipótese não passa disso, uma simples suspeita sem confirmação. Nos autos há apenas referências indiretas e imprecisas. Mas os advogados do Opportunity passaram a manobrar esse fantasma para relacionar a investigação no Brasil à outra da Itália, exigindo que uma acusação só fosse investigada depois da outra. É como se um motorista atropelasse alguém na rua e, quando encontrado pela polícia, alegasse ao juiz: “Lá na Itália uma pessoa disse que esse delegado que me prendeu aqui está me perseguindo. Então eu só posso ser acusado do atropelamento se antes vocês investigarem esse delegado”. É um argumento juridicamente absurdo. Mas que ganhou guarida em variados meios.
– No relatório da Satiagraha, Protógenes Queiroz dedica um capitulo às relações de Dantas com a mídia. Como você definiria essa relação?
– O foco do meu livro são as provas, acusações e explicações do caso Satiagraha e não o papel da mídia, embora ela seja uma personagem presente em toda a narrativa. Eu também entendi que o debate sobre o papel da mídia na cobertura da Satiagraha havia sido extenso e intenso na internet, por meio de blogs e sites e outras publicações, como CartaCapital, que remaram contra a maré, e por isso eu não precisava gastar páginas que poderiam ser usadas para avaliar outros aspectos do caso. Mas ao longo do livro eu procurei demonstrar diversas imprecisões e enganos divulgados pela mídia que acabaram por ajudar as posições do Opportunity. Outro aspecto notável foi ver que boa parte da mídia não viu nenhum problema na paralisação e anulação do caso Satiagraha, considerando-os fatos quase rotineiros, mas que de banais nada tinham.


Fonte: Correio do Brasil

Mensalão mineiro: PGR pede condenação de Azeredo a 22 anos de prisão


Mensalão mineiro: PGR pede condenação de Azeredo a 22 anos de prisão

Jornal do BrasilLuiz Orlando Carneiro
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviou nesta sexta-feira (7/2) ao ministro Roberto Barroso, relator no Supremo Tribunal Federal da ação penal do chamado mensalão mineiro (AP 536), as suas "alegações finais", nas quais recomenda que o deputado federal Eduardo Azeredo (PSDB-MG) seja condenado pelos crimes de peculato (três vezes) e lavagem de dinheiro (seis vezes) a penas que somariam 22 anos de prisão, mais multa de R$ 451.052 (623 dias/multa).
Nas alegações finais - que têm mais de 80 páginas - o chefe do Ministério Público afirma que o atual deputado federal Eduardo Azeredo provocou uma "subversão do sistema político-eleitoral", e acrescenta: "Usando a máquina administrativa em seu favor de forma criminosa e causando um desequilíbrio econômico financeiro entre os demais concorrentes ao cargo de governador de Minas Gerais em 1998".
Com estas alegações finais, o relator Roberto Barroso terá condições de levar a ação penal a julgamento, decorridos os prazos regimentais.
A expectativa é de que Barroso notifique os advogados do deputado na próxima semana. O prazo posterior é de 15 dias, ao fim do qual os autos devem ser remetidos ao revisor da AP 536, que é o ministro Celso de Mello.

Atual deputado e ex-governador de Minas é acusado de peculato e lavagem de dinheiro
Atual deputado e ex-governador de Minas é acusado de peculato e lavagem de dinheiro
O processo
No último dia 15 de janeiro, o ministro Luis Roberto Barroso determinou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentasse as alegações finais na ação penal do mensalão mineiro. Toda a parte de instrução do processo, como depoimentos de testemunhas de defesa e de acusação, já foi concluída.
Na AP 536 são apurados supostos desvios de dinheiro público durante a campanha de reeleição do hoje deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) ao governo de Minas Gerais, em 1998.
De acordo com denúncia da PGR, aceita pelo Supremo em 4/11/2009, o parlamentar é acusado dos crimes de peculato e lavagem de dinheiro.
Segundo a procuradoria, o então candidato teria se beneficiado de recursos oriundos do suposto esquema que envolveu a empresa de publicidade SMP&B, de propriedade do publicitário Marcos Valério, condenado na Ação Penal 470, o processo do mensalão. Outros acusados respondem às acusações na primeira instância da Justiça de Minas,porque não possuem foro privilegiado.
A denúncia que gerou a ação penal a ser julgada ainda este ano pelo STF foi acolhida pelo plenário do STF quando o seu relator era ainda o ministro Joaquim Barbosa - que teve de passar a ação para o ministro mais novo (na época Luiz Roberto Barroso) ao assumir a presidência do STF.
A ação penal foi aberta, formalmente, contra o senador Eduardo Azeredo(PSDB-MG), por crimes de peculato e lavagem de dinheiro, que teria cometido durante a campanha eleitoral para sua reeleição ao governo de Minas Gerais, em 1998, num esquema de caixa dois , em associação com o então vice-governador Clésio Andrade, o publicitário Marcos Valério e seus sócios, entre outros.
Clésio de Andrade - atual senador pelo PMDB e, como Azeredo, detentor do privilégio de foro especial no STF por prerrogativa de função - também teve a denúncia aceita, e responde como réu à Ação Penal 606.
O indício mais contundente para que o plenário do STF se convencesse da necessidade da abertura de processo penal para o futuro julgamento do senador, por crime de peculato, foi a liberação de R$ 3,5 milhões, pelo Banco do Estado de Minas Gerais (Bemge) e pelas estatais Companhia de Saneamento (Copasa) e Companhia Mineradora de Minas Gerais (Comig) - dois meses antes da tentativa de reeleição de Azeredo - destinados à promoção esportiva Enduro da Independência . Como a quantia fosse muito elevada, o presidente da Copasa - tendo em vista a magnitude do patrocínio, sem paralelo na história da empresa solicitou ordem por escrito, que foi dada por Eduardo Guedes, chefe da Casa Civil e secretário de Comunicação Social do então governador. Para justificar o montante exigido das instituições públicas, foram acrescentados ao plano de promoção ainda conforme a denúncia - dois outros eventos ciclísticos: o Iron biker e o Campeonato Mundial de Motocross.
Naquela época, o então relator Joaquim Barbosa destacou que o Enduro da Independência era realizado, há cinco anos, pelo governo mineiro, mas sempre sob o patrocínio da Secretaria de Comunicação Social. E que nunca custou mais de R$ 100 mil. Assim, a seu ver, ficou mais do que comprovada a prática de crime de peculato pelo então governador e candidato à reeleição, em conluio com a empresa de publicidade SMP&B,da qual o então vice-governador Clésio Andrade era titular de 40% das ações e Marcos Valério de 10%.
O ministro-relator considerou também relevante, para demonstrar "os indícios fortes da natureza criminosa da conduta de Azeredo", um recibo constante dos autos do inquérito, no qual o denunciado assumiu ter recebido da SMP&B a quantia de R$ 4,5 milhões, para saldar compromissos diversos. Segundo Barbosa, tal recibo desmontava a tese da defesa de que o governador-candidato não teria ingerência direta na administração dos recursos de sua campanha.
Eduardo Azeredo e o ex-ministro das Relações Institucionais Valfrido Mares Guia (coordenador da campanha de Azeredo) encabeçaram a lista dos 15 denunciados ao STF, em novembro de 2007, pelo então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, no que passou a ser chamado de mensalão mineiro. Também foram denunciados então o ex-vice-governador Clésio Andrade, Cláudio Mourão (tesoureiro da campanha), o publicitário Marcos Valério e seus sócios Ramón Hollerbach e Cristiano de Mello Paz.
De acordo com o Ministério Público, na denúncia reforçada em 2009, por Roberto Gurgel, os elementos de convicção angariados ao longo da investigação revelam que o esquema delituoso verificado no ano de 1998 foi a origem e o laboratório dos fatos descritos no inquérito do mensalão , cuja denúncia foi aceita pelo Supremo em agosto de 2007,tornando réus o ex-chefe da Casa Civil José Dirceu e mais 39 pessoas,incluindo parlamentares.
Trechos das alegações finais do PGR na ação penal do mensalão mineiro 
"Há nos autos conjunto probatório robusto que confirma a tese acusatória e afasta por completo a tese defensiva, estando claramente demonstrado ao longo da instrução processual que tanto o desvio de recursos públicos do Estado de Minas Gerais, quanto a lavagem desses capitais tiveram a participação direta, efetiva, intensa e decisiva de Eduardo Brandão de Azevedo que, além de principal beneficiário dos delitos cometidos, também teve papel preponderante em sua prática.Com vistas a delinear, de forma clara, todos os meandros das práticas delitivas descritas na denúncia, torna-se necessária a apresentação de tópicos específicos nas presentes alegações finais, considerando-se a complexidade da trama criminosa na qual o ora réu, o então Governador de Minas Gerais, esteve envolvido, ocupando posição de destaque".

"Ao desviar recursos públicos, Eduardo Azeredo pretendeu, ao fim e ao cabo, praticar mais um episódio de subversão do sistema político-eleitoral, ferindo gravemente a paridade de armas no financiamento das despesas entre os candidatos, usando a máquina administrativa em seu favor de forma criminosa e causando um desequilíbrio econômico-financeiro entre os demais concorrentes ao cargo de governador de Minas Gerais em 1998".

"Chama a atenção nesse período após a eleição de 1998 a intensa troca de ligações entre Eduardo Azeredo, a SMP&B, a DNA Propaganda e Marcos Valério. Entre julho de 2000 e maio de 2004 foram 72 ligações, sendo que conversas diretas entre o réu e Marcos Valério totalizaram 57.Esse número expressivo de ligações denota, a mais não poder, um relacionamento muito próximo entre o réu e Marcos Valério, sendo mais um elemento que, somado aos demais, comprova a inconsistência da versão defensiva de que Eduardo Azeredo não teria nenhum conhecimento sobre o desvio de valores públicos para emprego em sua campanha eleitoral".

"Não há se exigir que Eduardo Azeredo praticasse por suas próprias mãos, o 'iter' de cada conduta criminosa. Exatamente para isso havia a colaboração ('lato sensu') de outros agentes, todos devidamente denunciados na medida de suas ações e responsabilidades. O que se demonstrou no caso em tela é que os fatos não teriam como ser praticados na forma em que provados se não tivessem a participação essencial e decisiva, como verdadeiro coordenador e maestro, ditando as linhas de condutas, de Eduardo Azeredo. Não se trata de presunções,mas de compreensão dos fatos, segundo a realidade das coisas e a provados autos".

Assessoria de Eduardo Azeredo divulga nota:
"O teor das alegações finais da Procuradoria Geral da República ainda é desconhecido. O deputado Eduardo Azeredo manifesta sua confiança no Supremo Tribunal Federal, que decidirá ouvindo também as alegações da defesa.
Manifesta ainda total estranheza com a contradição entre o relatório da Procuradoria e as provas apresentadas ao processo.
Azeredo reitera sua inocência com relação às acusações e espera que as questões sejam esclarecidas o quanto antes. Reforça que não houve mensalão, ou pagamento a parlamentares, em Minas Gerais e que as questões financeiras da campanha de 1998, alvo da ação penal que tramita no STF, não eram de sua responsabilidade.
Reafirma ainda que a aquisição de cotas de patrocínio por estatais mineiras, também questionada, não é da alçada de um governador de Estado e não houve sua a determinação para que ocorresse".