quinta-feira, 6 de outubro de 2016

A VANTAGEM É QUE A HISTÓRIA NÃO ACABA

A vantagem é que a história não acaba

Em entrevista ao Blog do Rovai, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), fez uma análise do momento político do país, incluindo as eleições deste ano. Tratou ainda da forma com que a Lava-Jato foi instrumentalizada e a mudança de direção nos rumos do país. Aproveitando os 28 anos de promulgação da Constituição, Flávio Dino, que já foi juiz federal, comentou que a Carta Magna, “fruto de uma articulação progressista”, deu contribuições importantes no cenário político do país.

Para Dino, as eleições municipais, no Maranhão, enterraram de vez a oligarquia política da Era Sarney. O PCdoB elegeu 46 prefeitos, dentre um universo de 153 eleitos do campo aliado ao governo e mais 215 vereadores. Para ele, o principal mérito “foi ter conseguido paradoxalmente manter vivo o sentimento da mudança”.

“Em pouco tempo, um ano e meio, conseguimos mostrar para a população que é possível, ainda que de modo incipiente, claro, fazer mudanças assertivas na vida das pessoas, no modo de governar”, comemora.

O governo atribui o resultado positivo nas eleições municipais do Maranhão também à sustentação da “credibilidade”, apesar das dificuldades econômicas e fiscais, “do desemprego na sociedade, a gente manteve um estoque e credibilidade para continuar falando de mudanças e a população acompanhar. O tempero principal foi a capacidade de em pouco tempo, com poucos meios, gerar alguns resultados simbólicos que mantiveram nossa capacidade de aglutinar o campo pela alta aprovação popular”, avalia.
Aspecto nacional

Entretanto, para o governador, cabe uma revisão dos vários fatores que levaram à “derrota” do campo progressista e popular e a ascensão da direita e do conservadorismo, nas eleições, em nível nacional. E citou como exemplo a vitória em primeiro turno do empresário João Doria (PSDB) em São Paulo.

Para Dino, uma das razões para desequilibrar o jogo político ocorreu em 2014, com a instrumentalização política da Lava-Jato. “Qual a resultante do fortalecimento desse bloco no terreno da política, já que gostam tanto de falar de Operação Mãos Limpas, sem entender direito as consequências? Nós temos uma situação similar, meio italiana nesse sentido também, que é ‘berlusconização’ da política. Agora nós temos o próprio Berlusconi que é o João Dória.”

Segundo o governador, o que houve foi uma crise de representação aguda e uma “fragmentação do sistema partidário, de forma que se consegue identificar derrotados, mas tem dificuldade de identificar vencedores”. E dessa forma, teve “um afastamento da população da política, resultados indo na direção da abstenção, voto nulo e branco. Ou seja, uma descrença”.

Para ele, ninguém ganhou, “tirando essa vitória notável do Dória, em São Paulo, você vê que o próprio PSDB teve derrotas. O PMDB teve derrotas expressivas. Então, temos uma desestruturação de todo o sistema institucional”.

Crise da esquerda

No que tange à participação política no campo institucional, Flávio Dino faz uma análise de “profunda crise da esquerda”. “Como vimos, fomos reduzidos a praticamente 20% da sociedade”, explicou, citando os números eleitorais nos grandes centros.

“A esquerda foi pulverizada e reduzida a 20% praticamente da expressão institucional da política. Isso, naturalmente, não pode ser afirmado de forma aritmética. O pensamento de esquerda, a meu ver, é maior que 20% da sociedade. No que se refere ao jogo institucional, nós fomos reduzidos a um quinto.”

Para ele, o problema é que com um quinto “não se polariza o centro político, porque não há força suficiente”. “Nós estamos diante desse desafio enorme, de crise de representação política, fragmentação da esquerda, que tem dificuldade de se colocar para a sociedade em outros termos. E aliado a isso há uma recessão e um desemprego brutal, que naturalmente leva à ‘direitização’ da política.”

Flávio Dino recordou que o “nazifascismo surgiu do ventre de uma grande crise econômica”. “Crises econômicas agudas levam a saídas autoritárias, normalmente. A crise de 1929 foi o combustível do nazifascismo dos anos 1930. Nós vivemos isso em termos internacionais. Não somente na política brasileira. Mas qual é o desafio? Falar de esperança e de propostas que sejam galvanizadoras no sentimento, no quadro objetivo de muitas derrotas, porque há a Lava-Jato como território hostil. A sociedade indiferente à política, o desemprego e a recessão dizimando a luta social. Não é uma coisa simples. A vantagem é que a história não acaba, não se pode ser fatalista e achar que tudo acabou.”
Redução de direitos x igualdade de oportunidades

Entretanto, Dino ressaltou que tem convicção de que esse “ciclo” de crise deve durar pouco tempo. “Porque uma sociedade perversamente desigual e injusta tem impasses muito profundos que não se consegue resolver. A meu ver, com políticas que reforcem exatamente as desigualdades, a injustiça e a negação de direitos, conduz a uma inviabilização da sociedade, porque significa, por exemplo, aprofundar a violência.”

“Acho que acertando o movimento nós conseguiremos sair disso. Agora, o que não pode é acreditar no princípio da inércia”, avalia. “Não adianta uma subjetividade conduzir a certa tendência histórica sem que se construa, ativamente, os sujeitos para fazer com que essa objetividade se materialize nos fatos.”

Para Flávio Dino, a principal questão agora é “reorganizar nossos sujeitos históricos em um quadro profundamente adverso”. “É preciso, portanto, agregar um programa que seja prospectivo, porque não existe na sociedade voto de gratidão, por mais que as pessoas reconheçam os feitos do passado. Elas precisam acreditar no que o se apresenta, que vai ampliar benefícios para o futuro e, no mínimo, preservar conquistas ou ampliar benefícios.”

Outra questão mais programática, analisa Dino, é a “agenda dos serviços públicos e da igualdade de oportunidades”. Para ele, esse é o ponto mais claro, a “contradição” dos campos: “É a questão que nos coloca em contradição, com esse modelo mais privatizante, centralizador”.

“É preciso encontrar um jeito de repactuar as relações com o que se identifica mais claramente com a esquerda, mas também com outros rostos que podem e devem ser repolarizados.”

Para Dino, “a grande lição é que hoje ninguém está em condição de ficar sozinho. A esquerda está toda no mesmo barco”. “As derrotas que o PT colheu, nós também colhemos, com a exceção do Maranhão”, destaca.


Eleições 2016: um desastre e seus significados

Eleições 2016: um desastre e seus significados

Seduzida pelo poder, a esquerda afastou-se de seu eleitorado e entregou aos conservadores o voto anti-establishment. Será hora de reinventá-la?
por Antonio Martins — publicado 04/10/2016 15h51
Tânia Rêgo / Agência Brasil
Eleições 2016
Eleitor caminha pelo Rio de Janeiro no domingo 2: que lições saem das urnas?
[Quarta parte da série O Brasil sob o Golpe: seis hipóteses polêmicas. Leia também as hipóteses 12 e 3]
As forças políticas que deram um golpe de Estado e empossaram um governo ilegítimo, há poucos meses, tiveram no domingo uma vitória eleitoral expressiva, em todo o País. Ela pode ser vista por diversos ângulos.
No conjunto dos municípios, PMDB (1028) e PSDB (793) – os dois partidos essenciais para o golpe – elegeram o maior número de prefeitos. Embora já fosse assim em 2012, a novidade mais expressiva é o encolhimento das prefeituras petistas: são agora apenas 256, menos da metade de há quatro anos.
Já nas capitais e municípios com mais de 200 mil eleitores – um universo de 93 cidades, onde concentram-se 40% dos eleitores – sobressai algo ainda mais grave: o predomínio do PSDB; além, novamente, do declínio do PT. Os tucanos, que tinham 18 prefeituras há quatro anos, elegeram 14 candidatos no primeiro turno e levaram 19 postulantes ao segundo. Os petistas, que tinham 14 em 2012 (e chegaram a eleger 25, em 2008), ficarão entre um (eleito no primeiro turno) e oito.
O PT foi derrotado em redutos onde se concentraram, por décadas, suas bases sociais. Nos 39 municípios do ABC Paulista e Grande São Paulo, o partido só irá ao segundo turno em Santo André e Mauá. Em São Paulo, registrou seu pior resultado em vinte anos.
Nas capitais do Nordeste, para onde migrou seu eleitorado a partir da chegada de Lula ao governo, participará de uma única disputa definitiva: em Recife. Enquanto isso, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, conservador notório, despontava como um dos grandes vencedores do pleito. Alcançou o feito, contraditoriamente, ao eleger para a capital, já no primeiro turno, um suposto outsider: João Doria, milionário quase desconhecido, que surfou incólume na onda da rejeição à “velha política”.
Ao contrário do que algumas análises previam desde 2013, o espaço perdido pelo PT não foi ocupado por forças à esquerda. Nem os partidos estabelecidos (como o PSOL ou PCdoB) tiveram crescimento expressivo; nem surgiu, com relevância, alguma formação de novo tipo, um Podemos brasileiro.
Algumas vitórias alcançadas são notáveis: Marcelo Freixo e Edmilson Rodrigues (PSOL) irão ao segundo turno no Rio de Janeiro e Belém. O mesmo farão Edvaldo Nogueira e Carmin Moura (PCdoB), em Aracaju e Contagem. Mas nem em número de votos, nem em capacidade de expressar tendência nacional, estes resultados equiparam-se ao que significou o avanço da esquerda nas prefeituras entre 1990 e 2008.
* * *
Estes resultados devastadores atiçam certos analistas. Ainda ontem, o cientista político Gaudêncio Torquato, um dos assessores mais próximos de Michel Temer, decretava “a morte” do PT “radical”, “polarizador”, “de confronto”. Ele concede: a esquerda pode sobreviver – desde que se normalize; conforme-se às desigualdades e recalques da sociedade brasileira; perca dentes e unhas; e, em especial, aceite a agenda de retrocessos prevista para os próximos meses.
Segundo este raciocínio – que, nos próximos dias, será repetido à exaustão – as eleições municipais desmentem, para todos os efeitos, a ideia de que houve um golpe. A sociedade não elegeu os partidos acusados de golpistas? Aqueles que se sentiram golpeados e reivindicavam a democracia não foram agora punidos exemplarmente pelos eleitores?
Eleições 2016
Eleitores justificam voto em Brasília: índice de abstenção foi alto (Foto: Antonio Cruz / Agência Brasil)
Os que assumiram o poder derrubando Dilma não conquistaram ontem legitimidade para as medidas “sensatas e indispensáveis”? Não é hora de aceitarmos o congelamento os investimentos públicos, o corte dos direitos previdenciários e a devastação a CLT?
Tal construção choca-se, porém, com outra realidade. Há anos, o Brasil é palco de uma sucessão de movimentos e deslocamentos sociais que expressa uma agenda oposta à que foi, supostamente, vitoriosa nas urnas. Isso inclui, entre inúmeros fenômenos, a emergência das Culturas da Periferia, a multiplicação dos Cursinhos Públicos, as Marchas da Maconha e das Vadias, as Jornadas de Junho de 2013, os rolezinhos que desafiaram a segregação dos shopping centers, a Primavera da Mulheres (e a aparição do Feminismo Negro), a reivindicação de uma nova escola pelos secundaristas.
A reinvenção e a criatividade parecem intermináveis. O sentido, porém, é nítido: mais direitos; menos controle da sociedade pela lógica do branco, macho e rico. Ou seja, as ruas estão em conflito com o que dizem as urnas, segundo os que pretendem interpretar o 2 de Outubro…
* * *
Como decifrar este descompasso? Em oposição às análises convencionais, este texto propõe cinco argumentos:
1) A esquerda clássica não sucumbiu por se opor à “sensatez” neoliberal, mas por deixar-se aprisionar numa cilada histórica. Suas conquistas mudaram a paisagem social do Brasil; mas sua estratégia foi marcada por dois limites, examinados num texto anterior: a recusa a lutar por reformas estruturais e o captura pelo Estado – ou seja, a desmobilização dos mecanismos de pressão social sobre as instituições;
2) A presença da esquerda no governo central foi toleradaenquanto capaz de acomodar tanto os ganho da oligarquia financeira e grandes empresas quanto grandes espaços de poder para os partidos tradicionais. Por volta da metade do primeiro governo Dilma, porém, este arranjo entrou em risco. A partir desse momento, as elites antes associadas ao governo exerceram resistência crescente e diversa: oposição à queda dos juros; “greve de investimentos”; rebelião da base de apoio ao Palácio do Planalto no Congresso; “pautas-bombas”.
E, crucial: logo ficou claro que o governo era presa fácil, que cedia a chantagens, que fazia concessões cada vez mais escancaradas, exatamente devido a suas duas vulnerabilidades. Ele havia deixado intactas as estruturas (o oligopólio da mídia, por exemplo) que o emparedavam; e já não dispunha, fora do Estado, de nenhum fator de contrapressão. Da percepção desta fraqueza ao golpe, foram poucos passos.
3) A esquerda institucional reuniu, em diversos períodos, enorme popularidade. Porém, por não ter criado estruturas de contrapoder, este apoio foi sempre frágil, inorgânico, sujeito às manipulações midiáticas. A perseguição seletiva contra o PT, durante toda a Lava Jato, jamais pôde ser eficazmente enfrentada.
E políticas muito relevantes, como as que colocaram pela primeira vez centenas de milhares de negros nas universidades, acabaram sendo individualizadas, vistas como resultado do mérito pessoal. Distanciado de sua base, sem impulso político para mobilizá-la, o PT acabou por perdê-la também eleitoralmente. É o que mostram os fracassos emblemáticos no ABC Paulista ou nas capitais do Nordeste.
4) Pior – e daqui a ideia de cilada histórica. Por estar até recentemente no poder; por acovardar-se diante das pressões e chantagens; por enxergar como única defesa um mergulho cada vez mais acrítico nas práticas políticas tradicionais, a esquerda tornou-se incapaz de disputar o movimento de protesto anti-establishment. Trata-se de um fenômeno pouco estudado, mas cada vez mais potente em toda parte. Está na origem de fenômenos opostos.
De um lado, os Indignados espanhóis e a formação do Podemos; Occupy Wall Street e a candidatura de Bernie SandersJeremy Corbyn, na Inglaterra. De outro, o Brexit, a ascensão de Marine Le Pen na França, o Brexit, a rejeição do acordo de paz entre o Estado colombiano e as Farc, ainda ontem, em plebiscito.
5) Nos velhos tempos, um PT rebelde orgulhava-se de ser “diferente de tudo o que taí”. Agora é visto, no mínimo, como parte da elite política; ou, frequentemente, como sua expressão maior..No domingo, o voto anti-establishment manifestou-se no Brasil com força inédita. Examiná-lo com rigor, tarefe indispensável, não cabe neste texto. Mas é possível adiantar algumas hipóteses. Ele assumiu a forma de um índice inédito de votos em “ninguém” (abstenções, brancos e nulos somados): eles suplantaram o primeiro colocado em dez capitais.
Mas este voto deslocou-se também para um tipo particular de candidato, do qual João Dória, o novo prefeito de São Paulo, é a principal expressão. Parece ter sido cuidadosamente construído. Nunca havia disputado um pleito. Iniciou a disputa como azarão, com 5% das intenções de voto – o que o livrou do fogo cruzado dos adversários.
Apresentou-se como “um gestor, não um político”. Difundiu a imagem de “homem bem sucedido”, “por seus próprios méritos”. É tão verdadeira como uma nota de três reais, mas impressionou o eleitorado, numa disputa rápida, morna e sem atrativos.
* * *
“Olhar nos olhos de nossa tragédia é meio caminho andado para vencê-la”, escreveu o dramaturgo Oduvaldo Vianna Filho (Vianninha), pouco depois do golpe de 1964. A derrota de ontem, autêntico 7 x 1, não é a da resistência ao golpe, da oposição a sua agenda de horrores, da luta que permanecerá cada vez mais atual para vencer as relações de Casa Grande-Senzala. Mas é, de fato, a derrota de um projeto ao qual, de um modo ou de outro, todos estivemos ligados.
Vamos nos atrever a superá-lo? Por que parece tão difícil fazê-lo, no Brasil? Este é o assunto do próximo texto desta série.
Fonte: Carta Capital

Para onde nos leva a desilusão eleitoral?

Para onde nos leva a desilusão eleitoral?

A crise no sistema político tende a ampliar o fosso entre representantes e representados
por Gilberto Maringoni — publicado 05/10/2016 09h22
Sumaia Villela / Agência Brasil
Eleição
Eleitor chega para votar no Recife, no domingo 2
As eleições municipais deste domingo 2 apresentam dois fenômenos essenciais: 
1) O avanço avassalador da direita em todo o País, em sincronia com o antipetismo e o que este representa. Perde toda a esquerda. Mesmo o avanço do PSOL não altera o panorama. Isso muda a conjuntura, enfraquece os movimentos democráticos e tende a legitimar o golpe que levou Michel Temer à presidência; 
2) Apresenta um enorme desinteresse popular pelo processo eleitoral. Em nove capitais, o número de brancos, nulos e ausentes supera a votação dos eleitos ou mais votados. Em São Paulo, capital da mais reluzente vitória conservadora, os eleitores que não escolheram nenhum candidato somam 38,5% do eleitorado. Apesar de João Dória ter vencido com 53,29% dos votos válidos, se observarmos o total do eleitorado, o tucano obteve apenas 38,36% dos sufrágios. 
Embora não se possa questionar a legitimidade dos vitoriosos, o desalento com disputas eleitorais tem suscitado um sem-número de reflexões. O sistema político está em crise aberta e o fosso entre representantes e representados tende a aumentar. 
O fenômeno escancara também a descrença com a forma da democracia em vigor e é acentuada por uma legislação eleitoral que caminhou em direção contrária à participação popular. A “reforma” formulada por Eduardo Cunha e sancionada por Dilma Rousseff, em setembro de 2015, dificultou o esclarecimento e desvalorizou o papel dos partidos. Tempos mais curtos de campanha – reduzida de 90 para 45 dias – e o corte pela metade do tempo de TV tornaram o pleito anódino e tendente à despolitização. Vale a pena checar alguns números. 
As eleições para prefeito de quatro anos atrás, em São Paulo, apresentaram o seguinte quadro: 18,48% dos eleitores se abstiveram e os brancos e nulos somaram 12,78%. No final, 31,26% do eleitorado não quis saber de ninguém. 
Em 2008, os dados ficaram assim: brancos e nulos compuseram 7,92%, abstenções alcançaram 15,63% e o total resultou em 23,55% de cidadãos aptos que decidiram não escolher nenhum dos prefeituráveis. 
Em 2004, brancos e nulos foram 6,68%, abstenções 14,98% e o total chegou a 21,66% dos eleitores.
E em 2000, na mesma cidade, tivemos 9,5% de brancos e nulos, 14,24% de ausências e a adição resultou em 23,74%. 
Em linha, os números dos desinteressados em relação ao total de eleitores nos primeiros turnos paulistanos ficaram assim:
2000 – 23,74%
2004 – 21,66%
2008 – 23,55%
2012 – 31,26%
2016 – 38,5%
Os dados são do TSE, compilados pela Fundação Seade. Qual a explicação?
Os saltos mais expressivos ocorreram entre 2008 e 2012 (32,73% de aumento do percentual de desinteressados) e 2012 e 2016 (23,16%). 
Entre 2000 e 2004, tivemos a primeira eleição de Lula. O número dos que decidiram nada escolher caiu na comparação entre as duas disputas. Entre 2004 e 2008 – auge da fase de crescimento econômico e dois anos após o "mensalão", o desalento aumentou em 8,72%.
Se é certo que o estelionato eleitoral deve ter frustrado o eleitorado, que se sentiuludibriado pela campanha de Dilma Rousseff em 2014, o espantoso crescimento do desinteresse anterior não tem razões muito claras.
O eleitor paulatinamente percebe que a chamada “festa democrática” pouco tem a ver com sua vida cotidiana. Contribui para isso uma campanha diuturna da grande mídia a torpedear a atividade política como algo próximo ao banditismo e o fato de boa parte dos eleitos se valer de campanhas de marketing que criam mundos da fantasia nunca realizados.
Há de se levar em conta que, oito meses após as eleições que levaram Fernando Haddad (PT) à prefeitura, São Paulo foi o polo deflagrador das formidáveis manifestações de junho de 2013, que se espalharam pelo País.
Olhando retrospectivamente, é possível que aquele salto na descrença para com o sistema eleitoral já fosse um sintoma do que estava por vir, na forma de explosão social. 
Se for verdade – e os números paulistanos pedem exame mais amplo, que envolva as principais capitais – a atual perda de legitimidade pode também ser prenúncio de um crescente mal-estar social. 
Caso o conservadorismo consagrado no domingo der curso ao aprofundamento da recessão, com medidas fiscais ainda mais duras que aumentem o desemprego e a perda de direitos, as tensões sociais tendem a se aguçar e tomar rumos imprevisíveis. Nesse raciocínio, teremos dias preocupantes à frente.
Nada disso é certo. São apenas conjecturas, a partir de uma rápida mirada nos números das eleições mais estranhas das últimas décadas.
*Gilberto Maringoni é professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC (UFABC)
Fonte: Carta Capital

Temer faz 'terrorismo' para congelar verba de saúde e educação

Temer faz 'terrorismo' para congelar verba de saúde e educação

Polêmica propaganda aponta 'situação muito grave'. Cenário apresentado a deputados é de caos sem PEC 241
por André Barrocal — publicado 05/10/2016 18h43, última modificação 05/10/2016 20h13
Marcos Corrêa/PR/Fotos Públicas
Michel Temer
Planalto convocou deputados para um jantar com Temer para cobrar fidelidade e voto a favor.
O governo Temer lançou uma ofensiva “terrorista” para convencer o Congresso a congelar por vinte anos investimentos em serviços públicos como saúde e educação. Propaganda em jornais a apontar uma “situação muito grave nas contas públicas” e reuniões com parlamentares a projetar um cenário econômico caótico são algumas das armas.
Paralelamente, o Palácio do Planalto pressiona partidos aliados a punir parlamentares que votem contra ocongelamento de gastos, receoso de a impopularidade da proposta afugentar apoios. E convocou cerca de 400 deputados para um jantar com Michel Temer no domingo 9, véspera da primeira votação da medida na Câmara, para o presidente cobrar fidelidade e voto a favor.
A propaganda sobre as contas públicas começou nesta quarta-feira 5. Intitula-se “Vamos tirar o Brasil do vermelho para voltar a crescer”.
Devido à palavra “vermelho”, partidos de oposição, como PT e PCdoB, acionarão a Procuradoria Geral da República contra Temer e o ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), o homem das verbas publicitárias. Apontam improbidade, pois seria alusão ao PT (propaganda institucional precisa ter caráter impessoal), e crime eleitoral (ainda há disputas de segundo turno em várias cidades). A intenção é entrar também com ações populares na Justiça pelo País contra a propaganda.
“O governo está fazendo terrorismo para aprovar o congelamento de gastos com serviços públicos. Essa propaganda é gravíssima”, diz o deputado Paulo Teixeira (SP), vice-presidente do PT.
Na manhã dessa quarta-feira 5, a residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia(DEM-RJ), um aliado de Temer, foi palco de outra ação da ofensiva em favor do congelamento de gastos em saúde e educação.
A pedido de membros do governo houve uma apresentação a deputados elaborada por técnicos da Fundação Getúlio Vargas sobre o que acontecerá, caso não seja aprovada a chamada PEC 241. O dólar ultrapassaria os 4 reais até o fim do ano e a dívida pública logo chegaria a 100% do PIB – hoje, está em 70%. “Pintaram cenário caótico”, contou um dos deputados presentes.
Segundo ele, Temer está “inflexível”, encara essa votação como “ponto de honra” e quer uma primeira aprovação na Câmara de qualquer jeito na semana que vem. Maia marcou a votação para a segunda-feira 10.
Na véspera, deverá haver um jantar de Temer com cerca de 400 deputados de partidos aliados, no Palácio da Alvorada, um fato raro. O presidente pretende fazer um apelo pela aprovação da PEC.
Alguns governistas não gostaram muito, caso de Alberto Fraga (DEM-DF), que reclamou da tribuna. “Ótimo, domingo. Poderia ser no sábado, mas colocar um jantar na hora de votação, quando precisamos ter voto suficiente para derrotar a oposição, eu confesso que, se continuar desse jeito, já que eu me acostumei na oposição, não custa nada eu me manter na oposição.”
Adversário do governo, Silvio Costa (PTdoB-PE) disse que não tem cabimento Temer promover um jantar do tipo, destinado a aliciar deputados, com o país na crise fiscalapontada pelo próprio peemedebista. “Se sair 100 reais por pessoa, serão 40 mil reais com esse jantar. Não dá para aceitar.”
Menos aceitável ainda por ter como pauta a aprovação de uma proposta como a PEC 241, na opinião dele. “Dá para dizer quantas pessoas vão nascer no ano que vem? Quantas vão morrer em acidente de moto? Não dá para impor um teto de gastos na saúde, é um absurdo essa proposta.”

Fonte: Carta Capital

PEC que limita gastos públicos por 20 anos avança na Câmara

Sob protestos

PEC que limita gastos públicos por 20 anos avança na Câmara

Aprovada por comissão especial nesta quinta-feira 6, a proposta prevê o congelamento do orçamento da saúde e da educação a partir de 2018
por Redação — publicado 06/10/2016 20h47, última modificação 06/10/2016 21h34
Marcelo Camargo/ Agência Brasil
Quatro dias após as eleições municipais, o congelamento de gastos públicos, com impacto significativo nos orçamentos da saúde e da educação, avançou no Congresso. Após mais de seis horas de debate na comissão especial dedicada ao tema, 23 dos 30 deputados votaram nesta quinta-feira 6 pela aprovação do texto-base da Proposta de Emenda à Constituição 241, que limita as despesas do governo federal à variação do índice oficial de inflação (IPCA) aferida no ano anterior.
Os sete deputados que votaram contra a proposta são do PT, PCdoB, PDT e Rede.A comissão rejeitou oito destaques apresentados pelas legendas de oposição. 
Durante a sessão, o presidente do colegiado, Danilo Forte (PSB-CE), expulsou dois manifestantes.O primeiro era um professor, que protestava contra a falta de recursos para a educação pública. “Não tem nem papel para limpar a bunda nas escolas”, bradou. Retirado do plenário com truculência pelos seguranças, ele desmaiou no corredor e precisou passar por atendimento médico. O outro foi removido após gritar “não à PEC da Morte”, como a proposta foi batizada pelos opositores.
A proposta será levada ao plenário da Câmara, em primeiro turno de votação, na próxima segunda-feira (10). Para diminuir resistências parlamentares à aprovação, o relator Darcísio Perondi (PMDB-RS) combinou com o governo uma mudança no projeto.
O congelamento dos recursos de saúde e educação começaria não em 2017, como previa a proposta original do governo, mas em 2018. A restrição para as demais áreas terá início no próximo ano. Desse modo, levará mais tempo para a população sentir os efeitos da falta de verba em hospitais e escolas e, talvez, isso não afete o humor do eleitorado na campanha para deputado e senador em 2018.
Além disso, o novo relatório estabelece que a base de cálculo do piso da saúde em 2017 será de 15% da receita líquida, e não de 13,7%, como previsto inicialmente. A mudança assegura cerca de 112 bilhões de reais para a área no ano que vem, 8 bilhões a mais.
A modificação tinha sido acertada na segunda-feira 3 por Perondi em reunião com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, autor intelectual da proposta. Pelo plano do governo, o congelamento por 20 anos será incluído na Constituição. Para ser aprovada, a proposta precisa passar por duas apreciações plenárias tanto na Câmara quanto no Senado. A intenção do governo é liquidar as quatro votações ainda neste ano.
Como se trata de alteração constitucional, sua aprovação exige o apoio de três quintos dos votos na Câmara e no Senado. Ou seja, 308 deputados e 49 senadores, um quórum alto e sempre difícil de ser alcançado.
Deputados
O relator PEC 241, Darcísio Perondi, confabula com André Moura e Danilo Forte (Foto: Marcelo Camargo/ABr)
O relatório foi apresentado na comissão especial que a Câmara instalou em agosto para examinar o projeto. Adversários do governo bombardearam a ideia, mesmo com a mudança feita por Perondi. “Isso é um crime, o Brasil possui 60 milhões de analfabetos funcionais, a educação precisa de mais dinheiro, não de menos”, afirmou Ivan Valente (PSOL-SP).

A oposição tentou aprovar requerimentos de adiamento da votação na comissão. Todos foram derrotados pelos aliados do Planalto. "Os governistas dizem que já debateram muito, mas essa comissão caminhou em plena campanha municipal. Não teve, na verdade, debate. No dia seguinte à eleição, eles retornam com a disposição de votar logo para não deixar a sociedade conhecer a proposta e se mobilizar”, criticou a líder da oposição, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), em entrevista à TV Carta.
O congelamento dos gastos públicos é o coração da política econômica de Temer. Em recente debate na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, disse que, com o congelamento, vão melhorar as expectativas do “mercado” em relação ao Brasil e, sendo assim, haverá mais investimentos privados.
Segundo um líder de partido governista na Câmara, o congelamento será uma espécie de teste. Se o governo não for capaz de aprová-lo, também não conseguirá aprovar a reforma da Previdência, outra proposta em elaboração, nem mudanças na legislação trabalhista