terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Mídia alternativa dependerá cada vez mais de seus leitores

08/09/2016 10:04 - Copyleft

Mídia alternativa dependerá cada vez mais de seus leitores

Os meios de comunicação não são empresas como as outras e produzem um bem público, a informação, necessária ao bom funcionamento da democracia.


Leneide Duarte-Plon, de Paris
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Com o desmoronamento da receita publicitária, jornais e revistas, impressos ou online, se deparam com a questão : « Como financiar as redações na produção de uma informação de qualidade e independente »?  Honesta sobretudo, no caso do Brasil.
 
O slogan do mais conhecido e respeitado jornal online francês, « Mediapart”, resume a situação: “Mediapart, somente nossos leitores podem nos comprar”. Ele não tem publicidade e vive da assinatura dos seus mais de cem mil leitores. Criado em 2008 por Edwy Plenel, ex-diretor da redação do « Le Monde », « Mediapart »  é um verdadeiro jornal online, pure player, com uma redação de mais de 35 jornalistas. 
 
O maior argumento publicitário de « Mediapart » é sua independência. Uma publicidade recente para ampliar o número de leitores perguntava : « A quem pertence seu jornal ? A quem o possui ? Aos que anunciam nele ? Aos que defendem seus interesses ? Aos que o leem ? Mediapart, somente nossos leitores podem nos comprar ».
 
Qual o papel dos leitores de jornais e revistas nesse momento de crise da imprensa e de crise político-econômica no Brasil? O que pode ser feito para que revistas, jornais e blogs independentes não morram?





 
Essas perguntas foram respondidas pela economista Julia Cagé no livro « Sauver les médias » (« Salvar os meios de comunicação », editora La République des idées). Por coincidência nefasta, o livro chegou às redações dos jornais franceses no dia em que dois homens invadiram a redação do semanário « Charlie Hebdo » matando quase toda a redação em plena reunião de pauta. Era 7 de janeiro de 2015.
 
Por coincidência feliz, « Charlie Hebdo » - que vinha perdendo leitores progressivamente e estava à beira da falência - foi salvo pelo grande élan de generosidade que se avolumou em dons que atingiram mais de 4 milhões de euros. Os números de exemplares vendidos antes do atentado oscilavam em torno de 30 mil e o chamado « número dos sobreviventes », que saiu dia 14 de janeiro, vendeu 7.950.000 exemplares. Ninguém poderia esperar esse resultado.
 
O excesso de euros doados - vindos de particulares e de empresas com vantagens de isenção fiscal segundo a lei francesa - chegou a criar um novo problema para a redação sobrevivente.  Tiveram de reestruturar a estrutura jurídica do jornal.
 
Uma das ideias defendidas por Cagé em seu livro é exatamente que os leitores podem financiar e participar da gestão de jornais independentes do poder econômico. « Charlie Hebdo » não criou exatamento o que Cagé - doutora pela Universidade de Harvard e professora de economia do Instituto de Ciências Políticas (Sciences Po) de Paris - preconiza : o financiamento por pequenos doadores com participação nos destinos do jornal. Ela chama a isso de « société de média à but non-lucratif » (Sociedade de mídia sem fins lucrativos).
 
A informação é um bem público, necessário à democracia
 
Uma das ideias mais interessantes e fundamentais do livro é que como a mídia produz um bem público, a informação, reconhecida como necessária ao bom funcionamento da democracia, os meios de comunicação não são empresas como as outras. Idealmente, se a imprensa com o que veicula, a informação, pode ser considerada como um bem público, ela deveria fazer parte do setor da « economia do conhecimento » tanto quanto a escola, os cinemas, as bibliotecas e os museus. 
 
Ora, na França esses setores citados, incluindo neles a pesquisa e o ensino superior, recebem 10% do PIB. Mas na realidade francesa a imprensa está fora do PIB citado porque é um setor privado, ainda que os jornais recebam do governo o que se chama de « Ajuda direta à imprensa escrita ». 
 
Em  2013, esse total foi de 400 milhões de euros e entre os títulos, de direita e de esquerda, que mais receberam a subvenção governamental estavam entre os vinte primeiros, em ordem decrescente : Le Figaro, Le Monde, Aujourd’hui en France, Ouest France, La Croix, Télérama, Libération, Le Nouvel Observateur, Télé 7 Jours, L’Humanité e L’Express.  O primeiro da lista recebeu 16 milhões de euros e o último pouco mais de 6 milhões de euros.
 
« Na França consideramos que a educação não pode ser vendida porque é um bem público. Precisamos pensar a produção de informação da mesma maneira. A mídia pertence à iniciativa privada mas não pode ser considerada como qualquer empresa com fins lucrativos. Na sociedade de mídia de fins não lucrativos que menciono no livro, o voto dos pequenos acionistas é ampliado », explica Julia Cagé.
 
Charb, diretor do jornal Charlie Hebdo, um dos mortos no atentado, inspirou uma lei adotada no ano passado para « a modernização do setor de mídia”. A lei prevê a dedução de impostos de dons de particulars às empresas de mídia de menos de 50 assalariados. O governo fixou dois níveis de abatimento fiscal : 30% do total doado para títulos da « imprensa de informação política e geral » e até 50% quando esse investimento diz respeito a « empresas solidárias de mídia ».
 
100 anos de compromisso apenas com o leitor 
 
O mais respeitado e sólido impresso francês de sátira, « Le Canard enchaîné », completou este ano 100 anos em março vivendo apenas das vendas em bancas. Lançado em março de 1916, numa Europa devastada em plena 1a Guerra Mundial, o jornal não tem nenhuma publicidade. O número que comemorou os cem anos intitulava : « No caminho para o bicentenário » (En route pour le bicentenaire ! ).
 
Como resistir 100 anos sem publicidade? O segredo do jornal é aliar a sátira e desenhos humorísticos ao verdadeiro jornalismo. Frequentemente, o « Canard » dá furos nos outros jornais, que o citam em matérias apuradas a partir de histórias levantadas pelo jornal satírico.
 
Um pouco mais velho que o « Canard », o centenário « L’Humanité » (fundado em abril de 1904), já foi o órgão oficial do Partido Comunista Francês e hoje é apenas o melhor jornal independente, que sobrevive sem os milhões da casta financeira que se apropriou de parte da imprensa francesa. « Nosso objetivo é dar a informação mais ampla e exata a todas as inteligências livres para que tenham condições de compreender e julgar por elas próprias os acontecimentos do mundo », dizia no editorial do primeiro número seu fundador, Jean Jaurès. 
 
« Libération » e « Le Monde » pertencem a bilionários que, no entanto, não interferem na liberdade da redação. A total autonomia da redação  garante o bom jornalismo de centro-esquerda praticado pelos dois jornais.
 
Franceinfo, o allnews da TV pública
 
Como a BBC, o serviço público francês audiovisual tem agora seu canal de informação 24 horas. Dia 1° de setembro, o canal « Franceinfo » começou a funcionar e de repente deixou seus concorrentes parecendo jurássicos.
 
O canal público inovou na posição dos apresentadores, que não ficam mais sentados mas percorrem o estúdio e se servem dos mais modernos elementos de tecnologia. Os jornalistas fazem parte do grande serviço público francês de informação que conta com as holdings France Télévisions e Radio France. Elas dispõem de diversas estações de TV e rádio e têm a Maison de la Radio como base.
 
Os canais franceses de TV 24 horas de repente ficaram parecendo ultrapassados e demasiadamente comerciais. Os franceses têm agora um canal do serviço público digno do canal allnews da BBC.
 
No panorama francês de mídia sem publicidade, o jornal impresso semanal « Le UN-« 1 comemorou o número 100 em seu segundo ano de vida. Fundado por Éric Fottorino, ex-diretor da redação do « Le Monde », « Le Un » é uma agradável revista político-cultural para quem quer complemento à imprensa tradicional.
 
Quanto à internet, segundo o Instituto Reuters de Estudo do Jornalismo da Universidade de Oxford, 44% dos internautas se informam pelo Facebook, que conta com 1 bilhão e 700 milhões de utilizadores. 
 
O desafio é não se contentar com o Facebook e ir buscar a informação nos sites independentes do grande capital, cada vez mais numerosos e mais fortes. 
 
A saúde e a sobrevivência deles depende dos leitores, que os sustentam com a leitura e colaboração financeira como forma de militância cidadã.




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Lava Jato usa delação da Odebrecht para criminalizar a imprensa alternativa

13/12/2016 14:55 - Copyleft

Lava Jato usa delação da Odebrecht para criminalizar a imprensa alternativa

Dessa vez, na visão de CartaCapital, a investida se deu por iniciativa da Lava Jato, numa tentativa de retaliar o trabalho de jornalistas independentes.


Luis Nassif - Jornal GGN
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Jornal GGN - A revista CartaCapital se diz vítima de "ilações" feitas pela Lava Jato em conluio com o jornal O Globo, numa tentativa de calar a independência da revista que, assim como outros meios alternativos, não abdicou do "dever jornalístico" de apontar os abusos cometidos pela operação.
 
O jornal O Globo publicou nesta terça (13) mais uma reportagem no âmbito da Lava Jato, agora tentando levantar suspeitas sobre um "empréstimo" de R$ 3,5 milhões que a Odebrecht forneceu à editora da revista CartaCapital em 2007. O montante foi pago regularmente, mas ainda assim o episódio virou objeto de delação premiada do ex-executivo da empreiteira Paulo Cesena.
 
Cesena disse à força-tarefa da Lava Jato que intermediou as negociações com a equipe de CartaCapital com autorização de Marcelo Odebrecht. Ele diz que a transferência dos recursos se deu no segundo semestre de 2007, e que o montante teria saído do setor da Odebrecht que ficou conhecido como "departamento da propina". Os representantes de CartaCapital, porém, não tinham como saber dessa informação.
 
"CartaCapital não sabe e não tem obrigação de saber de onde vieram os recursos do adiantamento da verba de publicidade. Não existe carimbo em dinheiro e trata-se de má-fé acreditar que o investimento na revista saiu de “um departamento de propina” e o aplicado nos demais meios de comunicação tem origem lícita", rebateu a revista, em nota.





 
Sem apresentar provas, Cesena disse também que ficou sabendo por Marcelo Odebrecht que quem intercedeu por CartaCapital numa circunstância de crise e necessidade de investimentos financeiros foi o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.
 
Desde que foi expedido um mandado de prisão contra Mantega, a imprensa vem noticiando que a Lava Jato tem pressionado executivos da Odebrecht para obter delações que impliquem o ex-ministro da Fazenda e outro titular da pasta durante o governo Lula, Antonio Palocci.
 
“Marcelo Odebrecht me chamou para uma reunião em sua sala, no escritório em São Paulo, e me informou que a companhia faria um aporte de recursos para apoiar financeiramente a revista ‘Carta Capital’, a qual passava por dificuldades financeiras. Marcelo me narrou que esse apoio era um pedido de Guido Mantega, então ministro da Fazenda”, afirmou Cesena à Lava-Jato.
 
De quebra, Cesena insinuou que o "empréstimo" foi fornecido porque a linha editorial de CartaCapital está comprometida com interesses petistas.
 
“Entendi que esse aporte financeiro tinha por finalidade atender a uma solicitação do governo federal/Partido dos Trabalhadores, pois essa revista era editada por pessoas ligadas ao partido”, afirmou.
 
Não é a primeira vez que veículos da velha mídia associam meios independentes de comunicação ao PT, com o objetivo de desqualificar a imprensa alternativa, taxando-a de parcial. Recorrentemente, o financiamento por meio de anúncios públicos é objeto de reportagens que usam sempre da mesma fórmula: dizer que esses produtos jornalísticos não têm audiência que justiquem aportes e que, por isso, se há qualquer tipo de financiamento, este se dá por "afinidade com o PT".
 
Dessa vez, na visão de CartaCapital, a investida contra a revista se deu por iniciativa da Lava Jato, numa tentativa de retaliar o trabalho de jornalistas independentes.
 
"Desconfiamos que o vazamento dessa citação distorcida a CartaCapital esteja relacionado ao fato de não termos abdicado do dever jornalístico de apontar os erros e abusos da Operação Lava Jato, além da nossa conhecida postura crítica em relação aos meios de comunicação, em grande medida responsáveis, no nosso entender, pelo clima de caça às bruxas reinante no Brasil", escreveu Manuela Carta, publisher da revista.
 
DELAÇÃO SEM PROVAS
 
No caso desse "empréstimo" à CartaCapital, as únicas provas que O Globo diz que Cesena anexou à sua delação premiada foram "e-mails, planilhas demonstrando a alocação de recursos e notas fiscais mostrando o patrocínio aos eventos da Carta". Esses eventos teriam sido feitos justamente para cumprir com o acordo de apoio financeiro. Essa informação, aliás, casa com as explicações de CartaCapital, que o jornal da família Marinho relegou aos últimos parágrafos.
 
Primeiro, a revista nega (e, de fato, o delator ainda não apresentou provas de) que Mantega tenha participado de reuniões para discutir o apoio de Odebrecht à Carta. "Não houve interferência de ninguém a nosso favor." 
 
Segundo, não foi um "empréstimo" propriamente dito, mas sim um "acordo de publicidade que previa um adiantamento de verbas."
 
"Segundo [Manuela Carta], tudo já foi quitado, com páginas de publicidade e o patrocínio da Odebrecht a eventos. Ela citou o apoio da empreiteira aos encontros chamados Diálogos Capitais e Fórum Brasil, e a um encontro com a presença do economista Paul Krugman."
 
O Globo cita ainda um segundo "empréstimo", de 2009, no valor de R$ 500 mil, este conquistado por lobby de Luiz Gonzaga Beluzzo, um dos membros do conselho editorial de CartaCapital. O delator não deu detalhes que coloquem essa transação em xeque.
 
Leia, abaixo, a nota de CartaCapital:
 

A VERDADE SOBRE O DINHEIRO DA ODEBRECHT
 
Por Manuela Carta
 
Embora as informações pertinentes tenham sido prestadas ao jornal O Globo, as distorções na reportagem “Odebrecht ‘emprestou’ verba a CartaCapital”, publicada na edição desta terça-feira 13, exigem novos esclarecimentos:
 
1.Em 2007 e 2009, a Odebrecht fez um adiantamento de publicidade no valor total de 3,5 milhões de reais a CartaCapital, uma operação normal no mercado. Naquele momento, a revista procurou vários anunciantes em busca de um reforço de caixa. O adiantamento foi negociado diretamente com a empresa por Mino Carta e Luiz Gonzaga Belluzzo, sócios da Editora Confiança, que edita a revista CartaCapital. Não houve interferência de ninguém a nosso favor.
 
2. O adiantamento foi pago da forma tradicional: por meio de anúncios e patrocínios de eventos. A Odebrecht chancelou vários de nossos seminários regulares intitulados “Diálogos Capitais”, bem como patrocinou a premiação “As Empresas Mais Admiradas no Brasil” em 2009, 2011, 2012, 2013 e 2014. Em 2013, figurou entre os patrocinadores do “Fórum Brasil”, que trouxe o economista Dani Rodrik. No ano seguinte, também patrocinou o mesmo evento, cujo principal palestrante foi Paul Krugman, Nobel de Economia. A editora possui os registros e notas fiscais dos anúncios publicados e eventos realizados.
 
3. Uma das maiores empresas do País, a Odebrecht  regularmente anuncia e patrocina eventos em diversos veículos, entre eles, o próprio O Globo. CartaCapital não sabe e não tem obrigação de saber de onde vieram os recursos do adiantamento da verba de publicidade. Não existe carimbo em dinheiro e trata-se de má-fé acreditar que o investimento na revista saiu de “um departamento de propina” e o aplicado nos demais meios de comunicação tem origem lícita. Além disso, o investimento publicitário da empreiteira deu-se quando não havia nenhum sinal do envolvimento da empresa nas ilicitudes apontadas pela Operação Lava Jato. Lembremos que outros meios de comunicação receberam verbas da Odebrecht em 2016, quando os fatos eram sobejamente conhecidos, nem por isso esses veículos podem ser acusados de conivência com qualquer tipo de atitude da empresa ou de defender este ou aquele interesse.
 
4. Desconfiamos que o vazamento dessa citação distorcida a CartaCapital esteja relacionado ao fato de não termos abdicado do dever jornalístico de apontar os erros e abusos da Operação Lava Jato, além da nossa conhecida postura crítica em relação aos meios de comunicação, em grande medida responsáveis, no nosso entender, pelo clima de caça às bruxas reinante no Brasil. Nossa lisura e transparência, reforçadas semanalmente ao longo dos últimos 22 anos, não serão abaladas por essa classe de ilações.
*Manuela Carta é publisher de CartaCapital


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PEC DO TETO DOS GASTOS TRARÁ DANOS GRAVES À EDUCAÇÃO

PEC do teto dos gastos trará danos graves à educação

O Senado votou nesta terça-feira (13/12), em segundo turno, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, conhecida como PEC do teto dos gastos públicos. Elaborada como uma tentativa de conter a crise econômica, a proposta fixa um limite para os gastos do governo pelos próximos 20 anos. No primeiro turno, realizado no final de novembro, os senadores aprovaram a proposta por 61 votos favoráveis e 14 contrários.

Segundo a PEC 55, a partir de 2018, os investimentos mínimos para educação e saúde deixam de crescer proporcionalmente à receita do país e passam a ficar congelados – corrigidos apenas pela inflação do ano anterior. Como se trata de um piso, e não de um teto, é possível, na teoria, que a União invista mais que o mínimo estipulado. Mas como as outras áreas estarão com seus orçamentos limitados, é improvável que sobre dinheiro para gastos extras com educação e saúde.

Em entrevista à DW Brasil, Claudia Costin, ex-diretora global de Educação do Banco Mundial, afirma que os impactos da PEC 55 serão danosos às futuras gerações de alunos. “O Brasil continuará com o desastre educacional que tem hoje.”

Claudia já foi secretária de Educação da cidade do Rio de Janeiro, de Cultura do estado de São Paulo e ministra da Administração e Reforma do governo de Fernando Henrique Cardoso. Hoje, vive nos Estados Unidos, onde leciona na Faculdade de Educação de Harvard. Segundo ela, é imprescindível que o Brasil invista mais nos salários e na formação dos professores para aumentar a produtividade dos novos trabalhadores brasileiros.

“Se não conseguirmos avançar nessas medidas, estaremos condenados a uma educação de baixa qualidade, e o Brasil não vai conseguir crescer economicamente. O país será uma promessa falida”, afirma Claudia.

·         DW Brasil: Como avalia os impactos da PEC 55 para a educação?

Claudia Costin: Estamos com um problema sério e de longo prazo. Acredito que a PEC 55 vai trazer danos graves para a educação, sem ganhos significativos do ponto de vista fiscal. Não sou contra medidas de austeridade. Houve uma gestão irresponsável das contas fiscais, gastando-se mais do que se podia. Mas na tentativa de correção do problema, é fundamental preservar a educação. Normalmente, quando países têm problemas fiscais, ao menos os mais desenvolvidos, eles preservam a educação dos cortes. O Brasil optou por não fazer isso. É uma grande pena.

·         Qual será o ponto mais prejudicado pelas novas regras para investimentos em educação?

Muitos olham para os números e dizem que o Brasil já gasta muito com educação. Isso não é verdade. Países que deram saltos na qualidade da educação tiveram de aumentar os investimentos durante certo período. Não estamos fazendo o mesmo. Pelo contrário.

Hoje, não investimos o suficiente no ensino básico e pagamos mal os professores. Acredito que o mais complicado será lidar com a questão da atratividade da profissão de professor, que vai continuar baixa pelos próximos 20 anos. Caso não se estabeleça um mecanismo de revisão logo (antes dos dez anos previstos pela proposta), o Brasil vai continuar com o desastre educacional que tem hoje.

·         Quais serão as consequências de não se adotar esses investimentos?

O impacto direto é condenar o Brasil a uma baixa qualidade da educação das crianças por um período de 20 anos. Nenhum sistema educacional é melhor que a qualidade de seus professores. Melhorar o salário do professor é uma das medidas mais importantes para aumentar a atratividade da licenciatura, para aqueles jovens que ainda vão escolher que profissão seguir. Pesquisas mostram que os piores alunos tendem a escolher profissões de baixa atratividade. Corrigir esses salários demanda um esforço importante, constante e progressivo. Ao congelarmos os gastos por 20 anos, isso não poderá ser feito. Não é a única medida para melhorar a educação, mas é uma das mais importantes.

·         O que pode ser feito para melhorar a educação no país, independentemente da quantidade de recursos investidos?

O ideal seria, pelo menos, aprovar revisões dos valores dos investimentos antes dos dez anos – como prevê a PEC 55. Mas mesmo se isso não passar, será preciso mudar a universidade que forma os professores. Tornar a faculdade de educação e a licenciatura mais profissionalizantes, preparar melhor os universitários para a profissão de professor. Também temos de pensar na criação de um processo de ensino mais adequado para os jovens e adotar um currículo nacional comum (a base nacional curricular comum já está em processo de elaboração pelo governo), que defina claramente as expectativas de aprendizagem dos alunos brasileiros. É preciso que este currículo seja muito mais adequado para as demandas do século 21: que forme jovens que saibam pensar, aplicar conceitos em situações reais, ler e interpretar textos de forma analítica. Tudo isso demanda um professor mais bem preparado. É um esforço que temos de fazer independentemente da PEC do teto dos gastos públicos.

·         Em que sentido é preciso melhorar a formação dos professores?

Hoje, a formação dos professores é excessivamente focada nos fundamentos da educação, como sociologia da educação, história da educação, filosofia da educação. Os currículos das universidades que formam professores trabalham muito pouco com a prática. Os cursos de Engenharia e Medicina, por exemplo, preparam o futuro engenheiro ou médico com uma abordagem prática e reflexão sobre a prática muito maior. Em educação, isso não acontece. É urgente mudar os currículos de formação de professores pelas universidades e os concursos públicos das secretarias municipais e estaduais de educação para selecionar professores que, durante sua formação, tenham desenvolvido sua competência de ensinar de forma mais prática, com maior enfoque na didática.

·         Caso essas mudanças não sejam adotadas, como vê o país daqui a 20 anos?

Vejo o país estagnado. Uma das questões mais preocupantes que observamos na economia brasileira é a da produtividade, que está estagnada em um patamar muito baixo. Com uma produtividade baixa, e ela tem uma correlação importante com a qualidade da educação e o crescimento econômico de longo prazo, não vamos crescer. Com menos investimentos em educação, não vamos conseguir preparar os jovens para o futuro do mercado de trabalho. Hoje, vários cargos que demandam atividades manuais e intelectuais rotineiras estão se tornando obsoletos e desaparecendo por causa da automação do trabalho. O que está sendo cada vez mais valorizado no mercado é a capacidade de criação, concepção, reflexão crítica, comunicação. E essas habilidades dependem de uma educação mais sofisticada e de melhor qualidade. Se não conseguirmos avançar nessas medidas, estaremos condenados a uma educação de baixa qualidade, e o Brasil não vai conseguir crescer economicamente. O país será uma promessa falida.

O que garante o crescimento econômico de longo prazo, especialmente inclusivo, que diminua a desigualdade, é a educação de qualidade. Se o Brasil colocar no seu projeto de nação a educação como um eixo estruturador, e investir nela, poderemos ser um país diferente.

·         Conhece outros países que já adotaram medidas semelhantes ao que a PEC 55 propõe para a educação?

Não. No Brasil, quem usa os serviços de educação e saúde públicas são, em geral, as pessoas mais pobres. A classe média frequenta pouco as escolas públicas e os serviços de saúde do governo. Num país tão desigual como o nosso, estaremos atingindo os mais pobres. Com certeza, há outras formas de cortar gastos sem prejudicar investimentos em educação e saúde.

·         Em oposição à PEC 55 e à Medida Provisória da Reforma do Ensino Médio (que, entre outros pontos, diminui a quantidade de disciplinas obrigatórias da grade curricular), milhares de estudantes ocuparam escolas de todo o país. Como avalia este movimento estudantil?

Durante muito tempo, o sistema educacional brasileiro tratou os jovens de forma um pouco infantilizada, como se não pudessem ser protagonistas de sua própria vida escolar. Na Finlândia, por exemplo [país com desempenho educacional excelente], as escolas não chamam os pais para discutir comportamento de alunos de Ensino Médio. Eles chamam o próprio aluno. O estudante tem de perceber que a educação dele depende do seu protagonismo. Ele é o principal ator na construção dos seus sonhos e na sua vida escolar. Quem vai sair perdendo se a qualidade da educação ficar congelada ou se deteriorar ainda mais vai ser justamente esta geração.

Por isso, vejo esse movimento estudantil de forma positiva, embora eu concorde que o ensino médio brasileiro, com uma média de quatro horas de aula por dia e 13 disciplinas, está insustentável. Precisamos criar trilhas diferentes de educação, em que o aluno possa escolher disciplinas e não cursar durante os três anos as 13, ou 15 em alguns estados, matérias obrigatórias. Se olharmos para os 30 primeiros países no ranking do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), nenhum deles tem mais de seis matérias, e todos têm carga horária maior que quatro horas de aula por dia. É uma pena que a reforma tenha sido proposta por medida provisória, mas a meu ver ela é necessária.

·         O Brasil obteve resultados ruins no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) em 2015, ocupando a 59ª posição em leitura, 63ª em ciências e 66ª em matemática, de um total de 70 países avaliados. Por que o desempenho brasileiro foi tão fraco?

O Brasil está estagnado há várias edições do ranking. O Pisa enfatiza a área de ciências, de letramento científico. Em primeiro lugar, estamos com professores muito mal formados para sua função. A universidade não prepara adequadamente professores no Brasil. Um professor de química, por exemplo, tem em média três anos e meio de aulas de química e um ano, ou menos, de aulas de fundamentos da educação. Mas não aprende a didática da química, ele não aprende a ensinar os alunos a pensar cientificamente. A prova Pisa pede exatamente esta competência: aplicar conceitos científicos para resolver problemas do dia a dia. Os nossos professores não estão sendo preparados para isso. Além disso, dada à baixa atratividade da carreira, considerando os salários, condições e perspectivas, os melhores alunos do ensino médio não escolhem tornarem-se professores. E mesmo os que já estão na faculdade de Química, Física e Biologia, por exemplo, na hora de fazer a licenciatura, optam apenas pelo bacharelado, porque o mercado paga muito mais que a sala de aula. A somatória das duas coisas, a baixa preparação da universidade e os salários reduzidos, explica boa parte do problema.


UE e Cuba assinam primeiro acordo bilateral e bloco põe fim oficialmente à 'posição comum

UE e Cuba assinam primeiro acordo bilateral e bloco põe fim oficialmente à 'posição comum'


"Hoje reconhecemos que há mudança em Cuba e queremos acompanhar esta mudança, levar a relação para um novo nível", afirmou a alta representante da UE para as Relações Exteriores, Federica Mogherini
A União Europeia (UE) e Cuba assinaram nesta segunda-feira (12/12) seu primeiro acordo bilateral, de diálogo político e cooperação, com o qual o bloco põe fim à "posição comum", que impunha uma relação unilateral e restritiva com a ilha desde 1996.
"Hoje reconhecemos que há mudança em Cuba e queremos acompanhar esta mudança, levar a relação para um novo nível", afirmou a alta representante da UE para as Relações Exteriores, Federica Mogherini, na cerimônia de assinatura do documento, que também contou com participação do chanceler cubano, Bruno Rodríguez, e representantes dos 28 países do bloco comunitário europeu.

O acordo "seguramente contribuirá para desenvolver os vínculos políticos, sociais, financeiros, acadêmicos, esportivos e de cooperação", disse Rodríguez, para quem o pacto fará uma "modesta contribuição para o equilíbrio, o entendimento, a justiça e a paz nesta época conturbada de crescentes perigos para a espécie humana".

Com a assinatura deste acordo, UE e Cuba abrem uma nova etapa de relações e deixam para trás a “política comum”, por meio da qual ficava restrita qualquer negociação do bloco com o governo cubano enquanto não houvesse o que os europeus chamavam de “avanços” no campo dos direitos humanos dentro da ilha. A atitude era vista por Havana como um obstáculo para a normalização dos contatos.

Mogherini, que antes de assinar o tratado voltou a oferecer suas condolências pela morte do líder cubano Fidel Castro, uma "figura histórica", ressaltou que este acordo estabelece "a primeira relação contratual entre a UE e seus Estados e Cuba".
Agência Efe

Chanceler cubano Rodríguez e a diplomata europeia Mogherini: bloco pôs fim à 'posição comum'

Aumenta número de pessoas que consideram tortura aceitável, aponta relatório internacional

Ataque contra complexo de igrejas no Cairo deixa ao menos 20 mortos

 
"Viramos a página e hoje começamos a escrever juntos um novo capítulo", indicou a alta representante da UE, que também comentou que o Conselho da UE "decidiu revogar a 'posição comum' de 1996 com efeito a partir da assinatura".

A diplomata afirmou que o acordo ajudará as partes a "aproveitarem plenamente o potencial de diálogo e cooperação" e que é "o instrumento pelo qual a UE pode apoiar melhor a modernização social e econômica de Cuba". Segundo ela, o acordo vai oferecer uma "plataforma comum para o investimento bilateral e cooperar mais estreitamente em desafios globais como a migração, a luta contra o terrorismo e a mudança climática".

Já o chanceler cubano disse que, "com boa vontade e reciprocidade, é possível avançar sobre as diferenças". "Estamos abertos à construção de uma nova etapa nas relações sobre as bases do respeito e da reciprocidade", afirmou. Rodríguez também reconheceu "o impulso das companhias europeias" que acompanharam Cuba "nos momentos mais difíceis". 
As negociações do acordo começaram em abril de 2014 e terminaram em março deste ano, após sete encontros. No dia 11 de março, Mogherini esteve em Havana para participar da sétima reunião oficial de diálogo político entre UE e Cuba, durante a qual foi firmado o pacto.
(*) Com Efe

Diário de uma ocupação nº 26 - Futuros distópicos e o Brasil

13/12/2016 09:58 - Copyleft

Diário de uma ocupação nº 26 - Futuros distópicos e o Brasil

Quando pensamos no nosso futuro, pensamos em distopias, só imaginar obras como: 1984, Admirável Mundo Novo e Fahrenheit 451.


Equipe de Comunicação Internacional dos Estudantes do OCUPA IGC
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Em um diário, o dia 5 de novembro foi mencionado. Foi em meio a uma pequena poesia sobre as lutas. O dia 5 de novembro, para quem não sabe é um dia que marca o fim da alienação de um povo contra o governo corrupto da Inglaterra, mostrado em V de Vingança de Alan Moore e David Loyd. Esta Graphic Novel foi levada aos cinemas pelo diretor James McTeigue e roteirizado pelas irmãs Wachowski, que as pessoas lembram por Matrix e mais recentemente, por Sense 8. Como é o fim disso? Devem ler o quadrinho ou assistir ao filme, ou ainda os dois, porque se limitar?
 
E o que isso tem a ver com toda a luta da ocupação do IGC e de outras ocupações? Parece que não estamos fazendo nada, não estamos atingindo muitas pessoas com nossas intervenções ou que as intervenções da UFMG não estão surtindo nenhum efeito. Parece que são só atos que fecham uma das vias mais importantes da cidade de Belo Horizonte que é mais visto. Não é o fechamento da Av. Antônio Carlos ou da Praça Sete que são os símbolos das ocupações. Cada coração que tocamos, cada pessoa que estamos conscientizando, que ajudamos a tirar da alienação é uma vitória. Mas sobre legados, vamos falar depois, pois a Ocupa IGC continua. O que queremos focar é algo maior, o futuro. 
 
Quando pensamos no nosso futuro, pensamos em distopias. Em distopias, pensamos em extrema opressão, só imaginar obras como: 1984 (George Orwell, publicado em 1949), Admirável Mundo Novo (Aldous Huxley, publicado em 1932), Fahrenheit 451 (Ray Bradbury, publicado em 1953), V de Vingança (1982) e o recente Jogos Vorazes (Suzanne Collins, publicado em 2008). O que têm estas obras em comum com o que acontece hoje no Brasil? Simples, já falamos de extrema opressão contra o povo e todas falam sobre opressão. A máscara do V é um símbolo de luta contra a opressão, no mundo real pode ter sido desvirtuada por alguns movimentos, mas ainda sim remete a opressão. Cada um dos livros expõe alguém que luta contra a opressão. E os livros ajudam a mostrar mundos em que a alienação tomou conta da maioria das pessoas. O nosso mundo real está chegando perto da ficção distópica. O que é certo? Nos é dito, por regras extremas, mas que alguns não obedecem, olhem nosso judiciário, executivo e legislativo desrespeitando a Constituição Federal que rege suas condutas. São os três poderes aproveitando a alienação do povo para poderem agir, enquanto ao povo cabe ser correto, honesto e respeitar as leis impostas.  
 
Quem não torceu para Katniss Everdeen conseguir vencer o Presidente Snow ou V conseguir derrotar o governo inglês distópico? Como derrotamos Temer e seus asseclas? Eles que querem controlar a internet também e acabar com a pouca informação que ainda dispomos livremente. Somos zumbis de informação e redes sociais, mas o quanto pesquisamos e sabemos os reais motivos de cada ataque do governo golpista? PEC 55, Reformas da Previdência e Trabalhista estão aí e quantos estão realmente preocupados com isso no Brasil. Nesta terça, dia 13 a PEC 55 deve passar pelo Senado e depois sancionada pelo dito Presidente Temer. Cadê a população agindo contra. São poucos milhões contra centenas de milhões alienados. Centenas de milhões que ainda não acordaram, que talvez acordem com a Reforma da Previdência ou que despertem de verdade na Reforma Trabalhista. Ou para nossa tristeza, dos poucos milhões acordados, talvez nem isso seja parado ou aconteça o despertar. Onde está a Reforma Política? Algo tão necessário para tentarmos mudar o rumo da nossa política e não ficar a mercê de uma escolha ruim ou outra escolha ruim. As urnas mostraram que votos brancos e nulos em muitos lugares superam os votos do representante eleito. 





 
Ficção e realidade se misturam, pois nos dirigimos para futuros distópicos, de pesadelos se não acordarmos. Precisamos fazer o Brasil, mais de 200 milhões de pessoas, acordarem. E mostrar que a luta existe e que podem e devem fazer parte. Se não, as lutas de 2016 podem virar lendas, enquanto o povo brasileiro vive décadas de atraso e em meio a pesadelos para manter uma condição digna de vida. Centenas de milhões de pessoas neste prognóstico, porque nossos representantes cumprem muito bem seu papel de retirar cada um dos nossos direitos e só faltando nosso direito de pensar livremente. 
 
Fora alienação! E fora agentes da alienação!
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