domingo, 5 de fevereiro de 2017

O SILÊNCIO VERGONHOSO


O silêncio vergonhoso
Donato


Michel Temer fez um teatrinho. Simulando uma ‘reforma ministerial’, aproveitou para ressuscitar a Secretaria-Geral da Presidência – uma pasta que havia sido extinta por Dilma Rousseff em 2015 – com a finalidade de ali acomodar seu parceiro Moreira Franco.
Moreira Franco, ou “Angorá” segundo os apelidos listados em planilhas, passa assim a gozar de foro privilegiado. A alcunha é antiga, quem o batizou foi Leonel Brizola, antecessor de Moreira Franco no governo do Rio de Janeiro. “A característica do gato angorá é passar de colo em colo”, dizia Brizola.

Citado 34 vezes por Cláudio Melo Filho (ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht), como destinatário de bufunfa para que defendesse os interesses da empreiteira, o peemedebista agora só pode ser julgado pela Suprema Corte.

Tudo isso na mesma semana em que o Supremo Tribunal Federal homologou as 77 delações premiadas de executivos da Odebrecht.

Não é uma coincidência fantástica?

Quando Lula foi anunciado provável ministro da Casa Civil por Dilma em março do ano passado, populares patriotas ensandecidos, sanguinários contra a corrupção, foram para a Avenida Paulista e de lá não arredaram pé por mais de 40 horas.

Foi quando nasceu o acampamento em frente ao prédio da FIESP que ali permaneceu meses a fio, proporcionando centenas de momentos de tensão e conflitos, palco da festa do impeachment.

Onde estão aquelas pessoas que carregavam o discurso de que a ‘limpa’ seria geral, que primeiro tirariam Dilma, mas depois derrubariam todos? Não eram todos?

O que dirá agora a jornalista global Cristiana Lobo que fez campanha contrária à indicação de Lula desde quando ainda era mera intenção na cabeça de Dilma, alardeando para o perigo e descalabro de tal medida? Gilmar Mendes idem. Silêncio, agora?

Testemunhamos mais um exemplo perfeito de um peso, duas medidas. O atual ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse hoje que não há paralelo com o que ocorreu com Lula. “Lula não estava no governo [quando foi indicado]. Moreira já estava agindo como ministro, apenas recebe agora o título. É uma grande diferença”, disse o ministro Padilha, que depois ainda emendou: “Delações citando membros do governo por si só não provam nada.”

Como ninguém pensou nisso antes?

“Estão criando um ministério com o claro intuito de proteger e dar foro privilegiado a Moreira”, afirmou o senador Lindbergh Farias.

Ele tem toda razão.

“Sem foro, é Moro” é uma frase já recorrente em Brasília quando o assunto é Moreira Franco. Hoje ele é secretário-executivo do PPI (Programa de Parcerias em Investimentos), portanto a água estava alcançando seu pescoço. O cargo de ministro é sua tábua de salvação. Ele, obviamente, nega irregularidades.

“Isso nunca esteve entre as minhas preocupações”, falou o mais novo membro do clube dos blindados pelo poder.

‘Angorá’ deu um gato na justiça. A partir de agora seu nome sai do Excel das propinas e entra para a lista dos protegidos no Supremo Tribunal Federal. Coisas do Brasil de 2017, que comemora a morte de Dona Marisa Letícia, que assiste passivamente ao presidente golpista manobrar à vontade, fazer e acontecer, descumprindo inclusive compromissos firmados com o povo pró-impeachment. Sua retórica não era a de reduzir ministérios? Com a tal reforma ministerial, aumentou em mais dois.

O ‘gigante’ voltou a dormir e ‘Angorá’ se aninhou em um novo e protegido colo.


A CONFISSÃO

A CONFISSÃO
Moreira no Ministério não é nomeação, é confissão
Fernando Brito
Poucas coisas na política brasileira foram tão deploráveis quanto a elevação de Moreira Franco à condição de Ministro em função das delações premiadas mais que suficientes para estabelecer que é ele um dos operadores de Michel Temer.
A começar da incrível diferença com que este assunto foi tratado em relação à frustrada indicação de Lula para a Casa Civil de Dilma Rousseff, que escandalizou os comentaristas da mídia e ao Supremo, que a impediu de concretizar-se.
A nomeação de Lula era claramente política: um governo em desagregação, sabotado por todos os lados, precisava de uma figura política de primeira grandeza um interlocutor de largo trânsito para salvar-se o destino que já lhe tinha sido traçado: o do impeachment.
Lula, por maior que pudesse ser sua relação com Dilma, não habitava Brasília, não integrava o governo, não podia encaminhar acordos ou decisões.
Ao contrário, fora do Governo, tudo o que fizesse seria, automaticamente, “interferência”.
A nomeação de Moreira Franco, ao contrário, é apenas um “privilégio de foro”
Moreira é, desde que foi escorraçado do Governo do Rio de Janeiro, uma figura da penumbra. “Personal consultant” de Fernando Henrique, segundo Eliane Cantanhêde, “confiável se longe do cofre”, para o ferino Antonio Carlos Magalhães, foi enfiado por Temer nos governos Lula e Dilma. E tornou-se, ao ser expelido, o pilar “teórico” da conspiração, com sua “Ponte para o Futuro”, reduzida a “pinguela” por seu ex-chefe FHC.
Citado diretamente na delação da OAS, brecada por Rodrigo Janot e repetido nas delações da Odebrecht, Moreira é um Geddel Vieira Lima que não palita os dentes em público. Não tem a menor simpatia no parlamento, não articula politicamente senão com quem tem negócios com o Governo.
Na iminência da conclusão das delações da Odebrecht, guindá-lo á condição de ministro – para, aliás, fazer o mesmo nada que fazia no Planalto, a não ser estruturar os esquemas de privatizações – não é uma nomeação, é uma confissão.
A “gangue dos quatro” – Primo Padilha, Babel Geddel e o líder Michel Temer – sabe que o Angorá tem tão pouco caráter que, apertado, não hesitaria em, como sempre fez, empurrar adiante as responsabilidades por negócios.

Por que a Globo prendeu o Eike?



https://www.youtube.com/watch?v=0xwDxvaUWB0

CÁRMEM LUCIA HOMOLOGA DELAÇÕES

Cármem Lucia homologa delações
Fernando Brito


Do G1, agora, mostrando que a presidenta do STF não deixou as pressões subirem nem por uma manhã:

A presidente do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia, homologou as 77 delações de executivos e ex-executivos da construtora Odebrecht. Agora, o material será encaminhado para a Procuradoria-Geral da República, que vai analisar os documentos para decidir sobre quais pontos irá pedir investigação.

Na sexta-feira (27), juízes auxiliares do gabinete do ministro Teori Zavascki concluíram as audiências com os 77 executivos e ex-executivos da Odebrecht que fecharam acordo de delação premiada no âmbito da Operação Lava-Jato.

Teori Zavascki era relator da operação no tribunal. Com a morte do ministro, no último dia 19, a presidente do STF autorizou que os juízes auxiliares concluíssem os trabalhos.

Nas audiências com os executivos e ex-executivos da Odebrecht, os juízes perguntaram aos delatores se as informações foram prestadas nos depoimentos de livre e espontânea vontade, sem coação por parte dos investigadores.


PÂNICO GERAL ENTRE AS ELITES DO MUNDO

Pânico geral entre as elites do mundo

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Alarmados, angustiados, traumatizados, confusos, petrificados, lívidos… É difícil encontrar um qualificativo que reflita o estado de espírito dos dirigentes euro-atlânticos e da imprensa que lhe é fiel no momento em que Donald Trump acede à Casa Branca.

E que dizer dos punhados de “inocentes úteis” (conforme a fórmula outrora atribuída a Lênin) que, em Berlim, Paris ou Londres, desfilaram com o delicioso slogan: “Este não é meu presidente”… O que dizer se isto não é o apontar de uma linha de fratura fundamental que se esboça progressivamente tanto em numerosos países europeus quanto nos Estados Unidos, assim como em outros lados do mundo: entre camadas médias mais abastadas, urbanas, intelectuais e almejando a mundialização, e uma classe operária que sofre desprezo e atomização desde há décadas.

Entre os primeiros que pensam em “valores” e os segundos em “interesses”, mesmo na sobrevivência social pura e simples. Entre, de um lado, aqueles que se mobilizam “contra o ódio” (!) e, do outro, aqueles que se mobilizam pelo emprego. Simplificação excessiva? Talvez. Mas esta polarização de classe que emerge não está senão no princípio. E tanto melhor se os segundos recuperam esta dignidade, esta existência e estes papéis coletivos que lhes foram negados pelos cantores da globalização econômica e também ideológica.

Ouçamos estes últimos. “É o fim do mundo!”, lamentou-se Manuel Valls (BFMTV 16/01/17), que não se referia aos resultados da primária socialista e sim à perspectiva de uma “aliança entre Trump e Putin”. “Donald Trump está decidido a destruir o projeto europeu”, espantava-se o editorial de Libération (18/01/17). E Le Monde (19/01/17) tocava o sinal de alarme: “O presidente dos Estados Unidos lançou-se numa operação deliberada de desestabilização da Alemanha (…) é toda a Europa que é atacada”.

A Europa está confrontada com um dos “maiores desafios destas últimas décadas” alerta por sua vez Angela Merkel. O comissário europeu Pierre Moscou choca-se: “Tem-se uma administração americana que deseja o desmantelamento da União Europeia, isto não é possível!”. Quanto ao secretário de Estado americano cessante, ele exortou a nata das elites mundializadas reunida em Davos a “recordar porque fizemos juntos esta viagem de 70 anos”. John Kerry parece assim evocar o eixo euro-atlântico… no passado.

Este pânico geral – que não se pode deixar de saborear – é compreensível. Pois, numa entrevista publicada alguns dias antes da sua posse, Donald Trump confirmou os elementos que já faziam tremer tanto os governantes da União Europeia como o establishment de Washington durante a sua campanha eleitoral. Ora, como observou o primeiro-ministro francês Manuel Valls, decididamente inspirado, “esqueceu-se que um populista pode querer por em ação o seu programa”.

Será este o caso com o novo hóspede da Casa Branca?
Por enquanto, deve-se manter a prudência. Mas se o senhor Trump passa, ainda que apenas parcialmente, das palavras aos atos, então sim, isto será mesmo o fim de um mundo, o início de uma mudança de era histórica.

Pois o que disse o bilionário na entrevista publicada pelo jornal alemão Bild e pelo inglês The Times? Que o Reino Unido foi “inteligente” ao abandonar a União Europeia; que este não era senão o “veículo da potência alemã”; que esperava que muitos outros Estados imitassem o Brexit; que se rejubilava em preparar um acordo comercial separado com Londres; que o livre comércio mundial (portanto o TTIP, nomeadamente) era doravante caduco; que à indústria automobilística alemã poderia muito bem serem impostos importantes direitos alfandegários se isso encorajasse o emprego nos Estados Unidos; e que a chanceler havia cometido um “erro catastrófico” com a sua política de portas abertas aos refugiados.

Pior – ou melhor: o presidente americano confirmou que considerava a OTAN “obsoleta” e que um grande acordo com Moscou tendo em vista o desarmamento nuclear “seria de interesse de muita gente”; e que, consequentemente, as sanções contra a Rússia poderiam ser postas em causa. Mobilizando todo o seu sentido da retórica, o secretário-geral da Aliança Atlântica diz-se “preocupado”. Le Monde enraivecia-se já no fim de Dezembro (22/12/16): o senhor Trump “quer ser o homem da renovação industrial americana, não o xerife de uma ordem democrática ocidental para manter e propagar”. Imperdoável! Em Davos, Joseph Biden, ainda vice-presidente americano durante dois dias, lançou um apelo desesperado para “salvar a ordem liberal internacional”…

Dezesseis antigos chefes de Estado ou de governo e ministros – essencialmente dos países da Europa – haviam, pouco antes, alertado contra o perigo maior de um reaquecimento das relações com a Rússia: “a confiança e a amizade seriam um grave erro”, escreviam sem piscar.

Será preciso então estranhar a histeria crescente contra a Rússia? Moscou é confusamente acusada de promover (com êxito crescente) a sua mídia focada no Ocidente, de invadir as redes sociais com falsas notícias e piratear os computadores das instituições ocidentais. Segundo a CIA, a NSA e o FBI – e Deus sabe que estas nobres chafaricas não podem dizer senão a verdade – Vladimir Putin teria assim influenciado a eleição americana em favor do seu favorito e, certamente, aberto a champanhe.

Retransmitido por Arte (06/01/13), o grande chefe demissionário da informação, James Clapper, fez uma declaração assim: “Os russos têm uma longa experiência de ingerência eleitoral, quer se trate dos seus próprios escrutínios ou os dos outros”. Humor involuntário?

E assim, o hóspede do Kremlin estaria se preparando para levar pela mão os eleitores holandeses, franceses, depois os alemães, que comparecerão às urnas em 2017, para que tantos uns como outros escolhessem formações contra a União Europeia (ou consideradas como tal).

Pois, evidentemente, sem estas sombrias manobras, os cidadãos estariam entusiasmados para plebiscitar uma União Europeia cada vez mais popular e legítima.

Mais um golpe, Vladimir Vladimirovitch Putin?