quarta-feira, 19 de setembro de 2018

RETROCESSO Ministério do Trabalho confirma: a reforma trabalhista é um desastre


RETROCESSO

Ministério do Trabalho confirma: a reforma trabalhista é um desastre

Dos 50 mil empregos formais criados até julho, cerca de 80% correspondem a contratos intermitentes ou parciais

Brasil de Fato | São Paulo (SP)
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Ao contrário do prometido pelo governo, reformas só prejudicaram os trabalhadores / Foto: Agência Brasil
“A reforma trabalhista vai gerar 6 milhões de empregos”, prometeu Henrique Meirelles (MDB), ex-ministro da Fazenda do governo de Michel Temer (MDB), em defesa das alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) promovidas pelo Governo Temer e aprovadas pelo Congresso em dezembro de 2017. No entanto, como previam especialistas, o argumento do peemedebista não se tornou realidade.
De acordo com estatísticas sistematizadas pelo Ministério do Trabalho, baseadas no saldo de empregos de julho, desde a aprovação da Lei 13.467/17 foram gerados apenas 50.545 postos de empregos formais. Os dados correspondem ao período de novembro de 2017 a julho deste ano, ou seja, evidenciam o impacto da reforma nos 9 meses posteriores a sua aprovação. 
Por outro lado, entre dezembro de 2014 e dezembro de 2017, 2,9 milhões de empregos com carteira assinada foram fechados, uma média de 79,5 mil postos de trabalho a menos por mês. 
Bárbara Vallejos, integrante do Grupo de Trabalho sobre a Reforma Trabalhista do Instituto de Economia da Unicamp, mestre em Desenvolvimento Econômico e técnica do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), relembra que o principal argumento usado em defesa da reforma era o de que a antiga legislação trabalhista atrapalhava a geração de novos trabalhos e a flexibilização da lei potencializaria o crescimento do mercado de trabalho.
“Essa é uma tese infundada. A geração de emprego dos anos 2000, com carteira assinada, foi muito expressiva e não tivemos alterações significativas nos direitos do trabalho porque havia um cenário de crescimento econômico. Esse é o determinante”, argumenta.
“O efeito dessa reforma no mercado de trabalho, do ponto de vista do nível de emprego, vai ser quase nulo. Efetivamente, analisando os dados, o que vemos é que a crítica que era feita à reforma se confirmou. Esse saldo de 50,5 mil novos postos da reforma é um saldo irrisório frente a uma força de trabalho que tem 104 milhões de pessoas. É um crescimento muito inexpressivo. Em síntese, a reforma não está ajudando a gerar mais empregos”, analisa Vallejos. 
Precarização
A especialista ressalta que, além de não impactar na criação de novos postos de trabalho, o principal problema da reforma trabalhista é o aumento de vagas de trabalho precarizadas.
No último período, foram gerados 26.300 postos intermitentes e 13.320 parciais, ou seja, 78,4% dos saldos de empregos formais criados desde novembro correspondem a esses dois tipos de contratação. 
O contrato intermitente pode ou não ser provisório, mas, nessa modalidade, o trabalhador é remunerado apenas pela hora efetivamente trabalhada no mês, com a necessidade de estar à disposição do empregador, sem salário fixo. Já o contrato parcial é uma jornada fixa porém reduzida.
'Eu já sabia'
O grupo de trabalho do qual Vallejos faz parte estuda as implicações de reformas trabalhistas parecidas com a implementada no Brasil, antes de sua aplicação. A partir dessa análise, os especialistas alertaram quais seriam as consequências.
“Quando observamos como as reformas trabalhistas impactaram o mercado de trabalho, o que ocorreu foi um movimento de substituição dos postos formais, do que seria equivalente a uma CLT, com salário fixo, por formas precárias e atípicas de contratação. Então, vão se constituindo mercados de trabalhos mais flexíveis, em que os trabalhadores tem menos previsibilidade do seu salário e evidentemente tem uma perda também de seu poder de compra", explica a técnica do Dieese. 
José Eymard Loguércio, advogado trabalhista e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), concorda com a crítica. “Quem estava desempregado, permanece desempregado. Quem estava empregado, passa a estar desempregado e é recontratado por outra modalidade [contratual]. Não se aumenta postos de trabalho, simplesmente se distribui os postos que já existem. Substitui-se contratos regulares, permanentes, por contratos precários”. 
A ampliação desses contratos concentrou-se em setores econômicos com maior rotatividade e menores salários, ou seja, profissões historicamente vulneráveis. Mais de 60% dos contratos intermitentes estão nos setores de Comércio ou Serviços. As ocupações com maior saldo dessa nova modalidade de trabalho são assistente de venda, servente de obras, alimentador da linha de produção, faxineiro, vigilante e garçom. As profissões se repetem na relação de contratos parciais. 
Acordos
O advogado trabalhista também destaca que os números do “desligamento por comum acordo”, criado pela reforma, também são expressivos.
Foram 94,5 mil desligamentos nessa modalidade, na qual o trabalhador não acessa integralmente verbas rescisórias, nem o seguro desemprego. “O que indica, indica porque não há como dizer que todos são assim, é que muitos desses acordos foram realizados para que as pessoas se desligassem da contratação regular e voltassem a ser contratados com outro tipo de contrato”. 
O jurista critica a fala de Meirelles e aponta que o argumento de que a reforma trabalhista gera emprego não se sustenta e a deslegitima completamente.
“É um discurso simplesmente para conseguir apoio, portanto, discurso que não tem base empírica, não tem base de realidade. E a prova disso é o que aconteceu na prática depois desse período. Em pouquíssimo tempo, se comprova o fato de que a reforma tem por único e exclusivo objetivo, precarizar as relações e diminuir o custo da mão de obra”, enfatiza.
O impacto do desemprego e da precarização do trabalho na economia também preocupa os especialistas. Segundo Vallejos, sem poder de compra e consumo, a população não participa ativamente da movimentação econômica do país, fator que impede seu crescimento.
Edição: Diego Sartorato

Bolsonaro votou contra mudanças no Acordo de Alcântara e a soberania nacional


Bolsonaro votou contra mudanças no Acordo de Alcântara e a soberania nacional

A verdade é que o grupo de Bolsonaro ainda vive nos jurássicos tempos da Guerra Fria, ainda acredita na superioridade da raça ariana, ainda acha que existe uma "conspiração comunista global" e, portanto, ainda enxerga no alinhamento automático com os EUA uma salvação contra as terríveis ameaças dos "comunistas", dos "quilombolas" e da "mulambada"

 
19/09/2018 15:48
 
 
Corria o já longínquo ano de 2001. Na época, eu trabalhava como assessor para política externa e defesa nacional na Liderança do PT na Câmara dos Deputados e acompanhava todas as sessões da Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional (CREDN) naquela casa.

Foi exatamente nessa época que a CREDN recebeu a Mensagem nº 296, de 2001, do Poder Executivo, a qual encaminhava ao Congresso Nacional o texto do 

Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América sobre Salvaguardas Tecnológicas Relacionadas à Participação dos EUA nos lançamentos a partir do Centro Lançamento de Alcântara", o famigerado Acordo de Alcântara.

Foi designado Relator da matéria o saudoso Deputado Waldir Pires, homem de profunda cultura jurídica e um grande patriota. Educadíssimo, modesto e um verdadeiro gentleman, como só os grandes homens são, o Doutor Waldir Pires me concedeu a honra de elaborar para ele seu parecer sobre o tema.

Estudamos minuciosamente o assunto e o Doutor Waldir conversou longamente com grandes especialistas na matéria.

Elaborei para ele um pormenorizado voto pedindo a rejeição do Acordo, por ser ele atentatório à soberania nacional, inteiramente assimétrico e colocar o programa espacial brasileiro em estreita dependência do programa espacial norte-americano. Na realidade, o objetivo não manifesto do acordo era mais impedir que o Brasil desenvolvesse seu próprio veículo lançador e cooperasse com países como a China, na operação da sua base de lançamentos. Mas isso é tema para um longo artigo.

O fato é que o parecer do Doutor Waldir, muito bem fundamentado, caiu como uma bomba na CREDN. O governo ficou em polvorosa, pois o parecer desmontava, com lógica cartesiana, todos os argumentos oficiais para a aprovação do Acordo. Os deputados, mesmo os governistas, ficaram impressionados e passaram a considerar improvável ou muito difícil a aprovação do ato internacional.

Fora do Congresso, a repercussão foi também muito grande, especialmente na área militar. Agora, que o Doutor Waldir infelizmente se foi, posso me permitir uma indiscrição. Ele me confidenciou que havia recebido uma mensagem do General Alberto Cardoso, então Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, expressando sua aquiescência com a posição contrária ao Acordo de Alcântara. Os militares de então trabalhavam, discretamente, pela rejeição do ato internacional. Queriam manter o controle da base e desenvolver o veículo lançador de satélites.

O governo reagiu exercendo muita pressão sobre os deputados da base. Surgiu, então, a estratégia de apresentar um voto que, em vez de pedir a rejeição pura e simples do Acordo, acolhesse todas as críticas ao texto e propusesse sua aprovação com supressões, modificações e ressalvas. O Doutor Waldir negociou com todos os partidos e apresentou um parecer aditivo que propunha uma série de modificações profundas ao texto do ato internacional.

A estratégia tinha duas vantagens:

a) Agregava apoio à posição crítica ao Acordo.

b) Elevava o papel do Congresso Nacional na apreciação de atos internacionais, na medida em que propunha alterações ao texto negociado pelo Executivo.

Na prática, sabíamos que as alterações que estávamos propondo, embora necessárias para preservar a soberania nacional, eram de tal ordem que jamais seriam aceitas pelo governo brasileiro da época e, muito menos, pelo governo americano. Sabíamos que, se aquele parecer fosse aprovado, o Acordo, tal como redigido, estava enterrado.

No dia da sessão de votação, fomos surpreendidos por uma série de elogios ao trabalho do Doutor Waldir Pires. Todos os partidos, sem exceção, manifestaram total apoio ao parecer do Doutor Waldir. Mesmo o PSDB e o PFL (hoje DEM) expressaram seu entusiasmo com o parecer. O mínimo que se disse é que a sessão era histórica, que o parecer era primoroso, que nenhuma outra Comissão teria capacidade de derrubar o trabalho que seria ali aprovado, como de fato aconteceu. Formou-se, assim, uma grande frente suprapartidária contra o Acordo de Alcântara.

Entretanto, chegou a hora de manifestar seu voto um deputado de perfil, por dizê-lo de forma eufemística, extremamente discreto, que só abria a boca, em geral, para defender pautas corporativas de militares e a finada ditadura. Nunca o vimos, naquela comissão, expressar opinião relevante sobre os grandes temas internacionais ou apresentar algum relatório ou projeto expressivo.
Para nossa surpresa, as Notas Taquigráficas da Câmara registraram para a história a seguinte manifestação:

O SR. DEPUTADO JAIR BOLSONARO – Louvo a competência do Deputado Waldir Pires, mas por outras razões que, no momento, preservo-me de citar, voto contrariamente ao projeto"- Câmara dos Deputados, CREDN, Notas Taquigráficas, 31/10/2001)

Ficamos um tanto perplexos. Sabíamos que a maior parte das Forças Armadas queria a rejeição do Acordo e apoiava, por conseguinte, a proposta do Doutor Waldir Pires. Pensávamos que o referido deputado estava alinhado com essa posição. Ficamos mais perplexos ainda com a recusa do deputado em explicitar as razões que o tornavam a única voz discordante de uma grande frente pela soberania nacional e pelo programa espacial brasileiro.

Na época, imaginamos que o voto podia ser resultado de alguma implicância ideológica contra o PT ou contra o Deputado Waldir Pires, que fora figura proeminente no governo João Goulart.

Na perspectiva atual, contudo, talvez aquele voto faça algum sentido maior.

Com efeito, depois de ter batido continência à bandeira americana em Miami, Bolsonaro vem externando sua admiração a Donald Trump e sua intenção de alinhar a política externa brasileira e, portanto, a política de Defesa do Brasil, à geoestratégia global dos EUA.

Como Trump, Bolsonaro quer reduzir os compromissos do Brasil com as mudanças climáticas e a proteção aos direitos humanos. Como o imprevisível Trump, Bolsonaro e seguidores veem com desconfiança o multilateralismo e instituições como a ONU, associadas, em suas mentes delirantes, a uma conspiração socialista global". Também veem com muitas reservas as alianças estratégicas com países emergentes e o papel dos BRICS.

Recentemente, seu vice, o pitoresco General Mourão, o Ariano, associou a exitosa vertente Sul-Sul da diplomacia ativa e altiva a uma aproximação à "mulambada" de lá (África) e cá (América Latina), que só teria atrasado o Brasil". O povero não sabe que foi a "mulambada" de cá e lá (América Latina e outros países em desenvolvimento) que absorveu, entre 2010 e 2015, cerca de 60% das nossas exportações de manufaturados. Os países desenvolvidos, o pessoal loiro e de olhos azuis, de quem Mourão parece tanto gostar, compraram somente 40% dos nossos produtos industrializados.

A verdade é que o grupo de Bolsonaro ainda vive nos jurássicos tempos da Guerra Fria, ainda acredita na superioridade da raça ariana, ainda acha que existe uma "conspiração comunista global" e, portanto, ainda enxerga no alinhamento automático com os EUA uma salvação contra as terríveis ameaças dos "comunistas", dos "quilombolas" e da "mulambada".
Dentro dessa perspectiva macarthista, sobrevivente da Guerra Fria e da ditadura, aquele voto estranho do Deputado Bolsonaro contra a frente pela soberania nacional criada na CREDN, por ocasião da votação do Acordo de Alcântara, faz sentido. É possível que não tenha sido mero capricho político.

Afinal, para quem bate continência à bandeira americana e admira Trump, a defesa da soberania, a defesa da nossa base, deve ser coisa de "comunista" ou de "mulambos".

*Por Marcelo Zero, sociólogo, especialista em Relações Internacionais e assessor da liderança do PT no Senado | Publicado originalmente no Blog Nocaute

Governos progressistas erraram ao serem tolerantes com mídia golpista, avalia Chomsky


Governos progressistas erraram ao serem tolerantes com mídia golpista, avalia Chomsky

O filósofo participou de um encontro com jornalistas da mídia alternativa, nesta segunda-feira (17), em São Paulo

 
18/09/2018 12:07
Filósofo Noam Chomsky participa de encontro com jornalistas independentes em São Paulo (Júlia Dolce)
Créditos da foto: Filósofo Noam Chomsky participa de encontro com jornalistas independentes em São Paulo (Júlia Dolce)
 
Noam Chomsky, linguista, filósofo e um dos mais importantes pensadores e ativistas anticapitalistas da atualidade, compareceu a um encontro com jornalistas da mídia alternativa, na noite desta segunda-feira (17), na sede do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, em São Paulo.

Em uma fala de trinta minutos, Chomsky comentou o poder de manipulação da opinião pública dos meios de comunicação hegemônicos e opinou que a grande mídia latino-americana tem um conhecido histórico golpista. O filósofo deu inicio à sua fala apresentando a introdução do livro “Revolução dos Bichos”, do escritor George Orwell, originalmente censurada. O texto afirma que na Inglaterra não era preciso violência para haver opressão e totalitarismo e destaca o papel da grande mídia nesse processo.

“Quando você olha para a estrutura institucional da mídia, pertencentes a grandes empresas, o produto somos nós. A estrutura da mídia são grandes corporações vendendo as pessoas para outras corporações e anunciantes”.

Chomsky ressaltou exemplos de veículos de comunicação latino-americanos que abertamente se posicionaram pela derrubada de governos de esquerda nas últimas décadas, como o jornal La Prensa, na Nicarágua, e a RCTV, na Venezuela. “Governos de esquerda na América Latina sempre permitiram que as mídias funcionassem e ela é, frequentemente, muito hostil a esses governos. Isso é um problema, porque esses governos estiveram e estão sob um ataque amargo. Em um país livre, isso seria inconcebível”, afirmou.
O filósofo destacou que o governo Lula é um dos principais exemplos de condescendência com a mídia, mesmo sendo completamente atacado por ela.

“O Brasil se tornou o país com melhor perspectiva do mundo durante os governos de Lula. Em uma forma que nunca tinha acontecido antes. Isso durou até o colapso do governo do PT. Mas isso pode ser alcançado novamente, não há razão para o país não voltar a essa posição”, disse.

Nos últimos meses, Chomsky se engajou na campanha pela libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, defendendo o ex-presidente do que chama de perseguição política e ressaltando que, por direito, ele seria eleito presidente. Sobre a recente decisão do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), que determina que Lula deve ter o direito de ser candidato à presidente, o filósofo destacou a dependência que a organização tem dos estados poderosos.

“Os Estados Unidos não prestam nenhuma atenção ao Comitê de Direitos Humanos da ONU. A ONU não é uma força independente, então, atua até onde os países poderosos permitem”, opinou. No entanto, Chomsky destaca que os EUA já não possui o mesmo poder sobre os países latino-americanos. “A América Latina já conseguiu se livrar, no passado, do controle direto dos Estados Unidos”, afirmou.

Questionado sobre o fenômeno de estudantes e profissionais latino-americanos que, após intercâmbio nos Estados Unidos, exportam conhecimentos liberais para seus países, Chomsky ressaltou o fenômeno dos "Chicago Boys", economistas chilenos que estudaram na cidade estadunidense de Chicago e, posteriormente, formularam a política econômica da ditadura do general Augusto Pinochet, no Chile. Em um alerta, o filósofo ressaltou que o economista do candidato Jair Bolsonaro e nome para o Ministério da Fazenda caso ele seja eleito, Paulo Guedes, representa o mesmo fenômeno. Guedes é doutor em economia pela Universidade de Chicago, instituição referência no pensamento econômico liberal.

Edição: Tayguara Ribeiro

*Publicado originalmente no Brasil de Fato

Apostando no caos

Apostando no caos

As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público brasileiros estão apostando no caos. Tudo indica que elas estão incentivando uma grave e explosiva crise social. Qualquer que seja o resultado das eleições deste ano, a instabilidade social e política, instalada a partir de 2013 e agravada desde 2016, se estenderá e se aprofundará no pós-eleições de 2018 e nos anos que se seguirão

 
12/09/2018 12:31
 
 
O Brasil tornou-se um barril de pólvora. Entre os cinco países com maior concentração de renda do mundo, segundo a ONU, e com mais de 80% da população nas cidades, o Brasil vive o crescimento do desemprego, da pobreza e da violência.  

As demandas populares, que se manifestaram desde 2013 e que foram utilizadas oportunisticamente pelas oposições aos governos petistas no golpe de 2016, tendem hoje a crescer ainda mais, após a reforma trabalhista, a liberação da terceirização das relações de trabalho e o corte nos recursos públicos para os gastos sociais, realizados no governo Temer.   

Na contramão do caminho seguido pelas nações desenvolvidas, o Brasil resiste à realização de um pacto entre classes sociais e forças políticas capaz de levar o país ao desenvolvimento econômico com justiça social. E a maior trincheira desta resistência são, hoje, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público, que rasgam as leis e a Constituição que deveriam defender, para eliminar da cena política as principais lideranças do campo dos trabalhadores, sem as quais é impossível construir qualquer pacto social.   

 A perseguição às principais lideranças políticas com raízes populares no país e que, pela primeira vez, haviam conquistado, pela via eleitoral e democrática, o governo federal, iniciou-se com a Ação Penal 470, vulgo Processo do Mensalão. Seguiu-se a Operação Lava-Jato, uma imitação primária e distorcida da Operação “Mani Pulite” (Mãos Limpas), italiana. E avançou com os processos irregulares contra Luís Inácio Lula da Silva e sua condenação e prisão relâmpagos e ao arrepio das leis e da Constituição Federal. A perseguição culminou com a impugnação da candidatura de Lula, o líder das pesquisas de intenção de voto com chance de ser eleito no primeiro turno da disputa.

 A trincheira do atraso 
As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público vivem uma realidade socioeconômica oposta à da maioria da população do país. O salário médio mensal bruto de um magistrado brasileiro e, por extensão, dos procuradores federais, com os “penduricalhos”: auxílio moradia, creche e/ou babá e instrução (que se estendem aos filho(a)s até os 24 anos!!!), etc., etc., etc. e que, na linguagem oficial, são chamados de direitos pessoais, indenizações e direitos eventuais, é atualmente de R$ 41.148,08, de acordo com a folha de pagamentos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF4 – e disponibilizada o site do Conselho Nacional de Justiça (http://www.cnj.jus.br/transparencia/remuneracao-dos-magistrados/remuneracao-junho-2018). Este valor resulta da divisão do valor total da folha de pagamento do mês de junho dos juízes do TR4, que importou em R$20.203.706,29, pelo número total de juízes constantes na folha, que soma 491 magistrados – juízes e desembargadores.

Dessa forma, o salário médio recebido por um juiz federal por um mês de trabalho equivale ao valor total que um trabalhador de salário mínimo (R$ 954,00) receberá após quarenta e um meses de trabalho, ou seja, três anos e cinco meses de labuta. Se considerarmos o salário anual de uns e outros, será necessário que o trabalhador de salário mínimo trabalhe durante QUARENTA E TRÊS ANOS, ou seja, oito anos além do necessário para a sua aposentadoria, para receber o que um juiz federal recebe durante apenas um ano de trabalho.

O Poder Judiciário se autoconcede benefícios, aumentando ainda mais a distância salarial em relação à maioria dos trabalhadores do país, como acabou de fazer ao aprovar novo reajuste de seus vencimentos, num período em que mais da metade dos trabalhadores brasileiros recebem menos do que um salário mínimo. Segundo dados do IBGE, em 2016, 44,5 milhões de trabalhadores brasileiros receberam um salário mensal médio de R$ 747,00.     

As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público, como déspotas esclarecidos, que, sem serem eleitos por ninguém mas sustentados pelos impostos de todos, acreditam saber mais sobre as necessidades do país do que seu próprio povo, se concedem também o direito de prender, condenar sem provas e impedir de concorrer nas eleições presidenciais a liderança com a qual a maioria da população mais pobre se identifica e por quem quer ser governada, segundo indicam as pesquisas de intenção de voto.

E vão além, agindo seletivamente nas condenações, prisões e impugnações realizadas. Todos os delatores da Lava-Jato estão soltos, gozando da posse de grande parte dos seus roubos. Pouquíssimos políticos filiados a qualquer partido diferente do PT estão presos ou impedidos de concorrer nas próximas eleições. O atual presidente da República, empossado por uma ação inconstitucional, porque descabida de prática delituosa pela presidente legítima, e acusado de inúmeras ações de corrupção, foi empossado e continua no exercício da sua função, sem ser importunado por aqueles que deveriam zelar pelo respeito à Constituição e à legalidade.

O barril de pólvora
A Constituição Federal de 1988, que consolidou avanços sociais e políticos fundamentais, foi rasgada e desrespeitada. Prática que se renova a cada reunião do STJ, do STF e do TSE em que ministros decidem unicamente por sua vontade e ideologia, ou a cada nova manifestação da Procuradora Geral da República nos processos envolvendo lideranças políticas populares.

Determinações dos Comitês de Direitos Humanos da OEA e da ONU, às quais o Brasil se encontra subordinado por adesão voluntária e vinculante, têm sido reiteradamente desrespeitadas exatamente por autoridades que, anteriormente, haviam se pronunciado pela obrigatoriedade de seu cumprimento, já que elas se encontram acima das leis ordinárias e apenas abaixo da Constituição Federal brasileira.

Ao perseguir e procurar retirar da vida pública brasileira a maior liderança do campo popular e a mais capacitada para a construção do pacto entre classes sociais e forças políticas que permite a edificação de um estado de bem-estar social, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal posicionam-se no sentido contrário do processo civilizatório.

Julgando-se imunes e inimputáveis, pois confiam no poder da grande mídia oligopolista de construir uma narrativa que justifique sua perseguição política seletiva, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público contribuem com um perigoso combustível para o agravamento da crise social brasileira. Elas se contrapõem à necessidade urgente de o Brasil implementar um projeto de desenvolvimento democrático e com inclusão social, que rompa com a tradição da Casa Grande e Senzala.

*Benedito Tadeu César  é cientista Político, Professor da UFRGS (aposentado), integrante das coordenações do M3D – Movimento Democracia, Diálogo e Diversidade e do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito

Apostando no caos II

Apostando no caos II

Urge a necessidade de o Brasil implementar um projeto de desenvolvimento democrático e com inclusão social, que rompa com a tradição da Casa Grande e Senzala

 
17/09/2018 11:47
 
 
As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público brasileiros estão apostando no caos. Tudo indica que elas estão incentivando uma grave e explosiva crise social. Qualquer que seja o resultado das eleições deste ano, a instabilidade social e política, instalada a partir de 2013 e agravada desde 2016, se estenderá e se aprofundará no pós-eleições de 2018 e nos anos que se seguirão. 

O Brasil tornou-se um barril de pólvora. Entre os cinco países com maior concentração de renda do mundo, segundo a ONU, e com mais de 80% da população nas cidades, o Brasil vive o crescimento do desemprego, da pobreza e da violência.  

As demandas populares, que se manifestaram desde 2013 e que foram utilizadas oportunisticamente pelas oposições aos governos petistas no golpe de 2016, tendem hoje a crescer ainda mais, após a reforma trabalhista, a liberação da terceirização das relações de trabalho e o corte nos recursos públicos para os gastos sociais, realizados no governo Temer.   

Na contramão do caminho seguido pelas nações desenvolvidas, o Brasil resiste à realização de um pacto entre classes sociais e forças políticas capaz de levar o país ao desenvolvimento econômico com justiça social. E a maior trincheira desta resistência são, hoje, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público, que rasgam as leis e a Constituição que deveriam defender, para eliminar da cena política as principais lideranças do campo dos trabalhadores, sem as quais é impossível construir qualquer pacto social.   

 A perseguição às principais lideranças políticas com raízes populares no país e que, pela primeira vez, haviam conquistado, pela via eleitoral e democrática, o governo federal, iniciou-se com a Ação Penal 470, vulgo Processo do Mensalão. Seguiu-se a Operação Lava-Jato, uma imitação primária e distorcida da Operação “Mani Pulite” (Mãos Limpas), italiana. E avançou com os processos irregulares contra Luís Inácio Lula da Silva e sua condenação e prisão relâmpagos e ao arrepio das leis e da Constituição Federal. A perseguição culminou com a impugnação da candidatura de Lula, o líder das pesquisas de intenção de voto com chance de ser eleito no primeiro turno da disputa.

 A trincheira do atraso 

As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público vivem uma realidade socioeconômica oposta à da maioria da população do país. O salário médio mensal bruto de um magistrado brasileiro e, por extensão, dos procuradores federais, com os “penduricalhos”: auxílio moradia, creche e/ou babá e instrução (que se estendem aos filho(a)s até os 24 anos!!!), etc., etc., etc. e que, na linguagem oficial, são chamados de direitos pessoais, indenizações e direitos eventuais, é atualmente de R$ 41.148,08, de acordo com a folha de pagamentos do Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF4 – e disponibilizada o site do Conselho Nacional de Justiça (http://www.cnj.jus.br/transparencia/remuneracao-dos-magistrados/remuneracao-junho-2018). Este valor resulta da divisão do valor total da folha de pagamento do mês de junho dos juízes do TR4, que importou em R$20.203.706,29, pelo número total de juízes constantes na folha, que soma 491 magistrados – juízes e desembargadores.

Dessa forma, o salário médio recebido por um juiz federal por um mês de trabalho equivale ao valor total que um trabalhador de salário mínimo (R$ 954,00) receberá após quarenta e um meses de trabalho, ou seja, três anos e cinco meses de labuta. Se considerarmos o salário anual de uns e outros, será necessário que o trabalhador de salário mínimo trabalhe durante QUARENTA E TRÊS ANOS, ou seja, oito anos além do necessário para a sua aposentadoria, para receber o que um juiz federal recebe durante apenas um ano de trabalho.

O Poder Judiciário se autoconcede benefícios, aumentando ainda mais a distância salarial em relação à maioria dos trabalhadores do país, como acabou de fazer ao aprovar novo reajuste de seus vencimentos, num período em que mais da metade dos trabalhadores brasileiros recebem menos do que um salário mínimo. Segundo dados do IBGE, em 2016, 44,5 milhões de trabalhadores brasileiros receberam um salário mensal médio de R$ 747,00.     

As cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público, como déspotas esclarecidos, que, sem serem eleitos por ninguém mas sustentados pelos impostos de todos, acreditam saber mais sobre as necessidades do país do que seu próprio povo, se concedem também o direito de prender, condenar sem provas e impedir de concorrer nas eleições presidenciais a liderança com a qual a maioria da população mais pobre se identifica e por quem quer ser governada, segundo indicam as pesquisas de intenção de voto.

E vão além, agindo seletivamente nas condenações, prisões e impugnações realizadas. Todos os delatores da Lava-Jato estão soltos, gozando da posse de grande parte dos seus roubos. Pouquíssimos políticos filiados a qualquer partido diferente do PT estão presos ou impedidos de concorrer nas próximas eleições. O atual presidente da República, empossado por uma ação inconstitucional, porque descabida de prática delituosa pela presidente legítima, e acusado de inúmeras ações de corrupção, foi empossado e continua no exercício da sua função, sem ser importunado por aqueles que deveriam zelar pelo respeito à Constituição e à legalidade.

O barril de pólvora

A Constituição Federal de 1988, que consolidou avanços sociais e políticos fundamentais, foi rasgada e desrespeitada. Prática que se renova a cada reunião do STJ, do STF e do TSE em que ministros decidem unicamente por sua vontade e ideologia, ou a cada nova manifestação da Procuradora Geral da República nos processos envolvendo lideranças políticas populares.

Determinações dos Comitês de Direitos Humanos da OEA e da ONU, às quais o Brasil se encontra subordinado por adesão voluntária e vinculante, têm sido reiteradamente desrespeitadas exatamente por autoridades que, anteriormente, haviam se pronunciado pela obrigatoriedade de seu cumprimento, já que elas se encontram acima das leis ordinárias e apenas abaixo da Constituição Federal brasileira.

Ao perseguir e procurar retirar da vida pública brasileira a maior liderança do campo popular e a mais capacitada para a construção do pacto entre classes sociais e forças políticas que permite a edificação de um estado de bem-estar social, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público Federal posicionam-se no sentido contrário do processo civilizatório.

Julgando-se imunes e inimputáveis, pois confiam no poder da grande mídia oligopolista de construir uma narrativa que justifique sua perseguição política seletiva, as cúpulas do Poder Judiciário e do Ministério Público contribuem com um perigoso combustível para o agravamento da crise social brasileira. Elas se contrapõem à necessidade urgente de o Brasil implementar um projeto de desenvolvimento democrático e com inclusão social, que rompa com a tradição da Casa Grande e Senzala.

*Benedito Tadeu César é Cientista Político, Professor da UFRGS (aposentado), integrante das coordenações do M3D – Movimento Democracia, Diálogo e Diversidade e do Comitê em Defesa da Democracia e do Estado Democrático de Direito