domingo, 18 de abril de 2021

1964: golpe de classe com apoio militar

 


jeu. 1 avr. à 12:52

 

                                                 1964: golpe de classe com apoio militar

                                                                    Leonardo Boff                     

Os militares que deram o golpe em 1964 se imaginam que foram eles os principais protagonistas desta nada gloriosa façanha,atualmente celebrada vergonhosamente sob a presidência de Jair Bolsonaro, famoso defensor do golpe, da tortura e da eliminação de opositores. Na sua indigência analítica, os militares mal suspeitam que foram, na verdade, usados por forças muito maiores do que as deles.

René Armand Dreifuss escreveu sua tese de doutorado na Universidade de Glasgow com o título: 1964: A conquista do Estado, ação política, poder e golpe de classe (Vozes 1981). Trata-se de um livro com 814 páginas das quais 326 de documentos originais. Por estes documentos fica demonstrado: o que houve no Brasil não foi um golpe militar, mas um golpe de classe com uso da força militar.

         A partir dos anos 60 do século passado, se constituiu o  complexo IPES/IBAD/GLC. Explico: o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES fundado em 29 de novembro de 1961), o Instituto Brasiieiro de Ação Democrática (IBAD), o Grupo de Levantamento de Conjuntura (GLC) e mais tarde,  oficiais da Escola Superior de Guerra (ESG). Formavam uma rede nacional que disseminava idéias golpistas, composta por grandes empresários nacionais e  multinacionais, banqueiros, órgãos de imprensa, jornalistas, intelectuais, a maioria listados no livro de Dreifuss.

O que os unificava, diz o autor “eram suas relações econômicas multinacionais e associadas, o seu posicionamento anticomunista e a sua ambição de readequar e reformular o Estado”(p.163) para que fosse funcional a seus interesses corporativos. O líder nacional deste grupo era o General Golbery de Couto e Silva que já em “em 1962 preparava um trabalho estratégico sobre  o assalto ao poder”(p.186).

A conspiração pois estava em marcha, há bastante tempo, levada avante, não diretamente pelos militares mas pelo complexo IPES/IBAD/GLC, articulados com a CIA e com a embaixada norte-americana que repassava fundos e acompanhava o desenrolar de todos os fatos.

         Aproveitando-se a confusão política criada ao redor do Presidente João Goulart, identificado como o portador do projeto comunista, este grupo viu a ocasião apropriada para realizar seu projeto. Chamou os militares para darem o golpe e tomarem de assalto o Estado. Foi, portanto, um golpe da classe dominante, multinacional  e associada à nacional, usando o poder militar.

Conclui Dreifuss: “O ocorrido em 31 de março de 1964 não foi um mero golpe militar; foi um movimento civil-militar; o complexo IPES/IBAD e oficiais da ESG organizaram a tomada do poder do aparelho de Estado”(p. 397). Especifica Dreifuss: ”O Estado de 1964 era de fato um Estado classista e, acima de tudo, governado por um bloco de poder”(p. 488). E especificamente afirma: ”A história do bloco de poder multinacional e associados começou a 1º de abril de 1964, quando os novos interesses realmente tornaram-se Estado, readequando o regime e o sistema político e reformulando a economia a serviço de seus objetivos”(p.489).

         Para sustentar a ditadura por tantos anos criou-se uma forte articulação de empresários, alguns dos quais financiavam a repressão, os principais meios de comunicação (especialmente a FSP, VEJA, O Globo e outros), magistrados e intelectuais anticomunistas declarados, iniciativas populistas entre outros. A Ideologia de Segurança Nacional não era outra coisa que a Ideologia da Segurança do Capital.

         Os militares inteligentes e nacionalista de hoje deveriam dar-se conta de como foram usados não contra uma presumida causa – o combate ao perigo comunista – mas a serviço do capital nacional e multinacional que estabeleceu relações de alta exploração e de grande acumulação para as elites oligárquicas, as “elites do atraso”, articuladas com o poder militar.

O golpe não serviu aos interesses nacionais globais, mas aos interesses corporativos de grupos nacionais articulados com os internacionais sob a égide do poder ditatorial dos militares. Hoje não é diferente: depois do golpe de 2016 com a cassação do mandato da Presidenta legitimamente eleita, Dilma Rousseff, a criação da Lava Jato, a prisão sem crime explícito de Lula e a ascensão de Jair Bolsonaro, de extrema-direita, obedece-se aos mesmos propósitos da “elite do atraso”(a oligarquia endinheirada e rentista, articulada internacionalmente) como o tem detalhado minuciosamente por Jessé Souza (cf.A elite do atraso: da escravidão à Lava Jato, Estação Brasil 2020).

         Importa dizer com todas as palavras que o assalto ao poder foi um crime contra a constituição. Foi rasgar as leis e em seu lugar instaurar o arbítrio. Foi uma ocupação violenta de todos os aparelhos de Estado para, a partir deles, montar uma ordem regida por atos institucionais, pela tirania, pela repressão  e pela violência.

         Nada mais dilacerador das relações sociais do que a ruptura do contrato social. É este que permite a todos conviverem com um mínimo de segurança e de paz. Quando este é destruído, no lugar do direito entra o arbítrio e no lugar da segurança vigora o medo. Bastava a suspeita de alguém ser subversivo para ser tratado como tal. Mesmo detidos e sequestrados por engano, mas suspeitos como opositores, como ocorreu com muitos inocentes camponeses, para logo serem submetidos a sevícias e a sessões intermináveis de torturas.

Muitos não resistiram e sua morte equivale a um assassinato. Não devemos deixar passar ao largo, os esquecidos dos esquecidos que foram os 246 camponeses mortos ou desaparecidos entre 1964-1979.

         O que os militares cometeram foi um crime lesa-pátria. Alegavam que se tratava de uma guerra civil, um lado querendo impor o comunismo e o outro defendendo a ordem democrática. Esta alegação não se sustenta. O comunismo nunca representou uma ameaça real. Na histeria da guerra-fria (União Soviética/USA) todos os que queriam reformas na perspectiva dos historicamente condenados e ofendidos – as grandes maiorias operárias e camponesas – eram logo acusados de comunistas e de marxistas, mesmo que fossem bispos como Dom Helder Câmara. Contra eles não cabia apenas a vigilância, mas a perseguição, a prisão, o interrogatório aviltante, o pau-de-arara feroz, os afogamentos desesperadores.

Os alegados “suicídios”, como do jornalista Vladimir Herzog,  camuflavam apenas o puro e simples assassinato. Em nome de combater o perigo comunista, assumiram a lógica comunista-estalinista da brutalização dos detidos. Em alguns casos se incorporou o método nazista de incinerar cadáveres como admitiu o ex-agente do Dops Cláudio Guerra e a única sobrevivente da CASA DA MORTE em Petrópolis, Inês Etienne Romeu, local onde entre 22-40 militantes foram terrivelmente seviciados, assassinados, seus corpos esquartejados e incinerados.

É indigno e imoral celebrar 21 anos de uma ditadura civil-militar, quando conhecemos o horror que significaram aqueles tempos sombrios e de chumbo, justamente num momento trágico em nossa história em que mais de 300 mil brasileiros,de todas as idades, foram ceifados pelo Covid-19 com mais de 12 milhões estão afetados.

         Não devemos jamais esquecer a verdade do fato maior da dominação de uma classe viralatista, poderosa, nacional, associada à multinacional, que usou o poder discricionário dos militares para garantir sua acumulação privada à custa da maioria do povo brasileiro. Essa ameaça voltou pelo comportamento ameaçador do atual presidente, insano e indiferente à dizimação de milhares de vidas, se opondo,contra todas as recomendações científicas, ao lockdown e ao isolamenteo social, continuamente ameaçando com um golpe de estado ou a decretação de estado de sítio. As instâncias competentes que poderiam agir não agem e, inertes, também assistem à tragédia de todo um povo.

         Valem as palavras de Ulysses Guimarães, corajoso opositor da ditadura civil-militar e o coordenador da Constituição de 1988: “tenho ódio e nojo da ditadura”, palavras repetidas no 31 de março de 2021 por Miram Leitão, jornalista e analista de economia em O Globo, uma das vítimas da repressão. “Ditadura nunca mais”.

 Leonardo Boff é teólogo, filósofo, membro da Iniciativa Internacional da Carta da Terra e escritor.     

Os cem anos do Teste de Rorschach, este raio-X do Inconsciente

 


Os cem anos do Teste de Rorschach, este raio-X do Inconsciente

 Este personagem de quadrinhos americano leva o nome do teste de Rorschach. DC / Dave Gibbons

Há apenas um século, o psicólogo suíço Hermann Rorschach publicou um teste prometendo revelar as profundezas da mente humana. Como? ”Ou“ O quê? Observando as pessoas que descrevem uma seleção selecionada de manchas de tinta. O Teste de Rorschach deixou sua marca em todo o mundo: na guerra, no trabalho e na cultura pop.

Este conteúdo foi publicado em 03 de abril de 2021 - 11:00
Damion searls

No auge da Guerra Fria, a frente também estava em nossas cabeças. O governo dos Estados Unidos apoiou os esforços para sondar as profundezas do "espírito soviético", "espírito africano", "espírito não europeu" e outros. Uma de suas armas letais era uma técnica suíça na vanguarda da psicologia da época. Uma ferramenta destinada a revelar o caráter e a personalidade de sujeitos que podem pertencer a culturas muito diferentes: o Teste de Rorschach.

O período entre 1941 e 1968 viu a publicação de cerca de cinco mil artigos que incluíram pesquisas com este teste. Eles se concentraram em povos que vão desde os índios Blackfoot no oeste americano aos habitantes do atol de coral de Ifalik, no Pacífico.

 Uma das cartas do teste de Rorschach - a pessoa avaliada deve indicar o que vê nela. Stanley Goldblatt / Photo Researchers, Inc.

Durante a Guerra Fria, sem dúvida na pior das ambições em termos de psicologia, houve a decisão do Departamento de Defesa dos Estados Unidos de enviar psiquiatras a um Vietnã atormentado pelo combate. Objetivo: adaptar a propaganda, a fim de conquistar os corações e mentes locais e permitir que os americanos tragam "paz, democracia e estabilidade" para a região. Assim, Walter H. Slote, psicoterapeuta e professor da Universidade de Columbia, será enviado para Saigon em 1966 por sete semanas. Sua missão: descobrir "a personalidade vietnamita". Sua ferramenta: psicanálise e o teste de Rorschach.

Hermann Rorschach não tinha nada disso em mente quando inventou seu método de borrão de tinta em 1917 e o publicou em 1921. Psiquiatra, trabalhava sozinho em um asilo isolado em Herisau. Discípulo de Freud, mas nunca doutrinário ou dogmático, estudou com Carl Jung em Zurique, onde este desenvolveu o primeiro teste empírico do Inconsciente: as associações de palavras.

Uma das manchas lembra a muitos um morcego ou uma mariposa: você se junta à maioria ou tenta ser original?

Fim da inserção

Rorschach também foi um artista durante toda a sua vida. Na escola, ele foi reconhecido por seu talento diante da folha de desenho. Ele respondeu ao apelido "Klex", a mancha de tinta em alemão. Mais importante ainda, Rorschach era um ser muito visual, ciente de que todos veem o mundo de forma diferente e que essas diferenças, longe de serem secundárias, caracterizam nossa mente e como ela funciona.

 Hermann Rorschach: o Brad Pitt dos psicanalistas. Akg-images

Depois de tatear, Rorschach escolheu dez manchas de tinta apresentadas aos participantes, fazendo-lhes esta pergunta aberta: "O que poderia ser?" Spots que são tudo menos aleatórios, estruturados e possuindo qualidades visuais que vão além da simples ambigüidade, bem como uma aura de mistério difícil de definir. Foi preciso um artista para produzi-los. Eles ainda são usados ​​hoje, um século depois, ninguém fez melhor. Entendê-los como um todo é difícil e, enquanto alguns de nós chegam ao quadro geral, outros permanecem focados nos detalhes. Imagine ... Em que você está se concentrando e com que facilidade você alterna entre eles? Você vê movimento e vida nessas imagens ou apenas formas frias e inanimadas? Uma das manchas lembra a muitos um morcego ou uma mariposa: você se junta à maioria ou tenta ser original?

Foi preciso um artista para produzi-los, um cientista para avaliar os resultados. Rorschach estabeleceu um sistema de atribuição de códigos e pontuações às respostas dos sujeitos de acordo com a frequência das respostas “global”, “detalhe” e “movimento” em particular. Os especialistas podiam calcular proporções, seguir padrões. Os resultados dos testes foram baseados nessas medidas e não, por exemplo, na suposição de que se você vir sua mãe, ela está obcecado por você. Originalmente, Rorschach equiparou seus pontos com uma experiência perceptiva ao invés de um teste. Tratava-se de explorar a maneira como as pessoas processam as informações visuais. Só mais tarde ele percebeu que diferentes tipos de pessoas tendem a perceber manchas de maneira diferente.

 Barbara Rios / Photo Researchers, Inc.

Em 1922, Rorschach morreu aos 32 anos de apendicite, deixando seu teste para a posteridade. Em seu país natal, a Suíça, ele permaneceu confinado a entrevistas de emprego e outros testes de orientação. Na Alemanha, onde, enquanto morava, Rorschach conseguiu irritar alguns psicólogos eminentes, ele nunca conseguiu sobreviver. Por outro lado, Yuzaburo Uchida, psicólogo de profissão, encontrou uma cópia do livro de Rorschach ( Psychodiagnostic) em uma livraria de Tóquio em 1925, e seus anúncios fizeram seu lar na psicologia japonesa apenas quatro anos após sua publicação. Eles continuam sendo o teste psicológico mais popular no Japão hoje, embora sejam negligenciados na Grã-Bretanha. Seu sucesso é importante na Argentina, marginal na Rússia como na Austrália, crescendo na Turquia.

Após a morte de Rorschach, seu teste viveu uma vida, díspar de um canto do globo ao outro. Mas foi nos Estados Unidos que ele alcançou a fama e experimentou sua conquista mais espetacular, penetrando mais profundamente na cultura.

Em meados do século, no auge da psicanálise freudiana, o Teste de Rorschach (muito mais rápido e barato que uma terapia sem fim) havia se tornado o principal “raio X do Inconsciente”, usado sem restrições. As pessoas esperavam que ele não fosse usado apenas para estudar estilos perceptivos ou identificar doenças mentais, mas também para praticamente ler mentes. O Teste de Rorschach se infiltrou no imaginário coletivo - seus spots ainda pontuam filmes negros, propagandas de perfumes, videoclipes ...

Mas as apostas associadas ao teste às vezes são maiores. Durante a Segunda Guerra Mundial, os militares dos Estados Unidos o utilizaram na seleção de seus pilotos e soldados em treinamento. Dar muitas respostas relacionadas à morte antes da mancha do chamado “cartão suicida” tornava você um candidato à terapia eletroconvulsiva. O suficiente para encorajar Rorschach a se virar no túmulo, aquele que havia escrito a um correspondente que desejava usar seu teste para medir aptidões acadêmicas: “Imaginar que um jovem, talvez sempre tendo sonhado em ir para a escola 'Universidade, está impedido de fazendo isso porque ele falhou no experimento, naturalmente, minha respiração foi interrompida. "

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Em 1966, Walter Slote concluiu de suas reflexões que a dinâmica familiar "era a chave" para a psique vietnamita. Ele acreditava que, na cultura vietnamita, os pais autoritários são idealizados e qualquer hostilidade contra eles reprimida. Como resultado, os vietnamitas se sentiram insatisfeitos, incompletos. Ele os viu "em busca de uma figura paterna gentil e amorosa" - com "o desejo, às vezes quase nostálgico, de serem abraçados pela autoridade". Vietnamitas que teriam associado os Estados Unidos à "imagem do pai todo-poderoso e magnânimo". Em outras palavras, "em essência", os vietnamitas não eram nada antiamericanos, mas muito pró-americanos!

Eles teriam, infelizmente, também mostrado uma "profunda falta de autoavaliação crítica" ... Uma observação que, em retrospectiva, sem dúvida se aplica ao próprio Slote, que ignorou os manifestos motivos políticos, históricos ou militares que poderiam justificar um ódio de os vietnamitas para a América. Mas ele estava dizendo o que os americanos aparentemente queriam ouvir. Em 1966, o Washington Post intitulou o trabalho de Slote "quase hipnoticamente fascinante" e as autoridades em Saigon o consideraram "extraordinariamente perspicaz e persuasivo".

Mas esses usos e abusos do Teste de Rorschach finalmente, e com razão, desencadearam uma onda de críticas. No final da década de 1960, a ferramenta havia perdido sua magia, assim como Freud. No Reino Unido e em outros lugares, ele nunca se recuperou. Já nos Estados Unidos, na década de 1970, foi reformulado para acentuar os resultados quantificados. As polêmicas nunca cessaram, mas o uso das mesmas dez cartas desde o início também produziu um vasto acúmulo de dados.

Os estudos científicos mais recentes validam o Teste de Rorschach, desde que seja usado corretamente e sem servir como garantia para as conclusões pessoais dos psicanalistas. Um grande metaestudo publicado no principal jornal de psicologia em 2013 conseguiu convencer algumas das vozes mais críticas. Alguns usos do teste - na verdade, em grande parte correspondendo aos do próprio Rorschach - têm base científica.

No entanto, os segredos da personalidade humana permanecem tão impenetráveis ​​como sempre.

COVID-19: VACINAR OU NÃO VACINAR

 

COVID-19: VACINAR OU NÃO VACINAR

 

 

Aldemario Araujo Castro

Advogado

Professor

Mestre em Direito

Procurador da Fazenda Nacional

Brasília, 15 de janeiro de 2021

 

 

                                   Difteria, tétano, paralisia infantil, sarampo, caxumba, rubéola, entre outras, são doenças altamente contagiosas. Já foram tristemente comuns em passado recente. Atualmente, são muito raras no Brasil.

 

                                    O que tornou as doenças mencionadas verdadeiras raridades? Quase todos sabem a resposta para essa indagação. Trata-se de um avanço técnico-científico conhecido como vacina.

 

                                   Qualquer pesquisa despretensiosa identificará que o médico inglês Edward Jenner, no final do século XVIII, constatou e experimentou a ideia de   que provocar uma enfermidade de forma tênue evitaria que a mesma fosse contraída de maneira mais grave. O veículo de provocação da doença de forma branda passou a ser chamado de vacina. Basicamente, ela estimula o sistema imune a produzir elementos de defesa do organismo (anticorpos). Essa memória imunológica conseguirá acelerar intensamente a resposta do corpo diante dos verdadeiros agentes patogênicos (a doença em si).

 

                                   As vacinas não estão livres de reações adversas e de contraindicações. Exatamente com objetivo de minimizar essas ocorrências são desenvolvidos e aperfeiçoados protocolos de elaboração e testes, inclusive com milhares de voluntários.

 

                                   As vacinas e as vacinações se espalharam pelo mundo como a principal forma de prevenção de inúmeras e perigosas doenças. Observe-se o caso da varíola. Na década de 50 do século passado, iniciou-se um projeto, patrocinado pela OMS (Organização Mundial da Saúde), que riscou do globo terrestre a referida doença infecciosa.

 

                                   A história das vacinas, aqui resumida ao extremo, e as ideias subjacentes foram amplamente aceitas no mundo inteiro e incorporadas ao conhecimento médico-científico e aos ordenamentos jurídicos (para conformar as condutas relacionadas com as mesmas, notadamente a necessidade de suas utilizações). Em relação a esse último aspecto, cabe destacar estes elementos na ordem jurídica brasileira:

 

 

Art. 3º Cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório.

 

Parágrafo único. As vacinações obrigatórias serão praticadas de modo sistemático e gratuito pelos órgãos e entidades públicas, bem como pelas entidades privadas, subvencionadas pelos Governos Federal, Estaduais e Municipais, em todo o território nacional” (Lei n. 6.259, de 30 de outubro de 1975).

 

Art. 14. O Sistema Único de Saúde promoverá programas de assistência médica e odontológica para a prevenção das enfermidades que ordinariamente afetam a população infantil, e campanhas de educação sanitária para pais, educadores e alunos.

 

§1o É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias” (Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências).

 

PORTARIA NORMATIVA Nº 94/GM-MD, DE 4 DE NOVEMBRO DE 2020. Institui o Calendário de Vacinação Militar.

 

O MINISTRO DE ESTADO DA DEFESA, no uso das atribuições que lhe confere o art. 87, parágrafo único, incisos I e II, da Constituição, e o art. 1º, inciso XIX, do Anexo I ao Decreto nº 9.570, de 20 de novembro de 2018, tendo em vista o disposto na Lei nº 6.259, de 30 de outubro de 1975, regulamentada pelo Decreto nº 78.231, de 12 de agosto de 1976, e considerando o que consta do Processo Administrativo nº 60521.000103/2018-50, resolve:

 

Art. 1º Fica instituído o Calendário de Vacinação Militar, visando ao controle, à eliminação e à erradicação das doenças imunopreveníveis e à padronização das normas de imunização para os militares das Forças Armadas. Parágrafo único. As vacinas e os períodos estabelecidos no Calendário de Vacinação Militar serão obrigatórios”.

 

                                  

                                   Neste momento, em plena pandemia do covid-19, com mais de 200 mil brasileiros falecidos, mais de 8 milhões infectados (acumulado) e um recrudescimento da disseminação (“segunda onda”), crescem as “resistências” às vacinas desenvolvidas para combater a doença, em especial a variante elaborada pelos chineses (coronavac).

 

                                   É inegável a existência de inúmeras “objeções” relacionadas com a vacinação para o enfrentamento ao covid-19. Sem esgotar as ressalvas, podem ser destacados: a) as disputas políticas, notadamente entre os governos federal e paulista. É no mínimo estranha a busca desenfreada do Governo Federal por dois milhões de doses da vacina Oxford-AstraZeneca na Índia quando São Paulo recebeu e tem armazenadas, segundo várias notícias da imprensa, mais de dez milhões de doses da coronavac; b) as dúvidas quanto ao surgimento (natural ou artificial) do vírus e possíveis desdobramentos daí decorrentes; c) os poderosos interesses econômicos, notadamente dos grandes laboratórios farmacêuticos; d) a utilização de tecnologias inéditas; e) o desenvolvimento e os testes em prazos muito exíguos quando comparados aos realizados em relação a outras vacinas no passado; f) a considerável quantidade de técnicos que, especialmente nas redes sociais, discordam com veemência das visões majoritárias ou divulgadas pela grande imprensa (em relação à pandemia, tratamentos, medicamentos, providências de isolamento social, uso de máscaras, vacinações, etc) e g) a “sensação” de desorganização e falta de eficiência na administração do combate ao vírus (observe-se a situação desesperadora de Manaus e a infindável saga logística envolvendo uma estranha dicotomia entre a produção/estoque de cloroquina e uma aparente insuficiência de seringas e agulhas). O aprofundamento do debate acerca desses e outros pontos é fundamental para uma adequada percepção do (extremamente) complexo contexto vivenciado e os riscos envolvidos nos vários cenários que podem ser desenhados.

 

                                   Temos, entretanto, um problema de fundo de importância capital. Os legítimos e necessários questionamentos aos mecanismos sociais, políticos e econômicos que produzem malezas, de todas as ordens e naturezas, não podem, sob pena de uma volta estarrecedora às cavernas, ao estado de natureza, a lei do mais forte ou qualquer outra proclamação semelhante, afastar um acordo civilizatório mínimo que compreende, mas não esgota, conquistas científicas consolidas com inegáveis frutos colhidos ao longo da história. Nesse sentido, um dos mais emblemáticos disparates que tive o desprazer de tomar conhecimento foi proferido, por incrível que pareça, pelo senhor Jair Messias Bolsonaro. Afirmou o Presidente da República: “Eu tive a melhor vacina, foi o vírus. Sem efeito colateral” (site folha.uol.com.br).

 

                                    Em suma, as várias vacinas produzidas contra o covid-19 apresentam dúvidas e riscos (maiores ou menores). Entretanto, nenhum deles parece, isolada ou conjuntamente, superar os danos em termos de vidas e sofrimentos provocados pela doença (temos milhões de casos no Brasil e no mundo como base empírica para essa última afirmação). Assim, só me resta acreditar na consciência de um mínimo civilizatório dos envolvidos, com suas complexidades, contradições, defeitos e interesses, no amplo processo de produção e administração das vacinas. O vírus, esse sim, vive em total estado de barbárie, por assim dizer. Produz e produzirá o pior resultado que as condições físico-orgânicas que encontrar permitam.

 

                                   Recuso-me a conceber, de forma racional ou intuitiva, que milhares e milhares de pessoas, em instituições públicas e privadas (laboratórios, imprensa, governos, organismos internacionais, etc), consumam seus tempos e energias para maltratar e matar, numa espécie de torneio macabro cujo oponente é o vírus.

A Pública, em 26/3/2021

 

Com medo do amanhã? Não se sinta só


Se você que lê essa newsletter está esgotado, angustiado, ansioso e com medo do amanhã, não se sinta só. Confesso que escrever este texto na semana em que o nosso país chegou a mais de 300 mil mortes por Covid-19 — com mais de 3 mil mortes em 24h na última quarta-feira, no maior colapso sanitário da história do Brasil — me fez pensar quando haverá novamente alguma alegria no nosso dia a dia. 

O cenário em que médicos relatam choque com UTIs lotadas de jovens com Covid-19, morrendo muito mais do que antes, revela que as medidas que vêm sendo tomadas pelas autoridades, como antecipação de feriados, são cortina de fumaça.

Quando parcela considerável da população insiste em não respeitar medidas sanitárias mínimas, o lockdown seria a única forma de mitigar mais mortes. Quem diz isso não sou eu, mas a ciência e países que adotaram a medida

Atuando em Porto Alegre, uma profissional da saúde me relatou: "As pessoas chegam morrendo e, enquanto a gente vai atender, uma outra que já está lá também passa mal. Quando morre, a gente já sai desconectando tudo para conectar em outro. Tá horrível. Eu chorei mais de uma vez enquanto segurava a máscara de alguns pacientes. Botamos um lençol em cima [quando vem a óbito], empurramos para o canto e já vamos atrás do próximo. É muito cruel". 

Cruel e também indignante ver que, na semana em que economistas e banqueiros da elite econômica do país soltaram um manifesto duro (e tardio) com críticas a Bolsonaro, o presidente teve a cara de pau de ir mentir em rede nacional e exaltar a atuação de seu governo.

Um governo que chegou a cogitar criar novo espaço para o pior ministro da saúde da história (o general Pazuello) para agora, como ex-ministro, ele ter foro privilegiado diante da gestão de morte que conduziu. Parece que, por hora, a manobra não emplacou.

E veja você, nem bem assumiu o posto, o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, já causa espanto ao esconder os verdadeiros números de mortes diárias. A situação é uma espécie de déjà vu, como previu o filósofo Vladimir Safatle em entrevista para a jornalista Marina Amaral, que disse há um ano que “Bolsonaro se acha capaz de esconder os corpos”.  

Mesmo com a mudança de tom do ex-capitão em relação a vacinação, sabemos que é tudo discurso vazio de um governo que orquestrou a disseminação do vírus. O Brasil hoje é uma ameaça mundial. Por isso, como disse o jornalista Renato Terra em seu twitter, "cuidado com essa nova variante do Bolsonarismo". Ela pode ser ainda mais perigosa. E mata.


Thiago Domenici, editor e repórter na Agência Pública 

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Pauta Pública.
 Nesta edição especial dos 10 anos da Pública, nossas fundadoras, Marina Amaral e Natalia Viana, contam falam sobre os desafios de criar a primeira agência de jornalismo investigativo do Brasil. Elas responderam perguntas de nossos repórteres e de Aliados e fizeram um panorama não só desta primeira década, mas do presente e do futuro do jornalismo no Brasil. Ouça já o novo episódio do podcast Pauta Pública. 

O que você perdeu na semana


"Bolsa-estupro". O projeto de lei para a criação do "Estatuto da Gestante", que está em tramitação no Senado, quer proibir o direito ao aborto legal no Brasil. De autoria do senador cearense Eduardo Girão (Podemos), o PL 5435/2020 também quer incentivar as vítimas de estupro a não abortarem mediante pagamento de auxílio financeiro.  

Caso Samarco. Registros de reuniões feitas entre o juiz responsável pelo caso do desastre de Mariana e advogados do Espírito Santo em 2020 e 2021 indicam uma possível suspeição do juiz Mário de Paula Franco Júnior. Nos vídeos, obtidos com exclusividade pelo Observatório da Mineração, o juiz da 12ª Vara Federal de Minas Gerais admite que muita gente que não deveria receber nada vai receber e quem deveria receber vai ficar de fora. 

Covid-19 na América Latina. Mesmo já tendo imunizado quase seis milhões de pessoas, o Chile colocou em quarentena 13,7 milhões de cidadãos a partir desta quinta-feira (25), dos cerca de 19 milhões de habitantes do país. A ocupação de leitos em UTIs chega a 95% na rede pública e privada em nível nacional, que funcionam de forma integrada em resposta à crise sanitária.  

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Conservação das florestas. Novo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre conservação das florestas “ressalta e evidencia tudo o que é negado por Bolsonaro”, avalia líder indígena. Em entrevista à Agência Pública, a médica indígena Myrna Cunningham, presidente do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e do Caribe (Filac), afirma que o Brasil não é um risco apenas para os povos tradicionais da América Latina, mas para o mundo inteiro.  

Pública +10. O último dia de conversas do festival Pública+10 trouxe a diretora do Instituto Marielle Franco e pesquisadora, Anielle Franco, para debater a “barbárie na política” com o sociólogo e professor José Cláudio Souza Alves. O assassinato da vereadora Marielle Franco foi uma das questões abordadas. “Há mais de 500 anos o discurso bélico de segurança pública serve para perseguir e matar pessoas negras no Brasil. A gente não se cala, mas a gente tem que se cuidar”, afirmou Anielle. Para encerrar o evento, o ambientalista Ailton Krenak e a professora Déborah Danowski conversaram sobre o negacionismo científico e a emergência climática: “Nós temos um tempo para mudar o roteiro, se a gente não mudar o roteiro nós vamos nos transformar em um caos geral”, resumiu Krenak. 

Operação Mussulo. O resort paradisíaco Mussulo, que simbolizou luxo e prosperidade por dez anos no litoral da Paraíba, fechou sob acusações de dar calote nos funcionários e clientes. Mas investigações do Ministério Público apuram que o empreendimento estaria ligado a um esquema de lavagem de dinheiro que envolveria políticos e empresários angolanos e portugueses, bancos, a Sonangol  maior petrolífera de Angola , empresas offshores e imóveis no Brasil.

Nova caça às bruxas. Conhecida por livros como “Calibã e a Bruxa” e “Mulheres e Caça às Bruxas", a filósofa, escritora e professora italiana Silvia Federici aponta que os movimentos feministas têm reivindicado com mais força questões antigas como o trabalho doméstico e reprodutivo. Ela também encara a extrema-direita e o fundamentalismo religioso como as maiores estruturas de controle feminino atualmente.
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Defesa dos Kalunga. Pela primeira vez em 300 anos, o maior quilombo remanescente do Brasil conhece cada centímetro de seu território. Graças a um projeto inédito de georreferenciamento, os Kalungas puderam mapear a ocupação, os recursos naturais, as melhores terras para cultivo e as áreas sob ameaça de invasões dos 262 mil hectares da área onde vivem, no norte de Goiás.
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