terça-feira, 23 de outubro de 2018

As Democracias também morrem democraticamente

As Democracias também morrem democraticamente

Habituámo-nos a pensar que os regimes políticos se dividem em dois grandes tipos: democracia e ditadura. Depois da queda do Muro de Berlim em 1989, a democracia (liberal) passou a ser quase consensualmente considerada como o único regime político legítimo. Pese embora a diversidade interna de cada um, são dois tipos antagónicos, não podem coexistir na mesma sociedade, e a opção por um ou outro envolve sempre luta política que implica a ruptura com a legalidade existente. Ao longo do século passado foi-se consolidando a ideia de que as democracias só colapsavam por via da interrupção brusca e quase sempre violenta da legalidade constitucional, através de golpes de Estado dirigidos por militares ou civis com o objectivo de impor a ditadura. Esta narrativa, era em grande medida, verdadeira. Não o é mais. Continuam a ser possíveis rupturas violentas e golpes de Estado, mas é cada vez mais evidente que os perigos que a democracia hoje corre são outros, e decorrem paradoxalmente do normal funcionamento das instituições democráticas. As forças políticas anti-democráticas vão-se infiltrando dentro do regime democrático, vão-no capturando, descaracterizando-o, de maneira mais ou menos disfarçada e gradual, dentro da legalidade e sem alterações constitucionais, até que em dado momento o regime político vigente, sem ter formalmente deixado de ser uma democracia, surge como totalmente esvaziado de conteúdo democrático, tanto no que respeita à vida das pessoas como das organizações políticas. Umas e outras passam a comportar-se como se vivessem em ditadura. Menciono a seguir os quatro principais componentes deste processo.
A eleição de autocratas. Dos EUA às Filipinas, da Turquia à Rússia, da Hungria à Polónia têm vindo a ser eleitos democraticamente políticos autoritários que, embora sejam produto do establisment político e económico, se apresentam como anti-sistema e anti-política, insultam os adversários que consideram corruptos e vêem como inimigos a eliminar, rejeitam as regras de jogo democrático, fazem apelos intimidatórios à resolução dos problemas sociais por via da violência, mostram desprezo pela liberdade de imprensa e propõem-se revogar as leis que garantem os direitos sociais dos trabalhadores e das populações discriminadas por via etno-racial, sexual, ou religião. Em suma, apresentam-se a eleições com uma ideologia anti-democrática e, mesmo assim, conseguem obter a maioria dos votos. Políticos autocráticos sempre existiram. O que é novo é a frequência com que estão a chegar ao poder.
O vírus plutocrata. O modo como o dinheiro tem vindo a descaracterizar os processos eleitorais e as deliberações democráticas é alarmante. Ao ponto de se dever questionar se, em muitas situações, as eleições são livres e limpas e se os decisores políticos são movidos por convicções ou pelo dinheiro que recebem. A democracia liberal assenta na ideia de que os cidadãos têm condições de aceder a uma opinião pública informada e, com base nela, eleger livremente os governantes e avaliar o seu desempenho. Para que isso seja minimamente possível, é necessário que o mercado das ideias políticas (ou seja, dos valores que não têm preço, porque são convicções) esteja totalmente separado do mercado dos bens económicos (ou seja, dos valores que têm preço e nessa base se compram e vendem). Em tempos recentes, estes dois mercados têm-se vindo a fundir sob a égide do mercado económico, a tal ponto que hoje, em política, tudo se compra e tudo se vende. A corrupção tornou-se endémica. O financiamento das campanhas eleitorais de partidos ou de candidatos, os grupos de pressão (ou lobbies) junto dos parlamentos e governos têm hoje em muitos países um poder decisivo na vida política. Em 2010, o Tribunal Supremo dos EUA, na decisão Citizens United v. Federal Election Commission, desferiu um golpe faltal na democracia norte-americana ao permitir o financiamento irrestrito e privado das eleições e decisões políticas por parte de grandes empresas e de super-ricos. Desenvolveu-se assim o chamado “Dark Money”, que não é outra coisa senão corrupção legalizada. É esse mesmo “dark money” que explica no Brasil uma composição do Congresso dominada pelas bancadas da bala, da bíblia e do boi, uma caricatura cruel da sociedade brasileira.
As fake news e os algoritmos. A internet e as redes sociais que ela tornou possível foram durante algum tempo vistas como possibilitando uma expansão sem precedentes da participação cidadã na democracia. Hoje, à luz do que se passa nos EUA e no Brasil, podemos dizer que elas serão as coveiras da democracia, se entretanto não forem reguladas. Refiro-me em especial a dois instrumentos. As notícias falsas sempre existiram em sociedades atravessadas por fortes clivagens e, sobretudo, em períodos de rivalidade política. Hoje, porém, é alarmante o seu potencial destrutivo através da desinformação e da mentira que espalham. Isto é sobretudo grave em países como a Índia e o Brasil, em que as redes sociais, sobretudo o Whatsapp (o conteúdo menos controlável por ser encriptado), são amplamente usadas, a ponto de serem a grande, ou mesmo a única, fonte de informação dos cidadãos (no Brasil, 120 milhões usam o Whatsapp). Grupos de investigação brasileiros denunciaram no New York Times (17 de Outubro) que das 50 imagens mais divulgadas (virais) dos 347 grupos públicos do Whatsapp em apoio de Bolsonaro só 4 eram verdadeiras. Uma delas era uma foto da Dilma Rousseff, candidata ao Senado, com o Fidel Castro na Revolução Cubana. Tratava-se, de facto, de uma montagem feita a partir do registo de John Duprey para o jornal NY Daily News em 1959. Nesse ano Dilma Rousseff era uma criança de 11 anos. Apoiado por grandes empresas internacionais e por serviços de contra-inteligência militar nacionais e estrangeiros, a campanha de Bolsonaro constitui uma monstruosa montagem de mentiras a que dificilmente sobreviverá a democracia brasileira.
Este efeito destrutivo é potenciado por outro instrumento: o algoritmo. Este termo, de origem árabe, designa o cálculo matemático que permite definir prioridades e tomar decisões rápidas a partir de grandes séries de dados (big data) e de variáveis tendo em vista certos resultados (o sucesso numa empresa ou numa eleição). Apesar da sua aparência neutra e objectiva, o algoritmo contém opiniões subjectivas (o que é ter êxito? Como se define o melhor candidato?) que permanecem ocultas nos cálculos. Quando as empresas são intimadas a revelar os critérios, defendem-se com o segredo empresarial. No campo político, o algoritmo permite retroalimentar e ampliar a divulgação de um tema que está em alta nas redes e que, por isso, o algoritmo considera ser relevante porque popular. Acontece que o que está em alta pode ser produto de uma gigantesca manipulação informacional levada a cabo por redes de robots e de perfis automatizados que difundem a milhões de pessoas notícias falsas e comentários a favor ou contra um candidato, tornando o tema artificialmente popular e assim ganhar ainda mais destaque por via do algoritmo. Este não tem condições para distinguir o verdadeiro do falso e o efeito é tanto mais destrutivo quanto mais vulnerável for a população à mentira. Foi assim que em 17 países se manipularam recentemente as preferências eleitorais, entre eles os EUA (a favor de Trump) e agora, no Brasil (a favor de Bolsonaro) numa proporção que pode ser fatal para a democracia. Sobreviverá a opinião pública a este tóxico informacional? Terá a informação verdadeira alguma chance de resistir a esta avalanche de falsidades? Tenho defendido que em situações de inundação o que faz mais falta é a água potável. Com a preocupação paralela a respeito da extensão da manipulação informática das nossas opiniões, gostos e decisões, a cientista de computação Cathy O’Neil designa os big data e os algoritmos como armas de destruição matemática (Weapons of Math Destruction, 2016).
A captura das instituições. O impacto das práticas autoritárias e anti-democráticas nas instituições ocorre paulatinamente. Presidentes e parlamentos eleitos pelos novos tipos de fraude (fraude 2.0) a que acabo de aludir têm o caminho aberto para instrumentalizar as instituições democráticas, e podem fazê-lo supostamente dentro da legalidade, por mais evidentes que sejam os atropelos e interpretações enviesadas da lei ou da Constituição. Em tempos recentes, o Brasil tornou-se um laboratório imenso de manipulação autoritária da legalidade. Foi esta captura que tornou possível a chegada ao segundo turno do neo-fascista Bolsonaro e a sua eventual eleição. Tal como tem acontecido noutros países, a primeira instituição a ser capturada é o sistema judicial. Por duas razões: por ser a instituição com poder político mais distante da política eleitoral e por constitucionalmente ser o órgão de soberania concebido como “árbitro neutro”. Noutra ocasião analisarei este processo de captura. O que será a democracia brasileira se esta captura se concretizar, seguida das outras que ela tornará possível? Será ainda uma democracia?

Ibope diz que Haddad encurta em quatro pontos a vantagem de Bolsonaro.

Ibope diz que Haddad encurta em quatro pontos a vantagem de Bolsonaro. Por Fernando Brito

 
Fernando Haddad e Jair Bolsonaro. Fotos: Ricardo Stuckert, Marcelo Camargo/Agência Brasil
Publicado originalmente no blog Tijolaço
POR FERNANDO BRITO
Acaba de ser divulgada nova pesquisa Ibope/Globo.
A diferença entre Jair Bolsonaro e Fernando Haddad, que na semana passada era de 18 pontos (59 a 37%) caiu para 14: 57% a 43%, nos válidos.
O dado mais interessante é que a rejeição a Bolsonaro cresceu muito: na semana passada, 35% diziam que “não votariam nele de jeito nenhum” e este número passou a 40%. O mesmo aconteceu na declaração de voto espontânea: de 47% baixou a 42%.
A rejeição a Haddad caiu de 47% na semana passada para 41% na de hoje, colocando em empate técnico a “negação de voto”. No voto espontâneo, ele sobe dois pontos, de 31 para 33%, o que deixa a diferença entre os dois na casa dos 8 pontos.
O resultado injeta ânimo na reta final da campanha de Haddad, embora ainda seja muito grande a diferença, ainda que se tenha de lembra que, neste tripo de eleição,  um voto virado vale por dois..
Mas parece indicar que algo está começando se se mover na cabeça do brasileiro.

DISPARADA NA REJEIÇÃO DE BOLSONARO ABRE ESPAÇO PARA VIRADA DE HADDAD

Nobel de Economia diz que Bolsonaro o apavora

Nobel de Economia diz que Bolsonaro o apavora

"A possibilidade de Jair Bolsonaro ganhar as eleições brasileiras me enche de pavor", escreveu o professor

Nobel de Economia diz que Bolsonaro o apavora
Notícias ao Minuto Brasil
HÁ 6 HORAS POR NOTÍCIAS AO MINUTO
ECONOMIA OPINIÃO
Nobel de Economia e professor na Universidade Harvard, Eric Maskin se juntou a outros acadêmicos fora do país no repúdio à candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República.
"A possibilidade de Jair Bolsonaro ganhar as eleições brasileiras me enche de pavor", escreveu.
"Por muitos anos, o Brasil parecia estar politicamente no caminho certo: os governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula mostraram que os políticos podem diferir em suas políticas, mas ainda assim participar de forma construtiva de uma sociedade democrática. Agora Bolsonaro ameaça destruir as próprias normas da democracia e levar o país de volta a um tempo mais sombrio. Espero fervorosamente que ele seja derrotado."
Sua declaração foi dada em resposta a uma provocação de estudantes, professores e pesquisadores, brasileiros e estrangeiros, ligados a universidades em Nova York como NYU, Columbia, New School e Cuny.
Outros dois acadêmicos laureados pelo Nobel de Economia, Robert Shiller, e George Akerlof, também já se manifestaram contra Bolsonaro.

Ato com Haddad, no Rio

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Caetano Veloso, Chico Buarque, Mano Brown e mais 70 mil pessoas com Haddad no Rio

A virada da democracia começa nos Arcos da Lapa

Fernando Haddad, o candidato da democracia, foi abraçado por milhares de pessoas nos Arcos da Lapa, no centro do Rio de Janeiro, nesta terça-feira (23). Ao lado de sua vice, Manuela D’Ávila, e de sua esposa, Ana Estela Haddad, nosso candidato foi recebido por Chico Buarque, Caetano Veloso, Antônio Pitanga, Leonardo Boff, Marieta Severo, Criolo, Mano Brown e mais 70 mil pessoas.

Um quarteto desses, bicho!

VIRADA veio no mesmo dia em que nosso adversário, o adulador de torturadores Jair Bolsonaro, caiu dois pontos e Haddad, o candidato da democracia, subiu dois pontos.

Faltam cinco dias para a eleição e nós vamos, juntos, com um processo pautado pela democracia, ganhar esta eleição.



INSTRUÇÕES NORMATIVAS

Os juízes do Brasil lavam as mãos LAVARAM E LAVAM EM ÁGUAS IMPRÓPRIAS


Os juízes do Brasil lavam as mãos

Rosa Weber, presidenta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), disse que ninguém deve esperar uma ''solução rápida e eficaz'' contra o esquema de disseminação massiva de mentiras de campanha através contra a candidatura do PT

 
23/10/2018 09:38
(AFP)
Créditos da foto: (AFP)
 
Essa história lembra uma lenda urbana que teria acontecido na Argentina, durante os anos da ditadura: um professor de química teve sua casa invadida por militares devido a uma suposta denúncia anônima. Depois de um tempo vasculhando o local em busca de provas de sua militância esquerdista, e sem ter indício algum de tal situação, um dos fardados encontrou um livro que falava sobre “CUBA HECTOLÍTRICA” (em espanhol a palavra “cuba” não se refere somente ao país comunista, pode significar também “tonel”, ou se referir a recipientes cilíndricos de grande porte, de qualquer material). Ao ver o livro, o comandante da operação deu ordem de prisão ao professor, acusado de envolvimento com Cuba. O educador tentou dizer que o livro e o termo “CUBA HECTOLÍTRICA” se referiam a um manual para a utilização de um recipiente na realização de ensaios químicos, mas não convenceu os militares. Passou seis meses na prisão, tentando explicar o inexplicável.
Um vereador paulistano simpatizante de Bolsonaro afirmou que a Ku Klux Klan é uma organização de esquerda e que os seguidores do candidato atacaram a Igreja Católica “comunista”, em protesto realizado em frente à Catedral de Brasília, porque as colunas estavam iluminadas com luzes vermelhas. O olhar enviesado e enfurecido dos bolsonaristas os impediu de notar que os refletores lançavam luz rosa, não vermelha, sobre as colunas do templo, como parte de uma campanha contra o câncer de mama, na que também foram coloridos por essa cor todos os palácios públicos da capital federal.

As fake news estão fazendo estragos no imaginário político dos adoradores de Jair Bolsonaro, favorito para vencer as eleições presidenciais do próximo domingo (28/10). A propósito, o segundo nome do candidato, Messias, começou a ser usado politicamente por ele em 2016, durante um batismo realizado em Israel, onde foi acompanhado por um pastor evangélico anticomunista.

No domingo (21/10), o diário Folha de São Paulo publicou mais informações sobre o bombardeio de notícias falsas que atingiu milhões de cidadãos antes do primeiro turno eleitoral, realizado no dia 7 de outubro, quando o ex-militar surpreendeu os pesquisadores, obtendo 46% dos votos, cinco pontos mais do que o previsto, contra 29% de Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT) e herdeiro de Luiz Inácio Lula da Silva.

Também no fim de semana, durante uma visita ao estado nordestino do Maranhão, o candidato petista declarou que seu rival “não é um democrata, é um miliciano”, apelido dado aos parapoliciais que atuam em esquadrões da morte, que estão presentes nas favelas das grandes capitais.

Haddad tem dedicado esta última parte da campanha do segundo turno a denunciar o esquema de fraude eletrônica financiado por empresários de ultradireita, motivo que fundamentou seu pedido de impugnação da candidatura de Bolsonaro, apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Provavelmente, o formato principal desta tempestade de fake news foi desenhado pelo ex-assessor de Donald Trump, Steve Bannon, que após trabalhar para a vitória do magnata do Partido Republicano, em 2016, passou a se dedicar à formação de uma internacional da extrema direita “alternativa”.

Nessa frente neofascista, Bannon inclui, além de Trump e Bolsonaro – definido recentemente como “um dos nossos” por um dos líderes da Ku Klux Klan –, a vários movimentos radicais europeus.

A ministra Rosa Weber, presidenta do TSE, convocou uma coletiva de imprensa no mesmo domingo (21/10), para dizer que ninguém deve esperar uma “solução rápida e eficaz” contra o problema das mentiras disseminadas através do WhatsApp.

Ou seja, o Poder Judiciário atuará com desdém diante de um aparato que influiu na votação do primeiro turno presidencial, e que provavelmente repetirá a manobra para a votação que se realizará dentro de seis dias.

A vitória de Bolsonaro, se confirmada a projeção da maioria das pesquisas, será recordada pelos favores que o candidato recebeu do Judiciário. Juízes de diversas instâncias proscreveram o candidato favorito, Lula da Silva em tempo recorde, quando este tinha 40% das intenções de voto, contra 20% do capitão reformado, e toleraram o funcionamento de uma fábrica de fake news que “disparou centenas de milhões” de mensagens apócrifas, segundo um rigoroso artigo da Folha de São Paulo.

“Estamos frustrados com esta indulgência”, disse Fernando Haddad, se referindo à postura dos magistrados a respeito da propagação de mentiras através das redes sociais.

Outra omissão judicial tem a ver com o ativismo de milhares de pastores pertencentes às correntes neopentecostais, principalmente a Igreja Universal do Reino de Deus, cujo plano terrenal é conquistar o poder no Brasil. A promessa está registrada no livro escrito por seu principal líder, o bispo televisivo Edir Macedo.

O teólogo Frei Betto denunciou que Bolsonaro contou com a cumplicidade de grupos evangélicos vinculados aos Estados Unidos. Em entrevista ao programa “Vozes do Mundo”, do portal Sputnik, ele afirmou que o apoio das cada vez mais populares seitas neopentecostais, que converteram milhões de católicos nas últimas décadas, está unido a compromissos políticos que terão consequências diplomáticas se a extrema direita assumir o governo, a partir de janeiro de 2019. “É possível que Bolsonaro rompa relações com Cuba e Venezuela, e mude a representação diplomática do Brasil em Israel para a cidade de Jerusalém, copiando Trump”, declarou Betto.

*Publicado originalmente no Página/12 | Tradução de Victor Farinelli