sábado, 18 de fevereiro de 2012

Mais uma guerra provocada pelos EUA

TERCEIRA GUERRA MUNDIAL

Sara Sanz Pinto




Presidente e diretor do Centro de Investigação sobre a Globalização, Michel Chossudovsky conversou com o portal “i” sobre essa possível terceira guerra mundial, de que fala no seu livro “Towards a World War III Scenario: The Dangers of Nuclear War” (Cenário para a III Guerra Mundial: Os Perigos da Guerra Nuclear). Crítico da fortificação militar que os Estados Unidos estão construindo em torno da China, o professor canadense da Universidade de Ottawa defende que a opinião pública é fundamental para evitar uma guerra nuclear.

PORTAL I: Você diz no seu livro que a guerra com o Irã já começou e que os Estados Unidos está apenas à espera de um rosto humano para lhe dar. Acredita que os objetivos políticos e geoestratégicos de Washington podem levar-nos a uma guerra nuclear com consequências para toda a humanidade.

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Não quero fazer previsões e ir além do que aconteceu. Tudo o que posso dizer, e tenho reiteradamente afirmado, é que a preparação para a guerra está a um nível muito elevado. Se será levada a cabo ou não é outra questão, e ainda não podemos afirmar se isso virá a acontecer. Esperemos que não. Mas temos de considerar seriamente o fato de que este destacamento de tropas é o maior da história mundial. Estamos assistindo ao envio de forças navais, homens, sistemas de armamento de ponta, controlados através do comando estratégico norte-americano em Omaha, Nebrasca, e que envolve uma coordenação entre EUA, OTAN e forças israelenses, além de outros aliados no golfo Pérsico (Arábia Saudita e estados do Golfo). Estas forças estão a postos. Isto não significa necessariamente que vamos entrar num cenário de terceira guerra mundial, mas os planos militares no Pentágono, nas bases da OTAN, em Bruxelas e em Israel, estão sendo preparados. E temos de levá-los muito a sério. Tudo pode acontecer, estamos numa encruzilhada muito perigosa e infelizmente a opinião pública está mal informada. Dão espaço a Hollywood, aos crimes e a todo o tipo de acontecimentos banais, mas, no que toca a este destacamento militar que poderá levar-nos a uma terceira guerra mundial, ninguém diz nada. Isso é um dos problemas, porque a opinião pública é muito importante para evitar esta guerra. E isso não está acontecendo, as pessoas não se estão organizando para se oporem à guerra. Isto não é uma questão política, é um problema muito mais amplo, e tenho de dizer que os meios de comunicação ocidentais estão envolvidos em atos de camuflagem absolutamente criminosos. Só o fato de alinharem com a agenda militar, como estão fazendo na Síria, onde sabemos que os rebeldes são apoiados pela OTAN, a Arábia Saudita e Israel, e como fizeram na Líbia, é chocante do meu ponto de vista, porque as mentiras que se criam servem para justificar uma intervenção humanitária.

PORTAL I: Em vez de uma guerra nuclear, não podemos assistir a um cenário semelhante à Guerra Fria, com os EUA, a União Europeia e Israel de um lado e a China, a Rússia e o Irã do outro?

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Esse cenário já é visível. A OTAN e os EUA militarizaram a sua fronteira com a Rússia e a Europa de Leste, com os chamados escudos de defesa antimíssil – todos esses mísseis estão apontados a cidades russas. Obama sublinhou em declarações recentes que a China é uma ameaça no Pacífico – uma ameaça a quê? A China é um país que nunca saiu das suas fronteiras em dois mil anos. E eu sei, porque ando investigando este tema há muito tempo, que está sendo construída toda uma fortaleza militar ao redor da China, no mar, na península da Coreia, e o país está cercado, pelo menos na sua fronteira ao sul. Por isso a China não é a ameaça. Os EUA são a ameaça à segurança da China. E estamos numa situação de Guerra Fria. Devo mencionar, porque é importante para a União Europeia, que, no limite, os EUA, no que toca à sua postura financeira, bancária, militar e petrolífera, também estão ameaçando a União Européia. Estão por trás da desestabilização do sistema bancário europeu.

PORTAL I: E a colocação de mais tropas em torno da China vai trazer mais tensão à região.

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Quanto a isso não tenho dúvidas, porque os EUA estão aumentando a sua presença militar no Pacífico, no Oceano Índico e estão tentando conseguir o apoio das Filipinas e de outros países no Sudeste Asiático, como o Japão, a Coreia, Singapura, a Malásia (que durante muitos anos esteve reticente a juntar-se a esta aliança). Portanto, Washington está formando uma extensão da OTAN na região da Ásia-Pacífico, direcionada contra a China. Não há dúvida quanto a isto. E não se vence uma guerra contra a China. É um país com uma população de 1,4 bilhão de habitantes, com um número significativo de forças, tanto convencionais como estratégicas. Por isso, com este confronto entre a OTAN e os EUA, de um lado, e a China, do outro, estamos num cenário de terceira guerra mundial. E todo o mundo vai perder com esta guerra. Qualquer pessoa com um entendimento mínimo de planejamento militar sabe que este tipo de confronto entre superpotências – incluindo o Irã, que é uma potência regional no Médio Oriente, com uma população de 80 milhões de habitantes – poderá levar-nos a uma guerra nuclear. E digo isto porque os EUA e os seus aliados implementaram as chamadas armas nucleares tácticas – mudaram o nome das bombas e dizem que são inofensivas para os civis, o que é uma grande mentira.

PORTAL I: Mentira porquê?

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Está escrito em todos os documentos que a B61-11 [arma nuclear convencional] não faz mal às pessoas e pretendem usá-la. Tenho estado examinando estes planos de guerra nos últimos oito anos, e posso garantir que estão prontos a ser usados e podem ser acionados sem uma ordem do presidente dos EUA. Olhe para o que eles designam no documento “Nuclear Posture Review”, de 2001 - um relatório fulcral que integra as armas nucleares no arsenal convencional, sublinhando a distinção entre os diferentes tipos de armas e apresentando a noção daquilo que chamam “caixa de ferramentas”. E a caixa de ferramentas é uma coleção de armas variadas, que o comandante na região ou no terreno pode escolher, onde estão estas B61-11, que são consideradas armas convencionais. Se quiser posso fazer uma analogia, é a mesma coisa que dizer que fumar é bom para a saúde. As armas nucleares não são boas para a saúde, mudaram o rótulo e chamaram–lhes bombas humanitárias, mas têm uma capacidade destruidora seis vezes superior à bomba atômica lançada em Hiroxima, em 1945.

PORTAL I: Mas a maior parte das pessoas não parece consciente da gravidade do cenário.

MICHEL CHOSSUDOVSKY: A ironia é que a terceira guerra mundial pode começar e ninguém estará sequer a par, porque não vai estar nas primeiras páginas. Na verdade, a guerra já começou no Irã. Têm forças especiais no terreno, instigaram todo tipo de mecanismos para desestabilizar a economia iraniana através do congelamento de bens. Há uma guerra da moeda em curso – isto faz parte da agenda militar. Desestabilizando-se a moeda de um país desestabiliza-se a sua economia, bloqueiam-se as exportações de petróleo, e isto antecede a implementação de uma agenda militar. Se eles puderem evitar uma aventura militar contra o Irã e ocupar o país,poderão fazer através de outros meios. É isso que estão tentando neste momento. Querem a mudança de regime, o colapso das empresas de petróleo, apropriar-se dos recursos do país, e têm capacidade para fazer isto tudo sem uma intervenção militar, embora alguma possa vir a ser necessária. Mas o Irã é considerado uma das maiores potências militares da região e basta olharmos para as análises da sua força aérea, a sua capacidade em mísseis, as suas forças convencionais que ultrapassam um milhão de homens (entre ativo e reserva), o que permite que de um dia para o outro consiga mobilizar cerca de metade, ou até mais. Tendo em conta estes números, os EUA e os seus aliados não conseguem vencer uma guerra convencional contra o Irã, daí a razão pela qual estão tentando fazer a guerra com outros meios, e um desses meios é o pretexto das armas nucleares.

PORTAL I: Você acha que o Ocidente pode lançar um ataque preventivo contra o Irão mesmo sem provas?

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Claro que sim! Olhe para a história dos pretextos para lançar guerras. Olhe para trás, para todas as guerras que os EUA começaram, a partir do século XIX. O que fazem sistematicamente é criar aquilo que chamamos incidente provocado para começar a guerra. Um incidente que lhes permite justificar o início de um conflito por motivos humanitários. Isto é muito óbvio. Em Pearl Harbor, por exemplo, sabe-se que foi uma provocação, porque os EUA sabiam que iam ser atacados e deixaram que tal acontecesse. O mesmo se passou com o incidente no golfo de Tonkin, que levou à guerra do Vietnam. E agora são vários os pretextos que emergem contra o Irã: as alegadas armas nucleares são um, outro é o alegado papel nos atentados de 11 de Setembro, pois desde o primeiro dia que acusam o país de apoiar os ataques, a afirmação mais absurda que podem fazer, pois não existem quaisquer provas. Mas os meios de comunicação agarram nestas coisas e dizem “sim, claro”.

PORTAL I: Pode explicar às pessoas de uma forma simples a relação entre guerra contra o terrorismo e batalha pelo petróleo?

MICHEL CHOSSUDOVSKY: A guerra contra o terrorismo é uma farsa, é uma forma de demonizar os muçulmanos e é também a criação, através de operações em segredo dos serviços secretos, de brigadas islâmicas, controladas pelos EUA. Sabemos disso! Estas forças, ligadas ao grupo terrorista Al-Qaeda, são uma criação da CIA de 1979. Por isso a guerra contra o terrorismo é apenas um pretexto e uma justificação para lançar uma guerra de conquista. É uma tentativa de convencer as pessoas de que os muçulmanos são uma ameaça e de que as estão protegendo e para isso têm de invadir países perigosos, como o Irã, o Iraque, a Síria e a Coreia do Norte, que perdeu 25% da sua população durante a Guerra da Coreia, no entanto, continua a ser considerada como uma ameaça para Washington. É absurdo! Os imperialistas americanos são como a inquisição espanhola. Aliás, piores! O que mais me choca é que os EUA consegue virar a realidade ao contrário, sabendo que são mentiras e mesmo assim acreditando nelas. A guerra contra o terrorismo é uma mentira enorme, mas todas as pessoas acreditam e o mesmo se passava com a inquisição espanhola – ninguém a questionava. As pessoas conformam-se com consensos e quem assume a posição de que isto não passa de um conjunto de mentiras é considerado alguém em quem não se pode confiar e provavelmente perderá o emprego. Por isso esta guerra é contra a verdade, muito mais séria que a agenda militar. Contra a consciência das pessoas – parece que ninguém está autorizado a pensar. E depois vêm dizer-nos “Ah, mas as armas nucleares são inofensivas para os civis”. E as pessoas acreditam.

PORTAL I: Será Israel capaz de atacar o Irã sem o apoio dos EUA?

MICHEL CHOSSUDOVSKY: Não. Eles podem enviar as suas forças, por exemplo, para o Líbano, mas o seu sistema está integrado no dos EUA e, como o Irã tem mísseis, têm de estar coordenados com Washington. É uma impossibilidade em termos militares. Em 2008, o sistema de defesa aérea de Israel foi integrado ao sistema norte-americano. Estamos falando de estruturas de comando integradas. Quer dizer, Israel pode lançar uma pequena guerra contra o Hezbollah ou até contra a Síria, mas contra o Irã terá de ser com a intervenção do Pentágono. Embora tendo uma fatia significativa de militares, Israel tem uma população de sete milhões de pessoas e não tem capacidade para lançar uma grande ofensiva contra o Irã.

Fonte:  : http://www.ionline.pt/mundo




Nenhum comentário:

Postar um comentário