Política
Leandro Fortes
Togaduto
07.03.2012 14:47
Parente não é serpente
Renato parente é um assessor especialmente influente nos tribunais
superiores. Foi fiel escudeiro de Gilmar Mendes no Supremo Tribunal Federal e
até pouco tempo ocupava a chefia da comunicação do Tribunal Superior do
Trabalho, presidido por João Oreste Dalazen. Por uma questão formal, Dalazen
rebaixou Parente de função, mas manteve seus poderes, que consistem basicamente
em administrar as verbas do setor no TST, naco de um filão milionário do Poder
Judiciário onde reina a Fundação Renato Azeredo, de Minas Gerais. Trata-se de um
eficiente sorvedouro de dinheiro público comandado pelo PSDB.
Leia também:
PIB: Economia brasileira cresce apenas 2,7% em 2011
Código Florestal: A disputa entre a competitividade e a ganância
Aliança entre GM e PSA torna o mercado mais competitivo
Criada em 1996, a fundação leva o nome de um falecido deputado federal do antigo PSD mineiro, pai de outro parlamentar, Eduardo Azeredo (PSDB-MG). O hoje senador, quando governador, criou a fundação para auxiliar projetos de pesquisa da Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG). Em pouco tempo, a entidade de direito privado e sem fins lucrativos renegou as origens acadêmicas e passou a ganhar um dinheirão.
Apenas em Minas Gerais, entre 2003 e 2011, a Fundação Renato Azeredo faturou 212,1 milhões de reais de verbas repassadas diretamente do governo de Minas, graças a contratos firmados em gestões tucanas, duas de Aécio Neves e, desde o ano passado, a de Antonio Anastasia. A fundação é presidida pelo farmacêutico Aluísio Pimenta, ex-assessor especial de Aécio. Sob pretexto de notória especialização, a fundação sempre foi contratada pelos governos tucanos sem licitação. Na primeira gestão de Neves, por exemplo, a entidade recebeu cerca de 20 milhões por ano, limpos, dos cofres estaduais, para serviços em área de comunicação social.
Somente da tevê estatal mineira, a Rede Minas, a Fundação Renato Azeredo recebeu, por transferência direta, 17,6 milhões de reais, também em quatro anos. Uma investigação ainda em curso no Ministério Público Estadual detectou, em 2008, uma transferência de 23,3 milhões de reais. Mas nada comparado ao ano eleitoral de 2010, quando a Renato Azeredo levou uma bolada de 51,7 milhões de reais, 35,9 milhões dos quais apenas no primeiro semestre, às vésperas das eleições. Os promotores suspeitam que a fundação possa ter substituído o esquema de caixa 2 montado por Eduardo Azeredo com o publicitário Marcos Valério de Souza, mais tarde importado pelo PT e revelado no chamado “escândalo do mensalão”.
Ao contrário dos promotores mineiros, os procuradores da República em Brasília ainda não atinaram para o mesmo esquema montado no Poder Judiciário Federal, com verbas da União. Desde 2010, a Fundação Renato Azeredo passou a substituir outro baluarte do tucanato, a Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura, de São Paulo, até então dona das contas de comunicação social do Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Superior Tribunal de Justiça (STJ). Sem aviso e sem justificativa, naquele ano eleitoral, a fundação do tucano paulista decidiu abandonar os tribunais e abrir espaço para a coirmã mineira, num esquema de revezamento pouco sutil.
Em pouco tempo, estava tudo dominado. No STJ, a Fundação Renato Azeredo ganhou, sem licitação, em 2010, um contrato de 10,5 milhões de reais por ano (depois reduzido para 6,6 milhões de reais). Foi beneficiada por decisão do ex-presidente do tribunal César Asfor Rocha, amigo dileto do ministro Gilmar Mendes, do STF , fundamental para garantir a presença de Renato Parente na história.
No CNJ, a Fundação Renato Azeredo foi contratada também sem licitação, em 8 de março de 2010, durante a gestão de Gilmar Mendes, por um prazo de seis meses. O valor desse primeiro contrato foi de 1,6 milhão de reais. Em 22 de setembro de 2010, o contrato passou a ser renovado automaticamente por um ano, pelo valor de 4,2 milhões de reais, situação que se mantém até agora.
No STF, depois da saída da Fundação Padre Anchieta, o presidente Cezar Peluso, substituto de Mendes, ordenou a realização de uma licitação. Feita em julho de 2010, a disputa foi vencida pela Fundação LBV, de Brasília, logo desqualificada por não conseguir preencher os requisitos técnicos para a produção de noticiários para a TV e a Rádio Justiça, mantidas pelo Supremo. Classificada em segundo lugar, a Fundação Renato Azeredo levou o contrato de 15 milhões de reais.
No TSE, a fundação mineira também venceu a concorrência e abocanhou dois contratos. Um, de junho de 2010 a junho de 2011, de 4,2 milhões de reais. Outro, a vencer em junho próximo, de 3,1 milhões. A diferença de 1,1 milhão de reais é parte de uma regra do tribunal que garante valores maiores para contratos firmados em anos eleitorais.
O protagonismo de Parente nesse processo revelou-se apenas no ano passado, graças a dois eventos distintos. Primeiro, quando a burocracia interna do TST descobriu que, desde 1992, ele ocupa cargos comissionados de nível superior dentro do Poder Judiciário sem nunca ter-se formado em nada, apesar de se apresentar como “jornalista e publicitário”. Mesmo sem diploma, ele disponibilizou currículos fraudulentos nos quais constava a seguinte informação: “Graduado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM)”, de São Paulo. Há seis meses, uma ligação do TST para a direção da famosa escola paulista bastou para desmontar a farsa.
Técnico judiciário de nível médio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, Parente foi assessor de imprensa do juiz Nicolau dos Santos Neto, o “Lalau”, responsável por desvio de dinheiro das obras do tribunal em 1998. Em 2001, sempre montado na história do falso diploma, foi levado pelo ministro Marco Aurélio Mello para o STF, para assumir a Secretaria de Comunicação Social. Em 2006, ainda pelas mãos de Mello, passou a ocupar o mesmo cargo no TSE. Nas duas oportunidades, contratou, sem licitação, a Fundação Padre Anchieta, subordinada ao tucanato paulista.
Em 2008, Parente tornou-se o braço midiático do então presidente do STF, Gilmar Mendes, de quem passou a zelar como se fosse um capataz. A um repórter, no Acre, que ousou perguntar se Mendes era pecuarista, Parente ofereceu um pisão no pé. Em 2009, a pedido do chefe, conseguiu censurar temporariamente um programa da TV Câmara, no qual o autor desta matéria fazia críticas ao seu padrinho e patrão.
Parente alega não ocupar, desde 7 de janeiro de 2012, a função de secretário de Comunicação Social do TST. Na verdade, de acordo com registro do Diário Oficial da União, ele foi exonerado “a pedido”, em 29 de dezembro de 2011. Foi uma tentativa desesperada de evitar o vazamento da informação sobre a fraude funcional. No mesmo ato, Parente virou chefe de um “Núcleo de Comunicação Institucional”, que, como o nome indica, não significa nada. Na verdade, a solução interna achada pelo ministro Dalazen (lembrete: presidente do Tribunal Superior do Trabalho!) foi fazer com que um subordinado de Parente, o jornalista diplomado Alexandre Gomes Machado, passasse a assinar os papéis da secretaria e a responder, jurídica e administrativamente, por um cargo que não exerce.
O assessor tentou fixar o dia 7 de janeiro como data de exoneração porque há ao menos um documento interno assinado por Dalazen, datado de 6 de janeiro, para emissão de passagens aéreas e diárias para o “secretário de Comunicação Social” Renato Parente. O texto, ao qual CartaCapital teve acesso pelo site do TST, refere-se à emissão de passagens e diárias relativas a uma viagem a Caucaia (CE).
O segundo evento diz respeito à tentativa de Parente de levar a Fundação Renato Azeredo para o TST, sem licitação, no fim de 2011. Foi barrado pela burocracia, que o obrigou a realizar um pregão eletrônico no mês passado. Tropeço do acaso, algum funcionário da fundação tucana não conseguiu apresentar a proposta da entidade a tempo, pela internet. A solução encontrada foi a de melar o processo e impedir que a empresa vencedora, a AP Comunicação, de Brasília, ganhasse o contrato, orçado em 8,8 milhões de reais por ano, por cinco anos.
A agência vencedora foi enganada: um informe enviado pela internet depois do expediente deu 15 minutos a ela e a quatro outras classificadas para apresentar um plano de execução de serviços de produção de vídeo. Na manhã seguinte, os concorrentes souberam que tinham sido retirados do processo. A AP, contudo, entrou com um mandado de segurança para permanecer no páreo, mas Parente nem deu bola. Revogou o pregão sob a justificativa de que a proposta da agência vencedora era muito alta. Outra mentira: o edital publicado pelo tribunal estabelecia o valor do contrato em 10 milhões de reais.
No site do TST, Parente ainda é apresentado como titular do cargo, fato que ele reputa a um descuido do pessoal da área de informática da Casa. Na sexta-feira 2, ainda entronizado no cargo que a lei o impede de ter, ele viajou com o ministro Dalazen para o Rio de Janeiro, onde a dupla pretendia realizar um evento a favor da prevenção de acidentes de trabalho no canteiro de obras do Estádio do Maracanã.
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Criada em 1996, a fundação leva o nome de um falecido deputado federal do antigo PSD mineiro, pai de outro parlamentar, Eduardo Azeredo (PSDB-MG). O hoje senador, quando governador, criou a fundação para auxiliar projetos de pesquisa da Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG). Em pouco tempo, a entidade de direito privado e sem fins lucrativos renegou as origens acadêmicas e passou a ganhar um dinheirão.
Apenas em Minas Gerais, entre 2003 e 2011, a Fundação Renato Azeredo faturou 212,1 milhões de reais de verbas repassadas diretamente do governo de Minas, graças a contratos firmados em gestões tucanas, duas de Aécio Neves e, desde o ano passado, a de Antonio Anastasia. A fundação é presidida pelo farmacêutico Aluísio Pimenta, ex-assessor especial de Aécio. Sob pretexto de notória especialização, a fundação sempre foi contratada pelos governos tucanos sem licitação. Na primeira gestão de Neves, por exemplo, a entidade recebeu cerca de 20 milhões por ano, limpos, dos cofres estaduais, para serviços em área de comunicação social.
Somente da tevê estatal mineira, a Rede Minas, a Fundação Renato Azeredo recebeu, por transferência direta, 17,6 milhões de reais, também em quatro anos. Uma investigação ainda em curso no Ministério Público Estadual detectou, em 2008, uma transferência de 23,3 milhões de reais. Mas nada comparado ao ano eleitoral de 2010, quando a Renato Azeredo levou uma bolada de 51,7 milhões de reais, 35,9 milhões dos quais apenas no primeiro semestre, às vésperas das eleições. Os promotores suspeitam que a fundação possa ter substituído o esquema de caixa 2 montado por Eduardo Azeredo com o publicitário Marcos Valério de Souza, mais tarde importado pelo PT e revelado no chamado “escândalo do mensalão”.
Ao contrário dos promotores mineiros, os procuradores da República em Brasília ainda não atinaram para o mesmo esquema montado no Poder Judiciário Federal, com verbas da União. Desde 2010, a Fundação Renato Azeredo passou a substituir outro baluarte do tucanato, a Fundação Padre Anchieta, responsável pela TV Cultura, de São Paulo, até então dona das contas de comunicação social do Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Superior Tribunal de Justiça (STJ). Sem aviso e sem justificativa, naquele ano eleitoral, a fundação do tucano paulista decidiu abandonar os tribunais e abrir espaço para a coirmã mineira, num esquema de revezamento pouco sutil.
Em pouco tempo, estava tudo dominado. No STJ, a Fundação Renato Azeredo ganhou, sem licitação, em 2010, um contrato de 10,5 milhões de reais por ano (depois reduzido para 6,6 milhões de reais). Foi beneficiada por decisão do ex-presidente do tribunal César Asfor Rocha, amigo dileto do ministro Gilmar Mendes, do STF , fundamental para garantir a presença de Renato Parente na história.
No CNJ, a Fundação Renato Azeredo foi contratada também sem licitação, em 8 de março de 2010, durante a gestão de Gilmar Mendes, por um prazo de seis meses. O valor desse primeiro contrato foi de 1,6 milhão de reais. Em 22 de setembro de 2010, o contrato passou a ser renovado automaticamente por um ano, pelo valor de 4,2 milhões de reais, situação que se mantém até agora.
No STF, depois da saída da Fundação Padre Anchieta, o presidente Cezar Peluso, substituto de Mendes, ordenou a realização de uma licitação. Feita em julho de 2010, a disputa foi vencida pela Fundação LBV, de Brasília, logo desqualificada por não conseguir preencher os requisitos técnicos para a produção de noticiários para a TV e a Rádio Justiça, mantidas pelo Supremo. Classificada em segundo lugar, a Fundação Renato Azeredo levou o contrato de 15 milhões de reais.
No TSE, a fundação mineira também venceu a concorrência e abocanhou dois contratos. Um, de junho de 2010 a junho de 2011, de 4,2 milhões de reais. Outro, a vencer em junho próximo, de 3,1 milhões. A diferença de 1,1 milhão de reais é parte de uma regra do tribunal que garante valores maiores para contratos firmados em anos eleitorais.
O protagonismo de Parente nesse processo revelou-se apenas no ano passado, graças a dois eventos distintos. Primeiro, quando a burocracia interna do TST descobriu que, desde 1992, ele ocupa cargos comissionados de nível superior dentro do Poder Judiciário sem nunca ter-se formado em nada, apesar de se apresentar como “jornalista e publicitário”. Mesmo sem diploma, ele disponibilizou currículos fraudulentos nos quais constava a seguinte informação: “Graduado pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM)”, de São Paulo. Há seis meses, uma ligação do TST para a direção da famosa escola paulista bastou para desmontar a farsa.
Técnico judiciário de nível médio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, Parente foi assessor de imprensa do juiz Nicolau dos Santos Neto, o “Lalau”, responsável por desvio de dinheiro das obras do tribunal em 1998. Em 2001, sempre montado na história do falso diploma, foi levado pelo ministro Marco Aurélio Mello para o STF, para assumir a Secretaria de Comunicação Social. Em 2006, ainda pelas mãos de Mello, passou a ocupar o mesmo cargo no TSE. Nas duas oportunidades, contratou, sem licitação, a Fundação Padre Anchieta, subordinada ao tucanato paulista.
Em 2008, Parente tornou-se o braço midiático do então presidente do STF, Gilmar Mendes, de quem passou a zelar como se fosse um capataz. A um repórter, no Acre, que ousou perguntar se Mendes era pecuarista, Parente ofereceu um pisão no pé. Em 2009, a pedido do chefe, conseguiu censurar temporariamente um programa da TV Câmara, no qual o autor desta matéria fazia críticas ao seu padrinho e patrão.
Parente alega não ocupar, desde 7 de janeiro de 2012, a função de secretário de Comunicação Social do TST. Na verdade, de acordo com registro do Diário Oficial da União, ele foi exonerado “a pedido”, em 29 de dezembro de 2011. Foi uma tentativa desesperada de evitar o vazamento da informação sobre a fraude funcional. No mesmo ato, Parente virou chefe de um “Núcleo de Comunicação Institucional”, que, como o nome indica, não significa nada. Na verdade, a solução interna achada pelo ministro Dalazen (lembrete: presidente do Tribunal Superior do Trabalho!) foi fazer com que um subordinado de Parente, o jornalista diplomado Alexandre Gomes Machado, passasse a assinar os papéis da secretaria e a responder, jurídica e administrativamente, por um cargo que não exerce.
O assessor tentou fixar o dia 7 de janeiro como data de exoneração porque há ao menos um documento interno assinado por Dalazen, datado de 6 de janeiro, para emissão de passagens aéreas e diárias para o “secretário de Comunicação Social” Renato Parente. O texto, ao qual CartaCapital teve acesso pelo site do TST, refere-se à emissão de passagens e diárias relativas a uma viagem a Caucaia (CE).
O segundo evento diz respeito à tentativa de Parente de levar a Fundação Renato Azeredo para o TST, sem licitação, no fim de 2011. Foi barrado pela burocracia, que o obrigou a realizar um pregão eletrônico no mês passado. Tropeço do acaso, algum funcionário da fundação tucana não conseguiu apresentar a proposta da entidade a tempo, pela internet. A solução encontrada foi a de melar o processo e impedir que a empresa vencedora, a AP Comunicação, de Brasília, ganhasse o contrato, orçado em 8,8 milhões de reais por ano, por cinco anos.
A agência vencedora foi enganada: um informe enviado pela internet depois do expediente deu 15 minutos a ela e a quatro outras classificadas para apresentar um plano de execução de serviços de produção de vídeo. Na manhã seguinte, os concorrentes souberam que tinham sido retirados do processo. A AP, contudo, entrou com um mandado de segurança para permanecer no páreo, mas Parente nem deu bola. Revogou o pregão sob a justificativa de que a proposta da agência vencedora era muito alta. Outra mentira: o edital publicado pelo tribunal estabelecia o valor do contrato em 10 milhões de reais.
No site do TST, Parente ainda é apresentado como titular do cargo, fato que ele reputa a um descuido do pessoal da área de informática da Casa. Na sexta-feira 2, ainda entronizado no cargo que a lei o impede de ter, ele viajou com o ministro Dalazen para o Rio de Janeiro, onde a dupla pretendia realizar um evento a favor da prevenção de acidentes de trabalho no canteiro de obras do Estádio do Maracanã.
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