sábado, 4 de outubro de 2014

A candidatura da placenta

Ademir Alves de Melo*
Os homens que inventaram Deus devem ter a finura de desinventar o princípio da sua infalibilidade, justificada, recorrentemente, nos acertos e nos erros humanos com a sentença reducionista que dá por encerrada a questão: “Por que Deus quer”.
Se a Natureza por acaso fez de uma placenta hospedeira de dois óvulos sertanejos que se desenvolveram e tornaram em frutos do mesmo ramo - tão parecidos que, às vezes, um não sabe se é ele mesmo ou se é o outro – não se pode atribuir à vontade divina nem à Natureza responsabilidade por uma candidatura geminada, tão legítima e verdadeira quanto a propriedade de Jesus sobre um veículo adesivado com essa invencionice, como usualmente se vê em circulação essa manifestação de fé enganosa.
Os placentários juram pelo sangue de Cristo e a hóstia consagrada apoio à candidata de Dilma Rousseff à presidência da República. Não escondem do material de propaganda em divulgação esta opção concertada, mesmo a contragosto de Lula e Dilma, que rejeitam esse apoio, nos termos propostos, por seus fundamentos. Paradoxalmente e de encontro a essa declaração talhada de fidelidade, a turma do PT de estrela vermelha alaranjada chancela a candidatura  à reeleição do governador, que se esmera na campanha oposicionista de Eduardo Campos. Este presidenciável não poupa críticas ao governo Dilma e ao PT, somando voz às forças tenebrosas da reação e do golpismo latejante. Assim, a candidatura da placenta oxigena, via Ricardo Coutinho, os esforços de Campos e da oposição ranzinza, para impedir a vitória de Dilma no primeiro turno, e regatear, depois, vantagens e prebendas no eventual segundo turno. Até porque, vai ficar desempregado.
O candidato girassol faz a derrubada de votos com a força devastadora das derrubadas das florestas pelas lâminas e marinadas das serras e dos Serras, esperando compensação no novo governo social-desenvolvimentista, verbi gratia  a remissão da maquiavélica engenharia política que ora conduz. Nem Augusto dos Anjos foi tão enfático na exaltação do EU.
Ricardo arrasta na ciranda subalterna lideranças que repetem as lições mal aprendidas de FHC, ao dispensar a opinião pública no ocaso de seu desgoverno: “Esqueçam o que falei”. Lições mal assimiladas porque FHC sabia que se despedia da vida pública para entrar na história como o vendilhão da pátria, enquanto que os seus aprendizes, na esquerda descarrilhada do PT, pretendem entrar na política e fazer história como querem, alheios às circunstâncias com que se defrontam diretamente, ligadas e transmitidas pelo passado, como nos ensinam os mestres da socioeconomia.
E se Dilma ganhar no primeiro turno, como fica a situação da turma da placenta e entourage?
* Professor doutor do Centro de Ciências Jurídicas da UFPB


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