A última do STF: patrão 6, sindicato 3
Ao autorizar, por 6 votos contra 3, a extinção da contribuição sindical obrigatória, o Supremo Tribunal Federal aplicou aquele que pode ser um dos mais profundos e duradouros golpes do patronato brasileiro contra as organizações do movimento operário e popular.
Ponto de honra do golpe que derrubou Dilma Rousseff, a decisão equivale a uma derrota histórica. Inviabiliza -- do ponto de vista financeiro -- o funcionamento cotidiano de milhares de sindicatos que, apesar de falhas, omissões e desvios que todos conhecem, jogaram um papel fundamental não apenas na defesa dos direitos e reivindicações dos trabalhadores, como na garantia do poder de contra dos salários corroídos pela inflação do pós-Guerra, no combate à manipulação dos índices inflacionários durante a ditadura militar (1964-1985), na luta constante pela dignidade nos ambientes de trabalho através de comissões de fábrica criadas após a democratização.
Também atuaram como principal musculatura política das camadas de baixo da sociedade, normalmente silenciadas, quando não reprimidas diretamente. Funcionaram como escola de formação de ativistas transformados em dirigentes sindicais, mais tarde parlamentares, ministros de Estado e, por fim, no caso mais espetacular entre tantos, no Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva.
Ninguém tem o direito de discutir, obviamente, a necessidade de apurar, punir e corrigir praticas daninhas que transformaram as receitas do imposto sindical -- que chegou a R$ 3,5 bilhões em 2016 --- num alvo permanente de irregularidades e esquemas de corrupção.
A decisão do STF, contudo, faz outra coisa. Quebra um sistema que, bem ou mal, estava de pé e cumpria, na medida de suas forças e possibilidades, além de inúmeros imperfeições e fragilidades, o papel de garantir algum equilíbrio na disputa pela renda numa das sociedades mais desiguais do planeta.
Mesmo quem acredita que, do ponto de vista dos mais pobres e mais fracos, a situação estava longe de aceitável e necessitava passar por um conjunto de mudanças, a decisão deixa a certeza de que agora tudo vai ficar muito pior.
"É uma medida destinada a matar o movimento sindical por inanição," disse, ao 247, o juiz do Trabalho Titular Germano Silveira de Siqueira, de Fortaleza. O caráter irresponsável da decisão revela-se por um aspecto básico. Ao mesmo tempo em que reduz os recursos das entidades em 80%, a decisão do Supremo não elimina nenhuma das obrigações que os sindicatos devem cumprir, de acordo com a Constituição, a começar pela assistência jurídica a todos os trabalhadores de uma categoria, sindicalizados ou não.
Ponto de honra da igreja anti-getulista que alimentou a elite brasileira desde a promulgação da CLT, em 1943, houve uma época na qual a extinção do imposto sindical era defendida com argumentos que, pretensamente nobres, eram apenas ridículos.
O mesmo empresariado habituado a formular listas negras para vetar a contratação de lideranças combativas dizia que, sem recursos garantidos de antemão, os sindicalistas seriam obrigados a arregaçar as mangas e lutar pelo reconhecimento de suas bases -- e isso seria bom para os assalariados, no fim das contas.
A falsidade desse argumento se comprova de forma simples. Enquanto o imposto sindical é eliminado, nada se faz para controlar recursos públicos milionárias que entram nos cofres das entidades patronais pelo Sistema S, num montante é pelo menos duas vezes maior que o imposto sindical.
O 6 a 3 do Supremo não permite fantasias nem elocubrações. É a selvageria contra o trabalhador em estado puro, parte essencial do esforço para fazer o Brasil retornar a condição de fornecedor de mão de obra barata do mercado mundial.
Só pretende enfraquecer suas organizações para permitir aos empresários gastar cada vez menos com seus salários e benefícios.
O resto -- literalmente -- é lucro. Entendeu?
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