quarta-feira, 26 de dezembro de 2018

Lula envia carta para a família e amigos de Sigmaringa Seixas

Lula envia carta para a família e amigos de Sigmaringa Seixas

Texto foi lido pelo deputado distrital eleito pelo PT Chico Vigilante, amigo tanto de Sigmaringa, como do ex-presidente
Sigmaringa Seixas
O ex-presidente Lula, preso político em Curitiba desde o dia 7 de abril deste ano, escreveu uma carta à família e amigos de Sigmaringa Seixas, morto nesta terça-feira (25). Sigmaringa foi advogado de presos políticos durante o regime militar, era advogado de defesa do ex-presidente Lula e foi deputado federal pelo Distrito Federal em 1987-1995 (PMDB-PSDB) e 2003-2007 (PT). Ele foi velado nesta quarta-feira (26) no Cemitério Campo da Esperança da Asa Sul, em Brasília. Na ocasião, o deputado distrital eleito Chico Vigilante (PT-DF) leu uma carta do ex-presidente.
“O que guardo dele é o exemplo singular da decência, ética, dignidade, independência e honestidade intelectual. Prova disso é que o convidei duas vezes para a nossa Suprema Corte e ele recusou, com o argumento de que não se sentia preparado para a função, praticando um desprendimento raro, mas não surpreendente vindo dele”, disse Lula.
A Justiça Federal do Paraná negou o pedido feito pela defesa do ex-presidente para que ele deixasse a prisão e fosse ao funeral. “A amizade entre o requerente e o falecido era notória, sendo que ambos foram deputados na Assembleia Constituinte, mantendo, na sequência, estreito relacionamento pessoal”, argumentou a defesa.
Assista à leitura da carta e, em seguida, o texto na íntegra.
Minha querida Marina,
Foi com profunda tristeza que recebi a notícia da morte de meu grande amigo e seu companheiro de vida Luiz Carlos Sigmaringa Seixas. Nosso Sig teve a delicadeza de nos deixar no dia do Natal, uma data em que a sensibilidade das pessoas está voltada para o amor e para o bem, que foram a marca de sua passagem pela Terra.
É nessas qualidades do Sig que eu e seus incontáveis amigos e amigas estamos pensando neste momento de dor. Quantos defensores da Justiça e da Democracia conhecemos pessoalmente e ao longo da história de nosso país… Mas quantos se dedicaram à causa com abnegação, desprendimento e coragem como ele?
Não consigo me recordar agora de alguém que tenha vivido por estas causas sem perder a ternura, sem abrir mão da alegria de viver, sem faltar com a generosidade e o carinho que o Sig sempre dedicou aos amigos e à humanidade em que sempre acreditou. E foi por este amor à vida e à humanidade que ele lutou até as últimas forças.
Não conheço quem tenha ouvido dele uma palavra de rancor contra os muitos que o atacaram pela coerência que herdou do pai, o Velho Sigmão, e transmitiu aos filhos queridos Guilherme e Luíza. Também desconheço algum momento em que tenha titubeado diante dos riscos e ameaças por advogar em defesa de presos políticos e militantes sindicais durante a ditadura.
Poucos hoje são capazes de avaliar os riscos que ele correu, junto com um punhado de colegas, para levantar os documentos oficiais da Justiça Militar que comprovaram a prática de torturas no Brasil. Foram cinco anos de trabalho quase clandestino que resultaram no livro “Tortura: Nunca Mais”, com provas irrefutáveis contra 444 torturadores. Este livro mudou a historiografia do Brasil.
Eleito deputado constituinte, esteve no PMDB, no PSDB e no PT, sempre coerente com seus compromissos de vida e deixando amigos por onde passou. Como agente político e homem do direito, transitou entre os grandes e foi por eles respeitado e admirado. A cordialidade e o respeito à divergência foram os traços que o marcaram em ambientes onde a vaidade e a arrogância costumam vicejar.
Tive a honra de tê-lo como advogado, mas tive, principalmente, o privilégio de ter o Sig como amigo leal e generoso, convivendo familiarmente com você, Marina, e com nossa querida Marisa. Estes momentos são as melhores lembranças que levarei dele.
O que guardo dele é o exemplo singular da decência, ética, dignidade, independência e honestidade intelectual.
Prova disso é que o convidei duas vezes para a nossa Suprema Corte e ele recusou, com o argumento de que não se sentia preparado para a função, praticando um desprendimento raro, mas não surpreendente vindo dele.
Agora ele entra definitivamente no coração dos que o amavam e o admiravam, onde viverá eternamente.
Receba todo o meu carinho nesse momento de dor e transmita este sentimento, por favor, à família e aos muitos amigos e admiradores do Sig.
A vida segue, companheiro Sigmaringa, com a certeza de que o seu sonho de um Brasil de paz, fraternidade e justiça social ainda se transformará em realidade, por obra do nosso povo maravilhoso e de pessoas especiais como você.
Saudades para sempre e um abraço carinhoso do amigo
Luiz Inácio Lula da Silva”
Curitiba, 26 de dezembro de 2018

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