Buscar justiça social é a maior homenagem que os fãs podem prestar a Marcelo Yuka. Por Sacramento
Marcelo Yuka, falecido nesta sexta-feira, quis mas não teve filhos. Conforme explica no documentário “Marcelo Yuka no Caminho das Setas”, de 2011, o músico e ativista queria ver alguém com os próprios trejeitos, “não ver só trejeitos positivos mas os ruins, meio corcunda, bochechudo”. Temia que a sua passagem pelo planeta não fizesse diferença.
O filho não veio, mas Yuka deixou um legado de obras e mensagens por justiça social, diálogo e perdão. Principal letrista da melhor fase artística e comercial da banda O Rappa, escreveu sobre a violência urbana na época em que a moda era falar de bandido “com uma Uzi na mão”.
Hoje a submetralhadora israelense sumiu dos noticiários e deu lugar a nomes como AR 15, AK 47 e munição ponto 50. Tirando este detalhe, as cenas de desigualdade social e violência urbana retratadas nas letras de Yuka brotam a todo momento no país, do Rio Grande do Sul a Roraima.
Da mesma forma, crimes como o que tirou os movimentos das pernas de Yuka 18 anos atrás se repetem hoje em dia, deixam vítimas anônimas e alimentam as estatísticas criminais.
Para piorar o cenário, as milícias se juntaram às ameaças das gangues de traficantes de drogas, e o pensamento conservador, cimento das desigualdades sociais, se inflamou com o aumento do fundamentalismo cristão e da defesa do Estado mínimo.
Com isso, condutas como a de Yuka são fundamentais para a existência de uma sociedade mais justa e igualitária. Ele precisa ser copiado, ou, usando uma metáfora musical, sampleado.
E não só pela coerência com que se manteve firme aos princípios ideológicos ou pela coragem de lutar por causas que muitos artistas preferem passar longe, a ponto de ostentar uma bandeira do MST na apresentação do Rock in Rio em 2011.
Yuka deve ser lembrado também pela capacidade de perdoar e por não acreditar no ódio como saída para acabar com a violência que o vitimou. Depois do incidente, palestrou em presídios e ficou de frente com homens que poderiam ser os que o atingiram.
“Não guardo em rancor, se eu vivesse em uma sociedade, em uma cidade, em uma cultura que investisse mais em educação, as chances de acontecer o que aconteceu comigo seriam menores”, disse ele no programa Conversa com Bial.
Cada fã ou admirador deveria cultivar essas virtudes praticadas por Yuka ao longo da sua prolífera carreira. Fazer com que as suas mensagens não se percam e caiam no esquecimento. É a homenagem mais digna a quem lutou até os fins dos dias por um mundo mais justo e morreu sem realizar o sonho de ter um herdeiro.
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