Mulheres do Marajó por Andrea DiP
Quando ouvi a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, atribuir a violência sexual contra crianças e adolescentes no Marajó a uma suposta “falta de calcinha” decidi minha próxima pauta. Uma fala dessas, grave em tantos níveis, não poderia ficar impune. Na ocasião, o lançamento do programa “Abrace o Marajó”, a ministra ainda propôs como solução a instalação de uma fábrica de lingerie no arquipélago.
Em poucos dias, eu e a fotógrafa Julia Dolce fizemos as malas e fomos para o Pará encontrar a irmã Henriqueta Cavalcante, referência no enfrentamento à violência sexual na região. Ela nos levaria para São Sebastião da Boa Vista, um dos municípios com menor IDH do Brasil, como são 14 das 16 cidades do arquipélago. A viagem até o Marajó é feita de barco e leva mais ou menos horas, dependendo de onde se quer atracar. Existem lugares nos quais só se chega com mais de dois dias de viagem e é preciso ir mudando para embarcações cada vez menores conforme o rio vai estreitando. Quanto mais remoto, maior é o abandono por parte do Estado.
Eu não sei se você já leu ou não a reportagem, mas queria contar duas coisas que marcaram. A primeira é mais uma sensação do que um fato. A de que aquele lugar, tão lindo, tão quente, tão pobre e tão esquecido, está suspenso no tempo e no espaço. As histórias que ouvimos ali são de dar vertigem na gente. Crianças que a partir dos 5 anos idade já tem o corpo explorado sexualmente em troca de comida. De um pedaço de carne. Um pacote de biscoito. Um galão de óleo diesel. Gerações de meninas que são estupradas por seus pais a partir dos 7 anos de idade até virarem adultas, que parem filhas que também são netas. Netas que estarão predestinadas a, quando alcançarem certa idade, também serem violentadas pelo pai-avô, num ciclo de violência sem fim.
Montanhas de lixo a céu aberto, cobertas por urubus e cachorros a poucos metros do centro da cidade. Escolas que atendem quase 200 crianças mas funcionam só por duas horas ao dia porque falta luz, falta ventilador, falta merenda - que quando chega é saqueada por gente com fome.
A segunda coisa que eu queria contar pra vocês, que me emocionou muito, é que a gente também viu a força das mulheres marajoaras. Meninas que erguem suas vozes e pedem por mudanças, que dizem que querem ser delegadas, juízas, promotoras e lutadoras numa busca por defesa delas mesmas e da comunidade. E mulheres incríveis que lutam por essas outras mulheres e meninas – a reportagem no fim só entrevistou mulheres –, como a promotora Patrícia Medrado, que vimos trabalhar incessantemente e em diversas frentes, ou a conselheira tutelar Paula Rodrigues que, em operação de resgate de uma menina que havia engravidado do pai, sofrido um aborto e tinha muitas dores, se deitou no chão de uma embarcação para que a menina se apoiasse sobre ela.
Não ministra, o problema das meninas do Marajó não é a falta de calcinha. Mas sim, existem muitas coisas que o poder público pode fazer. Meu conselho para a senhora é que deixe as ideias esdrúxulas de lado e procure Henriqueta, Patrícia, Paula, as meninas do interior de São Sebastião da Boa Vista e dos furos de rio do Marajó, ouça o que elas têm a dizer. Menos falação delirante, mais escuta qualificada. Isso sim será um abraço no Marajó.
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Andrea DiP é repórter especial e editora na Agência Pública. |
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Rolou na Pública
Marajó. A reportagem sobre exploração sexual no Marajó mencionada no texto da newsletter de hoje foi republicada por 13 veículos, desde portais de abrangência nacional, como o site da Revista Exame, a blogs regionais, como o Ananindeua Debates.
Na segunda-feira, revelamos quem é Alexandre Giordano, suplente do senador Major Olímpio. A reportagem mostra que Giordano responde a processos judiciais e tem negócios imprecisos como empresário.
Também na segunda-feira publicamos entrevista com a pesquisadora Mônica Lopes Ferreira, do Instituto Butantan, que passou a sofrer perseguições após publicar estudo que comprova que não há dose segura de agrotóxicos. Até agora, a entrevista soma 18 republicações e mais de 18 mil engajamentos nas redes sociais.
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Novas dos Aliados
Alterar cartão. Temos recebido algumas queixas e mensagens com dúvidas sobre como alterar o cartão de crédito cadastrado para fazer contribuições à Agência Pública. Estamos trabalhando para desenvolver uma ferramenta que facilite esse processo, que deve ficar pronta ainda neste mês. Por enquanto, há duas maneiras de trocar o seu cartão: 1) Envie um e-mail para aliados@apublica.org. Vamos lhe mandar um link seguro da Vindi, nossa plataforma de pagamentos, para que você cadastre o novo cartão. 2) Caso o cartão cadastrado esteja vencido ou inválido, você vai receber um e-mail automático da Vindi no dia da sua contribuição. A mensagem dirá que o pagamento da sua contribuição falhou e, ao final do e-mail, haverá um link para que você cadastre um novo cartão.
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