segunda-feira, 7 de outubro de 2019

OPINIÃO Petrobras completa 66 anos sob a mais grave ameaça de sua história

 
Segunda-Feira, 7 de Outubro de 2019
     

Petrobras completa 66 anos sob a mais grave ameaça de sua história

Petrobras completa 66 anos sob a mais grave ameaça de sua história

Um governo que deseja encolher a Petrobras na surdina encontrará nos espaços democráticos a resistência daqueles que rejeitam a submissão

Em 3 de outubro, a Petrobras completou 66 anos seriamente ameaçada por um plano governamental de desmonte e esvaziamento disfarçado de especialização e “eficientização”. Não é novidade que, desde que ocupou a cadeira de presidente reconhecendo “nada entender sobre economia”, Jair Bolsonaro deu plenos poderes ao banqueiro e gestor de fundos financeiros Paulo Guedes. Para além das políticas econômicas em si, o vizir ultraliberal, estreante em assuntos de gestão pública, também se arrogou o papel de definir o destino das estatais brasileiras, seja por meio da indicação de seus dirigentes, da influência nos conselhos, seja pela decisão de extinguir, fracionar ou vender.
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Mais do que o direcionamento ideológico do ministro, o que contesto é sua alarmante estratégia de previamente desmantelar e desvalorizar tais empresas para facilitar sua venda. São manobras que desconsideram tanto os princípios da administração pública como as desvantagens que advirão para a população e para os setores produtivos brasileiros.
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 Um exemplo dessa estratégia é a adoção de medidas gerenciais esdrúxulas, como a imolação voluntária de oito refinarias da Petrobras diante do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, sem que ao menos o respectivo processo investigatório de práticas não competitivas tivesse chegado ao fim. Antes disso, perante a inércia de parte dos líderes políticos, empresariais e militares, foram vendidas algumas das subsidiárias mais importantes da estatal: a BR Distribuidora (líder em postos de combustíveis e dona de um terço da fatia de mercado nacional), a Liquigás (líder do mercado de botijões) e a TAG (operadora única dos gasodutos do Norte e do Nordeste).
O silêncio de um falso consenso, conivente, é ensurdecedor – explicável pelo desinteresse da mídia em esmiuçar e prever os seriíssimos efeitos e a relativa irreversibilidade destas medidas, a maioria delas tomada sem qualquer esclarecimento e discussão pública. Por outro lado, é despropositado apontar os casos recentes de má gestão, turbinando práticas de financiamento eleitoral históricas, como substrato suficiente para vender o controle e os ativos de subsidiárias e holdings estatais. Tais práticas, mesmo com grandes e desnecessárias extrapolações políticas, foram reveladas, investigadas e punidas, e isso deverá ocorrer a qualquer tempo e lugar no Brasil, sem servir de pretexto para se abrir mão do controle estatal e do papel socioeconômico que desempenham as estatais.
A razão para tais vendas é uma pretensa concentração de portfólio na exploração e produção do petróleo em águas profundas, bem como do seu respectivo refino na Região Sudeste. Mas até mesmo os acionistas privados aos quais se tem vendido vantagens nesta alegada racionalização dos investimentos deveriam perceber que este plano tende a reduzir drasticamente o tamanho da empresa, ao mesmo tempo que deverá aumentar o risco de aprisionamento a um único mercado regional a partir de um só ambiente operacional de produção.
Recentemente, os habitantes e lideranças do Norte e Nordeste ficaram apreensivos por conta dos rumores de que a Petrobras decidira liquidar seus ativos e abandonar as operações que tem nessas áreas. É mais um capítulo desse arriscado processo de afunilamento de atividades, abrindo mão de suas atuações em ambientes como a selva amazônica, os campos terrestres não marginais do Nordeste, a margem oceânica equatorial, o xisto paranaense e a margem oceânica atlântica nordestina, além dos mercados de distribuição de combustíveis, biocombustíveis, gás liquefeito e gás natural.
O governo quer descartar a vantagem competitiva da empresa, fruto de uma expertise singular na exploração de petróleo
A Petrobras desenvolveu uma expertise singular, que a situa como referência internacional – numa vantagem competitiva que se deseja, surpreendentemente, descartar. Neste caso, a agravante é o fato de o processo ser conduzido de forma quase sub-reptícia: enquanto seus dirigentes afirmam a governadores e parlamentares dos estados que vão manter ou incrementar investimentos locais, técnicos e gestores são realocados, sedes regionais esvaziadas e terceirizados demitidos.
É grave que o resultado de décadas de construção de um conglomerado estatal destinado a atuar em favor do interesse público brasileiro seja desmontado por esse nebuloso projeto político-ideológico que tem como alicerces a submissão dos ativos estratégicos nacionais ao mercado financeiro e a entrega do controle de recursos naturais estruturantes para o País ao capital internacional. A Frente Parlamentar em Defesa da Petrobras continuará a esgrimir argumentos, a mobilizar forças e a propiciar o debate aberto de modo que finalmente haja espaço para se trazer à luz as objeções concretas, e os consequentes impedimentos judiciais e parlamentares a este grande equívoco que pode resultar em perdas irreparáveis à Petrobras e aos setores produtivos.
Não podemos simplesmente jogar fora a autossuficiência em petróleo que conquistamos ao longo de décadas de trabalho, investimento e ciência. É o que acontecerá ao fazer ontem, celebrar hoje e lamentar amanhã a venda dos ativos estatais, que resultará na submissão integral do Brasil às oscilações do mercado internacional de petróleo contra as quais justamente lutamos tanto para nos proteger. Um governo que deseja encolher a Petrobras na surdina sempre encontrará nos espaços democráticos a resistência daqueles que rejeitam a submissão e aspiram um Brasil mais rico, justo e humano.
Este texto não reflete necessariamente a opinião de CartaCapital.

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É senador pelo PT do Rio Grande do Norte.

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