DEMOCRACIA
Diva e Brisa: mulheres pretas, feministas, progressistas e vereadoras eleitas de Natal
A Câmara Municipal de Natal vai aos poucos mudando de cor. O processo é lento, mas pela primeira vez o legislativo municipal terá três vereadores de cor preta. Duas delas são mulheres, feministas, progressistas e filiadas ao Partido dos Trabalhadores. Divaneide Basílio, primeira mulher a se reconhecer como negra no parlamento de Natal, terá na próxima legislatura a companhia de Brisa Bracchi.
Ao todo, 20 anos separam as duas militantes e colegas de partido. Diva tem 42 anos e vai para o segundo mandato com a pompa de ter saído das urnas como a mulher mais votada em 2020 com quase 6 mil votos. Mas não faltam recordes para Brisa. Aos 22 anos, é a vereadora mais jovem da história de Natal. As duas devem compor a bancada de oposição de esquerda na Casa que conta com mais uma mulher, Júlia Arruda (PCdoB), e dois homens: Daniel Valença (PT) e Robério Paulino (PSOL).
A socióloga petista Divaneide Basílio recebeu 5.966 votos e ficou atrás somente de Herbert Sena (PL), que obteve 6.029 das preferências nas urnas. Diferente de 2019, quando assumiu o cargo como primeira suplente no lugar vereadora Natália Bonavides, eleita deputada federal, Diva renova o mandato com votação expressiva, sendo responsável por 25% dos votos contabilizados por todos os candidatos do PT.
Sobre o aumento da bancada feminina do PT, Diva diz que o partido “fez o dever de casa” ao promover e fortalecer candidaturas femininas por meio do projeto “Elas por Elas”.
“Nós queremos a ampliação nesse lugar de fala que é muito misógino. Nós, mulheres, somos maioria na sociedade mas estamos sub representadas”, avalia.
Ela lembra que, em comparação ao número de homens, ainda há pouca participação feminina na Câmara, tendo em vista que são 29 cadeiras e apenas 7 eleitas. No entanto, afirma que ainda assim é preciso celebrar esse aumento da participação de mulheres. “É uma sementinha que foi plantada”, diz.
Com a pandemia ainda em curso, Divaneide Basílio define como prioridade para o próximo mandato a fiscalização e luta por uma atenção básica à saúde de qualidade, além do fomento a formas de renda para as populações mais vulneráveis.
“Nós aprovamos na Câmara um projeto de agricultura urbana e nosso próximo passo é fazer um levantamento dos quintais produtivos”, projeta a vereadora, que pretende atuar com projetos de incentivo à economia solidária e a comercialização de produtos orgânicos dessas pequenas hortas.
Além disso, Divaneide destaca a votação do Plano Diretor de Natal e afirma que cabe ao legislativo cuidar para que a revisão não descambe para uma cidade que não seja voltada para as pessoas.
Juventude feminina e feminista
O grande número de votos levantados por Divaneide ainda favoreceu outras duas candidaturas petistas a conseguirem vagas na Câmara. Uma delas é nada menos que a vereadora mulher mais jovem já eleita em Natal, a estudante de História Brisa Silva Bracchi, de 22 anos.
“Nós construímos uma candidatura jovem não só na idade, mas com um projeto que representava a juventude e demonstra uma nova forma de construir política”, reflete Brisa em relação ao resultado obtido.
Segundo a vereadora eleita, os 2.901 votos conquistados refletem uma busca das pessoas por novidades na política já que o eleitorado anda também muito insatisfeito com o que vem sendo apresentado.
Os ambientes digitais foram importantes pontos de apoio na campanha de Brisa. Além de movimentação constante no Instagram, também foram organizados espaços de diálogo virtuais para a construção de propostas. Por esses espaços, ela contabiliza terem passado cerca de 300 pessoas considerando diversas reuniões.
“Houve um trabalho de sistematização, mas o conteúdo político veio através desse processo participativo. E isso já é um reflexo da prática política que nós acreditamos, da coletividade, da escuta e do diálogo”, explica.
O suporte financeiro também fez toda a diferença. Juntando valores e aportes recebidos pelos diretórios estadual e municipal do partido, Brisa contou com R$ 66.967,65 em recursos do Fundo Especial. Além disso, fez uma vaquinha virtual onde conseguiu levantar R$ 9.647 para a campanha. Adiciona-se a isso, algumas doações e a vereadora eleita pode contar com um total de R$ 78.904,85 para trabalhos de campanha.
A vereadora eleita lembra que os valores fazem parte das regras implantadas para financiamento de candidaturas femininas e negras. Além disso, por representar a juventude na legenda, também tem acesso a recursos destinados exclusivamente a candidaturas com essa característica. “Esses financiamentos são um processo de reparação histórica”, afirma.
A estudante conta que também teve forte apoio da militância que a acompanhou nos atos de rua para exibição de bandeiras e distribuição de panfletos. “Ninguém era contratado. Você podia passar por qualquer pessoa que estava segurando a bandeira que ela ia te explicar todo o projeto”, lembra.
Enquanto isso, Divaneide dispôs de R$191.087,85 em recursos para campanha, incluindo valores disponibilizados pelo partido em âmbito nacional, estadual e local, financiamento coletivo e algumas doações. As duas tiveram as maiores receitas de campanha dentre as candidaturas femininas petistas apresentadas em Natal.
Trajetória
A trajetória política de Brisa começa no movimento secundarista. Foi gremista no Instituto Federal do Rio Grande do Norte e participou ativamente das ocupações escolares de 2016. Conta ter se filiado ao PT durante a movimentação que culminou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff em agosto do mesmo ano. Além disso, atuou pela causa da juventude negra no Kizomba e no Enegrecê, ambos movimentos políticos ligados a questões da negritude. Foi a partir deles também que se reconheceu e a passou a construir a identidade de mulher negra, conta.
Sobre prioridades para o mandato, fala destaca o acompanhamento da revisão do Plano Diretor de Natal, função que já exercia pelo movimento estudantil universitária e agora poderá atuar mais de perto, no legislativo. Também foca promete a luta por creches de tempo integral e políticas de construção de uma cidade mais acolhedora para mulheres.
Brisa comemora compartilhar bancada com Divaneide e outras cinco mulheres de diferentes partidos, mas lembra que ainda é preciso mais participação feminina na Câmara, mesmo que de linhas ideológicas divergentes.
“O ideal para nós seria que tivesse mais mulheres e que elas fossem feministas. Não temos o mundo ideal, mas mesmo as que não se reconhecem como feministas nem são de esquerda, já são mais sensíveis às pautas para as mulheres na cidade”, finaliza.
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