Presidente da Funai é expulso aos gritos de ‘miliciano’ de cúpula iberoamericana na Espanha
Ex-funcionário da Funai criticou presença de Marcelo Xavier na 15ª Assembleia Geral do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caribe e o acusou de ser responsável pelas mortes de Bruno e Dom Phillips
Publicado 21/07/2022 - 13h41
São Paulo – O presidente da Funai, Marcelo Xavier, foi expulso a gritos de um evento em Madri, na Espanha, que debatia a situação dos povos indígenas, nesta quinta-feira (21). Xavier estava sentado no auditório, acompanhando a fala de um palestrante quando, o indigenista Ricardo Henrique Rao, ex-funcionário da Funai, foi até a frente do palco para denunciar a presença do delegado da Polícia Federal, conduzido ao comando da Fundação Nacional do Índio pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
“Esse homem não pertence aqui”, gritou Rao, apontando o dedo a Xavier. “Ele não é digno de estar entre vocês (indígenas). E o Itamaraty é uma vergonha, está sendo babá de miliciano”, disparou o ex-funcionário, enquanto o presidente da entidade começava a se levantar. “Esse homem é um assassino, esse homem é um miliciano. Ele é responsável pela morte de Bruno (Pereira) e Dom Phillips. Você é um miliciano, bandido”, completou Rao.
Xavier deixou a sala constrangido (vídeo). O caso ocorreu na 15ª Assembleia Geral do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas da América Latina e Caribe (Filac). A cúpula iberoamericana não é órgão da ONU, mas se reúne nesta semana, em que completa 30 anos, no Ministério das Relações Exteriores da Espanha. O Brasil faz parte do mecanismo desde os anos 90, por adesão do então presidente Fernando Collor de Mello.
Quem é Rao
Rao, responsável pelo protesto, havia sido colega do indigenista Bruno Araújo de Pereira, desaparecido em 5 de junho ao lado do jornalista britânico Dom Phillips – ambos só encontrados mortos 10 dias depois. Bruno também era funcionário da Funai, mas foi exonerado em 2019, pela gestão de Xavier, 15 dias depois de atuar numa grande operação de fiscalização que resultou em perdas consideráveis ao garimpo ilegal. A região onde atuava, no Vale do Javari, está marcada por forte presença do garimpo e da pesca ilegal, além do narcotráfico, que ameaçam a segunda maior Terra Indígena do país.
O próprio Rao vive exilado na Europa desde 2019 também. Em uma entrevista ao portal Amazônia Real, ele contou ser um dos servidores da Funai que se sentia perseguido por fazer seu trabalho de fiscalização e proteção das TIs. Rao era alvo de diversas ameaças de morte e chegou a ter uma arma apontada para sua cabeça. Mas denunciou que, além dos criminosos ambientais, ele também enfrentava processos administrativos. O que, segundo ele, passaram a ser usados para constranger servidores considerados indesejados.
Atualmente, ele vive em no centro de Roma, na Itália, em um prédio ocupado e sobrevive com 150 euros enviados mensalmente por sua mãe.
Novo protesto
Até o fechamento desta nota, a Funai não havia se pronunciado sobre o protesto. A entidade Survival Internacional confirmou que planeja para esta quinta um protesto formal na chancelaria espanhola contra a presença do presidente da Funai. Ele é acusado de ser conivente com o genocídio indígena no Brasil.
Em junho deste ano, um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) e da associação Indigenistas Associados (INA) mostrou que, sob o governo Bolsonaro e a gestão de Xavier, a “Funai se transformou em um órgão anti-indígena”. O presidente da Funai é também aliado de Nabhan Garcia, atual Secretário Especial de Assuntos Fundiários do governo federal. O ruralista é um notório antagonista dos direitos indígenas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário