Outubro colocará à prova a resistência das instituições, do país supostamente civilizado, contra a barbárie
Peça 1 – o que muda nas eleições
Lula continua favorito nas eleições presidenciais. Segundo analistas meticulosos, a melhoria de Jair Bolsonaro se deveu ao voto útil de eleitores que estavam com Ciro Gomes e Simone Tebet,
Segundo o argumento das empresas de pesquisa, os dados mostrando a possibilidade das eleições terminarem no primeiro turno despertou uma onda de votos úteis em direção a Bolsonaro. Por outro lado, a estratégia do partido, em São Paulo, teria sido errada. Imaginava-se que enfrentar Tarcisio de Freitas seria mais fácil, devido à resistência contra Bolsonaro.
A estratégia de centralizar as críticas no governo Rodrigo Garcia tinha sua lógica, mas teria despertado o antipetismo latente da sociedade paulista.
De qualquer modo, a avaliação é que os eleitores que restaram a Ciro e Tebet são simpáticos a Lula, e seriam suficientes para levá-lo à vitória.
Por outro lado, a vitória a governos de estados importantes, de candidatos simpáticos a Bolsonaro, traz uma vantagem ao candidato. Fica a constatação de que o bolsonarismo chegou para ficar.
Mas o favoritismo continua sendo de Lula.
Peça 2 – as ameaças da continuidade
Nas últimas semanas, personagens centrais das instituições brasileiras, como ex-Ministros do Supremo Tribunal Federal, ex-Ministros de Fernando Henrique Cardoso, lideranças políticas historicamente anti-petistas, manifestam apoio a Lula. E a razão é simples: a eventualidade de uma vitória de Bolsonaro, com a formação de uma bancada de ultra-direita, é uma ameaça direta à democracia.
O país não sobreviveria a um segundo governo Bolsonaro. Significaria a destruição final do sistema educacional, de ciência e tecnologia, das políticas sociais, seria uma ameaça permanente ao Supremo Tribunal Federal, uma carta em branco para milícias e clubes de caça e tiro.
O que seria um país com governadores bolsonaristas controlando as Polícias Militares em grandes estados, uma bancada de direita apta a modificar a constituição e a impichar Ministros do STF?
Por tudo isso, haverá um fortalecimento da frente democrática em torno de Lula.
Peça 3 – as concessões
A grande questão, da ida para o segundo turno, é expor Lula a um conjunto de pressões de candidatos a aliados, que seriam enfrentadas como mais facilidade se as eleições terminassem no primeiro turno.
Do lado do PDT-Ciro Gomes e MDB-Simone Tebet, as exigências são legítimas. Defendem uma ação para resolver a questão do endividamento das famílias, ampliação do ensino integral e melhoria da renda básica.
Os problemas surgem nas tentativas de ceder em dois pontos centrais: concessões na área econômica – para conquistar mercado – e na pauta moral – para atrair evangélicos.
As pressões do mercado se manifestam especialmente através da mídia. Embora Lula já tenha se manifestado contra o teto de gastos, em favor dos gastos sociais, a favor dos investimentos públicos para reativar a economia e gerar emprego, a favor de uma reforma tributária que tribute especialmente ganhos de capital, há uma pressão midiática para que mantenha a preponderância dos interesses do mercado.
Em uma segunda frente, há setores internos do PT defendendo sinalizações para os evangélicos, com recuo nas pautas morais. Nos últimos dias, não apenas evangélicos, mas católicos conservadores aderiram à campanha anti-PT.
Ceder na pauta econômica e na moral é um jogo arriscado. Poderá facilitar a eleição de Lula, mas será uma quebra de valores que poderá comprometer fundamentalmente a legitimidade do futuro governo Lula, como representante do país civilizado contra a selvageria explicitada pelo bolsonarismo.
Peça 4 – o país olhando a própria cara
Os abusos do governo Bolsonaro promoveram uma catarse psicanalítica no país. Percebeu-se que o país acolhedor, cantado pelos líricos, era uma ficção. Por baixo de algumas regras sociais, há uma nação selvagem, sem regras, uma herança escravagista pesada, um dos maiores índices de mortes violentas do mundo.
Ao mesmo tempo, a estrutura do Estado foi tomada por interesses corporativistas, os serviços públicos essenciais foram privatizados, a política econômica passou a atender exclusivamente os interesses do mercado.
Este mês colocará à prova não apenas a resistência das instituições, do país supostamente civilizado, contra a barbárie. Mas, no final do trajeto, com Lula vitorioso, se saberá se o Brasil moderno conseguirá sobreviver ao país do conchavo, que já sufocou governos bem intencionados.
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