quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Concentração de renda no Brasil

Interessante e pertinente em relação à atual conjuntura política brasileira a entrevista efetuada por Luiz Carlos Azenha ao Márcio Pochmann (transcrita logo abaixo). Fica evidente que continua ocorrendo no Brasil uma violenta e desumana concentração de renda para o lado dos ricos e que piorou durante os últimos governos estabelecidos ao nível federal e quem está pagando a conta são os pobres e os trabalhadores assalariados. Mas não acredito que tais distorções possam ser resolvidas apenas com medidas fiscais (arrecadação de receitas, realização de despesas para o cumprimento da estabilização macroeconômica) ou monetaristas (quantidade de moeda em circulação, de crédito e das taxas de juros controlando a liquidez global do sistema econômico). Essas medidas foram realizadas competentemente por todas as autoridades financeiras nos ultimos vinte anos e que redundaram na citada concentração de renda. Está na hora do Brasil se ajustar aos movimentos mudancistas que acontecem em muitos paises da América Latina e enfocar para seu bem a realização de mudanças estruturais , mudanças de fundoque se relacionam com o aparato produtivo e a distribuição de renda. Entre essas se destacam a reforma agrária, a reforma urbana, a reforma politica, a reforma bancária, a reforma fiscal e principalmente estabelecero conceitode que alguns setores da economia são estratégicos e por isso não devem ficar em mãos privadas e muito menos estrangeiras, ou seja nacionalizar ou até mesmo em alguns casos estatizar bens e serviços que anteriormente estavam globalizados e servindo apenas ao grande capital. Somente assim poder-se-á corrigir a terrível injustiça que se faz contra a população trabalhadora brasileira - essa que constroi todas as riquezas e em troca recebe migalhas. Mas essas mudanças não virão por dádiva das elites e sim com o povo nas ruas reivindicando seus direitos, tal com aconteceu nos meses junho e julho passado nas ruas e praças das grandes cidades brasileiras. Recomendo também assistir ao vídeoe ouvir a entrevista feita com Márcio Pochmann (endereços transcritos logo abaixo) que são elucidativas. Abs. Jacob David Blinder
Marcio Pochmann e a concentração de renda no Brasil: imposto cobrado dos pobres paga juros para os mais ricos
Publicado em 13 de agosto de 2013 às 20:02 - Viomundo
por Luiz Carlos Azenha
As cenas acima são um registro do cotidiano numa ocupação do Jardim Wilma Flor, em Cidade Tiradentes, extremo da Zona Leste de São Paulo.
Um lembrete de uma realidade registrada assim no livro Qual desenvolvimento?, do economista Marcio Pochmann:
A concentração da renda e da riqueza é uma marca inalienável do Brasil. De acordo com o Atlas de exclusão social — Os ricos no Brasil (Campos, 2004), somente 5 mil clãs apropriam-se de 45% de toda a riqueza e renda nacional, embora o país tenha mais de 51 milhões de famílias.
Quando o autoritarismo predominou, os ricos foram os mais beneficiados, mantendo inalterado o padrão distributivo excludente no país.
… a composição fundiária segue muito concentrada. A estrutura tributária permanece regressiva, com a população pobre pagando mais impostos e os ricos quase que incólumes, enquanto a estrutura social permanece distante das possibilidades governamentais de garantia da universalidade e qualidade necessária dos bens, serviços e equipamentos sociais básicos para toda a população.
… perceber que a distância da separação entre o menor e o maior salário no país chega a atingir quase 2 mil vezes parece inacreditável nesse início de terceiro milênio.
Os avanços registrados ao longo dos mandatos do ex-presidente Lula e de Dilma Rousseff tangenciaram o problema. A insatisfação popular não deveria surpreender ninguém.
As manifestações de junho e julho, que levaram às ruas uma ampla pauta de reivindicações, foram em certa medida uma expressão disso. Nos protestos verificados no entorno de estádios de que sediaram jogos da Copa das Confederações — Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Recife, Fortaleza e Brasília — falou-se muito em hospitais, creches e escolas padrão FIFA.
De onde virá o dinheiro?
A resposta surpreendente de Marcio Pochmann* é que o Estado brasileiro já dispõe de uma carga tributária adequada para oferecer ao País serviços como aqueles que marcaram o padrão de civilização europeu e que, lá, diante da crise financeira, tem sido dilapidados.
A carga tributária brasileira saltou de 22 a 23% do Produto Interno Bruto (PIB), nos anos 80, para cerca de 35% agora.
O problema é que ela foi colocada nas costas dos pobres e da classe média, que proporcionalmente pagam mais impostos que os ricos.
De um lado o ex-presidente do IPEA, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, defende rever isenções e desonerações.
Por exemplo, os descontos dados no Imposto Renda para gastos com saúde, educação e assistência social privada. Na opinião de Pochmann, os incentivos do Estado deveriam ser no sentido de incentivar a saúde, a educação e a assistência social públicas.
Outras características injustas do sistema tributário brasileiro são amplamente conhecidas. Faz tempo. Tem sido denunciadas, por exemplo, por Pedro Delarue, do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, o Sindifisco. Ao Viomundo, ele lembrou que os ricos não pagam imposto sobre a propriedade de veículos automotores (IPVA) para lanchas, jatinhos e helicópteros particulares. O Supremo Tribunal Federal considerou que o IPVA sucedeu o imposto rodoviário e, portanto, só autorizou o imposto para veículos terrestres.
Delarue lembrou, também, que desde 1995, por decreto do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, empresários não pagam imposto sobre distribuição de lucros e dividendos.
Como o emblemático episódio de sonegação da Globo deixou claro — perdão, foi “planejamento tributário” –, o Estado fala grosso com a Bolívia e fala fino com os Estados Unidos.
Voltamos ao livro de Marcio Pochmann:
De acordo com a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) do IBGE, o trabalhador que recebe mensalmente até dois salários mínimos mensais tem uma carga tributária de até 48% do seu rendimento. [...] Já o trabalhador com remuneração superior a 30 salários mínimos mensais, deixa para os impostos somente 26% de sua renda.
Hoje presidente da Fundação Perseu Abramo, Pochmann nos disse em entrevista que outra mudança absolutamente necessária é a redução do pagamento de juros da dívida interna, que saltaram de 1,8% do PIB em 1980 para 5 a 6% atualmente.
O sifão por onde escoam os juros é estrutural à economia brasileira, sustenta Pochmann. Foi instalado no Tesouro para servir à elite.
…constata-se a existência de um elemento de ordem estrutural na dinâmica capitalista atual que transforma o setor público no comandante da produção de uma nova riqueza financeirizada, apropriada privadamente na forma de direitos de propriedade dos títulos que carregam o endividamento público.
… parte dos ricos abandonou o compromisso com a expansão produtiva, o que levou ao parasitismo e às ações anti-republicanas contaminadas pela improdutiva rentabilidade financeira.
Atualmente o peso da dívida líquida do setor público corresponde a cerca de 50% do PIB, praticamente mesma situação verificada na segunda metade da década de 1980.
As exigências das famílias ricas, ao disponibilizarem seus patrimônios na compra dos títulos públicos que lastreiam o endividamento financeiro do Estado são cada vez maiores, fazendo com que o objetivo perseguido pela política econômica seja, muitas vezes, atendê-las, tão-somente. Não sem motivo, o Ministério da Fazenda transformou-se no ministério dos juros.
É uma forma mais diplomática de dizer o mesmo que a ex-auditora Maria Lucia Fatorelli disse, em entrevista ao Viomundo: os banqueiros sequestraram o Estado brasileiro.
Desfazer este nó é absolutamente essencial para que o pessoal do Jardim Wilma Flor ganhe, afinal, uma ponte de acesso ao bairro, que depende de investimento público:
 
Na entrevista abaixo, Marcio Pochmann fala sobre alguns dos desafios diante do Brasil, dentre os quais os serviços ruins, caros e concentrados nas metrópoles, a educação inadequada e o surgimento de um novo segmento social, os agregados modernos, que representam 35% das famílias brasileiras e, apesar de pobres, desenvolvem identidade ideológica com os mais ricos por prestar serviços gerais a eles.
 
Vale a pena assitir e ouvir:
Entrevista com morador de bairro pobre em região da periferia de São Paulo (vídeo)

Entrevista com Márcio Pochmann (áudio)


*Marcio Pochmann (Venâncio Aires, 19 de abril de 1962) é um economista e político brasileiro.Filho de Clyde Pochmann e de Lilian Pochmann, formou-se em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul(UFRGS), em 1984. Entre 1985 e 1988 concluiu sua pós-graduação em Ciências Políticase foi supervisor do Escritório Regional do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Distrito Federal, além de docente na Universidade Católica de Brasília.Em 1989, mudou-se para o Estado de São Paulo, onde iniciou seu doutorado – concluído em 1993 – em Ciência Econômicana Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), tornando-se pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), do qual seria diretor-executivo anos mais tarde, assim como membro do corpo docente da Unicamp.Foi ainda pesquisador visitante em universidades da França, Itália e Inglaterra, com pós-doutorado nos temas de relações de trabalho e políticas para juventude. Também atuou como consultor noServiço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas(Sebrae), na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo(Fiesp) e no Dieese, entre outras instituições nacionais. No plano internacional, foi consultor em diferentes organismos multilaterais das Nações Unidas, como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Fundo das Nações Unidas para a Infância(Unicef) e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe(Cepal), entre outras.No período de 2001 a 2004, em São Paulo, Pochmann dirigiu a Secretaria Municipal do Desenvolvimento, Trabalho e Solidariedade durante o governo da prefeita Marta Suplicy. A partir de 2007, passou a exercer a presidência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea), em Brasília, cujo comando deixou este ano para retornar a Campinas.Nas eleições 2012, Marcio Pochmann foi o candidato do PT à Prefeitura de Campinas.1 .

 
 


 

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