segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Ayotzinapa: suposto autor do massacre é detido

20/09/2015 - Copyleft

Ayotzinapa:

suposto autor do massacre é detido

O chefe da Comissão Nacional de Segurança confirmou a prisão de um dos líderes do grupo supostamente relacionado com a desaparição de 43 estudantes


Diário La Jornada, do México

reprodução
O chefe da Comissão Nacional de Segurança, Renato Sales, confirmou a prisão de Gildardo López Astudillo, um dos líderes do grupo criminoso Guerreros Unidos, supostamente relacionado com a desaparição dos 43 estudantes de Ayotzinapa, em setembro de 2014.

“Diversos acusados apontaram López como o principal executor da operação que levou à desaparição dos estudantes. As declarações se referem a ele como alguém de participação preponderante nos acontecimentos”, explicou Sales, em coletiva para a imprensa.

Segundo o funcionário federal, o trabalho de investigação até a captura de López durou 11 meses, tempo em que se mudou três vezes de residência – finalmente, tentou se ocultar em um apartamento na cidade de Taxco de Alarcón, no Estado de Guerrero.

Sales contou que López atuava como suposto chefe de uma quadrilha dedicada à extorsão e distribuição de droga em Iguala e Cocula, municípios do Estado de Guerrero. Além disso, o acusado já possuía uma sentença por sequestro qualificado. Gildardo López foi levado ao Distrito Federal do México, e colocado à disposição da SEIDO (sigla em espanhol da Secretaria Especializada na Investigação da Delinquência Organizada).

Renato Sales disse também que, até o momento, já foram presos 111 suspeitos de estarem vinculados ao crime contra os estudantes de Ayotzinapa.

De acordo com a declaração de outro dos suspeitos do caso, identificado como Felipe Rodríguez Salgado, López falou com ele por telefone na noite de 26 de setembro de 2014, e pediu para que ele “acionasse o seu pessoal” e os colocasse na entrada da cidade de Iguala, junto com os comandos das polícias municipais de Iguala e de Cocula, que levava cinco patrulhas e uma caminhonete branca para deter um grupo de jovens.

Rodríguez contou que ao chegar ao local, colocaram os estudantes na caminhonete e os levaram ao depósito de lixo de Cocula, mas que, “mais ou menos uns 25 morreram no caminho, por asfixia, e ficaram uns 15 vivos”, e que, então, “López e seu pessoal terminaram de executar o serviço”, primeiro com tiros, depois queimando os jovens, para depois regressar a Iguala, apesar de que ele sabia que todos eram estudantes.

Sidronio Casarrubias Salgado, líder principal do grupo Guerreros Unidos, que também já foi preso, declarou que Gildardo López Astudillo contou a ele sobre os estudantes, mas assegurou que eles pertenciam ao cartel rival, afirmando que “as ações foram para defender o território”.

A detenção de Gildardo López Astudillo foi confirmada um dia depois de que a Procuradora Geral da República, Arely Gómez González, informou sobre a identificação dos restos de outro dos estudantes de Ayotzinapa.

Embora se trate da identificação de um fragmento do osso, e que se baseia em resultados que não são 100% conclusivos, a Universidade de Innsbruck determinou que o resultado é positivo, devido a que existem 72 possibilidades de que esse fragmento analisado realmente pertença ao estudante Jhosivani Guerrero, e apenas uma possibilidade de que não seja.

Em novembro do ano passado, o então procurador Jesús Murillo Karam divulgou pela primeira vez a foto de Gildardo López Astudillo.

Animal Político

Por sua parte, a Equipe Argentina de Antropologia Forense (EAAF), que atua como coadjuvante da defesa dos pais dos estudantes de Ayotzinapa, assegurou que o resultado obtido pelo Instituto de Medicina Legal de Innsbruck, que identificou o ADN mitocondrial de um fragmento ósseo encontrado no rio San Juan, como pertencente a Jhosivani Guerrero de la Cruz, “só pode ser considerada uma possibilidade”. Os profissionais argentinos defendem – como já haviam feito no dia 7 de fevereiro – que existem “muitas dúvidas a respeito da origem das mostras analisadas”.

O comunicado da EAAF, em resposta ao que foi divulgado durante a noite pela titular da Procuradoria Geral da República (PGR), Arely Gómez, só começou a circular depois que os peritos se reuniram com Martina de la Cruz e Margarito Guerrero Tecoapa, pais do desaparecido Jhosivani Guerrero, ambos camponeses da cidade de Omeapa, na região de Tixtla.

O indício genético, segundo a EAAF, é “questionável e não definitivo”. Além disso, disseram que faltam evidências seguras de que os resíduos encontrados pelos mergulhadores da Marinha, e entregues aos agentes da PGR, são efetivamente procedentes do depósito de lixo de Cocula.

“Os dois lugares onde se encontraram os restos (o rio San Juan e o depósito de lixo de Cocula) são incertos e problemáticos’’, afirmaram os legistas.

O comunicado também comenta que a diligência de “recuperação dos restos”, realizada no dia 28 de outubro do ano passado, foi feita sem a participação dos peritos coadjuvantes, apesar de que havia um acordo de trabalhar em todos os passos da investigação de maneira conjunta.

Até o momento, a PGR tampouco lhes entregou os históricos que certificam cada passo na custódia de cada uma das evidências recolhidas pela investigação até o momento, com as devidas assinaturas que confirmem essas informações.

A equipe argentina reiterou aquilo que sustenta desde o dia 7 de fevereiro, uma semana depois de que o procurador Jesús Murillo Karam anunciou suas conclusões sobre o caso Iguala. Nessa ocasião, os peritos independentes puseram em dúvida que o fragmento ósseo que foi identificado como pertencente ao estudante Alexander Mora Venancio tivesse sido efetivamente incinerado em Cocula e jogado ao rio. Hoje, levantam a mesma dúvida a respeito da segunda identificação.

Afirmam eles: “o EAAF não esteve presente no momento em que os mergulhadores e os peritos da PGR mencionam ter recuperado os restos, no dia 29 de outubro de 2014, numa das bolsas encontradas no rio San Juan. Tampouco participou na descoberta do fragmento de osso que a Procuradoria indicou ter recolhido da mesma bolsa”. As mesmas dúvidas prevalecem no caso de Jhosivani. Por tudo isso, concluem que o caso de Iguala “é um caso aberto, não um caso encerrado”.

O tratamento às famílias

Os especialistas do grupo forense, um dos mais reconhecidos do mundo em sua especialidade, questionou, novamente, o tratamento que a PGR deu aos familiares dos estudantes desaparecidos, sobretudo quando a procuradora Arely Gómez anunciou publicamente a possível identificação de um dos jovens sem ter falado antes com os seus pais.

Um grupo de pais das famílias de Ayotzinapa, entre os quais se encontrava Margarito Guerrero, foram notificados ao meio-dia que deveriam viajar ao Distrito Federal porque receberiam informações da Procuradoria. O Centro de Direitos Humanos Miguel Agustín Pro pediu à procuradora que esperasse os progenitores dos garotos desaparecidos, mas ela não atendeu o apelo da entidade, e se apresentou aos meios de comunicação sem informar anteriormente as famílias.

A equipe de legistas argentinos advertiu que “a urgência na comunicação pública” de resultados delicados, como o desta quarta-feira (16/9), “leva ao risco de acabar com o direito das famílias das vítimas, de conhecer os resultados relativos a seus entes queridos com o devido tiempo e a assistência necessária. Em se tratando de notícias tão delicadas, nenhuma família deveria ser informada dessa forma, através da imprensa”.

Esta semana, um grupo da equipe argentina viajou a Tixtla, no Estado de Guerrero, acompanhado pelo diretor do Centro Pro, Mario Patrón, e por Ximena Antillón, psicóloga que trabalha no acompanhamento psicossocial dos familiares dos 43. Juntos, tiveram uma longa conversa com os pais e com os irmãos de Jhosivani, na Escola Normal Raúl Isidro Burgos, de Ayotzinapa. Lá, eles explicaram os detalhes das implicações técnicas e legais da informação divulgada pela PGR. O estudante era o caçula de uma numerosa família de camponeses. Também é um dos mais jovens do grupo de desaparecidos, com 20 anos. Em seu povoado, que tem menos de 500 habitantes, a metade da população é analfabeta.

Os resultados

A equipe recordou que, em novembro de 2014, eles e a Procuradoria Geral da República enviaram ao laboratório austríaco – por recomendação do próprio EAAF – 17 fragmentos ósseos. O Centro de Innsbruck é considerado um dos melhores do mundo em identificação genética de restos, e capazes de resolver casos particularmente difíceis. Inicialmente, os forenses austríacos tentaram obter o DNA nuclear (do pai, da mãe ou dos irmãos de sangue) das amostras. Não tiveram sucesso nos primeiros 16 fragmentos analisados. Na 17ª amostra, obtiveram um perfil completo, que coincidiu com o DNA da família de Alexander Mora.

Posteriormente, tentaram realizar uma análise ainda mais específica, conhecida como “sequenciamento massivo paralelo”. Em sete das amostras, a conclusão foi que os restos supostamente recolhidos no el rio San Juan e procedentes da hipotética fogueira de Cocula, não são ‘‘de origem especificamente humano’’. Finalmente, tentaram a via da análise mitocondrial (procedente da mãe). Fortaleceram, assim, a demostração obtida nos restos de Alexander Mora – com um osso da base do crânio – e logo obtiveram indícios parecidos nas análises sobre as amostras que seriam pertencentes a Jhosivani.

Porém, a EAAF adverte que “as duas amostras provêm da bolsa que, segundo a PGR, foi recuperada no rio San Juan, nos arredores de Cocula” e não diretamente do depósito de lixo.

A possibilidade de haver coincidência entre o DNA de Martina de la Cruz e os restos ósseos analisados é “baixa, em termos estatísticos”, dizem os especialistas austríacos.

Ainda assim, a equipe de legistas argentinos insiste em questionar o problema do local de procedência dos restos, que impediria, segundo eles, uma conclusão a respeito da descoberta. “O valor do resultado, sobre a amostra que poderia pertencer ao jovem Jhosivani, perde muito em consistência, e impede que se defina o que realmente aconteceu naquele dia”, afirma o comunicado da equipe forense.

Inconsistências

O novo texto da EAAF, referente ao seu trabalho no caso de Iguala, recorda as inconsistências e irregularidades apresentadas no recolhimento das evidências desde o começo das investigações. Sobre os restos coletados pelos peritos das duas entidades – a equipe argentina e a PGR –, se encontraram fragmentos que não pertenciam aos estudantes. Por exemplo, um dos fragmentos de mandíbula humana possuía dentes e prótese dental. Nenhum dos jovens desaparecidos usava prótese.

A EAAF concorda com uma das teses que o Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes da CIDH divulgou recentemente, no dia 6 de setembro, ‘‘através de uma perícia sobre os incêndios e a dinâmica do fogo, com a que se descarta a versão apresentada pela Procuradoria Geral da República, que teria somente editado as declarações dos suspeitos detidos até o momento, e levou à hipótese de que os 43 cadáveres foram incinerados no depósito de lixo de Cocula”.

Tradução: Victor Farinelli



Créditos da foto: reprodução

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