Vazamento de informações pelo Wikileaks,
financiamento de movimentos golpistas por entidades americanas e outros
indícios mostram que país de Barack Obama trabalha para derrubar Dilma.
Eduardo Maretti
O golpe em marcha contra o governo Dilma
Rousseff tem por trás de si a mão do imperialismo? Os Estados Unidos estão por
trás das táticas e estratégias que, principalmente no segundo mandato da atual
chefe de Estado brasileiro, vêm cercando e minando todas as possibilidades
políticas, jurídicas e econômicas de a gestão petista se tornar viável? Segundo
analistas ouvidos pela RBA, embora não haja como "provar" que sim, os
dados e as relações políticas e históricas evidenciam que, nesse campo, nada
acontece por acaso.
"Evidências realmente concretas nós
não temos. Mas temos ações que indicam o interesse muito claro em uma mudança
de poder no Brasil. Já um tempo atrás, as pessoas acabam esquecendo, houve
denúncias que vazaram pelo Wikileaks sobre espionagem em uma das principais
empresas brasileiras, que é a Petrobras. Logo em seguida, inicia-se um processo
de denúncias em torno das atividades dentro da empresa e o próprio
monitoramento da presidente da República", lembra Analúcia Danilevicz
Pereira, professora de Relações Internacionais da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS).
"Ou seja, os Estados Unidos têm o
que a gente pode entender como uma espécie de governo invisível. Estão
presentes em diferentes países das mais diferentes formas. Seja através da
utilização de alta tecnologia, que permite espionagem, seja através de figuras
que de fato atuam dentro do Brasil e tentam se aproximar do governo. Isso pode
acontecer por meio de organizações não governamentais, por exemplo",
analisa a professora da UFRGS. "A igreja evangélica norte-americana tem um
poder financeiro e de atuação internacional muito grande. Não é à toa que a
igreja evangélica no Brasil foi ganhando terreno político. São ações que não
são facilmente confirmadas, concretamente, mas sabemos que existem."
Armando Boito, professor de Ciência
Política da Universidade de Campinas (Unicamp), cita a participação clara de
entidades norte-americanas no atual processo brasileiro. "Por exemplo, os
irmãos Koch, com suas diferentes fundações, que formam lideranças, financiam o
movimento Estudantes pela Liberdade e
o Movimento Brasil Livre (MBL). Isso
já está provado, é um fato notório." Ele se refere aos irmãos Charles e
David Koch, do Charles Koch Institute, que possuem uma fortuna de U$ 43
bilhões, segundo a Forbes. "Já o quanto as instituições do Estado
norte-americano, propriamente dito, estão envolvidas nisso a gente ainda não
sabe, mas que tem a mão do capital imperialista na mobilização contra Dilma,
tem. E os Estados Unidos teriam muitos motivos para preferir o fim dos mandatos
dos governos do PT", diz Boito.
Analúcia cita políticas desenvolvidas
pelos governos do PT nos últimos anos claramente incômodas aos Estados Unidos.
Como a autonomia em relação à produção de petróleo ou a questão relacionada ao
pagamento da dívida externa.
Para Boito, é possível enumerar uma
série de iniciativas e políticas desenvolvidas pelos últimos governos
brasileiros, nos planos econômico, político e militar, que, por si só, atingem
frontalmente os interesses do país mais poderoso da Terra em seu próprio
continente e são motivos mais do que suficientes para se desconfiar de que não
é o acaso que está por trás da poderosa conjunção de forças aliadas contra
Dilma.
No plano econômico, Boito lembra que os
EUA deixaram de ser o principal parceiro econômico do Brasil, "posto que
ocuparam por 80 anos", e hoje é ocupado pela China. No plano
econômico-diplomático, o Brasil foi um dos principais responsáveis pela criação
do G-20. E foi peça importantíssima nos BRICS e na criação do Banco dos BRICS.
"São iniciativas que retiram dos Estados Unidos a hegemonia absoluta em
escala internacional. Eu considero a iniciativa do Banco dos BRICS uma das mais
importantes dos últimos anos", diz.
E não é só. O Brasil fez representação
na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra a produção de algodão dos
Estados Unidos, por exemplo, além de etanol. "Atritos de natureza
econômica não faltaram", afirma o professor da Unicamp.
No plano político, o Estado brasileiro
se aliou aos governos de Hugo Chávez na Venezuela, de Raul e Fidel Castro em
Cuba, de Evo Morales na Bolívia, "o que destoava da política estadunidense
para a América Latina". "O Marcelo Odebrecht (hoje preso pela
Operação Lava Jato) deu entrevistas seguidas à imprensa defendendo o governo
Chávez."
O Porto de Mariel, em Cuba, inaugurado
em janeiro de 2014, com a presença da presidenta Dilma Rousseff, e tornado
viável graças a financiamento do BNDES, é outra iniciativa brasileira fora dos
padrões até então conhecidos no continente.
E, no plano militar, lembra Boito, o
governo Lula engavetou o projeto de lei herdado do governo Fernando Henrique
Cardoso de ceder a base de Alcântara para o controle dos Estados Unidos. Fora
isso, o Brasil assinou acordos militares com a França para a construção de
submarino nuclear e optou por caças de fabricação Sueca, em 2014, em vez dos
F-15 estadunidenses, por exemplo, o que trouxe benefícios ao Brasil, já que a
Suécia ofereceu transferência de tecnologia na negociação.
Nada é por acaso
Na análise da professora da UFRGS, não é
por acaso que a oposição, que desencadeia um bombardeio incessante desde o
primeiro dia após a reeleição de Dilma, tenha conseguido "virar o
jogo", que estava completamente a favor do governo até antes das manifestações
de 2013. Assim como não é por acaso que Bernie Sanders, pré-candidato democrata
à presidência dos Estados Unidos, tenha afirmado, ontem, que seu país precisa
parar de "derrubar" governos na América Latina. "Sim, este
interesse (de que o governo Dilma chegue ao fim) existe. Abriu-se espaço para
que a oposição, que estava extremamente fragilizada, conseguisse rapidamente um
espaço de atuação. Se considerarmos o momento em que todas essas coisas
acontecem, mais claramente a partir de 2013, em três anos a oposição virou o
jogo no Brasil", diz Analúcia.
A oposição sente-se tão à vontade que,
segundo o site Brasil 247, hoje (20/4), liderada pelo Solidariedade, chegou a
pedir à Justiça Federal para impedir Dilma de viajar aos Estados Unidos para
participar de um evento na Organização das Nações Unidas (ONU), na sexta-feira
(22), onde, espera-se, ela fará um discurso denunciando o golpe no país.
Nesse contexto, para Analúcia, também
não é coincidência que o senador Aloysio Nunes Ferreira tenha ido aos Estados
Unidos um dia após a votação da Câmara dos Deputados que aprovou no domingo
(17) a admissibilidade do impeachment. "Não tem nenhuma coincidência. Eu
não acredito em coincidências. Tudo é um grande jogo político. O próprio juiz
Sérgio Moro tem instrução norte-americana. Moro estudou e teve contato muito
próximo com o Departamento de Estado norte-americano", diz. "O
problema é que as coisas acabam acontecendo muito nos bastidores e a mídia
divulga aquilo que interessa."
Na mesma linha, Armando Boito avalia:
"Muitos dizem que não é possível que Sérgio Moro tenha se apropriado de
tanta informação sobre a Petrobras em tão pouco tempo, a não ser que algum
espião tenha entregado alguma coisa para ele". "Os Estados Unidos
espionavam Dilma e a Petrobras, isso o Wikileaks mostrou. E sabemos que a
Chevron quer mudar o regime de partilha, e que o José Serra, do PSDB, se
comprometeu a mudar o regime de partilha, caso vencesse as eleições em 2010. O
Wikileaks revelou isso."
Finalmente, há os indicadores históricos
irrefutáveis. Se, hoje, como diz Analúcia, não temos "evidências mais
concretas" da interferência de Washington, apesar de essas evidências
serem quase cristalinas a partir das próprias revelações do Wikileaks, é muito
provável que no futuro os dados hoje "supostos" sejam reconhecidos
como fatos.
"Existe um fato histórico, que
consiste no seguinte: o imperialismo conspira, sim", diz Armando Boito.
"Não conspirou no golpe no Chile, em 1973? Não conspirou no golpe no
Brasil, em 1964? Basta ver o filme O Dia que Durou 21 anos. O imperialismo e a
classe dominante conspiram e existe conspiração na história", afirma
Boito.
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