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A semana passada foi decisiva e terminou contabilizando importantes
vitórias para nós, os defensores da continuidade institucional e democrática no
Brasil. A percepção dos atores políticos mudou radicalmente:se antes a aposta
era que o impeachment de Dilma parecia inevitável, a
preço de hoje o prognóstico da maioria dos analistas é que o congresso deverá
rejeitar o golpe.
Lindbergh Farias*
Nesta semana, a proposta de um
governo golpista comandado pelo vice-presidente Michel Temer esvaziou-se à
velocidade da luz. Um dos índices de meu balanço político reside na letra e nas
entrelinhas do editorial de capa de hoje, domingo (03/04/2016) do jornal Folha
de S Paulo. Ninguém negará credenciais de oposição da Folha ao governo Dilma - tanto que o editorial se chama “nem Dilma,
nem Temer”. O fato de os editoriais da Folha
expressarem opinião de oposição de tipo neoliberal e conservador não é
novidade. A novidade de hoje é que, na prática, embora de maneira envergonhada,
o jornal desembarcou da aventura de derrubar o governo. A Folha e muito mais gente começam a exibir sinais mínimos de juízo.
Conforme o editorial, e não vejo como se possa discordar, um eventual
governo Temer chegaria comprometido até a medula com o pior do charco da nossa
desgastada política, por isso seria um governo frágil, sem apoio social mínimo
nem mesmo para realizar o programa neoliberal a que se propõe.
O governo Temer nasceu morto. Em vez de dirimir, tocaria fogo na crise.
Emblemático do mal-estar gerado na sociedade da perspectiva hipotética de um
governo Temer foi o comentário, vazado de uma palestra, do ministro do STF,
Luís Roberto Barroso, que faço questão de reproduzir: "quando anteontem o
jornal exibia que o PMDB desembarcou do governo e mostrava as pessoas que
erguiam as mãos, eu olhei e disse: 'Meu Deus do céu! Essa é nossa alternativa
de poder. Não vou fulanizar, mas quem viu a foto sabe do que estou
falando". Não há como discordar da opinião do Ministro Barroso.
É verdade que, efetivado o desembarque da canoa furada de Temer, a Folha propõe o inexequível, ou seja, a
renúncia da presidente Dilma. Ora, a renúncia é uma atitude de foro íntimo, e
todo o mundo sabe que Dilma jamais renunciaria por dois sabidos motivos: em primeiro
lugar - invocando a expressão de Álvaro Lins a propósito de uma proposta infame
de renuncia de Juscelino ao mandato de presidente, inexiste a palavra renúncia
no dicionário da história pessoal de Dilma. Dessa maneira, podem tirar o
cavalinho da chuva: Dilma jamais frustraria a maioria dos brasileiros que nela
confiaram e marcaram o 13 do PT na urna eletrônica. O segundo argumento é até
mais importante que o primeiro: inexistem motivos políticos consistentes que
autorizem o gesto pessoal de sacrifício máximo da renúncia. Pelo contrário,
vencida a batalha do impeachment, o governo fortalecido ganhará novos
horizontes.
A tese furada da renúncia de Dilma, também esposada pela Folha, apenas exibe a perplexidade do
jornal em apontar saídas para a crise. Por um lado, a análise prevê o desastre
da manobra do impeachment golpista, escancarando a fragilidade do arranjo em
curso de um eventual governo Temer. Por outro, depois da premissa correta, o
editorial, ao propor a impossível renúncia, embarca numa espécie de beco sem
saída: o desejo de interromper o governo e o reconhecimento da dificuldade de
fazê-lo.
A Folha também é obrigada
forçosamente a reconhecer que a presidente Dilma não cometeu crime de
responsabilidade. Lê-se no editorial que "pedaladas fiscais são razão
questionável numa cultura orçamentária ainda permissiva.” Sem dúvida,
acrescentaria, nem pedaladas e menos ainda a emissão de créditos suplementares
são razões válidas, à luz da Constituição, de caracterização de crime de
responsabilidade. Afora a inconsistência de fundamento, para se ter uma ideia,
14 governadores cometeram pedaladas e o próprio Temer assinou créditos
suplementares.
A luz da razão começa a atuar como detergente, limpando a sujeira do
golpismo. O debate político no parlamento e na sociedade, travado no decorrer
da semana destruiu por completo a linha de argumentação histriônica dos
defensores do impeachment. Ninguém da oposição consegue sustentar um debate
sério, argumentar racionalmente. Apelam a subterfúgios de retórica ou linhas de
fuga insustentáveis, a exemplo da tese ridícula e totalmente subjetiva de
impichar o governo “pelo conjunto da obra”,
esquecendo que impeachment é coisa muito seria, requer fato determinado e
cabalmente provado.
Os estrategistas do golpe se deram mal. Começaram a semana eufóricos.
Contabilizavam que o encontro do PMDB de terça-feira seria o começo de um
efeito dominó na base do governo, que cairia pedra sobre pedra. Analisaram mal.
Quanto ao governo Dilma, ele segue firme, nas ruas e no parlamento, em
articulações para derrotar o “golpe frio” (designação a revista alemã Der Spiegel) comandado por Eduardo
Cunha. Nem o PMDB desembarcou totalmente do governo, como Dilma e seus
assessores começaram a articular, de maneira exitosa, junto a outros partidos,
a consolidação de uma base consistente contra o golpe do impeachment. A relação
de forças mudou e o Brasil não se tornará uma República de Bananas.
Mas, principalmente, um grande movimento espontâneo de massas cresceu
exponencialmente em todo território nacional e no exterior, disputando os
indecisos e isolando a direita e o fascismo, que começaram a perder a olhos
vistos a batalha de ideias, nas ruas e redes sociais. A palavra de ordem "Não vai ter golpe, vai ter luta!”
cresceu, passou a ser apoiada por milhões de brasileiros.
Despeço-me observando que a luta não será fácil e as dificuldades
persistem, mas agora o vento sopra na direção do leme de nosso navio.
*Lindbergh Farias é senador pelo PT do Rio de Janeiro
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