Editorial
“Meu Deus do céu! Essa é nossa alternativa de poder!” - a reação
atribuída ao ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF),
ao assistir pela televisão a transmissão da convenção em que a direção do PMDB
decidiu deixar o governo, reflete semelhante perplexidade de democratas e
patriotas diante dos acontecimentos recentes. Das pessoas que não aceitam o
ataque golpista contra a legalidade constitucional.
De certa maneira o editorial publicado hoje (3) pela Folha de S. Paulo
revela igual percepção, embora no campo golpista. Ao reconhecer a que não há
“motivos irrefutáveis” para o impeachment, a Folha parece aderir ao “que se vayan todos”, como diziam os
argentinos que, em 2001, tiraram Fernando De La Rua do governo. É o
reconhecimento, no campo da oposição de direita, da falta de legitimidade do
golpe midiático judicial em curso. E também um reconhecimento ubíquo da
legitimidade do mandato de Dilma Rousseff, que resulta do voto de mais de 54
milhões de eleitores que a escolheram em 2014.
Esta perplexidade ajuda a entender o avanço da resistência ao golpe que
une militantes dos movimentos sociais e políticos a pessoas que, sem militância
organizada, defendem a democracia e a legalidade, como se viu nas manifestações
recentes contra o golpe, que levaram às ruas multidões, no Brasil e em muitas
cidades mundo afora.
Esta reação dignifica o povo e revela o aprendizado político e
democrático acumulado desde jornadas como a Diretas Já, de 30 anos
atrás, o Fora Collor, ocorrido há mais de 20 anos, e as lutas e
mobilizações democráticas ocorridas contra os desmandos neoliberais dos
mandatos de Fernando Henrique Cardoso.
De fato, aquele “meu Deus do céu” pode ser entendido
como uma manifestação da inconformidade da consciência democrática neste
momento em que é tramado um golpe disfarçado de respeito à lei e à
Constituição.
A Folha de S. Paulo – um dos esteios do golpe midiático judicial –
aposta no referido editorial, que, se Dilma Rousseff vencer a batalha na Câmara
dos Deputados, os “fatores que levaram à falência” de sua autoridade
permanecerão – embora aquele jornal golpista reconheça a falta da “comprovação
cabal” de crime de responsabilidade. E isso torna questionável a acusação
contra ela.
Apesar disso insiste na tese absurda da renúncia da presidenta e de
Michel Temer (que também não tem “suficiente apoio na sociedade”). Suas
renúncias, e o afastamento da “figura nefasta” (sic) de Eduardo Cunha, criariam
as condições para a convocação de eleições presidenciais "num prazo de 90
dias”. É outra maneira de buscar a legitimidade que o golpe não tem.
O golpe ainda não está derrotado e a mobilização em defesa da
legalidade continua urgente.
A ação da presidenta Dilma Rousseff indica o esforço para o reencontro
com sua base social. Ela tem multiplicado reuniões com trabalhadores do campo e
da cidade, artistas, intelectuais, gente do pensamento. Encontros que os
falastrões da mídia golpista e os parlamentares golpistas temem e tentam
desqualificar. Temem, pois preparam o cenário pós-impeachment e apontam para
novos e maiores compromissos que poderão permitir o avanço no rumo da
estabilidade, do crescimento e das mudanças que favoreçam o povo, a economia
nacional, e a soberania do país.
Por outro lado, quais seriam as chances de um governo de exceção,
ilegítimo, fruto do golpe? Nenhuma. Ninguém pode alimentar a ilusão de que um
improvável governo Temer traria estabilidade política, e muito menos a paz na
sociedade e na economia. Todos os programas golpistas revelam que aquele seria
um governo de arrocho, atraso social e econômico, perda de direitos políticos,
econômicos e sociais, de rendição ao imperialismo colocando o país de joelhos
ante as nações dominantes. Será a volta do malsinado programa neoliberal e seu
cortejo de retrocessos no crescimento econômico, desemprego, atentados aos direitos
sociais e políticos do povo e dos trabalhadores, de humilhação nacional.
Programa que reforça a falta de legitimidade de um governo golpista que enfrentará
a fúria popular e uma imensa resistência democrática. Basta observar quem se
aglutina em torno de Temer, quais são as forças que apoiam o golpe. São as
figuras que levaram o Brasil à bancarrota vista durante os mandatos neoliberais
de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Nos próximos dias a pressão popular será fundamental. é preciso
convencer os parlamentares indecisos a votar contra o impeachment golpista. No
cenário vivido pelo país desde meados de março, a urgência deste apelo à
consciência democrática dos parlamentares se acentuou e fortaleceu.
Não vai ter golpe! A direita e seus porta-vozes da mídia hegemônica
serão barrados pela consciência democrática materializada no povo nas ruas e
nos parlamentares democráticos no Congresso brasileiro.
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