“Super-ricos”, pequena elite
que não paga impostos
Eles ganham acima de R$ 300 mil mensais, mas recolhem apenas 7% — muito
menos que a massa dos assalariados. Seu segredo: a docilidade do Congresso
Nacional com as elites.
Os brasileiros super-ricos pagam menos imposto, na proporção da sua
renda, que um cidadão típico de classe média alta, sobretudo assalariado, o que
viola o princípio da progressividade tributária, segundo o qual o nível de
tributação deve crescer com a renda.
Essa é uma das conclusões de artigo publicado em dezembro pelo Centro
Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG), vinculado ao
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).
O estudo, que analisou dados de Imposto de Renda referentes ao período
de 2007 a 2013, mostrou que os brasileiros “super-ricos” do topo da pirâmide
social somam aproximadamente 71 mil pessoas (0,05% da população adulta), que
ganharam, em média, 4,1 milhões de reais em 2013.
De acordo com o levantamento, esses brasileiros pagam menos imposto, na
proporção de sua renda, que um cidadão de classe média alta. Isso porque cerca
de dois terços da renda dos super-ricos está isenta de qualquer incidência
tributária, proporção superior a qualquer outra faixa de rendimento.
“O resultado é que a alíquota efetiva média paga pelos super-ricos
chega a apenas 7%, enquanto a média nos estratos intermediários dos declarantes
do imposto de renda chega a 12%”, disseram os autores do artigo, Sérgio Gobetti
e Rodrigo Orair, que também são pesquisadores do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA).
Essa distorção deve-se, principalmente, a uma peculiaridade da
legislação brasileira: a isenção de lucros e dividendos distribuídos pelas
empresas a seus sócios e acionistas. Dos 71 mil brasileiros super-ricos, cerca
de 50 mil receberam dividendos em 2013 e não pagaram qualquer imposto por eles.
Além disso, esses super-ricos beneficiam-se da baixa tributação sobre
ganhos financeiros, que no Brasil varia entre 15% e 20%, enquanto os salários
dos trabalhadores estão sujeitos a um imposto progressivo, cuja alíquota máxima
de 27,5% atinge níveis muito moderados de renda (acima de 4,7 mil reais, em
2015).
“Os dados revelam que o Brasil é um país de extrema desigualdade e também
um paraíso tributário para os super-ricos, combinando baixo nível de tributação
sobre aplicações financeiras, uma das mais elevadas taxas de juros do mundo e
uma prática pouco comum de isentar a distribuição de dividendos de imposto de
renda na pessoa física”, disseram os pesquisadores.
A justificativa para tal isenção é evitar que o lucro, já tributado na
empresa, seja novamente taxado quando se converte em renda pessoal. No entanto,
essa não é uma prática frequente em outros países do mundo.
“Entre os 34 países da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico), que reúne economias desenvolvidas e algumas em
desenvolvimento, apenas três isentavam os dividendos até 2010”, disseram os
pesquisadores, citando México, Eslováquia e Estônia.
Contudo, o México retomou a taxação em 2014 e a Eslováquia instituiu em
2011 uma contribuição social para financiar a saúde. Restou somente a Estônia,
pequeno país que adotou uma das reformas pró-mercado mais radicais do mundo
após o fim do domínio soviético nos anos 1990 e que, como o Brasil, dá isenção
tributária à principal fonte de renda dos mais ricos.
Em média, a tributação total do lucro (somando pessoa jurídica e pessoa
física) chega a 48% nos países da OCDE (sendo 64% na França, 48% na Alemanha e
57% nos Estados Unidos). No Brasil, com as isenções de dividendos e outros
benefícios tributários, essa taxa cai abaixo de 30%.
Além disso, o estudo concluiu que o Brasil possui uma elevada carga
tributária para os padrões das economias em desenvolvimento, por volta de 34%
do Produto Interno Bruto (PIB), equivalente à média dos países da OCDE.
Mas, diferentemente desses países — nos quais a parcela da tributação
que recai sobre bens e serviços é residual, cerca de um terço do total, e há
maior peso da tributação sobre renda e patrimônio — cerca de metade da carga
brasileira provém de tributos sobre bens e serviços, o que, proporcionalmente,
oneram mais a renda dos mais pobres.
“Enquanto o avanço conservador está sendo parcialmente revertido na
maioria dos países da OCDE, que estão aumentando a taxação sobre os mais ricos,
inclusive os dividendos (…); no Brasil, nenhuma reforma de fôlego com o
objetivo de ampliar a progressividade do sistema tributário foi realizada nos
últimos 30 anos de democracia, dos quais 12 anos sob o governo de
centro-esquerda do Partido dos Trabalhadores (PT)”, disseram os pesquisadores,
acrescentando que a agenda da progressividade tributária é um dos grandes
desafios do país na atualidade.
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04/04/2016
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