A vantagem é
que a história não acaba
Em entrevista ao Blog do Rovai, o
governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), fez uma análise do momento
político do país, incluindo as eleições deste ano. Tratou ainda da forma com
que a Lava-Jato foi instrumentalizada e a mudança de direção nos rumos do país.
Aproveitando os 28 anos de promulgação da Constituição, Flávio Dino, que já foi
juiz federal, comentou que a Carta Magna, “fruto de uma articulação
progressista”, deu contribuições importantes no cenário político do país.
Para Dino, as eleições municipais, no
Maranhão, enterraram de vez a oligarquia política da Era Sarney. O PCdoB elegeu
46 prefeitos, dentre um universo de 153 eleitos do campo aliado ao governo e
mais 215 vereadores. Para ele, o principal mérito “foi ter conseguido
paradoxalmente manter vivo o sentimento da mudança”.
“Em pouco tempo, um ano e meio,
conseguimos mostrar para a população que é possível, ainda que de modo
incipiente, claro, fazer mudanças assertivas na vida das pessoas, no modo de
governar”, comemora.
O governo atribui o resultado positivo
nas eleições municipais do Maranhão também à sustentação da “credibilidade”,
apesar das dificuldades econômicas e fiscais, “do desemprego na sociedade, a
gente manteve um estoque e credibilidade para continuar falando de mudanças e a
população acompanhar. O tempero principal foi a capacidade de em pouco tempo,
com poucos meios, gerar alguns resultados simbólicos que mantiveram nossa
capacidade de aglutinar o campo pela alta aprovação popular”, avalia.
Aspecto
nacional
Entretanto, para o governador, cabe uma
revisão dos vários fatores que levaram à “derrota” do campo progressista e
popular e a ascensão da direita e do conservadorismo, nas eleições, em nível
nacional. E citou como exemplo a vitória em primeiro turno do empresário João
Doria (PSDB) em São Paulo.
Para Dino, uma das razões para
desequilibrar o jogo político ocorreu em 2014, com a instrumentalização
política da Lava-Jato. “Qual a resultante do fortalecimento desse bloco no
terreno da política, já que gostam tanto de falar de Operação Mãos Limpas, sem
entender direito as consequências? Nós temos uma situação similar, meio
italiana nesse sentido também, que é ‘berlusconização’ da política. Agora nós
temos o próprio Berlusconi que é o João Dória.”
Segundo o governador, o que houve foi
uma crise de representação aguda e uma “fragmentação do sistema partidário, de
forma que se consegue identificar derrotados, mas tem dificuldade de
identificar vencedores”. E dessa forma, teve “um afastamento da população da
política, resultados indo na direção da abstenção, voto nulo e branco. Ou seja,
uma descrença”.
Para ele, ninguém ganhou, “tirando essa
vitória notável do Dória, em São Paulo, você vê que o próprio PSDB teve derrotas.
O PMDB teve derrotas expressivas. Então, temos uma desestruturação de todo o
sistema institucional”.
Crise
da esquerda
No que tange à participação política no
campo institucional, Flávio Dino faz uma análise de “profunda crise da
esquerda”. “Como vimos, fomos reduzidos a praticamente 20% da sociedade”,
explicou, citando os números eleitorais nos grandes centros.
“A esquerda foi pulverizada e reduzida a
20% praticamente da expressão institucional da política. Isso, naturalmente,
não pode ser afirmado de forma aritmética. O pensamento de esquerda, a meu ver,
é maior que 20% da sociedade. No que se refere ao jogo institucional, nós fomos
reduzidos a um quinto.”
Para ele, o problema é que com um quinto
“não se polariza o centro político, porque não há força suficiente”. “Nós
estamos diante desse desafio enorme, de crise de representação política,
fragmentação da esquerda, que tem dificuldade de se colocar para a sociedade em
outros termos. E aliado a isso há uma recessão e um desemprego brutal, que
naturalmente leva à ‘direitização’ da política.”
Flávio Dino recordou que o “nazifascismo
surgiu do ventre de uma grande crise econômica”. “Crises econômicas agudas
levam a saídas autoritárias, normalmente. A crise de 1929 foi o combustível do
nazifascismo dos anos 1930. Nós vivemos isso em termos internacionais. Não
somente na política brasileira. Mas qual é o desafio? Falar de esperança e de propostas
que sejam galvanizadoras no sentimento, no quadro objetivo de muitas derrotas,
porque há a Lava-Jato como território hostil. A sociedade indiferente à
política, o desemprego e a recessão dizimando a luta social. Não é uma coisa
simples. A vantagem é que a história não acaba, não se pode ser fatalista e
achar que tudo acabou.”
Redução
de direitos x igualdade de oportunidades
Entretanto, Dino ressaltou que tem
convicção de que esse “ciclo” de crise deve durar pouco tempo. “Porque uma
sociedade perversamente desigual e injusta tem impasses muito profundos que não
se consegue resolver. A meu ver, com políticas que reforcem exatamente as
desigualdades, a injustiça e a negação de direitos, conduz a uma inviabilização
da sociedade, porque significa, por exemplo, aprofundar a violência.”
“Acho que acertando o movimento nós
conseguiremos sair disso. Agora, o que não pode é acreditar no princípio da
inércia”, avalia. “Não adianta uma subjetividade conduzir a certa tendência
histórica sem que se construa, ativamente, os sujeitos para fazer com que essa
objetividade se materialize nos fatos.”
Para Flávio Dino, a principal questão
agora é “reorganizar nossos sujeitos históricos em um quadro profundamente
adverso”. “É preciso, portanto, agregar um programa que seja prospectivo,
porque não existe na sociedade voto de gratidão, por mais que as pessoas
reconheçam os feitos do passado. Elas precisam acreditar no que o se apresenta,
que vai ampliar benefícios para o futuro e, no mínimo, preservar conquistas ou
ampliar benefícios.”
Outra questão mais programática, analisa
Dino, é a “agenda dos serviços públicos e da igualdade de oportunidades”. Para
ele, esse é o ponto mais claro, a “contradição” dos campos: “É a questão que
nos coloca em contradição, com esse modelo mais privatizante, centralizador”.
“É preciso encontrar um jeito de
repactuar as relações com o que se identifica mais claramente com a esquerda,
mas também com outros rostos que podem e devem ser repolarizados.”
Para Dino, “a grande lição é que hoje
ninguém está em condição de ficar sozinho. A esquerda está toda
no mesmo barco”. “As derrotas que o PT colheu, nós também colhemos, com a
exceção do Maranhão”, destaca.
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