Teria sido possível prender os corruptos e
salvar as empresas!
Entrevista
Paulo Henrique Amorim
Conversa
Afiada reproduz importantíssima
entrevista de Walfrido Jorge Warde Júnior, sócio da Warde Advogados, formado em
Direito e Filosofia pela USP e doutor pela USP, a Alexa Salomão:
O advogado Walfrido Warde Júnior (...)
defende: “Precisamos punir os responsáveis, mas também preservar os negócios”,
diz.
(...)
Nós temos algumas leis que gravitam no
entorno do problema da corrupção, especificamente da corrupção endêmica, que é
o caso da Lava-Jato. Temos a lei de improbidade administrativa, pela qual o
Estado busca ressarcimentos – condena quem causou o dano a pagá-lo e impõe
outras punições. Por exemplo: não poder fechar contratos com o poder público –
caso de empresas; ou perder direitos políticos – caso de pessoa física. Essa
ação é pelo Ministério Público. Tem também o processo penal. O autor também é o
Ministério Público. Além disso, tem o processo administrativo, que, no caso da
Lava-Jato, é tocado pelo Ministério da Transparência (antiga Controladoria
Geral da União, CGU), que pode levar à improbidade administrativamente. Então,
fazer uma leniência com a ex-CGU não significa que o Ministério Público vá
parar uma ação penal. O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)
busca infrações às regras de proteção à concorrência. TCU (Tribunal de Contas
da União) vê se tudo é feito conforme as regras, se a indenização é correta, se
a multa é adequada. E por aí vai.
·
O correto seria
negociar com todos ao mesmo tempo?
Correto seria que tivéssemos uma
legislação que trouxesse toda essa gente para sentar à mesa, em colaboração.
·
Mas o que estamos
vendo é concorrência e busca de protagonismo entre eles.
Não podemos ter um combate
inconsequente. Quando digo inconsequente é um combate que destrua a empresa
brasileira, que acaba com o capitalismo nacional.
·
É isso que está
acontecendo?
Estamos vendo isso acontecer. A gente
tinha um modelo de capitalismo – podemos discutir se era certo ou errado, mas
era assim – escorado em relações entre Estado e empresas. As construtoras eram
como recheios do Estado. De um lado, negociavam com o Estado financiamentos
para as suas atividades; do outro lado, desde os anos 90, passaram a exercer
funções estatais, como concessionárias de serviços públicos.
O perecimento dessas relações tem
impacto. Mesmo que elas não tenham sido condenadas, têm problema de reputação.
O Estado não pode financiá-las, contratá-las. Simplesmente congelamos um setor
importantíssimo da economia.
·
Como empresas
corruptas são punidas em outros países?
Temos coisas que nos distinguem do resto
do mundo. Primeiro, falta pragmatismo no tratamento dessas questões. No resto
do mundo a lei põe todo mundo na cadeia, apresenta qual é o dano, qual
indenização deve ser paga, de uma maneira possível, para impactar o mínimo
possível a empresa. A segunda coisa é o nosso nível de concentração econômica.
Essas empresas são todas pelos donos. É mais fácil quando são de capital
aberto.
·
O executivo é uma
peça móvel.
Exato. Não há dúvida que no caso
brasileiro tem essa dificuldade: achar que uma organização vai deixar de ser
como ela era porque você mandou o executivo embora, mas o controlador
permanece, é uma ilusão.
(...)
Lá em 2015, a gente tinha uma proposta
(veja no Conversa Afiada entrevista com o professor Gilberto Bercovici, um dos
co-autores dessa proposta - PHA) que retornou há pouco na voz do ministro Bruno
Dantas (do TCU). Você não vai na holding e tira o controlador, mas é possível
fazer uma abertura do fechadíssimo mercado de infraestrutura transferindo as
concessões. Vamos supor que após a investigação se conclui o tamanho do prejuízo
que uma empreiteira causou ao erário. Ela paga transferindo ao Estado as ações
do projeto dessa hidrelétrica e o Estado leva a leilão. Se der para cobrir a
multa, maravilha. Se não, precisa dar ações de outros projetos.
·
Mas o Estado já
foi lesado e ainda vai entrar nisso. Por quê?
Você tem ressarcimento rápido, permite
que as empresas paguem a sua dívida com a sociedade e o País e destrava o
mercado de infraestrutura.
·
Fazer algo assim
não pode dar a sensação de que elas não estão sendo devidamente punidas?
Vão ficar sem punição se quebrarem e não
pagarem o que devem. Podem achar que deixar que elas quebrem seria uma punição.
Não é. Isso seria uma vendeta emocional.
(...)
Não existem Estados distintos. Existem
agentes distintos do Estado. A força-tarefa tem um trabalho importantíssimo de
combate à corrupção. Mas não é possível imaginar que Polícia Federal,
Ministério Público e Judiciário estão apartados de outros interesses nacionais.
A minha ponderação é simples. Precisamos punir os responsáveis, mas também
preservar os negócios.
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