“Verba
volant, pecunia manent”. Uma carta ao boi traidor
FERNANDO BRITO
À moda e sem o talento de
Veríssimo, com suas cartas da Dorinha:
Senhor Joesley,
“Pecunia nunc mala est”
Por isso lhe escrevo, claro
que anonimamente, posto que, falasse, decerto gravar-me-ia e a verba (do latim
as palavras, porque a outra esvaiu-se), non volant.
Muito a propósito do intenso
noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas
no Palácio.
Esta é uma carta pessoal. É
um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é
preciso qualificar a sua deslealdade.
Entretanto, sempre tive
ciência da absoluta desconfiança do senhor e de seus asseclas em relação a mim
e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio
pessoal e partidário ao seu negócio.
Voei em seu avião, deixei que
seus modos ousados de açougueiro afluente oferecessem as rosas da cupidez à
recatada. Ruborizei-me, claro, como em meus mui talentosos versos: De
vermelho/Flamejante/Labaredas de fogo assomaram-se-me às faces (abro um
parênteses para esclarecer que labaredas de fogo é licença poética e não
pleonasmo, como sua bovina convivência di-lo-ia).
À minha natural discrição
conectei aquela derivada da cobiça que nos é comum.
Vamos aos fatos. Exemplifico
alguns deles.
Jamais usei consigo os
métodos do Calado de Curitiba, ou o linguajar chulo de outros, imundo como o pó
de Minas, mas caí na esparrela, como o dinheiro caiu no Perrela. (é incontida
minha atração por rimas ricas, perdoe-me)
Cedi ao senhor o meu
subterrâneo acesso, que noutros palácios d’antanho apenas aos amantes e
conspiradores se franqueava.
Desta confiança, porém,
valeu-se sua alma rastaquera para, sordidamente, gravar-me, o que só não foi
pior por conta de meu natural recato monosilábico. Tanto que, frequentemente,
há quem me tome como decorativo, de tão
silencioso.
Contido, disse apenas “tem
que manter isso”, não o “vai, Tigrão” do seu linguajar.
Contava, decerto, com minha
ruína, planejada e desejada por aquel’outro
Gato Angorá, que me ruge, enquanto o outro mia.
E não esperava que meu
capanga lá do Mato Grosso pudesse me blindar.
Passados estes momentos
críticos, tenho certeza de que o senhor amargar-se-á profundamente do que fez.
Sei que a senhor não teve
confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã, quando o levarmos ao
matadouro, o descarnarmos, porcionarmos, fatiando, o seu império e – perdoe-me
a rudeza açougueira – usarmos suas tripas para fazer linguiça.
Vingativamente,
O Anônimo do Tietê
PS: em homengem piedosa à sua
ignorância, esclareço que a epígrafe desta missiva, “Pecunia nunc mala est”,
não é “nunca ponha o dinheiro na mala”, mas que “o dinheiro agora é ruim”.
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