Basta
de intermediários: Huck candidato a presidente
EMIR SADER*
A direita não tem partidos. Ela usa, alternadamente, vários
partidos, conforme suas necessidades de cada momento.
No Brasil, ela foi udenista, porque era o refúgio para
colocar em prática seu antigetulismo.
Perdia sempre.
Até que embarcou na aventura do Jânio Quadros. Deu no que
deu. Aí a direita abandonou os partidos e foi bater na porta dos quarteis,
apelando ao partido militar, para dar o golpe e governar com ditadura.
No fim da ditadura, a direita foi se distanciando de fininho
do partido da ditadura, que havia embarcado na canoa furada do Paulo Maluf,
para participar do pacto de conciliação do Colégio Eleitoral, com a aliança
PMDB-PFL. Um pacto que desembocou no governo Sarney, em que a direita se
representava, até que pulou para uma nova a aventura – a do Collor.
Deu no que deu.
Com FHC e a aliança PSDB-PFL a direita encontrou o novo bloco
de partidos que passou a representá-la, no marco do programa neoliberal. Foi
assim durante os dois governos do FHC e continuou sendo durante os governos do
PT, quando voltou sistematicamente a perder, até que apelou para o atalho do
golpe, abandonando os partidos em que se representava.
Desde a derrota de 2014, a direita constituiu outro bloco
político para levar a cabo o golpe e colocar em prática o regime de exceção. É
um bloco composto pelo monopólio privado da mídia, que dá condução política e
difunde as atividades do bloco; o Judiciário, que monta as armadilhas para a
existência do governo do golpe e a inviabilização da oposição política; o
Congresso, que aprova o pacote de medidas antipopulares e antidemocráticas do
governo.
Em um regime de exceção, os partidos de direita também perdem
espaço. Porque eles dependem de algum tipo de apoio popular, para disputar
eleições contra a esquerda. O que os partidos tradicionais não conseguem, sejam
porque estão completamente desmoralizados pelo governo antipopular que apoiam e
pelo envolvimento dos seus principais dirigentes com a corrupção.
Daí que a busca de candidatos "de fora" da política
tradicional se torne objetivo fundamental da direita, cada vez menos segura de
que possa excluir Lula da disputa e cada vez mais segura de que os candidatos
que se apresentam até agora – de Bolsonaro a Alckmin – seriam derrotados
facilmente pelo ex-presidente.
A direita passou por uma fase de renegar os partidos em
função de empresários privados de sucesso. Berlusconi foi o que chegou mais
longe, antes de fracassar. Sebastián Piñera é a versão latino-americana, que
não deu certo na primeira tentativa, tenta de novo agora.
No Brasil, a tentativa de encontrar um outsider da política
recai sobre Luciano Huck, exatamente o tipo de adversário que Lula reitera que
prefere, com a estrela da Globo na testa.
A tentativa é a de projetar o poder real no plano do governo,
abandonando os intermediários, entre eles os partidos políticos tradicionais.
Em 1964, antes do golpe, nós gritávamos e pintávamos paredes: "Basta de
intermediários, Lincoln Gordon presidente", referindo-nos ao embaixador
dos EUA.
Agora, caso se confirme a candidatura de Luciano Huck, a Globo vai jogar tudo para
medir sua influência política real. Que influência real a Globo tem sobre os
brasileiros? A audiência que tem se traduz em influência política?
Caso se enfrentem Lula e Huck, será o grande tira teima. De
um lado o líder de maior popularidade na história do Brasil, de outro o
representante do maior monopólio midiático que o pais já conheceu.
Da parte do campo popular estaria quem melhor representa o
povo brasileiro. Do lado da direita, um representante legítimo do maior
monopólio dos meios de comunicação.
Nos dois casos, sem intermediação.
A direita abandonaria de vez sua representação através de
partidos, no desespero, para tentar jogar a última cartada, com um funcionário
seu.
Ou se apropria completamente do poder ou corre o risco de a
derrota condená-la à morte.
* Sociólogo e cientista político
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