JUDICIÁRIO
“Brasil está vivendo Estado punitivo e isso deixará sequelas”, diz jurista
É um tribunal de exceção que condenou Lula sem provas, disse Marco Aurélio de Carvalho
Marco Aurélio de Carvalho, advogado da Frente Brasil de Juristas pela Democracia, acredita que o pedido do Partido Ecológico Nacional (PEN) para suspender as Ações Diretas de Constitucionalidade (ADC’s), que seriam colocadas em pauta hoje (11), no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), tem caráter político.
“Isso também tem a ver com o fato de ser um julgamento político, porque em circunstâncias normais um partido jamais faria algo desse tipo. Não teria porque tirar um advogado renomado e colocar outro no processo”, disse Marco Aurélio, em entrevista à Rádio Brasil de Fato, na manhã desta quarta-feira (11).
Na última terça-feira (10), o partido destituiu o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, para colocar em seu lugar Paulo Fernando Melo, que pediu vistas do processo. De acordo com Marco Aurélio de Carvalho, a decisão do ministro do STF Marco Aurélio Mello de acatar a suspensão foi correta.
“O que o ministro fez é o que eu faria no lugar dele, e o que todo e qualquer ministro deveria fazer, infelizmente. O PEN colocou um novo advogado no processo para falar o contrário do que estava previsto. Como o advogado entrou agora, ele tem o direito de pedir vistas do processo”, explicou.
Veja os principais trechos da entrevista:
Rádio Brasil de Fato: Do que se tratam as ADC’s que seriam votadas hoje e como elas impactam o ex-presidente Lula?
Marco Aurélio de Carvalho: Nós temos um princípio no direito brasileiro, que vigora desde a Constituição de 88, que é o principio da presunção da inocência. . Recentemente houve uma flexibilização, em 2016, por parte do STF, e isso causou um problema enorme no país. Muitas pessoas, cujo os processos ainda não haviam chegado ao final, foram presas provisoriamente. Várias entidades ingressaram com ADC’s para que o STF diga: ‘este dispositivo é correto, oportuno, adequado, e o alcance que ele tem é exatamente o que a simples leitura dele faz supor”. Bastaria ler o texto com posição isenta e compreender qual o alcance que ele tem, e é isso que nós defendemos. Antes que eu tenha a oportunidade de recorrer e a minha situação possa mudar, eu não posso ser recolhido ao sistema penitenciário.
O Lula teve seus direitos desrespeitados? Quais foram as arbitrariedades após a decisão do STF?
O que vale para chico, vale para francisco. Esse caso é um caso que está tramitando há mais de dois anos. As ADC’s foram propostas antes mesmo da condenação do ex-presidente Lula. Quando a imprensa, de maneira criminosa, manipula as informações, ela está mentindo. É claro que vai favorecer o ex-presidente Lula, como vai favorecer o joão, a maria, milhares de pessoas, que porventura estejam na mesma situação. Hoje, no país, há 750 mil presos. Cerca de 40 % são presos provisórios. Não é o crime do colarinho branco, como disse o ministro Barroso. São os pequenos delitos, pessoas que foram condenadas injustamente. Não será um beneficio exclusivo do ex-presidente. No caso dele, é um direito dele que está sendo desrespeitado, nós sabemos que esse processo foi manipulado para tirá-lo das eleições. É um tribunal de exceção, que o condenou sem provas. Foram confirmadas as condenações nos votos de 3 desembargadores do TRF-4 com votos atécnicos, sem justificativas. O que está acontecendo no brasil é muito grave. Estão utilizando a justiça para criminalizar o maior líder político que o pais já teve. Vivemos uma politização do judiciário e é contra isso que devemos nos insurgir.
Qual o panorama da Operação Lava Jato e quais são as irregularidades do caso Lula para além da condenação em 2ª instância?
Evidente que nenhum de nós é favorável a impunidade. O crime precisa ser combatido e isso merece nosso aplauso. Ninguém é condescende com a corrupção. O problema é que com o pretexto de combater a corrupção, eu possa cometer excessos contra o estado de direito. Infelizmente, a Lava Jato, que tem méritos, cometeu um número enorme de excessos. Ela utilizou o direito para a disputa política. Logo no inicio, ao definir um numero enorme de alvos, com o pretexto de prejudicar um campo político, a operação deixou de considerar outros fatores e dados que foram apresentados. Nos primeiros depoimentos, os delegados tinham o interesse de ouvir apenas argumentações envolvendo a Petrobras apenas nos governos Dilma e Lula. Houve o disparate de desconsiderar um número de fatos que foram ocorridos antes das gestões petistas. Não bastasse isso, houve a criação do juízo universal, para que Sérgio Moro comandasse e dirigisse tudo. A bem da verdade, a maior parte dos casos da Lava Jato deveriam ser julgados em Brasília, por conta do foro privilegiado que as autoridades tinham. Houve um número enorme de conduções coercitivas e prisões preventivas que foram decretadas para constranger investigados e promover delações premiadas. O que foi dito para réus acusados é que eles poderiam evitar constrangimentos se eles assumissem delitos e prejudicassem determinadas pessoas. São vários fatores bem questionáveis
Para o cidadão comum, qual o impacto dessa decisão sobre prisão em 2ª instância promovida pelo STF?
Não há a menor dúvida. Se o maior líder político que o país teve está sofrendo um processo de tamanha agressividade, imagine o sujeito que não tem essa visibilidade. Nós estamos vivendo o avanço do estado de exceção. Há um numero enorme de condenações injustas e injustificadas. Só em São Paulo nós tivemos 13 mil prisões que são questionáveis. Nós temos um sistema prisional que é a escola do crime. Há uma massa carcerária formada pelo preso provisório. Haverá no país um encarceramento em massa. No caso do presidente, eu tenho absoluta certeza que ele não tem responsabilidade nenhuma e que ele vai provar isso ao final do processo. Mas há uma camada que tem responsabilidade, mas que mesmo assim tem direito de ver seu processo tramitando com normalidade. Estamos vivendo no Brasil um Estado punitivo, e isso vai deixar sequelas muito graves.
Como está a ADC proposta pela OAB. Ela está tramitando?
A do PEN também continua tramitando, é importante que se diga isso. Quando uma ADC é proposta, ela se torna indisponível. Mesmo que o partido queira voltar atrás, isso não é mais possível. O que eles podem fazer, e me parece que será opção, o que mostra a fulanização do processo, é sustentar contra o que disseram anteriormente. Eles destituíram o advogado anterior e colocaram outro no lugar. Não dá pra arquivar o processo, e esse tema será julgado na semana que vem. Quanto à ADC da OAB, ela continua firme, com solidez de todas as instituições que a apoiam. Mas há outras medidas tramitando, no STJ, reclamações constitucionais, outros habeas corpus, então a sorte do ex-presidente Lula não depende apenas dessas ADC’s.
Essa medida de aceitar a suspensão das ADC’s, promovida pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello, na noite desta terça-feira (10), mostra que o julgamento do ex-presidente Lula é político?
O que o ministro fez é o que eu faria no lugar dele, e o que todo e qualquer ministro deveria fazer, infelizmente. O PEN colocou um novo advogado no processo para falar o contrário do que estava previsto. Como o advogado entrou agora, ele tem o direito de pedir vistas do processo. Para que não demorasse demais, o ministro Marco Aurélio concedeu esses cinco dias. Essa responsabilidade não é do Marco Aurélio Mello. Agora, isso também tem a ver com o fato de ser um julgamento político, porque em circunstâncias normais um partido jamais faria algo desse tipo. Não teria porque tirar um advogado renomado e colocar outro no processo. O ministro Marco Aurélio agiu da maneira correta, mas a atuação do partido mostra que o julgamento é político.
Edição: Juca Guimarães
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