Um dos motivos para você ler esta newsletter é respirar enquanto interpreta o texto na tela. Respirar, como você sabe, exige oxigênio nos pulmões. É o que nos mantém vivos e sua falta nos cilindros ceifou a vida de pelo menos 57 pacientes de Covid-19 em Manaus, segundo o MP.
A conta só aumenta com a interiorização do caos e o estouro do problema em outros estados, caso do Pará, como bem pontuou em entrevista a enfermeira e doutora em epidemiologia Ethel Maciel.
A sucessão de erros da crise de oxigênio poderia ter sido evitada? Poderia. O Ministério da Saúde demorou dez dias para agir, como revelamos. Sabia, nada fez de efetivo e ainda indicou "tratamento precoce" (não existe tratamento precoce para a Covid-19).
A situação levou ao desespero pessoas como Layla Mariana Batista, 27 anos, e Grace Sá, 34 anos, ambas com parentes manauaras infectados pelo coronavírus.
Elas contaram à Pública no último sábado o drama da busca por cilindros de oxigênio. Conversei com as duas durante a semana para saber a situação no dia a dia.
Até o fechamento deste texto, quinta-feira (21), Layla me contou que a mãe havia sido transferida para Natal, a tia para Brasília e o tio seguia internado num hospital da cidade. Ela mesma agora está com sintomas de Covid-19.
Já Grace está tratando a mãe em casa com oxigênio reduzido para economizar. Ela diz que tem recebido muitas notícias tristes de amigos e conhecidos. "Todos os dias recebemos notícias da morte de alguém. De domingo pra cá já foram 6 pessoas conhecidas que morreram".
Diante da minha reação, ela diz: "Mas é isso mesmo! Infelizmente é como nosso estado está: “na m*rda”. As pessoas implorando pra salvar quem amam" — o que inclui, pasmem, bebês prematuros e recém-nascidos.
Como não se indignar? Mesmo com a vacina, 2021 só será melhor se Bolsonaro sair — de Trump já estamos livres. A responsabilidade do governo federal diante das mais de 211 mil mortes por Covid-19 é cristalina para boa parte da população que não se deixa iludir pelo negacionismo mórbido do capitão — falta, claro, Rodrigo Maia ou seu sucessor pautarem o impeachment para que se evitem mais mortes.
Mortes com as quais a médica Anne Menezes lida todos os dias desde o início da pandemia. Aos inomináveis fura-filas da vacina e demais festeiros da Covid-19, recomendo assistir ao depoimento dilacerante de Anne a Drauzio Varella. Ela é residente do Hospital Getúlio Vargas, o primeiro em que faltou oxigênio em Manaus. Para ela, "essas pessoas não morreram, foram assassinadas".
Thiago Domenici, editor e repórter da Agência Pública
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