Destroçada a partir das revelações do Intercept – que há quase dois anos vem publicando sem parar a série Vaza Jato –, a força tarefa se viu deitada de barriga para cima em plena calçada quente de Brasília sem ninguém que lhe desse a mão.
Os procuradores e o juiz que usaram de seu poder para benefícios pessoais e foram decisivos para dar à luz a Bolsonaro viveram nesta semana seu momento mais humilhante.
Na praça pública do STF, Moro e seus comandados foram mordazmente chamados de “figuras angelicais” por Gilmar Mendes. Em seu voto na terça-feira (um sim pela suspeição do ex-juiz e ex-comandado de Bolsonaro), o ministro do Supremo leu dezenas de diálogos das reportagens que começaram a vir a público no dia 9 de junho de 2019 pela Vaza Jato e que depois culminaram na Operação Spoofing.
Ricardo Lewandowski também votou. Citou ao vivo nosso livro e acrescentou parte considerável do nosso editorial no qual explicamos como e por que o Intercept estava publicando chats privados sobre a Lava Jato e Sergio Moro.
Um dos pontos mais importantes do julgamento foi a ênfase em relação à autenticidade legal que os diálogos receberam. Ministros tinham reservas em usar, durante os votos, os diálogos da Vaza Jato, sob pena de terem que justificar o uso de provas talvez obtidas ilegalmente – mesmo que provas deste tipo possam ser usadas em favor de um réu. Por sorte, temos Sergio Moro.
Graças à soberba do então ministro da Justiça, a Polícia Federal apreendeu, ainda em 2019, 7 terabytes de conteúdos que constituem, hoje, o acervo da Spoofing. O arquivo enviado ao Intercept tem apenas 43,8GB, ou seja: 0,56% do que está em poder do estado brasileiro. Moro queria usar o arquivo apreendido para seus fins pessoais. Tentou chantagear autoridades em busca de apoio para destruir as provas contra si e contra seus comandados no MPF.
Uma jogada amadora, digna de quem se crê um gênio cercado por idiotas, sem perceber o contrário. Da ânsia de nos prender e de acabar com nossas reputações depois de nos acusar – sem provas, como de costume – de sermos aliados de hackers criminosos, Moro acabou tornando o arquivo periciável. Veredicto da PF: é autêntico.
Nós já sabíamos que os chats eram verdadeiros antes mesmo da Spoofing, é lógico. Caso contrário não os publicaríamos. Na primeira vez em que abri o arquivo na redação do Intercept, cliquei imediatamente em ctrl+F e pesquisei pelo meu próprio nome. Corriam os primeiros dias da apuração daquela massa colossal e complexa de informações e ainda estávamos testando as possibilidades de checagem do material. Afinal, pensei, se houvesse ali menções a mim, e se essas menções fossem informações privadas que eu pudesse identificar como verdadeiras, ali estaria a prova de que elas não poderiam ser inventadas.
Dei de cara com o resultado: não havia nenhum chat entre mim e procuradores, o que eu já sabia. Eu não fazia parte da panela de Curitiba. Mas havia, sim, um diálogo entre Bruno Brandão, diretor-executivo da Transparência Internacional no Brasil, e Deltan Dallagnol, que dizia respeito a mim. Eu já contei essa história em entrevista.
No chat de duas frases, Brandão pedia ao procurador e chefe da Lava Jato se poderia passar a mim seu contato. Dias antes, eu havia me encontrado com Brandão na redação da revista piauí, onde fui editor, para tratar de uma reportagem. Eu estava interessado nas obras de arte que a Lava Jato havia apreendido com delatores, sobretudo Nelma Kodama – que mais tarde diria que colaboradores da Lava Jato mentiram para se livrar da prisão, e que haveria uma delação premiada para quem entregasse Lula.
Ao ler o chat, bingo. Outros colegas fizeram e fariam o mesmo, procurando por seus nomes no arquivo. Não havia mais dúvidas de que o material era autêntico. Ele precisava ser publicado.
O TIB está para sempre na história do Brasil. Não há que se ter falsa modéstia aqui, porque não estou falando de mim, estou falando de nós, do nosso jornalismo e do nosso público, vocês que vêm nos apoiando desde então, de todos os modos possíveis. Eu me sinto muito agradecido por esse afeto. Depois de todos os ataques aos quais sobrevivemos, é hora de comemorar a missão nobre do jornalismo em um de seus momentos de plenitude: causar impacto, manter poderosos na linha e promover justiça.
Que assim seja, cada vez mais.
Obrigado, |
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