domingo, 24 de outubro de 2021

Fake news em grupos de igreja acendem alerta para eleições de 2022

 


Os grupos de igrejas no WhatsApp se tornaram um terreno fértil para a disseminação de desinformação. É o que mostra uma pesquisa da UFRJ que publicamos com exclusividade há algumas semanas. Na newsletter de hoje, a repórter e editora Mariama Correia conta os detalhes da matéria e explica como esse fenômeno pode impactar as próximas eleições. 

Você participa de grupos religiosos no WhatsApp? Já recebeu alguma notícia falsa por lá? Conte sua experiência nas Cartas dos Aliados. É só responder este email.

Abraços, 

Giulia Afiune
Editora de Audiências da Pública
Fake news em grupos de igreja acendem alerta para eleições de 2022
por Mariama Correia
 
Minha mãe não é tão fã de redes sociais, mas está sempre ligada no "zap". Ela adora trocar mensagens com os parentes que moram longe e me mandar vídeos de pregações. Durante o isolamento, quando não podia ir à pequena igreja evangélica que frequenta, na periferia de Olinda (PE), o WhatsApp se tornou o único vínculo com sua comunidade de fé. Os grupos viraram uma espécie de lugar de culto, onde irmãos e irmãs compartilhavam textos bíblicos e pedidos de oração. A plataforma também é uma linha direta com o pastor, que envia orientações aos fiéis. 

O serviço de troca de mensagens mais popular do Brasil é extremamente difundido no meio evangélico. E, durante a pandemia, o WhatsApp se tornou o novo "ir à igreja no domingo".

O uso intenso do aplicativo para a prática religiosa tem, entretanto, um efeito colateral: o fortalecimento de redes de desinformação, segundo uma pesquisa sobre evangélicos e desinformação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que publicamos com exclusividade. Iniciado em 2019, antes da pandemia do coronavírus, o trabalho já apontava dados preocupantes.

Quase metade dos evangélicos entrevistados na pesquisa receberam notícias falsas nos grupos das igrejas. Os temas políticos foram identificados como os mais recorrentes. Mais de 20% das pessoas evangélicas ouvidas disseram que não têm o costume de checar notícias, sobretudo se quem envia é uma pessoa de confiança, como o pastor ou alguém da igreja. Nesses casos, muitos até admitiram que já compartilharam notícias falsas mesmo sabendo que era mentira, pois concordavam com a abordagem. 

Qualquer jornalista ficaria desanimado ao saber que 1 em cada 3 evangélicos entrevistados preferem consultar pessoas conhecidas (e isso inclui membros da igreja) na hora de se informar do que recorrer aos veículos jornalísticos. E que mais de 13% disseram que os pastores e irmãos representam a fonte mais confiável de notícias. 

Os dados indicam o tamanho do desafio que temos pela frente. Se o WhatsApp teve papel central na disseminação de informações falsas durante as eleições de 2018, quando Jair Bolsonaro foi conduzido à presidência com apoio do voto evangélico, no pós-pandemia, o fortalecimento de redes de desinformação infiltradas nos grupos das igrejas torna o cenário potencialmente mais catastrófico.

O jogo parece estar a favor de Bolsonaro, que ainda mantém o apoio de grandes lideranças evangélicas e continua usando o WhatsApp para mobilizar apoiadores e transmitir desinformação, como mentiras sobre as vacinas e sobre remédios ineficazes. O presidente também tem um canal com quase um milhão de inscritos no Telegram, outro aplicativo de troca de mensagens cujo controle de conteúdo é ainda menor do que o do WhatsApp. Especialistas apontam que o Telegram pode ser o próximo vilão da desinformação na eleição de 2022, como mostrou reportagem do jornal O Globo

Por enquanto, minha mãe, que não votou em Bolsonaro, segue ativa no WhatsApp e nos grupos da igreja. Mas está vacinada contra a desinformação. Quando recebe alguma informação duvidosa, muitas vezes comenta comigo para checar a veracidade. E ela chega a reclamar quando alguém envia notícias falsas no grupo da igreja, mesmo quando é o pastor.
Mariama Correia é repórter e editora da Agência Pública

Rolou na Pública
 

Relatório final da CPI da Covid. Nos últimos meses, contamos algumas vezes neste espaço que nossas reportagens haviam sido mencionadas na CPI da Covid. Hoje está sendo lido o relatório final da CPI, que começou a ser distribuído ontem. Nele também há referências ao nosso trabalho. Para nossa surpresa, não são mencionadas somente nossas reportagens sobre a pandemia, como a que revela as discrepâncias entre o número de pessoas negras e brancas nos primeiros meses de vacinação. Ao apontar o "anti-indigenismo" do governo Bolsonaro, o relatório menciona uma fala do antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, entrevistado por nossos repórteres em 2019 a pedido de vocês, em uma das primeiras Entrevistas dos Aliados. Três reportagens e entrevistas de nossa cobertura sobre a Amazônia foram mencionadas. 

Entre nossos valores estão a promoção dos direitos humanos e do direito à informação e a qualificação do debate democrático. Ter nosso trabalho listado como referência para uma investigação tão importante como a CPI da Covid significa que estamos no caminho certo, ajudando a enriquecer os debates. 

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