Fake news em grupos de igreja acendem alerta para eleições de 2022 por Mariama Correia Minha mãe não é tão fã de redes sociais, mas está sempre ligada no "zap". Ela adora trocar mensagens com os parentes que moram longe e me mandar vídeos de pregações. Durante o isolamento, quando não podia ir à pequena igreja evangélica que frequenta, na periferia de Olinda (PE), o WhatsApp se tornou o único vínculo com sua comunidade de fé. Os grupos viraram uma espécie de lugar de culto, onde irmãos e irmãs compartilhavam textos bíblicos e pedidos de oração. A plataforma também é uma linha direta com o pastor, que envia orientações aos fiéis.
O serviço de troca de mensagens mais popular do Brasil é extremamente difundido no meio evangélico. E, durante a pandemia, o WhatsApp se tornou o novo "ir à igreja no domingo".
O uso intenso do aplicativo para a prática religiosa tem, entretanto, um efeito colateral: o fortalecimento de redes de desinformação, segundo uma pesquisa sobre evangélicos e desinformação da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que publicamos com exclusividade. Iniciado em 2019, antes da pandemia do coronavírus, o trabalho já apontava dados preocupantes.
Quase metade dos evangélicos entrevistados na pesquisa receberam notícias falsas nos grupos das igrejas. Os temas políticos foram identificados como os mais recorrentes. Mais de 20% das pessoas evangélicas ouvidas disseram que não têm o costume de checar notícias, sobretudo se quem envia é uma pessoa de confiança, como o pastor ou alguém da igreja. Nesses casos, muitos até admitiram que já compartilharam notícias falsas mesmo sabendo que era mentira, pois concordavam com a abordagem.
Qualquer jornalista ficaria desanimado ao saber que 1 em cada 3 evangélicos entrevistados preferem consultar pessoas conhecidas (e isso inclui membros da igreja) na hora de se informar do que recorrer aos veículos jornalísticos. E que mais de 13% disseram que os pastores e irmãos representam a fonte mais confiável de notícias.
Os dados indicam o tamanho do desafio que temos pela frente. Se o WhatsApp teve papel central na disseminação de informações falsas durante as eleições de 2018, quando Jair Bolsonaro foi conduzido à presidência com apoio do voto evangélico, no pós-pandemia, o fortalecimento de redes de desinformação infiltradas nos grupos das igrejas torna o cenário potencialmente mais catastrófico.
O jogo parece estar a favor de Bolsonaro, que ainda mantém o apoio de grandes lideranças evangélicas e continua usando o WhatsApp para mobilizar apoiadores e transmitir desinformação, como mentiras sobre as vacinas e sobre remédios ineficazes. O presidente também tem um canal com quase um milhão de inscritos no Telegram, outro aplicativo de troca de mensagens cujo controle de conteúdo é ainda menor do que o do WhatsApp. Especialistas apontam que o Telegram pode ser o próximo vilão da desinformação na eleição de 2022, como mostrou reportagem do jornal O Globo.
Por enquanto, minha mãe, que não votou em Bolsonaro, segue ativa no WhatsApp e nos grupos da igreja. Mas está vacinada contra a desinformação. Quando recebe alguma informação duvidosa, muitas vezes comenta comigo para checar a veracidade. E ela chega a reclamar quando alguém envia notícias falsas no grupo da igreja, mesmo quando é o pastor. |
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