PARA NÃO ESQUECER – 03 DE NOVEMBRO DE 1935
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NASCE HERBERT JOSÉ DE SOUZA – O BETINHO
(Ernesto Germano Parés)
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Herbert José de Sousa, o “Betinho”, nasceu em Bocaiúva (MG), no dia 3 de novembro de 1935. Uma das grandes figuras da história de resistência de nosso povo, ele era sociólogo e um grande ativista pelos direitos humanos, expressão que causa insônia aos poderosos e torturadores em nosso país.
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Betinho nasceu no norte de Minas Gerais e, junto com seus dois irmãos - o cartunista Henfil e o músico Chico Mário, herdou da mãe a hemofilia. Os três irmãos sofreram muito desde a infância e Betinho ainda resistiu à uma tuberculose, doença que matava muito na época. Como se não bastasse, cresceu entre uma penitenciária e uma funerária, locais onde seu pai trabalhava.
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Betinho teve formação dos padres dominicanos, com os quais travou contato na década de 1950. Virou militante da JEC (Juventude Estudantil Católica) e, mais tarde, da JUC (Juventude Universitária Católica). Em 1962 participou da fundação da AP (Ação Popular), com Vinícius Caldeira Brant e outros. Quem assistiu à minha aula sobre as frações da esquerda vai entender essa parte e o papel que teve. Ele foi coordenador da entidade nos anos de 1963 e 1964.
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Em 1962, vencendo a doença e as dificuldades, formou-se em Sociologia na Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Durante o governo de João Goulart assessorou o MEC, chefiou a Assessoria do Ministro Paulo de Tarso Santos, e defendeu as Reformas de base, sobretudo a reforma agrária.
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O golpe militar de 1964 não o fez sossegar. Com outros companheiros, mobilizou-se para enfrentar a ditadura, sem nunca esquecer as causas sociais. Mas ele tinha muitas dificuldades: além de ser visado, a doença o enfraquecia e ele necessitava de transfusões de sangue periodicamente. A única saída foi exilar-se no Chile, em 1971. Lá participou ativamente da assessoria de Salvador Allende, mas o golpe fascista o surpreendeu.
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Conseguiu escapar e obter refúgio na embaixada panamenha. Dali viajou ao Canadá e depois ao México. Durante esse período foram reforçadas as suas convicções sobre a democracia - que ele julgava ser incompatível com o sistema capitalista.
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Ainda na década de 1970, no Brasil, João Bosco e Aldir Blanc o homenageavam com a música “O Bêbado e a Equilibrista" onde, em um trecho da letra, diz “Meu Brasil / que sonha com a volta do irmão do Henfil / com tanta gente que partiu…”. E a música virou praticamente um hino durante a Campanha pela Anistia aos presos e exilados políticos.
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Em 1979, com a Lei da Anistia, Betinho volta ao Brasil. Encontrou nos economistas Carlos Afonso e Marcos Arruda os companheiros que ajudaram a realizar um sonho e fundaram o IBASE - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas. Passa a se dedicar à luta pela reforma agrária, sendo um de seus principais articuladores. Nesse sentido conseguiu reunir, em 1990, milhares de pessoas no Aterro do Flamengo, Rio de Janeiro, em manifestação pela causa.
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Eu o conheci em 1990, quando iniciávamos a luta contra a privatização da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e ele abraçou a causa. Tivemos várias conversas, na sede do IBASE, e gravei um vídeo onde o entrevistava sobre as alternativas para não privatização da empresa. Lamentavelmente não sei o fim desse vídeo, mas lembro que foi passado e debatido em escolas, universidades e alguns sindicatos. Além da defesa intransigente da empresa nacional, ele começou a desenvolver um projeto de transformar a CSN em uma “empresa pública”, administrada pela sociedade!
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Nesta época já se dedicava com todo o seu amor à “Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida”, movimento em favor dos pobres e excluídos.
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Em 1986 Betinho descobriu ter contraído o vírus da imunodeficiência humana (AIDS) em uma das transfusões de sangue a que era obrigado a se submeter periodicamente devido à hemofilia. Em sua vida pública esse fato repercutiu na criação de movimentos de defesa dos direitos dos portadores do vírus. Junto com outros membros da sociedade civil, fundou e presidiu até a sua morte a Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS. Dois dos seus irmãos, Henfil e Chico Mário, morreram em 1988 por consequência da mesma doença. Mesmo assim, não deixou de ser ativo até o final de sua vida, dizendo que a sua condição de soropositivo o forçava a “comemorar a vida todas as manhãs”.
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Ele gostava muito de contar uma fábula que aprendi e já usei em várias aulas. Não sei se era de sua autoria.
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“Uma vez, na floresta, houve um grande incêndio e os animais começaram a fugir, desesperados. Certo momento, a onça olhou para o alto e viu um beija-flor que corria até o riacho, enchia o bico de água, jogava no fogo e voltava para pegar mais. Curiosa, a onça perguntou: ‘Você acha que, com esse biquinho aí, vai conseguir apagar esse fogo?’. O beija-flor parou no ar e respondeu: ‘Não, eu sei que sozinho não consigo, mas estou fazendo a minha parte’.”
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Betinho era genial! Morreu no Rio de Janeiro, em 9 de agosto de 1997, já bastante debilitado. Deixou dois filhos: Daniel, filho do seu primeiro casamento com Irles Carvalho, e Henrique, filho do segundo casamento com Maria Nakano, com quem viveu por 27 anos.
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BETINHO ESTARÁ SEMPRE PRESENTE EM NOSSAS LUTAS!
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VIVA BETINHO!
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Nas imagens: 01) Betinho; 02) genial charge de Aroeira; 03) “Fome – a maior violência!”
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