sábado, 8 de novembro de 2014

Agora, é guerra total contra os BRICS



 
Agora, é guerra total contra os BRICS 

4/11/2014, Pepe Escobar, Rússia Today Tradução: Vila Vudu

Apertem os cintos, a guerra de informação já desencadeada contra a Rússia deve expandir-se para Brasil, Índia e China.

Brasil, Rússia, Índia e China, como o mundo inteiro sabe, são os quatro principais países do grupo BRICS de potências emergentes, que também inclui a África do Sul e em futuro próximo incorporará também outras nações do Sul Global. Os BRICS perturbam imensamente Washington – e sua Think-Tank-elândia – porque são a corporificação do impulso concertado do Sul Global rumo a um mundo multipolar.

Podem-se apostar garrafas de champanhe crimeano que a resposta dos EUA a esse processo deve ser alguma espécie de guerra total de informação – não muito diferente, em espírito, do “Conhecimento Total de Informação” [orig. Total Information Awareness (TIA)], elemento central da Doutrina da Dominação de Pleno Espectro, do Pentágono. Os BRICS são vistos como importante ameaça –, e conseguir contratorpedeá-los implica dominar toda a grade informacional.

Vladimir Davydov, diretor do Instituto de América Latina da Academia de Ciências da Rússia, acertou o olho do alvo quando observou que “a situação atual mostra que há tentativas para suprimir não só a Rússia, mas também os BRICS, dado que o papel global daquela associação só faz crescer.”

A demonização da Rússia escalou rapidamente nos EUA, das sanções relacionadas à Ucrânia, para Putin o “novo Hitler” e a ressureição do bicho-papão bem testado ao longo da Guerra Fria, tipo “Os Russos estão chegando”.

No caso do Brasil a guerra de informação já começou antes da reeleição da presidenta Dilma Rousseff. Assim como Wall Street e suas elites comprador locais faziam de tudo para bombardear o que definem como economia “estatista”, Dilma foi também pessoalmente demonizada.

Passos não inimagináveis para futuro próximo talvez incluam sanções contra a China, por causa de sua posição “agressiva” no Mar do Sul da China, ou Hong Kong, ou Tibet; sanções contra a Índia por causa do Kashmir; sanções contra o Brasil por causa de violações de direitos humanos ou excesso de desflorestamento. Seletos diplomatas indianos, lamentam, off the record, que o primeiro dos BRICS a ser afivelado sob pressão será a Índia.

Dado que os BRICS são tijolos realmente chaves na construção de um sistema global de relações internacionais e um sistema financeiro mais inclusivos – e não há outros no mercado –, eles que, pelo menos, mantenham-se bem alertas. Se não, cada um deles será abatido, um depois do outro.

Georgy Toloraya, diretor executivo da Comissão Nacional Russa de Pesquisa sobre os BRICS, lembra que hoje, pelo menos, há “mais e mais comunicação acontecendo pelos canais BRICS.”

Os brasileiros, por exemplo, estão particularmente interessados em cooperação de investimentos. O Banco de Desenvolvimento dos BRICS será realidade já em 2015. E uma equipe russa está preparando relatório detalhado sobre perspectivas futuras para cooperação entre os BRICS, para ser discutido em Pequim, em profundidade, durante uma semana, enquanto acontece a reunião de cúpula da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico [orig., Asia-Pacific Economic Cooperation, APEC].

Da guerra de energia à guerra da moeda

O novo choque do petróleo dos sauditas – que, no mínimo, recebeu luz verde do governo Obama – combina perfeitamente com o padrão “Conhecimento Total de Informação” (TIA), em termos de ofensiva contra os BRICS, com dois deles no papel de alvos chaves: Rússia e Brasil.

Mais de 50% do orçamento da Rússia vem da venda de petróleo e gás. Cada redução de $10 no preço do barril de petróleo significa que a Rússia deixa de receber coisa como $14,6 bilhões por ano. Pode ser de certo modo compensado pela desvalorização do rublo – mais de 25% contra o dólar norte-americano, desde o início de 2014. E a Rússia, claro, ainda tem cerca de $450 bilhões em reservas. Mesmo assim, a economia russa pode crescer só de 0,5 a 2% em 2015.

Com a redução de $1 nos preços do petróleo cru, a maior empresa brasileira, Petrobras, perde mais de $900 milhões. Aos preços atuais do petróleo, a Petrobras estará perdendo em torno de $14 bilhões por ano. A queda dos preços portanto mina a expansão de longo prazo da Petrobrás para financiar novos projetos de infraestrutura e de exploração conectados aos seus valiosos depósitos de petróleo do pré-sal. A Petrobras foi alvo preferencial para a demonização de Rousseff.

O Irã não é membro dos BRICS, mas partilha o impulso do grupo com vistas a um mundo multipolar. Para equilibrar o próprio orçamento, o Irã precisa de petróleo a $136 o barril. Um acordo nuclear a ser firmado com o P5+1 em três semanas, dia 24/11, pode levar a um alívio nas sanções – pelo menos as vindas da Europa – e permitir que o Irã melhore suas exportações de petróleo. Mas em Teerã não há ilusões sobre o quanto a manipulação dos preços foi cerebrada para desestabilizar ainda mais a economia iraniana e minar sua posição nas negociações nucleares.

No front econômico, a doutrina do “Conhecimento Total de Informação” [orig. Total Information Awareness (TIA)] manifesta-se em o Fed pôr fim ao quantitative easing, QE [injeção de dólares recém impressos na economia, lit. “facilitação quantitativa” ou “alívio quantitativo”]: significa que o dólar dos EUA continuará a subir e mais dólares dos EUA deixarão os mercados emergentes. A rede chinesa Xinhua expôs e discutiu seriamente essa questão.

O dólar norte-americano e o yuan estão efetivamente ligados. Quando o dólar norte-americano sobe, o yuan também sobe. Mas é a economia chinesa que sofre. O que preocupa Pequim é que é possível que a manufatura chinesa torne-se excessivamente cara, em muitíssimos países nos quais as margens de lucro já são muito estreitas.

Portanto, o que com certeza acontecerá é o Banco Central da China determinar uma queda controlada do yuan – e ao mesmo tempo desenvolver mecanismos para combater a saída de dinheiro quente, sobretudo para Hong Kong.

A China pode até ser relativamente imune ao fim do QE. Mas todos na Ásia lembram ainda muito bem da crise financeira de 1997, que respingou na Rússia em 1998. Os únicos beneficiados então foram – e quem seria?! – os interesses privados norte-americanos e a hegemonia de Washington.

O centro não se mantém coeso
[orig. The center cannot hold]
A demonização dos BRICS, em graus diferentes, prossegue sem parar – com o foco central na Rússia, a qual, por falar dela, iniciará a 3ª Guerra Mundial. Por quê? Porque os EUA dizem que sim.

A mais recente ação envolve o Serviço de Inteligência da Defesa Dinamarquesa [orig. Danish Defense Intelligence Service (DDIS)], que noticiou, semana passada que a Rússia simulara um ataque com jatos e mísseis sobre a ilha de Bornholm em junho.

DDIS não distribuiu qualquer detalhe concreto sobre o ataque simulado. Mas enfatizou que foi o maior exercício militar russo sobre o Mar Báltico desce 1991. DDIS distribuiu um documento “Avaliação de Risco 2014” [orig. Risk Assessment 2014], no qual prevê que “ao longo dos próximos poucos anos, a situação no leste da Ucrânia tem alta probabilidade de converter-se em novo conflito europeu frio.”

Mas os dinamarqueses foram muito claros: “Não há indicações de que a Rússia constitua crescente ameaça militar direta ao território dinamarquês.” Nada disso impediu que os chefes militares norte-americanos de sempre se pusessem a repetir que a Rússia se prepara para iniciar a 3ª Guerra Mundial.

Não há absolutamente nenhuma prova de que Washington esteja preparada sequer para discutir a possibilidade de modificar o atual sistema-mundo, como teorizado por Immanuel Wallerstein, na busca por gestão mais democrática. A próxima reunião do G20 na Austrália, mais uma vez, deixará isso bem claro.

O que se vê, portanto, é o sistema, cada dia mais fragmentado, deslizando inexoravelmente rumo a um catastrófico ponto de ruptura.  O “Conhecimento Total de Informação” [orig. Total Information Awareness (TIA)] e suas reviravoltas e circunvoluções não passam de “estratégia” desesperada para adiar uma decadência inevitável. No fim, Wallerstein estava certo. O mundo do pós-Guerra Fria está condenado a permanecer imensamente volátil. *****

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