28/06/2015 - Copyleft
Antonio Lassance (*)Escândalo: o lobby das petroleiras que se transformou em projeto de lei
Plano do lobby das petroleiras estrangeiras revelado pelo Wikileaks mostra o entreguismo de José Serra: senador quer dar de bandeja o pré-sal.
Entreguismo juramentado
O senador José Serra (PSDB-SP) transformou interesses do lobby das petroleiras estrangeiras em projeto de lei. Com o apoio de vários congressistas, conseguiu aprovar requerimento de urgência para que o projeto seja votado o quanto antes.
A proposta (Projeto de Lei do Senado 131/2015) permite excluir a Petrobrás do pré-sal e deixar a exploração do petróleo brasileiro exclusivamente por conta de empresas estrangeiras.
Na justificativa de seu projeto, ruge e urge o Senador:
“Torna-se imprescindível então a revogação da participação obrigatória da estatal no modelo de exploração de partilha de produção, bem como da condicionante de participação mínima da estatal de, ao menos, 30% da exploração e produção de petróleo do pré-sal em cada licitação.”
O entreguismo sequer nos poupou do sarcasmo. Bafeja que a permissão para excluir a Petrobras é para "ajudá-la" nesse momento difícil. O empurrãozinho é para tirá-la do jogo. Os campos podem vir a ser explorados com 100% de participação estrangeira e zero de presença da empresa brasileira.
Para os setores nacionalistas, a participação, mesmo que minoritária (30% da Petrobrás, no mínimo, e até 70% de outras empresas), é considerada essencial para se ter um mínimo controle sobre o real volume de Petróleo extraído, além do domínio fundamental que a Petrobrás exerce sobre a tecnologia de extração.
O regime de partilha também garante o conteúdo nacional que alimenta uma ampla rede de empresas brasileiras relacionadas direta ou indiretamente à economia do petróleo e gás. A mudança nas regras do jogo pode tirar de cena essas empresas e os respectivos empregos mantidos em nosso território.
É disso que se trata: manter ou entregar. É resgatar e fortalecer a Petrobras ou dela subtrair uma importante fonte de recursos.
Serra e as petroleiras estrangeiras: “nós”
Um vazamento feito pelo grupo Wikileaks (o Cable 09RIODEJANEIRO369) revelou que o lobby das empresas petrolíferas estrangeiras atuou pesadamente para, desde 2009, derrubar a proposta encaminhada pelo presidente Lula ao Congresso e aprovada sob muita polêmica, mas com uma correlação de forças, na época, mais favorável aos interesses nacionais. A correlação de forças agora mudou, e o lobby estrangeiro voltou à carga com toda força.
No Cable (a mensagem descoberta e vazada pelo grupo Wikileaks), José Serra aparece como interlocutor privilegiado do lobby petrolífero. O Cable tem origem no Consulado dos Estados Unidos, no Rio de Janeiro. É classificado como confidencial seguindo o código 1.4(B) das regras de classificação de documentos do Departamento de Estado. O código é usado em informações relacionadas a governos de outros países e cujo vazamento possa significar "dano aos interesses nacionais" - dos Estados Unidos, bem entendido.
O Cable revela detalhes de conversas tidas com Serra quando este era, pela segunda vez, pretendente à Presidência da República. Serra já anunciava o mesmo simulacro de seu projeto atual no Senado: não se colocar publicamente contra o regime de partilha, mas apresentar emendas que, na prática, significassem sua reversão.
A julgar pelas mensagens reveladas, Serra fez mais do que apenas expressar sua posição. Agiu quase como um consultor das petroleiras estrangeiras, ao sugerir que uma boa saída seria boicotar os leilões do pré-sal. Se elas não fizessem ofertas, o modelo de partilha se revelaria um fracasso e forçaria o retorno ao antigo modelo de exploração.
Diz o texto em inglês, atribuindo a Serra a estratégia: "There will be no bid rounds, and then we will show everyone that the old model worked… And we will change it back". Um detalhe importante que não pode passar desapercebido, estampado na mensagem do Cable atribuída a Serra: ele se refere às petroleiras e ao PSDB como "nós". "Não haverá ofertas" (obviamente, ofertas das petroleiras estrangeiras nos leilões) "e então nós mostraremos a todos que o velho modelo funcionava… e nós vamos fazê-lo voltar."
Os ventos mudaram e o lobby quer ir à forra
Ao contrário da aposta do tucano e da maioria das empresas associadas ao lobby petrolífero estrangeiro, quando se fez o leilão do Campo de Libra (2013), localizado no litoral do Rio de Janeiro - até então, o maior da camada pré-sal , o resultado foi considerado um sucesso.
Coincidentemente, a maioria das gigantes do petróleo, as norte-americanas Exxon Mobil e Chevron e as britânicas British Petroleum (BP) e British Gas Group (BG), cumpriram o combinado: não participaram. Seguiram a aposta de fazer o leilão fracassar.
Mas o lobby falhou e o consórcio vencedor teve a participação de uma das gigantes do petróleo, a Shell. Todo o plano arquitetado em 2010 tinha ido por água abaixo e uma das gigantes roeu a corda do lobby. A Chevron, que encabeça o lobby das petroleiras no Brasil, é a principal concorrente mundial da Shell. A Shell, por sua vez, comprou a BG e tornou-se a principal parceira da Petrobras.
Os ventos começaram a mudar desde que o Governo Dilma passou a sofrer fissuras em sua base de apoio; depois que o Congresso elegeu uma bancada ainda maior de parlamentares interessados em fazer negócios por meio da política; e a partir do exato momento em que José Serra retornou ao Senado.
A segunda empresa que mais gasta dinheiro em lobby do petróleo, nos Estados Unidos, a ultrareacionária Koch Industries, inclusive financia direitistas que estiveram à frente de protestos de 15 de março e 12 de abril deste ano, contra o governo Dilma.
A partir de agora, eles têm a faca e o queijo na mão - e não é para fazer a partilha com nenhum dos brasileiros, a não ser os que façam parte do seu lobby. A orgia do parlamentarismo de negócios testa a consciência dos brasileiros e sua disposição para reagir, antes que seja tarde demais.
(*) Antonio Lassance é cientista político.
O senador José Serra (PSDB-SP) transformou interesses do lobby das petroleiras estrangeiras em projeto de lei. Com o apoio de vários congressistas, conseguiu aprovar requerimento de urgência para que o projeto seja votado o quanto antes.
A proposta (Projeto de Lei do Senado 131/2015) permite excluir a Petrobrás do pré-sal e deixar a exploração do petróleo brasileiro exclusivamente por conta de empresas estrangeiras.
Na justificativa de seu projeto, ruge e urge o Senador:
“Torna-se imprescindível então a revogação da participação obrigatória da estatal no modelo de exploração de partilha de produção, bem como da condicionante de participação mínima da estatal de, ao menos, 30% da exploração e produção de petróleo do pré-sal em cada licitação.”
O entreguismo sequer nos poupou do sarcasmo. Bafeja que a permissão para excluir a Petrobras é para "ajudá-la" nesse momento difícil. O empurrãozinho é para tirá-la do jogo. Os campos podem vir a ser explorados com 100% de participação estrangeira e zero de presença da empresa brasileira.
Para os setores nacionalistas, a participação, mesmo que minoritária (30% da Petrobrás, no mínimo, e até 70% de outras empresas), é considerada essencial para se ter um mínimo controle sobre o real volume de Petróleo extraído, além do domínio fundamental que a Petrobrás exerce sobre a tecnologia de extração.
O regime de partilha também garante o conteúdo nacional que alimenta uma ampla rede de empresas brasileiras relacionadas direta ou indiretamente à economia do petróleo e gás. A mudança nas regras do jogo pode tirar de cena essas empresas e os respectivos empregos mantidos em nosso território.
É disso que se trata: manter ou entregar. É resgatar e fortalecer a Petrobras ou dela subtrair uma importante fonte de recursos.
Serra e as petroleiras estrangeiras: “nós”
Um vazamento feito pelo grupo Wikileaks (o Cable 09RIODEJANEIRO369) revelou que o lobby das empresas petrolíferas estrangeiras atuou pesadamente para, desde 2009, derrubar a proposta encaminhada pelo presidente Lula ao Congresso e aprovada sob muita polêmica, mas com uma correlação de forças, na época, mais favorável aos interesses nacionais. A correlação de forças agora mudou, e o lobby estrangeiro voltou à carga com toda força.
No Cable (a mensagem descoberta e vazada pelo grupo Wikileaks), José Serra aparece como interlocutor privilegiado do lobby petrolífero. O Cable tem origem no Consulado dos Estados Unidos, no Rio de Janeiro. É classificado como confidencial seguindo o código 1.4(B) das regras de classificação de documentos do Departamento de Estado. O código é usado em informações relacionadas a governos de outros países e cujo vazamento possa significar "dano aos interesses nacionais" - dos Estados Unidos, bem entendido.
O Cable revela detalhes de conversas tidas com Serra quando este era, pela segunda vez, pretendente à Presidência da República. Serra já anunciava o mesmo simulacro de seu projeto atual no Senado: não se colocar publicamente contra o regime de partilha, mas apresentar emendas que, na prática, significassem sua reversão.
A julgar pelas mensagens reveladas, Serra fez mais do que apenas expressar sua posição. Agiu quase como um consultor das petroleiras estrangeiras, ao sugerir que uma boa saída seria boicotar os leilões do pré-sal. Se elas não fizessem ofertas, o modelo de partilha se revelaria um fracasso e forçaria o retorno ao antigo modelo de exploração.
Diz o texto em inglês, atribuindo a Serra a estratégia: "There will be no bid rounds, and then we will show everyone that the old model worked… And we will change it back". Um detalhe importante que não pode passar desapercebido, estampado na mensagem do Cable atribuída a Serra: ele se refere às petroleiras e ao PSDB como "nós". "Não haverá ofertas" (obviamente, ofertas das petroleiras estrangeiras nos leilões) "e então nós mostraremos a todos que o velho modelo funcionava… e nós vamos fazê-lo voltar."
Os ventos mudaram e o lobby quer ir à forra
Ao contrário da aposta do tucano e da maioria das empresas associadas ao lobby petrolífero estrangeiro, quando se fez o leilão do Campo de Libra (2013), localizado no litoral do Rio de Janeiro - até então, o maior da camada pré-sal , o resultado foi considerado um sucesso.
Coincidentemente, a maioria das gigantes do petróleo, as norte-americanas Exxon Mobil e Chevron e as britânicas British Petroleum (BP) e British Gas Group (BG), cumpriram o combinado: não participaram. Seguiram a aposta de fazer o leilão fracassar.
Mas o lobby falhou e o consórcio vencedor teve a participação de uma das gigantes do petróleo, a Shell. Todo o plano arquitetado em 2010 tinha ido por água abaixo e uma das gigantes roeu a corda do lobby. A Chevron, que encabeça o lobby das petroleiras no Brasil, é a principal concorrente mundial da Shell. A Shell, por sua vez, comprou a BG e tornou-se a principal parceira da Petrobras.
Os ventos começaram a mudar desde que o Governo Dilma passou a sofrer fissuras em sua base de apoio; depois que o Congresso elegeu uma bancada ainda maior de parlamentares interessados em fazer negócios por meio da política; e a partir do exato momento em que José Serra retornou ao Senado.
A segunda empresa que mais gasta dinheiro em lobby do petróleo, nos Estados Unidos, a ultrareacionária Koch Industries, inclusive financia direitistas que estiveram à frente de protestos de 15 de março e 12 de abril deste ano, contra o governo Dilma.
A partir de agora, eles têm a faca e o queijo na mão - e não é para fazer a partilha com nenhum dos brasileiros, a não ser os que façam parte do seu lobby. A orgia do parlamentarismo de negócios testa a consciência dos brasileiros e sua disposição para reagir, antes que seja tarde demais.
(*) Antonio Lassance é cientista político.
Créditos da foto: Moreira Mariz/Agência Senado
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