'Gente boa também mata': a fascista campanha de educação no trânsito do governo federal
Não é a 'gente boa' - diretamente associada a ações de esquerda na campanha - e sim o governo Temer que mata literal e simbolicamente os brasileiros, mas atribui à juventude e ao povo aquilo que claramente comete
“Gente boa também mata”: a campanha do governo Michel Temer levantou polêmica ao associar ações socialmente consideradas como boas a um possível acidente de trânsito decorrente do uso do celular ao volante. Diversos portais repercutiram o inconformismo de alguns e a dúvida de outros quanto ao sentido que o Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil gostaria de passar.
Em comunicação, não existe mensagem sem intenção. O significado em aberto tem o objetivo de provocar. Esse é um velho truque da publicidade, que, nos dias atuais, aposta também na viralização com base na polêmica.
São duas as peças. Um vídeo distribuído nas redes sociais e cartazes afixados em diversas cidades brasileiras. No vídeo, vê-se uns jovens plantando árvores, um homem servindo sopa para pessoas em situação de rua e uma mulher sendo gentil e pixando corações nos muros cinzas da cidade. No final dele, um ciclista é atropelado por uma moça que confere o celular.
Veja a propaganda:
Os cartazes são ainda mais explícitos. “Quem resgata animais na rua pode matar” e “O melhor aluno da sala pode matar” escrito em letras garrafais. Apenas nas letras miúdas dos cartazes vem a “justificativa”: dirigir usando o celular é perigoso. Como tem gente que acha que tudo é consumo na vida, essas letras miúdas são como as letras miúdas em contratos proibidas pelo Código de Defesa do Consumidor: estão lá para te enganar, para não serem lidas.
Acontece que o sentido em aberto em que essa campanha se sustenta deixa, ao final, fortemente realçado o seu sentido perverso, ou seja, a naturalização do fato de que pessoas que praticam boa ação “também matam” e, portanto, são perigosas – indo mais além, devem ser vigiadas, controladas, punidas, quiçá por antecipação. O texto do vídeo da campanha, por exemplo, não sugere que tais cidadãos podem matar, mas afirma que eles matam. Já os cartazes ressaltam essa afirmação e fixam a mensagem: essa galera do bem também pode matar. Assim, essas pessoas não são potencialmente perigosas, diz o texto da campanha: elas já são perigosas, não confiem em seus sorrisos.]
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Mas a questão não para aí: o vídeo usa diversos estereótipos que relaciona as ações praticadas da peça com “tipos sociais” esquerda. São pessoas tatuadas, modernas, jovens ativistas, que estão espalhando amor pela cidade — qualquer semelhança com o mote da campanha de Fernando Haddad à prefeitura de São Paulo, em 2012, não pode ser mera coincidência — e que procuram ser protagonistas de uma cidade melhor, uma sociedade mais justa e igualitária.
Curioso, nesse aspecto, é o fato de ser uma campanha de trânsito: sabemos que a redução das velocidades na cidade de São Paulo fez despencar o número de mortes nas ruas, avenidas e marginais da cidade. E que essa redução foi uma das bandeiras, novamente, da campanha de Haddad em 2016. Atenção petistas ou apoiadores do prefeito, vocês também já são culpados de matar um pedestre ou ciclista imaginário, mesmo que sua posição tenha contribuído para salvar dezenas de vida no trânsito só em 2016!
Por que a sugestão de que esse tipo de pessoa – que defende os mais fracos, que vai bem na escola, que trabalha pela comunidade - mata? Se a mensagem era contra a direção irresponsável, por que a associação?
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Vivemos tempos de acirramento ideológico no Brasil. Logo após o golpe de Estado no país, verificou-se um recrudescimento do conflito de posições à direita e à esquerda.
Neste cenário, a extrema direita misógina e racista ganhou corpo e, já nas primeiras horas de 2017, mostrou o que acontece quando os comentários de redes sociais se materializam na vida real, com o atentado feminicida que vitimou 12 pessoas em Campinas, no interior de São Paulo (leia mais sobre isso aqui e aqui).
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A fascistização da sociedade não é, portanto, algo estranho à nova era no Brasil. Ao atacar a cultura do amor e da solidariedade, o que o governo transmite é uma mensagem clara de destruição da tolerância, da diversidade, paz, amor e protagonismo social. Ser feminista, militante pelas cotas, defender a paz na comunidade: isso faz de você uma ameaça a todos.
Ao atacar as práticas de solidariedade e amor associá-las a mortes e assassinatos, o governo desfecha um claro ataque também à geração de 1968 que lançou o sonho de um mundo solidário, pacífico e amoroso, do qual a juventude seria um alicerce fundamental, atuando de forma histérica, tal como os nazistas que usaram o incêndio do Reichtag para suprimi-lo.
Não é a “gente boa” e sim o governo Temer que mata literal e simbolicamente os brasileiros, mas atribui à juventude e ao povo aquilo que claramente comete.
Está lançado o desafio para “a gente boa” das redes sociais. Denunciemos, numa antipropaganda, como a cada dia o governo Temer mata o povo brasileiro com seu pacote infinito de maldades, que incluem: a reforma previdenciária; a reforma trabalhista; a PEC 55, a entrega da soberania no Pré-Sal, aumento do salário mínimo abaixo da inflação, reforma autoritária do Ensino Médio, a repressão aos movimentos sociais, a genocida política de privatização carcerária, a ameaça de intervenção sobre universidades e a FIOCRUZ e etc. Quem mata, inclusive no trânsito, são as medidas demagógicas baseadas na manipulação descarada de fantasias, como a da “indústria da multa”.
Entretanto, para nós, a voz da utopia e dos sonhos democráticos e socialistas falam mais alto: estejamos atentos e fortes, pois não há tempo de temer a morte.
Outro lado
Em nota, a Secretaria Especial de Comunicação da Presidência da República afirmou que "o alerta que se faz é que não apenas o motorista estereotipado como 'inconsequente' provoca acidente. Mesmo que involuntariamente, qualquer cidadão pode causar acidentes graves e até mortes no trânsito com pequenas atitudes, como mandar um whatsapp enquanto conduz, desviar a atenção das ruas ao trocar a música no rádio ou fazer uma ultrapassagem em locais de risco, sem visibilidade ou em trecho com faixa continua. As mortes no trânsito estão entre as 10 principais causas de óbitos no país. É essa realidade que o Governo Federal quer mudar".
Fonte: Diálogos do Sul
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